A verdade que se exploda

Você nunca ouviu falar de Clara Averbuck? Basicamente é o seguinte: ela é uma blogueira feminista que tem ideias bastante curiosas, para quem diz ser democrata. Por exemplo:

1. Ela acha que a classe média brasileira é ignorante “além do bom senso”. Bem, ela pode achar o que quiser – inclusive que há uma medida necessária de ignorância para todo homem – sobre o que discordamos absolutamente. Ignorância não é um direito, mas um defeito! Além disso, não seria no mínimo temeroso generalizar a classe média assim, de uma só tacada? Alguém tem de dizer à escritora que o próprio de viver em democracia é justamente isso: nela a opinião de qualquer indivíduo vale tanto quanto as opiniões ilustradas e esclarecidas da senhora Averbuck, exceto quando a ciência diz o contrário.

2. Ela acha que os religiosos não podem “contestar leis no STF”, mas entende que outros grupos podem fazer isso, quando são favoráveis às demandas de grupos pró-aborto et caterva.

3. Ela acha que misoginia, radicalismo, preconceito, raiva e rancor são coisas de gente “da direita”. Ela se auto-denomina “de esquerda, por favor”. Curioso que ela não cita outros colegas “de esquerda” ou seus aliados no seu blog, como os virtuosos João Pedro Stédile, Renan Calheiros, José Dirceu, João Paulo Cunha, José Genoíno. Será que todo membro “de esquerda, por favor”, possui a exclusividade do bom caratismo? A experiência recente do Brasil não mostra isso, não é?

Mas o tema do texto não é o silêncio descarado da blogueira sobre o maior golpe à República de todos os tempos, que foi o Mensalão, cujo chefe ainda não foi pego; nem sobre os critérios morais que ela utiliza para saber o que é preconceito e radicalismo. A blogueira pode ter ideias equivocadas sobre alguns assuntos, enquanto acerta em outros. No seu caso, pelo contrário, revela-se uma incrível coerência no seu pensamento,

O motivo do texto é refletir sobre algo mais fundamental, aquilo que justamente permite que ela seja tão engraçada, como no caso do elogio sem vergonha dos políticos dos partidos “de esquerda”. No fundo, para a blogueira, não há nada que seja importante por natureza: não há justiça, nem direito, nem bem-estar, nem felicidade. Para a blogueira, esses conceitos são todos reformuláveis segundo o seu talante, segundo o seu humor. Ela quer mesmo que a verdade se exploda, se a verdade contrastar com suas opiniões diárias. Aliás, segundo sua própria pena, a verdade não tem nada de permanente:

“1. É verdade, mas é tudo mentira“.

De outro modo, parece que para a escritora não há nada de realmente seguro, verdadeiro, permanente na vida. O que é defendido hoje pela blogueira pode, sem problema, ser combatido amanhã. Por exemplo, a blogueira diz que é a favor da liberdade, mas só até a página dois. Se os grupos cristãos exercerem o direito de ter suas legítimas demandas acolhidas pela constituição, aí eles não têm liberdade, não; a blogueira diz que é a favor da vida, mas só de algumas delas. Se as pessoas têm um minuto de vida, um segundo, aí ela não defende, não; a blogueira defende a legitimidade das instituições democráticas, mas só até uma delas ultrapassar o limite do “politicamente correto”, traçado por ela mesma. E é nesse espírito que a blogueira analisa o texto do Estatuto do Nascituro (Projeto de Lei nº 478/2007): mandando a verdade às favas.

Por exemplo, a blogueira diz que o Estatuto do Nascituro criou a necessidade do Estado pagar uma bolsa estupro às vítimas de violência sexual. Veja que ela tenta ridicularizar o benefício proposto pelo Estatuto falando que ele seria um incentivo ao bestial delito. Supondo que a blogueira usa-se a mesma lógica para outros objetos, o Bolsa Família poderia também chamar-se Bolsa Miséria, mas ela não faz isso: ela quer mais é que a verdade se exploda! Pelo contrário, o subsídio do Estado aos violentados assemelha-se ao subsídio aos que passam por situação de pobreza: não pretende fazer com que a situação permaneça, muito menos incentivar a que os cidadãos busquem a pobreza extrema, mas pretende minorar as agruras de quem sofre tais violências absurdas.

Outro exemplo em que a blogueira quer que a verdade se exploda: ela diz que, em razão do Estatuto, as gravidezes que ponham em risco de morte a mãe violentada estariam proibidas de sofrer quaisquer atos médicos realmente necessários: mentira! Caso as gravidezes, frutos de violência ou não, ponham em risco de morte a mulher, elas obviamente poderão buscar atos médicos, sempre visando a sua saúde, mas nunca intentando a morte do bebê concebido a 30 dias, 15 dias ou 1 segundo atrás. Mas isso não interessa à blogueira: ela quer que a verdade se exploda!

De modo curioso, a blogueira parece ser a favor da discriminação de bebês (e seu relativo assassinato por aborto) em razão de alguma doença. Pois quando o artigo 9º diz que “É vedado ao Estado e aos particulares discriminar o nascituro, privando-o da expectativa de algum direito, em razão do sexo, da idade, da etnia, da origem, da deficiência física ou mental ou da probalidade de sobrevida”, ela fica brava. Quer dizer que se o bebê tiver doença grave pode-se matá-lo?? Ela dá a entender que o bebê de 1 mês não é vida humana, nem de 29 dias, nem de 15, nem de 1. Mas será que não é?? Não importa para ela: que a verdade se exploda!

De novo, falando de deficiências físicas que dificultem a vida extra-uterina, ela acha que anencéfalo não vive o suficiente. Aí vem o problema: o que é suficiente para ela? Será que um bebê que vive apenas um ano viveu o suficiente? Ou 6 meses? Esses casos de diagnóstico de anencefalia seriam suficientes para a blogueira? E a verdade sobre a sobrevivência extra-ulterina? Que se exploda!

A pior de todas as mentiras da blogueira é a afirmação de que o Estatuto reflete a posição religiosa de uma parcela da população. Não é verdade! A defesa da vida do mais inocente é assunto de ciência. Se por acaso nesse ponto os elementos se encontrem é meramente eventual. Por causa de sua ideologia anti-natalista, ou mesmo eugênica, ela chama o bebê reiteradamente de “amontoado de células”, como se todos nós – nascidos – fôssemos muito diferente disso. Um homem ou uma vaca são amontoados de células; um cadáver humano ou um cadáver de vaca são amontoados de células; um homem dormindo ou uma vaca no abatedouro são um amontoado de células. Então, qual a diferença entre o homem e a vaca, já que, no nível celular, são idênticos? Obviamente, é a natureza. Natureza que não depende de estar acordado, consciente, vivo ou morto. A dignidade humana não é algo que se outorga com uma lei, mas apenas se lhe a reconhece. Não, o bebê não é um amontoado de células! Desde a concepção cada humano possui já todos os elementos constitutivos da sua natureza, que o fará um artista, um cientista, um cidadão com direitos civis, reconhecidos ou não pela legislação. Mas isso não importa para a blogueira: ela quer a a verdade se exploda!

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