Por que a Bíblia fala tão pouco acerca de Maria?

– Por que a Bíblia é tão parcimoniosa com relação a Maria? Não há relatos sobre sua efetiva santidade, sobre feitos relevantes, enfim, sobre nada. Só consta que ela gerou Jesus. Mas, se não fosse ela, seria outra… Os apóstolos, em contrapartida, possuem muitas e muitas menções, inclusive um livro. Outrossim, a Bíblia relata que até da sombra de Pedro emanava poder. Mas, Maria, nada. Jesus, também, nunca fez apologia a sua mãe. Nem dela se despediu… Antes de subir ao céu, apresentou-se aos discípulos, e fez-lhe admoestações. Mas, Maria, nada! Finalmente, por que a Bíblia não relata um evento tão extraordinário como o traslado de Maria? (Hugo)

MARIA NOS EVANGELHOS

Esta pergunta nos chega em boa hora, já que estamos concluindo uma obra apologética sobre a Mãe de Deus e que se encontra, neste momento, aguardando a competente aprovação eclesiástica. Com o material fresco na mente e no editor de textos, examinemos as perguntas formuladas por este leitor. Antes de mais nada, examinemos sua sincera necessidade de apreciar o assunto. As perguntas são apresentadas em um tom bastante respeitoso. Aprecio muito o fato de o leitor não afirmar suas próprias conclusões, propondo apenas as perguntas que ele julga necessárias. Como uma nota prévia, gostaria de citar um pequeno parágrafo do escritor protestante C.S.Lewis (anglicano) que, de passagem, em sua obra “Cristianismo Puro e Simples”, menciona os diferentes pontos de vista que existem acerca da Mãe de Jesus:

“…não existe entre os cristãos uma controvérsia maior ou que deva ser tratada com maior tato. As crenças dos católicos não são defendidas apenas com um fervor normal que se espera encontrar em toda religiosidade sincera, mas (muito naturalmente) com o ardor incomum e, por assim dizer, cavalheiresco com que um homem defende a honra de sua mãe o de sua amada. E muito difícil discordar do católico sem, ao mesmo tempo, não parecer a seus olhos um malcriado ou mesmo um herege. Já a crença do protestante a respeito desse assunto desperta sentimentos inerentes às raízes de todo o monoteísmo. Para o protestante radical, a distinção entre o Criador e a criatura (por mais santa que seja) parece ameaçada: o politeísmo renasce. Logo. é difícil discordar sem parecer a seus olhos algo pior que um herege—um pagão…”[1]

Consideremos então a seriedade das perguntas propostas por nosso leitor, já que a partir do seu ponto de vista a hiperdulia que os católicos prestam a Maria é interpretada muitas vezes como um retorno às práticas pagãs ao estilo da “Bona Dea” romana. Se algo assim estivesse realmente ocorrendo na Igreja Católica, haveria uma séria violação dos Mandamentos divinos. Portanto, a primeira coisa que queremos esclarecer ao leitor é que o respeito católico por Maria não é, de maneira nenhuma, a adoração que apenas se rende ao Deus Todo-Poderoso, fonte e origem de tudo o que foi criado e o próprio Criador de Maria, a excelsa criatura que Ele encheu de graça, conforme explicam os Evangelhos a partir do mesmo princípio.

INDÍCIOS DA SINGULARIDADE DE MARIA

Nosso leitor se pergunta por que a Bíblia diz tão pouco acerca de Maria. Com isto, quase expressa uma frase católica que se ouvia muito quando o latim era falado com mais frequência na Igreja do que as línguas vernáculas: “de Maria nunquam satis”, frase esta que pode ser traduzida como: “de Maria nunca se fala em demasia”. E é certo que a Bíblia, embora fale muito de Maria, não o faz de maneira direta, de modo que devemos dispender algum esforço para penetrarmos nas Escrituras e encontrarmos os muitos indícios da singularidade e peculiaridade desta mulher sem igual em toda a História da Salvação.

Iniciemos pela já famosa visita do Anjo a Nazaré:

Lucas 1,26-29 — “No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galiléia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um varão chamado José, da casa de Davi; e o nome da virgem era Maria. Entrando onde ela estava, disse-lhe: ‘Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo!’ Ela ficou intrigada com essa palavra e pôs-se a pensar qual seria o significado da saudação”.

Analisemos o que as Escrituras dizem aqui e tomemos conhecimento da exata situação. As Escrituras assumem que possuiremos entendimento (Marcos 7,17-18) quando orarmos a Deus, pedindo a luz do Espírito Santo para extrair coisas boas do bom tesouro da riqueza de Deus (Mateus 12,35). Não podemos nos colocar na pessoa do Anjo, porém, como seres humanos, sabemos o suficiente para nos colocar no lugar de Maria, uma pequena jovem judia, obviamente piedosa.

