Católica pede conselho diante da conversão do esposo ao protestantismo

Estou passando um sério problema conjugal, pois meu casamente está terminando após longos anos, principalmente porque meu marido resolveu frequentar uma Igreja Evengélica e, por ele ser uma pessoa de pouca cultura, acredito que está interpretando tudo errado. Ele só fala para mim que está na Bíblia que a mulher tem que ser submissa ao homem e tem que viver na obediência. Se eu vou ao supermercado sem falar nada e depois comento ele já diz: – “Você quer continuar vivendo na desobediência”. Resumindo, minha vida virou um inferno, não sei mais o que argumentar. Me esclareça por favor. Sempre fui católica e praticante, faço parte do Grupo de Oração e não me vejo em uma Igreja Evangélica. Já faz 2 anos que ele está frequentando essa Religião. (Anônima)

Caríssima sra., lhe desejamos primeiramente toda a paz e a graça que procedem da parte de Nosso Senhor Jesus Cristo enquanto rogamos ao bom Deus que nos auxilie nesta reflexão e nos guie até a paz que procede da verdade e da virtude.

Vosso caso é muito delicado e por desconhecermos pormenores de vosso relacionamento gostaríamos de deixar muito claro que nesta conversa faremos juizos a partir das informações que temos; não será possível esgotar o assunto portanto, tentaremos nos ater a alguns princípios fundamentais que poderão depois nortea-lá em vossas decisões.

Tens toda a razão em tentar salvar vosso casamento; saibas que Deus mesmo é convosco nesta intenção. Com efeito, Nosso Senhor Jesus Cristo deu Ele mesmo atenção especial ao casamento durante Sua vida nesta terra. Além de iniciar sua vida pública na celebração de um casamento, deixou claro a vontade divina de resgatar a indissolubilidade matrimonial pelo recebimento da graça, capaz de por fim a dureza do coração humano:

Continuou Jesus: “Foi devido à dureza do vosso coração que ele vos deu essa lei; mas, no princípio da criação, Deus os fez homem e mulher. Por isso, deixará o homem pai e mãe e se unirá à sua mulher; e os dois não serão senão uma só carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. Não separe, pois, o homem o que Deus uniu.” (São Marcos 10, 5-9)

Estas palavras de Jesus Cristo podem ser consideradas como o marco zero, o momento primeiro em que se inicia a sacramentalidade do matrimônio como a conhecemos: agora o casamento passa a contar com a graça específica e especial para o homem não separar aquilo que Deus uniu. A partir de agora é o próprio Deus encarnado quem declara solenemente e positivamente o princípio indissolúvel em que está e deve estar fundado o plano divino original sobre o casamento humano: já não são mais duas carnes, mas apenas uma, já não são mais dois, mas apenas um! Como quem quer dizer: mesmo que se queira, a desunião a partir de agora jaz impossível. É como querer dividir uma criança ao meio!

São Mateus também narra esse episódio demonstrando a importância que Cristo dá a esta realidade profunda e misteriosa acerca da união entre homem e mulher no casamento: “Os fariseus vieram perguntar-lhe para pô-lo à prova: É permitido a um homem rejeitar sua mulher por um motivo qualquer? Respondeu-lhes Jesus: Não lestes que o Criador, no começo, fez o homem e a mulher e disse: Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher; e os dois formarão uma só carne? Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, não separe o homem o que Deus uniu” (São Mateus 19, 3-6).

Ora, desde que Cristo afirmou que “Aquele que faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (São Marcos 3, 35), e que nos deixou explícita e clara qual seria a vontade divina acerca da vivência matrimonial, precisamos nos esforçar para seguí-la se desejamos participar ativamente da família cristã. “Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus” (São Mateus 7, 21).

Se sabemos também que o amor é o vínculo da perfeição (Colossences 3, 14) viveremos tanto mais a vontade divina do casamento quanto mais descobrirmos a medida do amor de Cristo para com a humanidade: “Caríssimos, se Deus assim nos amou, também nós nos devemos amar uns aos outros” (I São João 4,11).

E como Deus nos amou? A narrativa dos evangelhos nos indicam quatro diferentes vivências desse amor:

1) Jesus nos deu sua vida livremente: “Ninguém a tira de mim, mas eu a dou de mim mesmo e tenho o poder de a dar” (Jo 10,18);
2) Nos deu sua vida sem reservas: “até o extremo os amou” (Jo 13,1);
3) Deu-nos sua vida fielmente: “Eu estarei sempre convosco” (Mt 28,20)
4) Deu-nos sua vida fecundamente: “Eu vim para que tenham vida” (Jo 10,10).

Foram justamente essas quatro características do amor divino um dia propostas a vós como compromisso de caminho matrimonial diante do altar: “Vocês vieram aqui livremente (1) e sem reservas (2) para darem-se um ao outro em casamento? Vocês prometem ser fiéis (3) até a morte? Vocês prometem receber com amor os filhos (4) que Deus vos der?

