O “consenso unânime” dos Padres da Igreja

A Igreja vê os Pais da Igreja como os sucessores dos apóstolos, a fonte mais próxima do ensino apostólico e da tradição, e conseqüentemente com autoridade. Por que, então, devemos confiar na interpretação de um protestante X, ou de seu pastor, quando nós podemos aprender daqueles que aprenderam dos apóstolos?

Nós devemos entender bem o que a Igreja quer dizer quando ela é limitada pelo consentimento unânime dos pais (unanimem consensum Patrum). A igreja não pode, não pôde, e não se contradiz. Pode desenvolver doutrinas, mas não pode negar sua herança e a base de sua existência nas Escrituras, na Tradição e no Magistério. A igreja não alega que toda sua autoridade “repousa” no consentimento dos Pais. Repousa em diversas fontes, incluindo as Escrituras; os pais são um elemento desta fundação.

Em segundo lugar, a Igreja nunca entendeu ou ensinou que o consentimento unânime significa que os pais são individualmente infalíveis ou que os vários pais nunca ensinaram uma opinião alternativa. Qualquer passagem dada da Escritura pode ter diversas aplicações válidas e todas foram apropriadas pelos pais dependendo da matéria em estudo. Assim, um padre pode se referir a Jesus como a rocha, ou à confissão de Pedro como a rocha, ou ao próprio Pedro como a rocha . Isto em não é incomum ou inesperado. Certamente não nega a intenção literal de Mateus, nem invalida o consentimento unânime dos pais.

A Igreja Católica cresceu organicamente a partir dos apóstolos e dos pais. Dizer que ela não concorda com eles é absurdo. Mas agora, o que é o consenso unânime dos pais? O Maryknoll Catholic Dictionary dá uma definição muito simples:

“Quando os pais da igreja forem moralmente unânimes em seu ensino de que uma determinada doutrina é uma parte da revelação, ou é aceita pela igreja universal, ou que o seu oposto é uma heresia, então seu testemunho conjunto é um determinado critério de revelação divina. Não sendo os pais pessoalmente infalíveis, o testemunho contrário de um ou de dois não seria destrutivo ao valor do testemunho coletivo; basta uma simples unanimidade moral”. (Maryknoll Catholic Dictionary, pg. 154).

A palavra “unânime” vem de duas palavras latin: únus, um + animus, mente. “consentimento”, “ser da mesma mente ou opinião”. Onde os pais falarem universalmente com uma só mente, não necessariamente cada um, nem numericamente todos, mas pelo consenso e pelo acordo geral, nós temos “o consentimento unânime”.

A frase “consenso unânime dos pais” teve uma aplicação específica no Concílio de Trento (sessão 4) e reiterada no Concílio Vaticano I (Decretos Dogmáticos, cap. 2). Os padres conciliares a usaram especificamente para a interpretação das Escrituras. A confusão exegética e doutrinária era a ordem na época da reforma protestante. Matinho Lutero escreveu: “existem tantas seitas quanto cabeças; um não admite o batismo; outro rejeita o sacramento do altar; outro acrescenta um mundo entre o atual e o dia do julgamento; outros dizem que Jesus não é Deus. Não há um só indivíduo que não clame ser inspirado pelo Espírito Santo que não esteja ensinando as profecias derivadas de seus sonhos”.

O Concílio de Trento afirmou que o conhecimento apropriado das Escrituras era aquele praticado pelos pais da Igreja para trazer ordem ao caos. William Webster se opõe a esta definição (cf. The Church of Rome at the Bar of History [Carlisle, PA: Banner of Truth Trust, 1995]). Ele mal-interpreta os pais da Igreja a partir de um conceito errôneo do que seja “consenso unânime”. Primeiro, ele diz que para que haja consentimento unânime os pais da Igreja precisam ensinar as mesmas doutrinas, nos mesmos termos, de forma clara, como usadas nos Concílios da Igreja. Este é um conceito errado e mesmo na lei americana temos que consentimento unânime “não significa que todos os presentes votaram uma dada proposta, mas quer dizer, e geralmente diz, que quando um voto [verbal] é dado, não houve voto em negativo” (Black’s Law Dictionary). Segundo, ele aplica o termo não em direção às Escrituras, mas à Tradição da Igreja. Suas asserções não são verdadeiras, e utilizando uma definição e aplicação errada do consenso unânime dos pais, faz uso de passagens de textos patrísticos para dar razão às suas alegações.

Falando sobre as variações nas interpretações nos pais da Igreja, o Papa Leão XIII (Estudo sobre as Sagradas Escrituras, Providentissimus Deus, nov. 1893) escreve: “Pelo fato de a defesa das Escrituras dever ser conduzida com vigor, todas as opiniões de um certo padre ou de um intérprete recente lançaram para explicações não necessitam ser idênticas. Pois eles, interpretando passagens onde assuntos foram julgados de acordo com o conhecimento de suas épocas, e nem sempre de acordo com a verdade, podem ter produzido opiniões que não são atualmente aprovadas.Portanto, devemos estar atentos e cuidadosamente aprender a discernir o que neles realmente pertence à fé e o que apenas está conectado a ela, e o que estabeleceram como consentimento unânime, pois ‘nos assuntos que não estão sob a obrigação da fé, os santos são livres para expressar opiniões diversas, assim como nós’, de acordo com a opinião de Santo Tomás”.

Tradução: Rondinelly Ribeiro

 

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