EVIDÊNCIA DA FAMILIARIDADE COM OS ANJOS

Primeiro, vejamos como ela trata o Anjo. Eu não sei quantos entre vocês têm recebido visitas angelicais visíveis; eu, particularmente, nunca tive o prazer de receber uma. Entretanto, se não me falha a memória, ao ler as Escrituras, todas as aparições de anjos produzem algum temor sobrenatural nas pessoas presentes. Em muitas ocasiões, os mensageiros celestes dizem “não temais”, pois a aparição da pureza celeste inspira temor nos seres humanos imperfeitos.

O que me chama a atenção em primeiro lugar é a naturalidade de Maria diante do evento. Um Anjo do céu a saúda e ela percebe que a saudação é “incomum”. Isto indica “prima facie” que não era a primeira vez que um anjo lhe aparecia. Conforme o meu entender, isto é evidência de que Maria mantinha um contato frequente com seres angélicos antes da Anunciação registrada por São Lucas. Seria esta familiaridade a consequência de uma pureza superlativa, pureza que nós, homens comuns descendentes de Eva, perdemos? Muito provavelmente sim. Adão ouvia a voz de Deus no Jardim (Gênesis 3,8-10)… Contudo, já na época de Samuel, os homens deviam ser treinados para ouvir aquilo que tão naturalmente ouviam os nossos primeiros pais (1Samuel 3,1-21).

Vemos aqui uma mudança no Anjo, que intriga Maria: “Que espécie de saudação é esta?”. Tenha o leitor um pouco de paciência e assumamos por um instante – embora apenas tenhamos uma evidência indireta – que Maria compara esta saudação com outros encontros anteriores, pois, de outra maneira, como poderia entendê-la “incomum”? Ora, se um anjo nos aparece, isto, por si só, já é “incomum” e a saudação incomum não seria surpreendente em uma situação incomum. É tão somente dentro do marco de uma situação mais ou menos normal que a saudação poderia chamar a sua atenção. Para fazer uma grossa comparação, digamos que eu esteja hoje em minha casa e uma nave espacial pouse no meu quintal; e que dela saia um homenzinho verde com antenas e três olhos e me diga: “Saudações, terrestre!”. Não acredito que ninguém neste pobre planeta, diante dessa situação, se pusesse a pensar sobre a não usualidade da saudação! Compreende-se agora o que eu quero dizer?

A VIDA INICIAL DE UMA SANTA PRINCESA

Então, assumimos com certa confiança que Maria teve algum contato com anjos em sua infância próxima, antes dos quinze ou dezesseis anos de idade que provavelmente tinha no tempo da Anunciação feita pelo Anjo Gabriel. No entato, pela Escritura deduzimos também que nunca até então um anjo lhe havia chamado “kekharitomene”, “cheia de graça”. Posteriormente oferecerei mais detalhes quanto a isto; por ora, coloquemo-nos no ofício do Anjo e no de outros anjos que devem ter estado a cargo da proteção de Maria. Por quê? Porque, como em todas as cortes do mundo, as princesas são protegidas e não vão a lugar algum sem escolta. Deus não seria menos cuidadoso do que Rainiero de Mônaco. Maria, com efeito, desde o seu nascimento na presença de Deus, foi muito mais preciosa do que a princesa Carolina quando tinha essa idade. Os anjos cuidavam dela e, se ela realmente era imaculada, como foram Adão e Eva antes de pecarem, sua capacidade para enxergar anjos não deveria surpreender ninguém.

Fico imaginando a Pequena Princesa, com total desconhecimento do seu destino – como todas as princesinhas que apenas pensam em pulseiras, flores e laços coloridos, como todas as crianças de sua idade – estando sob a cuidadosa vigilância dos seus guardiães e pensando, em sua simplicidade, que todas as crianças podem contemplar o mesmo que ela enxerga.

Entretanto, ao chegar a hora de brincar com outras meninas da aldeia, Maria deve ter notado que o que ela via e ouvia era algo que tão somente ela podia ver e ouvir. Isto deve ter aguçado nela a necessidade de refletir sobre o mundo epiritual em sua mente infantil. Amparada pelos santos anjos, a Princesinha foi aprendendo os segredos da vida e aos quinze ou dezesseis anos de idade, já sabia o suficiente para poder consagrar sua virgindade a Deus, sabendo muito bem como os bebês vinham ao mundo.

Tendo decidido manter-se virgem por toda a sua vida, certamente surgiu entre os adultos a questão de o que fazer com Maria, pois sendo ela pobre, carecia do dote necessário para se casar com um levita e, assim, poder se dedicar ao Templo. É aí que entra em cena o bom José.

O QUE FAZEMOS COM A MENINA?

José é um carpinteiro, mas não um carpinteiro de alto padrão; ele é um “tekton”, a classe de “operário” que constrói arados, arneses, cercas e currais. Curiosamente, a classe de trabalhador que um dia iria construir o “xilon”, a Cruz onde supliciará Jesus. Nosso bom José é mais velho que Maria, talvez um homem de pouquíssimas palavras e bastante devoto. Como o seu antecessor José, o filho de Jacó, tem sonhos e aprendeu a obedecer o que Deus lhe ordena em seus sonhos (Gênesis 37,2-11; Mateus 1,20; 2,12; 2,19). José, pelo pouco que sabemos, é provavelmente célibe. É possível que tenha se dedicado a Deus como nazareu, permanecendo virgem. É possível também que não fosse capaz de falar ou que tivesse uma fala bastante limitada. Reparemos que a Bíblia não registra qualquer frase deste homem tão importante, pai putativo do Messias. José é um homem manso e obediente, simples e trabalhador, um homem puro e forte de corpo e alma.

