Respondendo argumentos contra a doutrina do Purgatório

RESPONDENDO A ARGUMENTOS CONTRA A DOUTRINA DO PURGATÓRIO

 

Os católicos sabem que a doutrina do purgatório é uma das mais difíceis para o entendimento protestante e, por isso, freqüentemente estes argumentam contra esta baseando-se em idéias que são frutos justamente deste mal-entendido.

 

Neste texto procuro considerar alguns argumentos protestantes contra o purgatório e confrontar com o real ensino da Igreja Católica sobre este tão mal compreendido tema. 

...Porque o Senhor vosso Deus é um fogo devorador, um Deus zeloso (Dt 4,24)

Ele é precedido por um fogo que devora em redor os inimigos (Sl 96,3)

Põe-me como um selo sobre o teu coração, como um selo sobre os teus braços; porque o amor é forte como a morte, a paixão é violenta como o sheol. Suas centelhas são centelhas de fogo, uma chama divina (Ct 8,6)

A questão do purgatório envolve muitas outras questões essenciais a serem discutidas para que as pessoas entendam. Mas não podemos discutir por causa disso todos os dogmas cristãos, sendo assim, temos que nos esforçar ao máximo em focar apenas o núcleo do problema. São forjados textos para rejeitar a canonicidade dos livros deuterocanônicos, chamados pelos protestantes de ?apócrifos?, para argumentar contra a doutrina do purgatório. Mas se formos tomar este exemplo (a canonicidade dos livros bíblicos), teríamos que enveredar por vários outros campos para refutar tal hipótese, pois a rejeição à teologia do purgatório também envolve a questão das indulgências, da doutrina da justificação imputada, da doutrina da eleição de Calvino e da conseqüência da prática do dogma da Sola Scriptura. Se formos discutir todos estes temas para incluir o purgatório no meio deles, então não sairemos do lugar e poderíamos confundir ainda mais as pessoas.

 

Existem certos parâmetros que devemos delimitar para que o entendimento seja bem absorvido, e as dúvidas que surjam sejam decorrentes deste entendimento que foi passado, e não do que se acha que foi passado, como bem fazem alguns protestantes.

 

O que é o Purgatório?

 

A Igreja Católica ensina o que é o purgatório no seu Catecismo, parágrafos 1030 a 1032, páginas 290 e 291. Vejamos o que ele diz:

Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão completamente purificados, embora tenham garantida a sua salvação eterna, passam, após a sua morte, por uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrarem na alegria do céu.

 

A Igreja denomina purgatório esta purificação final dos eleitos, que é completamente distinta do castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da fé relativa ao purgatório sobretudo no Concílio de Florença (1660) e de Trento (1661). Fazendo referência a certos textos da Escritura (1662), a tradição da Igreja fala de um fogo purificador.

 

No que concerne a certas faltas leves, deve-se crer que existe antes do juízo um fogo purificador, segundo o que afirma que é a Verdade, dizendo que se alguém tiver pronunciado uma blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhe será perdoada nem no presente século nem no século futuro (Mt 12,32). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas no século presente, ao passo que outras, no século futuro (1663).

 

Este ensinamento apóia-se também na prática da oração pelos defuntos, da qual já a Sagrada Escritura fala: ?Eis porque ele [Judas Macabeu] mandou oferecer esse sacrifício expiatório pelos que haviam morrido, a fim de que fossem absolvidos do seu pecado? (2 Mac 12,46). Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos e ofereceu sufrágios em seu favor, em especial o sacrifício eucarístico (1664), a fim de que, purificados, eles possam chegar à visão beatífica de Deus. A Igreja recomenda também as esmolas, as indulgências e as obras de penitência em favor dos defuntos:

Levemo-lhes o socorro e celebremos a sua memória. Se os filhos de Jó foram purificados pelo sacrifício de seu pai (1665), por que duvidar de que as nossas oferendas em favor dos mortos lhes leve a alguma consolação? Não hesitamos em socorrer os que partiram e em oferecer as nossas orações por eles (1666).