Ao dizer do “sim”, marido e mulher prometeram amar-se mútuamente, como Cristo nos amou. A vida de união indissolúvel será posteriormente a concretização, a consumação prática desses votos assim como Cristo, depois de oferecer toda a sua vida na revelação do Amor, consuma a prática de suas palavras na entrega total da crucificação: “Havendo Jesus tomado do vinagre, disse: Tudo está consumado. Inclinou a cabeça e rendeu o espírito” (São João 19,30).

Neste sentido São Paulo irá afirmar categóricamente que a união matrimonial é e precisa ser um constante reflexo da entrega de Cristo à Igreja e à humanidade: “Maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela… Por esta razão o homem deve deixar seu pai e sua mãe e unir-se à sua esposa, e os dois devem se tornar uma só carne. Este é um grande mistério, eu quero dizer no que se refere a Cristo e a Igreja” (Ef 5. 25,31-32).

Se a união matrimonial deve seguir o exemplo da união entre Cristo e a Igreja, nada menos do que uma entrega completa e perfeita até as últimas consequências é a vocação do cônjuge. Como Cristou amou a Igreja? “Este é o meu corpo, que será entregue por vós” (Lc 22,19). Como devem amar esposos no casamento? Entregando-se ambos um ao outro até o fim: “completai a minha alegria, permanecendo unidos. Tende um mesmo amor, uma só alma e os mesmos pensamentos” (Filipenses 2,2)

Esta breve reflexão nos demonstra como é caro a Deus a indissolubilidade do matrimonio, e como Ele mesmo deseja que a observemos, pois como nos ditou o grande apóstolo, “é grande este mistério“. Se é assim, e de fato é, não poderá faltar ânimo e disposição para cumprir esse intento em vosso matrimonio. Assim nos propõem o Catecismo da Igreja Católica no ponto 1639 e 1642:

“O consentimento pelo qual os esposos se entregam e se acolhem mutuamente é selado pelo próprio Deus (Mc 10,9). De sua aliança “se origina também diante da sociedade uma instituição firmada por uma ordenação divina” (GS 48,1). A aliança dos esposos é integrada na aliança de Deus com os homens: “O autêntico amor conjugal é assumido no amor divino” (GS 48,2).

“Cristo é a fonte desta graça. “Como outrora Deus tomou a iniciativa do pacto de amor e fidelidade com seu povo, assim agora o Salvador e o Esposo da Igreja vem ao encontro dos cônjuges cristãos pelo sacramento do Matrimônio” (GS 48,2).

E aqui temos o primeiro ponto: Deus quer que vosso casamento vá adiante.

Contudo, para que vosso casamento siga adiante a partir dos preceitos da caridade, que expusemos acima, será necessário que a sra. aprenda a praticar primeiramente o amor à vossa própria alma. Esse amor deverá necessáriamente partir de um amor profundo por Deus, que é mais nós do que nós mesmos, e pela Sua Igreja, a Igreja Católica, inundando-a de virtude e de zelo pela salvação de vossa alma, em primeiro lugar, e depois, pela salvação da alma de vosso esposo. Não vejo ser possível salvar vosso casamento senão a partir da salvação de vossas almas, senão a partir da santificação de vossas almas. Vejamos o que nos ensina a Igreja:

“Nos casamentos com disparidade de culto, o cônjuge católico tem uma missão particular: “Pois o marido não cristão é santificado pela esposa, e a esposa não cristã é santificada pelo marido cristão” (1Cor 7,14). Será uma grande alegria para o cônjuge cristão e para a Igreja se esta “santificação” levar o cônjuge à livre conversão à fé cristã (1Cor 7,16). O amor conjugal sincero, a humilde e paciente prática das virtudes familiares e a oração perseverante podem preparar o cônjuge não cristão a acolher a graça da conversão” (CIC 1637). *

E aqui temos portanto o segundo ponto: Deus quer que vosso casamento vá adiante, pela salvação de vosso marido e pela vossa santificação.

Se continuar o vínculo conjugal com vosso marido significar perder a vossa fé católica, perder o acesso aos sacramentos, especialmente, se significar virar as costas para a eucarístia aonde Cristo se encontra, vossa união não só perderá o significado mas como será para a sra. ocasião de pecado grave. Seria melhor perder a vida conjugal antes que ofender a Deus: “Pedro e os apóstolos replicaram: Importa obedecer antes a Deus do que aos homens” (Atos dos Apóstolos 5,29).

Quer dizer, não apenas podes mas deves lutar para salvar vosso casamento, que significará para a sra. salvar vossas almas, mas sabendo, como nos dizia São Josémaria Escrivá, que “Cruz, trabalhos, tribulações: tê-los-ás enquanto viveres. – Por esse caminho foi Cristo, e não é o discípulo mais que o Mestre” (Caminho, 699). Sofres e sofres muito, mas quão consolodar não pode ser vosso sofrimento aceito por amor de Deus e oferecido como sacrifício pela conversão última de vosso marido à verdadeira Igreja de Cristo, a Igreja Católica! Podes e deves seguir o exemplo de tantas outras santas mulheres que devotaram suas vidas, observando a indissolubilidade do matrimonio e a caridade verdadeira, para a salvação eterna de seus esposos!