MARIA É A MÃE DE DEUS

Os responsáveis pelo futuro de Maria devem ter concluído que, entre os homens da aldeia, José era o melhor partido para Maria, por sua pureza e sua boa disposição, e ainda por ser da mesma tribo de Maria. A menina que já tinha feito votos de virgindade a Deus não poderia se casar com um homem qualquer, que precisasse suscitar descendentes. Assim, foi prometida a José. O rude carpinteiro teria quem cozinhasse e guardasse sua casa pelo resto da vida, alguém que conversaria com ele e o ajudaria no seu pequeno negócio. Contudo, os planos humanos não iriam sair assim tão redondos…

DE ONDE VIRÁ ESSE MENINO?

O destino de Maria começa a se manifestar com a visita desse Anjo que a saúda de maneira “incomum”.

Lucas 1,30-33 — “O Anjo, porém, acrescentou: ‘Não temas, Maria! Encontraste graça junto de Deus. Eis que conceberás no teu seio e darás à luz um filho, e tu o chamarás com o nome de Jesus. Ele será grande, será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai; ele reinará na casa de Jacó para sempre e o seu reinado não terá fim'”.

Até aqui, tudo muito claro. Maria sabe que conta com o favor de Deus e que Deus decidiu que ela fique grávida (mas ainda não sabe como). Sabe que o Menino será de Deus e o Anjo lhe diz aquilo o que ela certamente já suspeitava: o menino é o mui esperado Messias! Maria percebe que ela – sim, ela, a jovem mais pobre da sua parentela! – será a “gebirah”, a Mãe do Rei Eterno de Israel! Quantas vezes, na sinagoga, havia escutado as palavras do rolo de Isaías, sem jamais suspeitar que ela era a bendita mulher de quem falava o profeta! Mais feliz que Sara, que Léa e Raquel, Maria, a pequena Maria de Nazaré!

Isaías 62,1 – “Por amor de Sião não me calarei, e por amor de Jerusalém não me aquietarei, até que saia a sua justiça como um resplendor, e a sua salvação como uma tocha acesa. E os gentios verão a tua justiça, e todos os reis a tua glória; e chamar-te-ão por um nome novo, que a boca do Senhor designará. E serás uma coroa de glória na mão do Senhor, e um diadema real na mão do teu Deus. Nunca mais te chamarão: Desamparada, nem a tua terra se denominará jamais: Assolada; mas chamar-te-ão: O meu prazer está nela, e à tua terra: A casada; porque o Senhor se agrada de ti, e a tua terra se casará. Porque, como o jovem se casa com a virgem, assim teus filhos se casarão contigo; e como o noivo se alegra da noiva, assim se alegrará de ti o teu Deus”.

E Maria aqui, com a rapidez mental que caracteriza as mulheres de sua raça, pergunta respeitosamente ao Anjo:

Lucas 1,34 – “Como será isto, visto que não conheço varão?”

Transcrevo agora um parágrafo do meu livro, “Arca da Graça”, com algumas reflexões acerca desta passagem:

“Esta pergunta de Maria é bastante reveladora. Lucas havia nos dito que ela fora prometida em matrimônio a um homem chamado José. Pois bem: se Maria pretendesse ter relações conjugais com o seu futuro marido, ela não teria nenhuma razão para fazer uma pergunta como essa. Ao contrário, teria assumido normalmente que ela e José iriam ser os pais do Messias após terem se casado. No entanto, ela pede respeitosamente ao anjo para que lhe explique como o seu Filho será concebido. A forma mais razoável para se explicar esta questão é concluir que Maria tinha consagrado a sua virgindade a Deus e não esperava ter relações conjugais com o seu futuro esposo. A prática de alguém consagrar sua virgindade a Deus é bem atestada na cultura judaica dessa época. Há alguns precedentes bíblicos, como a filha do juiz Jefté (Juízes 11, 34-40) e a profetiza Ana, que se consagrou a Deus após tornar-se viúva em idade relativamente jovem (Lucas 2, 36-37; 1Coríntios 7, 23-40). Para ser uma testemunha perfeita e eterna do poder de Deus, a virgindade de Maria deveria ser também eterna. Seu voto para permanecer virgem durante toda a sua vida pode ser claramente deduzido da sua pergunta ao mensageiro angélico”[2]

ARCA DA GRAÇA

A resposta do Anjo não é menos interessante:

Lucas 1, 35-37 — “O Anjo lhe respondeu: ‘O Espírito Santo descerá sobre ti e o poder do Altíssimo te cobrirá com sua sombra. Por isso o Menino será Santo e será chamado Filho de Deus. Também Isabel, tua parente, concebeu um filho na velhice, e este é o sexto mês para aquela que chamavam de estéril. Para Deus, com efeito, nada é impossível”.