1660. cf. DS 1304 ? 1661. cf. DS 1820; 1580 ? 1662. Por exemplo 1 Cor 3,15; 1 Pd 1,7 ? 1663. S. Gregório Magno, Dial. 4,39 ? 1664. cf. DS 856 ? 1665. cf. Jó 1,5 ? 166. S. João Crisóstomo, Hom. In 1 Cor 41,5: PG 61,594-595.

 

Diante do ensino oficial da Igreja Católica podemos dizer agora o que o purgatório não é:

 

    1 ? O purgatório não é uma segunda chance para a salvação, como afirmam os protestantes quando citam passagens como Tt 1,14 e Ef 1,7. O Catecismo deixa bem claro que as almas no purgatório possuem a garantia da salvação eterna.

 

    2 ? A prática de oração aos mortos não foi ?inventada? pela Igreja Católica, que somente a definiu, ou seja, organizou as idéias a seu respeito. Esta prática está descrita já em 2 Mc 12,46. Sobre este livro falaremos depois.

 

    3 ? O ?fogo? no purgatório é diferente do ?fogo? do inferno. Este é um fogo de tristeza e de dor, aquele é um fogo purificador.

 

    4 ? O purgatório não é uma passagem obrigatória, mas somente aos que não atingiram a santificação necessária para ver a Deus.

 

Muito bem, existem outras coisas que o purgatório não é, mas podemos deixar para mais adiante à medida que for desenvolvendo o texto.

 

Porque os protestantes rejeitam a doutrina do purgatório? Bem, existem vários motivos. Existem aqueles protestantes que o rejeitam somente porque se trata de um ensino da Igreja Católica, e assim como fazem com tudo o que vem dela, a rejeitam, sem ao menos saber porquê. Existem os que o rejeitam pela tradição teológica dos reformadores. A formulação do dogma da Sola Fide e da doutrina da eleição de Calvino deixou uma herança que não dá margens para uma possibilidade ou necessidade de purificação do homem. O fato histórico de Lutero ter retirado o Livro dos Macabeus, junto com outros 6 livros da Bíblia, também gerou a confusão entre os protestantes em achar que tal ensinamento não se encontra na Bíblia.

 

Destarte, muitos dizem que não aceitam tal doutrina porque não está na Bíblia. Ora, as grandes verdades que dão razão de ser do cristianismo são o mistério da Santíssima Trindade e o da Encarnação do Verbo. Onde, por acaso, vemos as palavras ?Santíssima Trindade? ou ?Encarnação? na Bíblia? Não é porque a Bíblia não cita a palavra ?purgatório? que devamos rejeitá-la, senão deveríamos proceder com os mesmos mistérios apontados acima e outros tantos mais.

 

Existe alguma necessidade de nos purificarmos para podermos entrar no céu, onde ?não entrará nada impuro? (Ap 21,27)?

 

Segundo o Antigo Testamento, o que está destinado ao serviço de Deus deve ser perfeito. Mesmo os animais para o sacrifício devem ser perfeitos.

Não oferecereis ao Senhor animal algum cego, estropiado, mutilado, atacado de úlcera, de sarna ou de dartro; não fareis dele um holocausto ao Senhor sobre o altar (Lv 22,22)

Da mesma forma os sacerdotes e ministros de culto.

Dize a Aarão o seguinte: homem algum de tua linhagem, por todas as gerações, que tiver um defeito corporal, oferecerá o pão de seu Deus. Desse modo, serão excluídos todos aqueles que tiverem uma deformidade: cegos, coxos, mutilados, pessoas de membros desproporcionados, ou tendo uma fratura no pé ou na mão, corcundas ou anões, os que tiverem uma mancha no olho, ou a sarna, um dartro, ou os testículos quebrados. Homem algum da linhagem de Aarão, o sacerdote, que for deformado, oferecerá os sacrifícios consumidos pelo fogo. Sendo vítima de uma deformidade, não poderá apresentar-se para oferecer o pão de seu Deus. Mas poderá comer o pão de seu Deus, proveniente das ofertas santíssimas e das ofertas santas. Não se aproximará, porém, do véu nem do altar, porque é deformado. Não profanará meus santuários, porque eu sou o Senhor que os santifico (Lv 21,17-23)

A perfeição deve corresponder de uma entrega total a Deus de acordo com os ensinamentos de sua Lei.