Santa Rita de Cássia, casada com homem violento e assassino, por uma vida de silêncio orante, de sacrifícios suportados por amor e uma vida de presença de Deus, uma vida de graça e de penitência, conseguiu a conversão final de seu marido. O mesmo se passou com tantas outras em todos os tempos cristãos: de Santa Mônica no século III a Beata Isabella Canori Mora, no século XVIIII. A história nos conta o que o heroísmo humano aliado a graça divina pode fazer pelo testemunho da caridade. Deus pode fazer novamente em vosso lar.

Com efeito caríssima leitora, a primeira missão de um esposo cristão é lutar para que a alma de seu cônjuge se encaminhe pelas veredas do Senhor. Deus quer, Deus dá a graça, Deus faz, o que precisamos é nos unirmos à vontade do altíssimo e o milagre acontece. Agora que o vinho de vosso casamento parece acabar, só pela intercessão piedosa de Maria ao seu filho Jesus, é que será possível trazer vida nova em vosso lar, vinho novo em vossas vidas.

Neste intento prático é preciso ter em mente todas as coisas que possam ser sujeitadas aos desejos de vosso marido, que para a sra. não passarão de chateação, mas que para ele possa significar muito. Eventualmente tentar passar a ele uma pauta semanal de vossas tarefas fora de casa e buscar um comum acordo para que sejam cumpridos sem maiores crises, ou quem sabe, até buscar agradá-lo usando determinadas roupas que para a sra. não farão nenhuma diferença, mas que para ele será motivo de sossego. E aqui vale lembrar mais uma palavras práticas de São Josémaria acerca da vivência do amor matrimonial seguidas do ponto 1648 do CIC:

“Se alguém diz que não pode agüentar isto ou aquilo, que lhe é impossível calar-se, está exagerando para se justificar. É preciso pedir a Deus força para saber dominar o capricho, graça para ter o domínio de si próprio, porque os perigos de uma zanga são estes: perde-se o controle e as palavras se enchem de amargura, chegando a ofender e, embora sem querê-lo, a ferir e a causar mal.” (Questões atuais do Cristianismo, 108).

“Pode parecer difícil e até impossível ligar-se por toda a vida a um ser humano. Por isso é de suma importância anunciar a Boa-Nova de que Deus nos ama com um amor definitivo e irrevogável, que os esposos participam deste amor, que ele os apóia e mantém, e que através de sua fidelidade podem ser testemunhas do amor fiel de Deus. Os esposos que, com a graça de Deus, dão esse testemunho, não raro em condições bem difíceis, merecem a gratidão e o apoio da comunidade eclesial” (FC 20).

Mais uma vez: tudo isto não por cumprimento a interpretação livre que ele e a Assembléia de Deus fazem das Escrituras, muito erradas e absurdas diga-se de passagem, mas por Amor de Deus e pela salvação da alma de vosso marido.

Óbviamente todos essas sujeitações não poderão jamais interferir em vossa catolicidade, interrompendo, por exemplo, da frequência periódica aos sacramentos, de vosso amor a Nossa Senhora e a Igreja etc. Vosso amor a vosso esposo jamais poderá ultrapassar o vosso amor a Deus e a Igreja, pelo contrário, deverá se nutrir na fé católica. Assim nos ensina novamente o Catecismo no ponto 1634: “A diferença de confissão entre cônjuges não constitui obstáculo insuperável para o casamento, desde que consigam colocar em comum o que cada um deles recebeu na sua comunidade, e aprender um do outro o modo de viver sua fidelidade a Cristo“.

Quer dizer, será indispensável uma conversa franca e honesta com vosso esposo aonde explicará a ele que estás disposta a aprender dele uma vivência de fidelidade a Cristo, mas desde que seja recíproco, e que ele também queira aprender da sra. uma vivência cristã.

No caso negativo, de que a união com vosso marido venha a interfirir em vosso livre direito de professar a fé católica (ou de vos obrigar a práticas radicalmente protestantes), sugeriremos que entre novamente com contato conosco novamente para buscarmos uma solução canônica para que, mesmo cumprindo a vontade de Deus, viva separado de vosso esposo: “A separação dos esposos com a manutenção do vínculo matrimonial pode ser legítima em certos casos previstos pelo Direito canônico (cf. CIC, cânone. 1151-1155). Se o divórcio civil for a única maneira possível de garantir certos direitos legítimos, o cuidado dos filhos ou a defesa do patrimônio, pode ser tolerado sem constituir uma falta moral” (CIC §2383).

Esperamos ter sido úteis para a sra. neste momento difícil, rogamos ao Espírito Santo paráclito que derrame sobre vós toda a graça necessária para seguir em frente decididamente em vosso casamento como caminho de santificação. Também pedimos que não se esqueça jamais de usar dos meios disponíveis para percorrer este estreito caminho, sempre disponíveis para nós católicos, que são os sacramentos, em especial a confissão e a eucaristia, a leitura das Escrituras, a oração frequente e diária do terço, e um constante auxílio espiritual mediante a consulta de um diretor espiritual.

Em Cristo Jesus.

* Como esse ponto do Catecismo faz referência a disparidade de culto, pode-se entender a expressão “não-cristão” como “não católico” sem maiores problemas.

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