O Anjo emprega a palavra “epischiadze” para descrever como o Espírito Santo se aproximaria de Maria. Essa palavra é a mesma usada no Êxodo para descrever os “querubins protetores” que estendiam suas asas sobre o tabernáculo da Arca da Aliança e também em Êxodo 40,34-35. Mas o leitor familiarizado com as Escrituras não deixará de perceber duas coisas:

1. A Arca da Aliança continha diversas coisas que representavam diferentes aspectos de Jesus, o Messias: as tábuas da Lei que Jesus cumpriu fielmente; a escudela com o maná milagrosamente preservado e que representa Jesus como “o pão do céu”; o báculo que havia florescido e dado fruto em testemunho do sumo sacerdócio de Aarão, símbolo prefigurativo de Cristo como Sumo Sacerdote e Bom Pastor.

2. A misteriosa mulher que o Apóstolo São João vê com a Arca da Aliança nos céus, em sua visão relatada por Apocalipse 11,19 a 12,6.

Maria, como a Arca da Aliança, contém Jesus em seu seio assim como a Arca continha as representações proféticas de Jesus. Essa mesma Arca aparece nos céus na visão de São João, mas agora é a uma mulher quem dá à luz “um Filho varão, que regerá todas as nações com cetro de ferro; e seu Filho foi arrebatado até Deus e seu trono”. Esse Filho varão é o Messias ressuscitado, “arrebatado até Deus e seu trono” logo após triunfar sobre o mal no Calvário e agora seguramente destinado a reger o mundo “com cetro de ferro” (Salmo 2,7-9).

TODAS AS GERAÇÕES ME CHAMARÃO BEM-AVENTURADA

Maria compreende imediatamente a maravilha da sua singularidade. Ela será a Mãe do Rei Eterno de Israel, ou seja, a Rainha Eterna de Israel, e assim expressa, inspirada pelo Espírito Santo, no “Magnificat”. Tais palavras não saíram da pena de São Lucas, mas do coração de Maria. Que ninguém jamais diga que a Escritura não registra palavras de Maria!

Lucas 1, 46-50 — “Maria, então, disse: ‘Minha alma engrandece o Senhor, e meu espírito exulta em Deus, em meu Salvador, porque olhou para a humilhação de sua serva. Sim! Doravante as gerações todas me chamarão de bem-aventurada, pois o Todo-Poderoso fez grandes coisas em meu favor. Seu nome é santo e sua misericórdia perdura de geração em geração, para aqueles que o temem. Com o seu braço agiu valorosamente; Dissipou os soberbos no pensamento de seus corações. Depôs dos tronos os poderosos, E elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, E despediu vazios os ricos. Auxiliou a Israel seu servo, recordando-se da sua misericórdia; como falou a nossos pais, Para com Abraão e a sua posteridade, para sempre”.

Há aqui ecos dos Salmos (45,6-17) e da Canção de Ana (1Samuel 2,1-10). Ana é uma figura profética de Maria pois possui um filho, Samuel, a quem dedica a Deus (1Samuel 1,24-28; Lucas 2,21-24). Curiosamente, na época do seu pedido, Ana é acusada de estar embriagada com o vinho de Pentecostes (1Samuel 1,12-17), assim como Maria e os cristãos são acusados da mesma coisa no primeiro Pentecostes da Igreja (Atos 2,13).

E agora que chegamos ao Pentecostes, o início da Igreja e da sua missão, coloquemo-nos nos sapatos (ou melhor, nas sandálias) daqueles homens e mulheres, os “cento e vinte” de quem fala os Atos, entre os quais encontra-se Maria (Atos 1,14).

A IDENTIDADE PÚBLICA DA MÃE DE JESUS

Alguns perguntam, como nosso leitor: Se Maria era tão importante na Igreja Primitiva, como é que não se apresenta o seu papel preponderante nos escritos dos Apóstolos? Novamente irá nos ajudar se nos colocarmos no lugar dos protagonistas. Antes, porém, uma recordação das idéias dos seguidores de Jesus ao tempo da Ascensão:

Atos 1,3-14 – “Depois de ter padecido, Jesus se apresentou vivo, com muitas e infalíveis provas, sendo visto por eles por espaço de quarenta dias, e falando das coisas concernentes ao reino de Deus. E, estando com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, que (disse ele) de mim ouvistes. Porque, na verdade, João batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias. Aqueles, pois, que se haviam reunido perguntaram-lhe, dizendo: Senhor, restaurarás tu neste tempo o reino a Israel? […] Então voltaram para Jerusalém, do monte chamado das Oliveiras, o qual está perto de Jerusalém, à distância do caminho de um sábado. E, entrando, subiram ao cenáculo, onde habitavam Pedro e Tiago, João e André, Filipe e Tomé, Bartolomeu e Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelote, e Judas, irmão de Tiago. Todos estes perseveravam unanimemente em oração e súplicas, com as mulheres, e Maria mãe de Jesus, e com seus irmãos”.