Que o vosso coração seja todo para o Senhor, nosso Deus, sem reserva, a fim de que andeis segundo as suas leis e observeis os seus preceitos, como hoje o fazeis (1 Rs 8,61)

 

Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças (Dt 6,5)

Mas como pode um pecador atingir este estado de perfeição? O Salmo 50 pode nos ajudar:

Só contra vós pequei, o que é mau fiz diante de vós. Vossa sentença assim se manifesta justa, e reto o vosso julgamento… Aspergi-me com um ramo de hissopo e ficarei puro. Lavai-me e me tornarei mais branco do que a neve… Ó meu Deus, criai em mim um coração puro, e renovai-me o espírito de firmeza… Deus, ó Deus, meu salvador, livrai-me da pena desse sangue derramado, e a vossa misericórdia a minha língua exaltará (Sl 50,6.9.12.16)

O Novo Testamento reafirma ainda mais a nossa necessidade de buscarmos a nossa santificação:

Depositários de tais promessas, caríssimos, purifiquemo-nos de toda imundície da carne e do espírito, realizando plenamente nossa santificação no temor de Deus (2 Cor 7,1)

Para que nos preparemos para ?que ele confirme os vossos corações, e os torne irrepreensíveis e santos na presença de Deus, nosso Pai, por ocasião da vinda de nosso Senhor Jesus com todos os seus santos!? (1 Tes 3,13).

 

Existem aqueles que não atingem este grau de perfeição exigido, devido a fraqueza da natureza humana.

 

?Sabemos, de fato, que a lei é espiritual, mas eu sou carnal, vendido ao pecado? (Rm 7,14) e por isso o homem pode não atingir esta perfeição. Mas, como ensina a Igreja, como o próprio apóstolo Paulo escreve, existem pessoas que serão salvas, ?mas como que através do fogo? (1 Cor 3,15). Estas pessoas são aquelas cuja obra não foi devidamente perfeita.

 

O purgatório não é nada mais que a purificação final.

 

A doutrina do purgatório, ao contrário do que pensam os protestantes, não se baseia somente no livro de Macabeus. Ela não se encontra explícita na Escritura, mas esta traz sua idéia implícita. Alguns rejeitam esta forma de entendimento, pois somente aceitam o que se pode perceber de imediato, como vemos com os fundamentalistas protestantes (a suposta “claridade das  Escrituras“). Mas os próprios protestantes aceitam que existam doutrinas que sejam determinadas, mesmo estando implícitas nas Escrituras.

CONFISSÃO DE FÉ BATISTA DE 1689

 

?7. Na Escritura não são todas as coisas igualmente claras, nem igualmente evidentes para todos.?

Passemos agora a analisar as passagens que a Igreja usa para testificar a existência de uma purificação final aos imperfeitos ?que morreram na amizade de Deus?.

 

2 Mac 12,46

 

O texto diz:

Era esse um bom e religioso pensamento; eis por que ele pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres de suas faltas

Mas só este texto não basta. Os protestantes fazem objeção ao grau de pecado dos judeus que acompanhavam Judas Macabeu e à canonicidade do próprio Livro.

 

Bem, vejamos uma coisa: A Igreja Católica diz que a prática de oração expiatória aos mortos já era feita desde tempos antes de Cristo, já na época dos Macabeus ou até mesmo antes. Para isso não há necessidade nenhuma de considerar o Livro dos Macabeus como inspirado. Se não é inspirado, como dizem os protestantes, que não possuem a autoridade necessária para determinar se algum livro bíblico é inspirado ou não, é, no mínimo, um livro histórico que apresenta a todos um fato! E isso os protestantes não podem negar. Negue-se a autoridade canônica do livro, mas não neguem que ele foi escrito em algum momento da história de Israel. Além do mais, na Bíblia Católica, os livros dos Macabeus são incluídos no grupo dos livros históricos.

