Ateísmo 2.0

O ateísmo é uma teoria curiosa. Eles evoluem como os invertebrados supostamente identificados por Darwin. Ou só alguns deles, como dizia o mesmo pesquisador. No passado, o ateísmo tinha consequências práticas, mas era fundamentalmente teórico. Isto é, para um ateu do século XVII, para um iluminista engajado, o ateísmo se movia sobre um princípio filosófico embasando suas teses e, por isso, ele era ateu na prática. Eram questões metafísicas, como a pretensa inexistência do invisível, ou a existência do mal, duas das razões que fundamentavam as escolhas dos indivíduos. Mas o ateísmo se metamorfoseia, como uma lagarta. No ateísmo 2.o não se possuem argumentos tão fortes, mas a existência de Deus é muito incômoda. Então, os ateístas engajados mudam de tática e escolhem o ateísmo, apesar de não haver razões claras para isso. Nesta nova perspectiva, escolhe-se o ateísmo e, depois, corre-se atrás de qualquer argumento. É o aggiornamento do ateísmo.

Para o neo-ateísmo não importa se o mundo físico é inexplicável per se, exigindo um princípio imaterial que o sustente; para eles não interessa que a vida surgindo dos elementos brutos seja impensável; não importa que a razão repugne o surgimento da vida espiritual a partir do material, tornando o homem um milagre inexplicável da natureza. Enfim, argumentos não valem. O que importa é a decisão: o ateísmo tem que ser seguido e pronto.

Sendo assim, o que os seguidores do ateísmo fazem para argumentar acerca de sua decisão? Esgrimam acusações ao léu sobre os teístas e, especialmente, sobre a história do cristianismo. Com um grito histriônico, que na verdade ofende o lendário Canto das Sereias da mitologia, o neo-ateísmo levanta acusações sobre a moralidade dos teístas, sobre a moralidade das instituições teístas, sobre a impossibilidade do conhecimento do divino. Tudo, porém, da perspectiva do Ateísmo 2.0, isto é, todo fato que desminta a escolha ateísta é peremptoriamente negado ou escondido. Pois vamos lá:

1. Dos argumentos para justificar a escolha dos ateístas o mais importante é sobre a natureza do intelecto humano. Dizem que a capacidade cognoscitiva do homem é muito limitada para saber sobre temas tão difíceis como a existência da Divindade e sua natureza. A esta postura denominou-se agnosticismo e já vimos porque é insustentável. Mas o curioso é que o agnosticismo nada mais é que um disfarce mal costurado para o ateísmo, como o Jô Soares desmascara no “As Esganadas”: o agnóstico é um ateu medroso, alguém ainda mal resolvido que não tem coragem de defender o ateísmo forte, porque sabe que as consequências são funestas. Ele sabe, ou pelo menos suspeita, que no campo moral negar Deus é cair na falta de lei (se Deus não existe tudo é permitido) ou na fundamentação social da lei (se Deus não existe a lei é o próprio homem), o que já foi provado pela história que não é nada bom. Ainda que não seja o melhor motivo para fugir do ateísmo, é já um motivo.

2. Em geral, quando esse breve cântico falha, inicia-se a sequência de acusações. A primeira é sobre o caráter obscurantista da Igreja Católica: os cristãos e o cristianismo não fazem a ciência avançar. A existência da religião é um atraso científico. Não sabem (por que não interessa saber) que a Academia de Ciência do Vaticano possui na sua história 29 prêmios Nobel. Quantos prêmios Nobel possuem as faculdades brasileiras, de onde e em nome de quem falam os ateístas histriônicos? Nenhum! Não que a ciência de um país se meça pela quantidade de prêmios internacionais. Mas se alguém tem o direito de acusar de obscurantismo a ação de alguém, se alguém pode levantar suspeitas sobre se a ação dos indivíduos impede o andamento da ciência, quem é? O Vaticano com seus 29 prêmios ou essas faculdades do Brasil, sem prêmios nesses séculos, e que formam majoritariamente sindicalistas e políticos e não cientistas?

3. Outra acusação é a do mal no mundo. O ateísmo histérico lança na mesa os males do mundo como se fossem prova de que Deus não há. Assim, a discussão está acontecendo, os argumentos deles vão sendo derrubados, aí eles vem e jogam a paralisia na mesa: “mas se Deus existe por que ele deixa isso acontecer”… como se houvesse relação entre a doença do homem e a existência de Deus. A doença do cabrito é prova de que o homem, animal mais perfeito em relação ao cabrito, não exista? Não! Ora, então por que as doenças humanas seriam prova de que Deus não existe? Por que para o ateísmo 2.0 qualquer prova vale, mesmo as falsas, contanto que sejam contra a existência de Deus. De fato, o ateísmo serve como um anestésico contra a dor e a injustiça que estão no mundo. Como não há solução para esse fato, afinal o PT, PC do B, PSOL estão aí, eles afirmam que Deus não pode existir. No fundo, o ateísmo é moralista, pois tira suas conclusões de premissas morais. De modo inconsciente sustentam que se entendem o mal no indivíduo, na situação, então um ser Todo Bom não pode existir. Falácia escancarada…

Mas e as provas de que o universo é um milagre de coincidências improvável, que cada célula viva é um milagre incompreensível, que a vida por acaso é quase impossível? Bem tudo isso fica no escuro, por que não advoga em favor do neo-ateísmo, qual seja: o mundo tem que se tornar ateu a todo custo, inclusive da verdade.

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