Entremos na mente dos Apóstolos ao tempo da Ascensão: viram Cristo ressuscitado e perceberam que há uma grande missão pronta para começar. No entanto, não sabem ainda que o Reino de Israel que Cristo veio manifestar é um reino espiritual. A pergunta: “Senhor, restaurarás tu neste tempo o reino a Israel?” demonstra que ainda esperam uma mudança política. Como bons judeus, sabem que o Messias está destinado a reinar sobre Israel e o mundo, e também sabem que a Rainha do Reino de Deus, a “gebirah”, a Grande Senhora”, é Maria, a Mãe de Jesus. Disto não resta dúvida alguma. Por isso a protegerão com suas próprias vidas, se necessário, e, como cabe a uma Rainha, lhe é dada um pajem real – São João – que agora deve cuidar dela como se fosse sua própria mãe natural (João 19,27).

MARIA, MÃE DA MISERICÓRDIA

A Igreja começa a crescer em um ambiente hostil. Alguns dos Apóstolos são açoitados e um dos diáconos, Estêvão, é apedrejado até a morte pelos fariseus. Saulo de Tarso persegue os cristãos em várias comunidades espalhadas entre a Judéia e a Síria. Não são tempos tranquilos para a Igreja. O Rei está de viagem e a Rainha está sob os cuidados dos fiéis; logo, deve ser protegida.

Creio que seja por isso que os Apóstolos não escrevem muito sobre Maria. Eles têm a esperança de que Cristo retorne logo e sabem que Maria, a Arca da Nova Aliança, apontada por Deus para trazer o Messias ao mundo está entre eles da mesma forma como a Arca da Aliança estava no meio da antiga Israel. Assim como ocorre hoje com as rainhas de diversos países, os cristãos dispersos pelo mundo cuidaram de Maria porque ela era o seu segredo e os segredos não deviam ser escritos em papéis que pudessem cair em poder dos legionários do Imperador ou dos partidários da sinagoga. Maria é tesouro da Igreja; única e valiosa, é guardada com o mesmo zelo com que antigamente se guardavam a Arca e a Rainha de Israel.

A ASSUNÇÃO DE MARIA AOS CÉUS

“As Sagradas Escrituras supõem que temos entendimento […] Após Cristo expirar na Cruz … sendo sepultado e ressuscitando, apareceu à sua bendita Mãe em corpo e alma […] Primeiro apareceu à Virgem Maria, embora nada se diga na Escritura, quando se diz que apareceu a muitos outros, pois a Escritura supõe que temos entendimento, como está escrito: ‘Também vós estais sem entendimento?'”[3].

Quando pessoas mal informadas questionam o dogma da Assunção de Maria aos céus, elas crêem que inexistem evidências bíblicas desse evento. Na Bíblia existe um relato da ascensão de Jesus, mas não menciona a assunção da Virgem Maria. Como a Igreja sabe, então, que Maria foi assunta aos céus? [4]

Atos 1, 1-12 — “Compus meu primeiro relato, ó Teófilo, a respeito de todas as coisas que Jesus fez e ensinou desde o início, até o dia em que foi arrebatado, depois de ter dado instruções aos Apóstolos que escolhera sob a ação do Espírito Santo. Ainda a eles, apresentou-se vivo depois de sua paixão, com muitas provas incontestáveis: durante quarenta dias apareceu-lhes e lhes falou do que concerne ao reino de Deus. Então, no decurso de uma refeição com eles, ordenou-lhes que não se afastassem de Jerusalém, mas que aguardassem a promessa do Pai, ‘a qual’ — disse ele — ‘ouvistes de minha boca: pois João batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo dentro de poucos dias’. Estando, pois, reunidos, eles assim o interrogaram: ‘Senhor, é agora o tempo em que irás restaurar a realeza em Israel?’ E ele respondeu-lhes: ‘Não compete a vós conhecer os tempos e os momentos que o Pai fixou com sua própria autoridade. Mas recebereis uma força, a do Espírito Santo que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e a Samaria, e até os confins da terra’. Dito isto, foi elevado à vista deles, e uma nuvem o ocultou a seus olhos. Estando a olhar atentamente para o céu, enquanto ele se ia, dois homens vestidos de branco encontraram-se junto deles e lhes disseram: ‘Homens da Galiléia, por que estais aí a olhar para o céu? Este Jesus, que foi arrebatado dentre vós para o céu, assim virá, do mesmo modo como o vistes partir para o céu’. Então, do monte chamado das Oliveiras, voltaram a Jerusalém. A distância é pequena: a de uma caminhada de sábado”.

Lendo esta passagem cuidadosamente, os fiéis cristãos verificam que Jesus ascendeu aos céus na presença de aproximadamente 500 pessoas. E imediatamente a seguir, apareceram dois anjos. As tradições locais até indicam o local onde este fato aconteceu.