 

Portanto, existia, de fato, a prática de oração aos mortos na antiga Israel.

 

Um argumento protestante diz:

 

?Devemos notar também que muito, muito ao contrário do que os católicos afirmam de que o ensinamento sobre o Purgatório tem raízes já na crença dos próprios judeus, cerca de 200 anos antes de Cristo, quando ocorreu o episódio de Judas Macabeus é uma mentira…!!! Querem usar um apócrifo para sustentar o purgatório.?

 

Vejamos que não é mentira nenhuma, pois o livro não foi escrito por um autor católico, mas um autor Judeu, e se o argumento protestante nega a autoridade do livro, não pode, sob hipótese alguma, negar a historicidade do livro.

 

Também dizem que:

 

?A referência mais antiga ao cânon hebraico é do historiador judeu Josefo (37-95 AC)?.

 

Mas esquece de dizer que não existia nenhum cânon definitivo até o fechamento (questionável, diga-se) do cânon hebraico em Jâmnia na Palestina, onde ficaram de fora os 7 livros encontrados no cânon dos judeus de Alexandria, por exemplo. O Cânon do Antigo Testamento não foi definido por critério de inspiração pelo Espírito Santo pelo fato de que tal Cânon é da religião judaica e por isso estes (os judeus) excluem que haja um ?Espírito Santo? que inspire autores a escrever. O Cânon palestinense foi definido com bases na língua escrita e em fatores patrióticos e políticos (e, porque não, anti-cristãos…).

 

Existe ainda um livro, este sim ?apócrifo?, chamado ?A Vida de Adão e Eva? que retrata Adão à espera do regozijo: ?…Ele ficará até o dia do julgamento nos últimos tempos, quando tornarei seu pesar em regozijo? (A Vida de Adão e Eva, 46,7).

 

Este livro a Igreja Católica não considera como canônico, mas nunca negou que apresenta uma crença histórica.

 

Dizem ainda:

 

?Usam este livro apócrifo, que serve apenas para revelar o costume pagão de alguns judeus, e que não deveria, evidentemente, ser tomado como norma para o povo de Deus, para provar a doutrina do Purgatório?

 

Vou analisar cada frase usada neste argumento:

 

1 – ?Vocês usam este livro apócrifo?

 

Primeiro, este livro não é apócrifo para todos os cristãos. Os cristãos orientais negam a autoridade do Papa, mas consideram este livro como canônico. Os protestantes negam a autoridade do Papa, e negam este livro. O porquê está no fato de Lutero ter retirado este livro juntamente com outros 6, e, se não fosse impedido por outros reformadores, o livro de Tiago, chamado por ele de ?verdadeira epístola de palha? onde “nada de evangélico existe”, também iria junto, por refutar sua nova doutrina da salvação somente pela fé. Se o livro de Macabeus deve ser apócrifo, e os protestantes baseiam-se somente na Bíblia para determinar em quê acreditar, então esta determinação deveria estar na Bíblia, o cânon de quais livros os cristãos deveriam aceitar ou não, deveria vir nas Escrituras. Mas o fato é que não veio.

 

2 – ?Que serve apenas para revelar o costume pagão de alguns judeus?

 

Ora, o costume da oração aos mortos tinha um objetivo:

Em seguida, fez uma coleta, enviando a Jerusalém cerca de dez mil dracmas, para que se oferecesse um sacrifício pelos pecados: belo e santo modo de agir, decorrente de sua crença na ressurreição, porque, se ele não julgasse que os mortos ressuscitariam, teria sido vão e supérfluo rezar por eles. Mas, se ele acreditava que uma bela recompensa aguarda os que morrem piedosamente, era esse um bom e religioso pensamento; eis por que ele pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres de suas faltas (2 Mac 12,43-46)

A prática se deu pela crença na ressurreição dos mortos, que é uma crença cristã. Logo o ?costume pagão? a que o argumento se refere é a crença cristã na ressurreição dos mortos.

