Eis o homem!

Quando Nosso Senhor foi pendurado na Cruz, ninguém percebeu que Sua dor humana começava nesse momento a irradiar, como a luz do sol irradia, a todos os homens de todas as épocas. A Cruz nos ensinou que a dor e a morte nada são diante do amor de Deus, que tudo submete ao poder Divino. Ele nos amou primeiro e, por nos ter amado, sofreu para que por todas as suas feridas fôssemos curados.

Anos depois, um escritor cristão aconselharia seu rebanho a permanecer no amor, essa argamassa divina que une todas as partes da Igreja através do tempo e do espaço:

– “Permanecei no amor fraterno. Não vos esqueçais da hospitalidade, pois graças a ela alguns, sem que o soubessem, hospedaram anjos. Lembrai-vos daqueles que sofrem na prisão, como se estivésseis encarcerados com eles, e dos maltratados, observando que também vós possuís um corpo” (Hebreus 13,3).

Desde o início da Igreja, o Senhor tem permitido que seus seguidores sofram tal como Ele sofreu. Em alguns casos, aos seus filhos favoritos, Jesus os presenteia com lascas seletas da Cruz. No meu entender, esse é o caso do Padre Gordon MacRae: um homem de bem, um inocente, que já há muitos anos suporta uma injustiça insuportável e bem difícil de ser compreendida.

Falsamente acusado de um crime que não cometeu, o Padre MacRae é um desses justos que tem pago em seu corpo as culpas de outros pecadores, tal como Cristo o fez. Como todos os sacerdotes católicos, o Padre MacRae dedicou a sua vida a ser um “alter Christus”, outro Cristo ao serviço da Igreja. Jesus tinha lhe preparado um sacrifício especial, que o levou a ser falsamente acusado – tal como Cristo – e condenado sem justiça nem piedade.

Há algumas semanas descobri um artigo no “The Wall Street Journal”, redigido por uma prestigiosa colunista, Dorothy Rabinowitz, ganhadora do Prêmio Pulitzer. A autora também foi entrevistada em um vídeo que vale a pena ser visto e que recomendo àqueles que conseguem entender o inglês. Extraio uma importante frase do artigo, que servirá de introdução ao drama que apresento a vocês. A autora se refere ao julgamento do Padre MacRae: “A aqueles que conhecem os fatos deste caso, resulta-lhes difícil imaginar que algum tribunal contemporâneo poderia ignorar a perversão da justiça que este caso representa”.

Três meses antes do surgimento do artigo, um juiz de segunda instância do Estado de New Hampshire (Estados Unidos) rejeitou a apelação do caso sem sequer ouvir qualquer testemunha, sem julgar seus méritos, nem a evidência de que há graves violações do direito cometidos neste caso. Com o passar do tempo, apelou-se para a Suprema Corte de New Hampshire, que inexplicavelmente também rejeitou a apelação e se negou a ouvir o caso.

Nós, nestes países do assim chamado “terceiro mundo”, olhamos muitas vezes, por força do costume, para os Estados Unidos como um modelo do que a administração da justiça deveria ser. Ainda que seja certo que os Estados Unidos têm sido melhores que outros países no balancear do jogo dos poderes do Estado, também devemos admitir que as virtudes estadunidenses têm sido muitas vezes contrapesadas por vícios claríssimos, dos quais a escravidão e a segregação racial oficializada são apenas dois exemplos entre muitos. Neste caso que apresento, existe um homem inocente – o Padre Gordon MacRae – que suporta já 20 anos uma injusta condenação em circunstâncias que fariam corar qualquer juiz do velho sistema de justiça soviético. O Padre MacRae, um cidadão estadunidense com plenos direitos, foi acusado por um delinquente imoral e julgado culpado pela justiça de New Hampshire que, pelo menos neste caso, resultou ser tão infamante quanto os tribunais de qualquer república de bananas.

Estou certo que muitos, ao atingir este ponto [de leitura], creem que isto que apresento aqui é uma defesa motivada pela parcialidade que eu poderia sentir como católico por um sacerdote que caiu em tal desgraça. Mas não é nada disso. Atualmente é bem conhecida a minha posição em relação a monstros como Marcial Maciel Degollado e outros pervertidos assemelhados. Meu desprezo por esses imorais e pelos anormais que os defendem e apoiam não conhece paliativos. O que me move aqui não é a simpatia por um irmão sacerdote, mas a evidente injustiça que sobressalta aos olhos quando examinamos os fatos deste caso e os submetemos ao mero senso comum.