No decorrer da História até os nossos dias, têm surgido muitos questionamentos acerca da veracidade da ressurreição de Jesus. Os céticos sempre propuseram explicações alternativas. A mais comum e antiga é a de que o corpo de Jesus foi escondido por seus discípulos, “falsificando” assim a ressurreição e fazendo com que o Impostor viesse a ser considerado o Messias (Mateus 27, 62-66). Mas, a princípio, alguns discípulos de Jesus que encontraram o sepulcro vazio pensaram que seus inimigos tinham subtraído o corpo do Senhor (João 20, 1-2).

A evidência histórica que temos hoje mostra claramente que o pequeno grupo de crentes judeus saíram a evangelizar o mundo, mesmo que a custo de suas próprias vidas. Seria inviável falsificar uma ressurreição para iniciar uma falsa religião. Todos os Apóstolos, com exceção de um, morreram como mártires. É difícil acreditar que tais pessoas pudessem chegar tão longe, suportando terríveis torturas e a morte, apenas para perpetuar uma fraude. Só existe um jeito de explicar os eventos que se seguiram à morte de Cristo: Ele ressuscitou! Posteriormente, seus discípulos levaram o fogo do Evangelho de Jesus para todas as partes do mundo, porque eles tinham a certeza inabalável de que o seu Senhor havia ressuscitado.

É assim que explicamos a ressurreição de Jesus; mas não temos um relato do que aconteceu com Maria. Na verdade, temos um registro indireto: o corpo de Maria não está em lugar algum que possa ser encontrado. Não temos, portanto, apenas um sepulcro vazio, mas dois!

É de pleno conhecimento dos historiadores em geral que os cristãos tinham especial cuidado com as relíquias dos santos. Partes do corpo, ossos, cabelos e outros pertences dos santos martirizados têm sido, por séculos, cuidadosamente preservados e custodiados. Conhecemos a maioria dos lugares onde os Apóstolos foram sepultados. Conhecemos bem, ainda, os sepulcros de alguns mártires dos séculos I e II.

Seria possível que, de alguma forma, os cristãos primitivos negligenciassem um simples registro sobre o local onde Maria teria sido sepultada? Novamente estamos diante da evidência indireta de que Maria teve um destino diverso dos demais santos do Cristianismo primitivo.

Outras assunções ao céu são registradas na Bíblia. Henoc e Elias foram assuntos ao céu (Hebreus 11, 5; 2Reis 2, 11). Em Mateus 27, 52-53 encontramos um relato de que os corpos dos santos saíram de seus sepulcros logo após a morte de Cristo. Essas primeiras ressurreições prefiguraram a ressurreição de todos aqueles que, até hoje, morreram fiéis à Nova Aliança em Cristo. A assunção de Maria nada mais é do que crer fielmente que Deus lhe concedeu a graça de ser ressuscitada, da mesma forma como Ele fizera com muitos no passado. A Bíblia promete isso até mesmo a nós, pecadores!

Romanos 8, 10-17 — “Se, porém, Cristo está em vós, o corpo está morto, pelo pecado, mas o Espírito é vida, pela justiça. E se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vós, aquele que ressuscitou Cristo Jesus dentre os mortos dará vida também a vossos corpos mortais, mediante o seu Espírito que habita em vós. Portanto, irmãos, somos devedores não à carne para vivermos segundo a carne. Pois se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo Espírito fizerdes morrer as obras do corpo, vivereis. Todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Com efeito, não recebestes um espírito de escravos, para recair no temor, mas recebestes um espírito de filhos adotivos, pelo qual clamamos: ‘Abba! Pai!’ O próprio Espírito se une ao vosso espírito para testemunhar que somos filhos de Deus. E se somos filhos, somos também herdeiros; herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo, pois sofremos com ele para também com ele sermos glorificados”.

Nesta passagem, o apóstolo São Paulo promete a nós, pecadores, que aqueles que sofrem com Cristo serão glorificados com Ele. Não seria, pois, de se estranhar que a Mulher que aceitou sofrer com Cristo — a Mãe das Dores — não pudesse receber um especial tratamento da parte de Deus? (cf. Lucas 2, 34-35). É perfeitamente claro que aquela que consagrou a sua vida unicamente para servir o propósito de Deus e ser a Mãe do Messias recebesse um tratamento especial, assim como muitos outros santos homens e mulheres de Deus nos tempos passados.

1Coríntios 3, 7-14 — “Assim, pois, aquele que planta nada é; aquele que rega nada é; mas importa tão somente Deus, que dá o crescimento. Aquele que planta e aquele que rega são iguais entre si; mas cada um receberá seu próprio salário, segundo a medida do seu trabalho. Nós somos cooperadores de Deus, e vós sois a seara de Deus, o edifício de Deus. Segundo a graça que Deus me deu, como bom arquiteto, lancei o fundamento; outro constrói por cima. Mas cada um veja como constrói. Quanto ao fundamento, ninguém pode colocar outro diverso do que foi posto: Jesus Cristo. Se alguém sobre esse fundamento constrói com ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno ou palha, a obra de cada um será posta em evidência. O Dia torna-la-á conhecida, pois ele se manifestará pelo fogo e o fogo provará o que vale a obra de cada um. Se a obra construída sobre o fundamento subsistir, o operário receberá uma recompensa”.

