Por que a Igreja Católica se “intromete” no cânon do AT

Nome: E.

Religião: Protestante

POR QUE A IGREJA CATÓLICA ACEITA OS LIVROS APÓCRIFOS DO AT SENDO ESTES NÃO CONSIDERADOS PELOS JUDEUS NO SEU CÂNON? O ANTIGO TESTAMENTO FOI DADO AOS JUDEUS E NÃO A IGREJA CATÓLICA E NEM A PROTESTANTE, COMO PODE ENTÃO O CATOLICISMO SE ENTROMETER EM ASSUNTO ALHEIO.


Prezado E.,

O cânon do AT não foi dado por Deus aos Judeus. Se isso fosse verdade, não precisaria que os fariseus de Jâmnia (1) no ano 90 d.C definissem um cânon para os judeus, não é mesmo? Ora, eles resolveram fechar o cânon hebreu porque este mesmo cânon ainda estava em aberto. Isso está registrado até na Mishiná (2) no tratado Yaddyim IV,6. Lógico que os livros canônicos do AT já existiam, mas não existia ainda uma lista que definia quais livros deveriam ser considerados canônicos pelos judeus. Também é verdade que a falta de uma lista oficial não impediu que muitos dos livros disponíveis gozassem de caráter canônico, já que foram transmitidos pelo Magistério e Tradição judaicos.

Um outro equívoco bastante comum sobre este assunto é dizer que os fariseus definiram o cânon do AT. Não, eles definiram um cânon hebraico, isto é, os livros que segundo eles deveriam ser considerados canônicos por todos os judeus sobre a terra. Eles recusaram as escrituras cristãs que já circulavam entre os judeus e levavam muitos à conversão a Cristo. Toda escritura que oferecia perigo à religião judaica foi limada, inclusive os livros produzidos em grego ou fora da terra de Israel (Tobias, Judite, Lamentações de Jeremias, 1 e 2 Macabeus, Sabedoria de Sirac, Eclesiástico, e adições de Daniel e Ester). A decisão de quais livros ficariam ou não no cânon deles foi arbitrária, como é atestado [pasmem!] pela própria Mishiná (cf. Yadvim III 5 cd). Livros como Cântico dos Cânticos, Eclesiastes, Ezequiel e Ester quase foram arrancados. E se tivessem sido significa que nunca foram considerados canônicos? Significaria que nunca tiverem prestígio no seio do Judaísmo? Logo se vê que os arbitrários fariseus de Jâmnia poderiam ter considerado apócrifos livros que são canônicos.

O fato dos deuterocanônicos estarem incluídos na tradução grega das escrituras hebraicas (a Septuaginta ou Tradução dos Setenta), e vários manuscritos deles terem sido descobertos nas cavernas do Mar Morto de Massada não dizem nada?

A Igreja Católica ao dizer quais livros pertencem ao Cânon Bíblico, não está se intrometendo, pois só há intromissão quando alguém trata de um assunto que lhe é alheio. Jesus deu as chaves do Reino dos Céus e o poder de “ligar e desligar”, isto é decidir o que é certo e errado, a Pedro (cf. Mt 16,16-18). Jesus não deu esse poder aos fariseus do séc. I que no ano 90 d.C resolveram definir um arbitrário cânon hebraico. Diga-me que autoridade os fariseus tinham para definir um cânon bíblico em plena Era Cristã? Já que em plena Era Cristã o cânon das escrituras hebraicas ainda estava em aberto, a quem os cristãos devem obedecer: aos fariseus de Jâmnia ou aos Sucessores dos Apóstolos? Que autoridade possuía o ex-padre e apóstata Martinho Lutero para dizer o que é Escritura e o que não é? As chaves do Reino foram dadas a Lutero ou a Pedro? Se dependesse dele, não só AT protestante estaria mutilado, mas também o NT, pois ele rejeitou também Judas, Hebreus, Tiago e Apocalipse. Felizmente reformadores posteriores resolveram colocar estes livros novamente na Bíblia protestante, pena que não fizeram o mesmo com os Deuterocanônicos.

Como fica então o slogan protestante “Somente as Escrituras” se a definição da Escritura dependeu de autoridade da Igreja Católica para existir?

Assim como sua Bíblia, uma grande mutilação da Verdade é a nuvem da doutrina protestante.

Em meu livro (3) escrevo sobre este assunto trazendo muitas informações interessantes. Tenho plena certeza que você ficará surpreso com o que lá exponho.

Espero tê-lo ajudado,

Alessandro Lima,

Notas

(1) O Sinédrio que era a autoridade civil e religiosa para os judeus, foi destruída após a invasão de Jerusalém pelos romanos em 70 d.C. A autoridade judaica se restabeleceu anos depois em Jâmnia na Palestina, sob o comando dos Fariseus. Daí é que surge o atual judaísmo rabínico.

(2) Compilação da “Tradição dos antigos” (cf. Mc 7,3-5).

(3) https://www.veritatis.com.br/articles/4091.

 

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