O advogado americano Robert Rosenthal apelou para a Suprema Corte de New Hampshire nestes termos:

– “…trata-se de uma fraude para obter dinheiro da Igreja Católica a título de indenização legal. Tom Grover, um delinquente viciado em drogas e álcool, acusa o Padre Gordon MacRae de o ter abusado [sexualmente] há alguns anos. O julgamento cível que dá ganho de causa a Grover – e condena MacRae – fixou a indenização em cerca de 200.000 dólares. Não se encontraram testemunhas dos presumidos fatos delitivos, apesar de haver a alegação de que ocorreram em locais bastante movimentados. As afirmativas de Grover são contraditórias em relação a fatos objetivos e concretos (por exemplo: trancas quebradas que o acusador declara funcionarem perfeitamente, atos cometidos em uma sala que não era acessível a MacRae, referências a um jogo de xadrez que até então nem mesmo havia sido comprado)”.

Thomas Grover, o acusador do Padre MacRae, afirma que foi violentado pelo sacerdote em pelo menos quatro ocasiões diferentes. Afirma também que retornou uma e outra vez ao local das supostas violações porque, ao sair, se esquecia totalmente do que havia acontecido. A porta de acesso à sala onde as violações supostamente ocorreram encontra-se em um local bastante movimentado e à vista das demais salas da paróquia. O jornalista Ryan A. MacDonald, em um artigo recentemente publicado, afirma que “a entrada era o lugar mais transitado da paróquia de Saint Bernard nos anos 1980” e no entanto ninguém, ninguém mesmo, viu Thomas Grover entrar ou sair desse lugar. Tampouco foi ele visto próximo da janela, detrás da qual disse ter sido violentado. Tal janela pode ser perfeitamente vista a partir de outros edifícios da paróquia e também fica à toda vista da rua principal do povoado. Thomas Grover, um conhecido delinquente, lembrou em 1994 que, aos 27 anos de idade foi violentado quatro vezes no verão de 1983. Grover explica seu retorno ao local onde foi supostamente violentado dizendo que uma síndrome de stress pós-traumático o fazia esquecer totalmente cada uma das violações, até que, muitos anos depois, lembrou-se de todas… As boas compensações que a Igreja começou a pagar a partir de então devem ter-lhe refrescado a memória. Uma boa parte do testemunho de Grover não batem com as circunstâncias e os lugares em que o Padre MacRae desempenhava seu trabalho em 1983.

Colhido nestas extraordinárias circunstâncias, o Padre MacRae foi abandonado por sacerdotes que poderiam ter testemunhado a seu favor. Depois, foi também abandonado por seu próprio bispo, da Diocese de Manchester. Ninguém queria que a falsa acusação “respingasse” sobre outros na paróquia ou diocese e, por isso, deixaram o Padre MacRae entregue à própria sorte.

Nós, católicos de boa consciência, não podemos deixar que esta injustiça perdure. Esta é uma apelação para que cumpramos o conselho evangélico de Hebreus 13,3, anteriormente citado. Isto inclui o atual bispo de Manchester e o Estado de New Hampshire e suas autoridades, para que revisem o caso. É necessário ainda colaborar financeiramente com o Padre MacRae, para que possa obter os meios para a sua defesa.

A comunidade de New Hampshire também tem a obrigação de revisar este caso. Muito tempo se passou desde a época de caça às bruxas nesta parte do mundo. Este caso não deixa New Hampshire representar um bom papel diante do mundo e diante de outros Estados americanos. É importante que os bispos estadunidenses e nosso Santo Padre em Roma recordem que a política dos “caixas abertos” está tentando muitos delinquentes e pessoas imorais, o que causará ainda maior dano à Igreja. Tenho a impressão de que se está a tapar um erro com outro erro; está se administrando mal a confiança e as esmolas que temos depositado nas mãos dos nossos bispos.

Barrabás já foi solto e Judas já recebeu as suas moedas… Eis o homem: Gordon MacRae! Bispos da Igreja: o que faremos com ele?

O Blog do Padre MacRae, em inglês, pode ser visitado AQUI.

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