Se nós concordamos com o ensinamento de São Paulo, devemos então considerar o lugar de Maria na História da Salvação para concluirmos que sua recompensa tinha que ser tão única quanto tão única foi sua crucial missão.

Muitos confundem o Novo Testamento com uma crônica que deveria incluir tudo o que aconteceu com a Igreja. Tal conceito é equivocado. Por exemplo, o Evangelho de São João atesta que nem todos os feitos de Jesus foram incluídos nos Evangelhos (João 21, 25) e muitos crêem que há indícios de uma “carta de lágrimas”, que foi perdida, escrita por São Paulo aos coríntios (cf. 2Coríntios 2, 4). Não seria razoável concluir que Maria não foi assunta ao céu pelo simples fato de o Novo Testamento não indicá-lo. Devemos recordar que nem toda doutrina cristã se encontra explicitamente na Bíblia.

A assunção de Maria contradiz as Sagradas Escrituras? É lógico que não! Tal dogma é realmente necessário para confirmar algumas profecias que deveriam ser cumpridas.

Se cremos que Jesus ressuscitou, devemos também crer que toda autoridade lhe foi dada nos Céus e na Terra (Mateus 28, 16-20). Jesus é o Messias, glorificado e sentado à direita de Deus Pai. Ele não concederia essa honra e glória a Maria? Negligenciaria honrar sua Mãe, Maria, violando assim o Quarto Mandamento? (cf. Gálatas 4, 4). É impossível concluir que Jesus não amasse sua Mãe o suficiente para preservá-la da corrupção e da morte (cf. Salmos 16, 10). Mesmo um homem pecador não permitiria que a sua própria mãe apodrecesse e se corrompesse, caso tivesse o poder para evitá-lo. Quanto mais faria o Filho de Deus com a sua própria Mãe!

É por isso que dizemos que as Sagradas Escrituras necessitam do dogma da Assunção de Maria. Para Jesus ser o Messias, Ele tinha que honrar sua Mãe perfeitamente, na sua máxima capacidade. Se Maria tivesse que sofrer o fim comum de todos os mortais, então Jesus teria falhado ao cumprir a Lei Mosaica. Isto é simplesmente inconcebível. Ele não negaria a Maria aquilo que Deus havia concedido a Henoc, Elias e outros santos homens e mulheres dos tempos antigos (Gênesis 5, 24; Hebreus 11, 5; 2Reis 2, 11-12; 1Macabeus 2, 50-64).

Portanto, podemos concluir que é biblicamente assegurado que o corpo de Maria não conheceu a corrupção e foi assunto aos Céus. Mas o que aconteceu com ela uma vez tendo chegado aos Céus?

Já explicamos como Maria foi prefigurada na “gebirah”, a Rainha Mãe de Israel, que sentava no trono do lado do Rei. É mais do que óbvio que Jesus é o eterno Rei de Israel e Maria a eterna Rainha de Israel[5]. Sabemos que ela foi coroada porque o Apóstolo São Paulo ensina que todos aqueles que vivem uma vida reta em Cristo recebem a coroa da glória nos Céus. São Pedro nos diz que, uma vez manifesto o Bom Pastor, receberemos a nossa coroa (1Pedro 5, 4). O apóstolo São Tiago ensina o mesmo em Tiago 1, 12. O próprio Jesus ensinou isso (Apocalipse 2, 10).

Com todos esses testemunhos de Jesus e dos Apóstolos, poderíamos duvidar que a Mulher vista no céu por São João seria outra pessoa e não Maria?

Apocalipse 12, 1-5 — “Um sinal grandioso apareceu no céu: uma Mulher vestida com o sol, tendo a lua sob os pés e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas; estava grávida e gritava, entre as dores do parto, atormentada para dar à luz. Apareceu então outro sinal no céu: um grande Dragão, cor de fogo, com sete cabeças e dez chifres e sobre as cabeças sete diademas; sua cauda arrastava um terço das estrelas do céu, lançando-as para a terra. O Dragão colocou-se diante da Mulher que estava para dar à luz, a fim de lhe devorar o filho, tão logo nascesse. Ela deu à luz um filho, um varão, que irá reger todas as nações com um cetro de ferro. Seu filho, porém, foi arrebatado para junto de Deus e de seu trono”.

Esta visão confirma para todos os crentes a coroação de Maria. Ela também é apresentada dando à luz a uma criança que reinará sobre todas as nações: o Messias, o Cristo que é conduzido até Deus e o seu Trono. Em Apocalipse 12, 13, nos é dito que ela tem outros descendentes. Seus filhos espirituais formam a Igreja daqueles “que observam os mandamentos de Deus e mantêm o Testemunho de Jesus”. Eis porque Maria não é apenas a Glória do seu povo Israel; ela é, ainda, a Rainha da Igreja e a Rainha do Céu, pois seu Filho é o Senhor dos Senhores e o Rei dos Reis (Apocalipse 5, 12; 19, 16; Filipenses 2, 9-11).

POR QUE “ISSO” NÃO ESTÁ NA BÍBLIA?

Muitas vezes tem surgido a pergunta: “Por que a Bíblia não fala de…?” e, como consequência, alguns exigem que esqueçamos tudo o que a Bíblia não menciona explicitamente.

Comecemos por afirmar que a Bíblia não promete, em nenhuma das suas páginas, um detalhe pormenorizado dos fatos históricos com fotos, mapas e notas de rodapé. A Bíblia não é um livro histórico, ainda que contenha dados históricos em algumas passagens. Tampouco pretende ser um álbum de recordações de tudo o que foi feito por certo personagem importante. Para os cristãos, o personagem mais importante da Bíblia é Jesus. Da vida e obra de Jeus, diz o Apóstolo São João:

João 21,24-25 – “Este é o discípulo que testifica destas coisas e as escreveu; e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro. Há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez; e se cada uma das quais fosse escrita, cuido que nem ainda o mundo todo poderia conter os livros que se escreveriam”.

O que o Apóstolo nos explica aqui é simples: o Evangelho foi escrito para revelar, não para registrar. A Bíblia não é um documento histórico destinado a perpetuar a memória do Povo de Deus. Ocasionalmente, livros como Reis e Crônicas possuem registros cronológicos, mas nem todos os escritores da Bíblia foram inspirados para assim atuar.

LER A BÍBLIA COM CUIDADO

Finalmente, o testemunho da Igreja, que é um testemunho vivo, serve de referência para aqueles que querem encontrar tudo o que é explicitamente mencionado na Bíblia. Por exemplo, a Bíblia não condena especificamente coisas como o lesbianismo ou o aborto, no entanto, ambas as práticas foram condenadas pela esmagadora maioria dos judeus e cristãos de todos os tempos (com algumas exceções de grupos recentes, mais identificados com políticas liberais). Muitas coisas sobrevivem dentro da Igreja ainda que não estejam detalhadas na Bíblia, como a liturgia da Santa Missa e as palavras que são comuns a tantos ritos diferentes em Roma, na Rússia, na Síria ou no Egito, e que, evidentemente, possuem uma origem comum e apostólica. Entre os judeus, a liturgia da sinagoga ou a usada no Yom Kippur sobreviveram sem que se encontre na Bíblia um detalhe exaustivo de todas as minúcias de cada celebração.

Isto porque o centro da adoração de Deus é a Igreja e a Bíblia é um dom de Deus que nos veio por intermédio da Igreja. Quando as pessoas tentam usar a Bíblia para “criar” uma Igreja, cometem um erro com a melhor das intenções, como se pudesse reconstruir um carro usando por base o “Guia do Proprietário” que se encontra no porta-luvas.

No caso das “objeções bíblicas” contra a Virgem Maria, sempre são falhas e cheias de omissões, em razão dos objetores desconhecerem os idiomas originais das Escrituras e por ignorarem os problemas que surgem ao se traduzirem as línguas da Idade do Ferro para as formas e línguas modernas.

Algumas objeções contêm erros de conceito ou falhas históricas. Outras, como as que analisamos aqui, surgem de uma leitura superficial das Escrituras, que não é meditada e estimada nas circunstâncias humanas e históricas que complementam o texto.

Nosso amável leitor nos pergunta por que a Bíblia é tão discreta ao falar de Maria, porém, para quem lê a Bíblia com atenção, desde Gênesis 3,15 até Apocalipse 12,15, passando pelos muitos tipos proféticos como Ana, Sara, Judite, Ester, Débora, Jael e as muitas alusões proféticas de Isaías, dos Salmos, do Cântico dos Cânticos e tantas outras, pareceria que nas Escrituras não se encontra outra coisa senão dessa mulher secreta que dará à luz ao Messias e marcará o início de uma nova era. A verdade é que a Bíblia está tão cheia de alusões a Maria como uma casa de família está sempre cheia das recordações de uma mãe!

Logo, por mais que as Escrituras digam “de Maria nunquam satis”, sempre poderemos falar mais.

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NOTAS:

[1] “Cristianismo Puro e Simples”, Martins Fontes, São Paulo 2005, pp. 11-12. Citado na obra “Arca da Graça: Nossa Senhora nas Sagradas Escrituras”, de Carlos Caso-Rosendi, Capítulo XIII, Ed. Christianville Press, Connecticut 2009.
[2] “Arca da Graça: Nossa Senhora nas Sagradas Escrituras”, de Carlos Caso-Rosendi, Capítulo I, Ed. Christianville Press, Connecticut 2009.
[3] “Exercícios Espirituais”, Santo Inácio de Loyola, nº 219.
[4] Extraído de “A Assunção de Maria aos Céus”, do livro “Arca da Graça: Nossa Senhora nas Sagradas Escrituras”, de Carlos Caso-Rosendi, Capítulo IX, Ed. Christianville Press, Connecticut 2009.
[5] Ver “A Sempre Virgem Maria”, no livro “Arca da Graça: Nossa Senhora nas Sagradas Escrituras”, de Carlos Caso-Rosendi, Capítulo V, Ed. Christianville Press, Connecticut 2009.

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