 

3 – ?Não deveria, evidentemente, ser tomado como norma para o povo de Deus, para provar a doutrina do Purgatório?

 

O argumento atrela a necessidade da crença na doutrina de acordo com a quantidade das pessoas que crêem nela. Bem, vejamos que alguns protestantes são adeptos das doutrinas teológicas de João Calvino (TULIP), e sei que somente uma pequena parte dos protestantes hoje em dia aceita tal sistema, pois a maioria tem tendência arminiana. Será que os calvinistas não gostariam que a sua teologia (?de alguns cristãos?) fosse aceita como norma para o povo de Deus inteiro, por acharem-na a verdadeiramente correta?

 

Bem, existe um problema para resolver. Ele consiste em dizer que, pelo fato de terem sido encontradas imagens de ídolos junto aos corpos dos soldados de Judas Macabeu, o que a lei judaica proíbe, os mesmo praticaram pecado mortal, e portanto não poderiam receber a expiação tentada por Macabeu, pois o pecado mortal leva ao fogo eterno, necessariamente.

Não sabeis que os injustos não herdarão o reino de Deus? Não vos enganeis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas? (1 Cor 6,9)

Outra passagem:

O sangue de Jesus Cristo que nos purifica de todo pecado” (1 Jo 1.7)

E por fim os protestantes alertam: ?todo pecado é todo pecado?.

 

Será que entre ?todo pecado? o pecado da idolatria se inclui?

 

Jesus o faz:

?Por isso, eu vos digo: todo pecado e toda blasfêmia serão perdoados aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não lhes será perdoada? (Mt 12,31)

Por isso sabemos que mesmo o pecado da idolatria pode ser perdoado.

 

Os soldados de Macabeu praticaram a idolatria, mas ao morrerem estavam servindo a Deus, mesmo que carregando ídolos, o que foi a causa de sua morte. Eles morreram pelo pecado cometido, o que configura sua pena temporal, mas estavam atuando na obra de Deus, na ?amizade de Deus? como diz o catecismo, o que não lhes imputava a pena eterna.

 

Mesmo existindo entre os soldados de Macabeu alguns que praticaram a idolatria, Deus não deixou de estar com eles:

?Sob a proteção do Senhor, Macabeu e seus companheiros retomaram o templo e a cidade? (2 Mc 10,1)

E mesmo possuindo o pecado, fizeram o que era da vontade de Deus:

?Destruíram os altares que os estrangeiros haviam edificado na praça pública, como também os troncos sagrados. Após terem purificado o templo, erigiram um outro altar dos perfumes; utilizaram uma pedra para tirar faíscas das quais eles se serviram para oferecer os sacrifícios, após dois anos de interrupção; queimaram o incenso, acenderam as lâmpadas e recolocaram os pães da proposição? (2 Mac 10,2-3)

E nunca se esqueciam de louvar a Deus por isso:

?Foi assim que, levando tirsos, ramos verdejantes e palmas, cantaram hinos àquele que lhes havia concedido a dita de purificar o seu templo? (2 Mac 10,7)

E para suas batalhas, Macabeu e seus companheiros sempre pediam o auxílio de Deus:

?Então Macabeu com seus companheiros atacaram as fortalezas da Iduméia, após haver rezado e invocado o auxílio de Deus? (2 Mac 10,16)

E o Senhor os ouvia:

?Ao despontar a aurora, travaram combate os dois lados, contando uns com o êxito e a vitória, por causa de sua valentia e do socorro do Senhor, e os outros entregando-se ao combate, apoiados no próprio furor? (2 Mac 10,28)

E sempre após cada vitória, louvavam ao Senhor, que os concedia a fortaleza.

?Após essa façanha, cantaram hinos e cânticos ao Senhor, que havia operado grandes prodígios em favor de Israel, concedendo-lhe a vitória? (2 Mac 10,38)

Vejam que mesmo estando alguns deles em pecado, Deus não os abandonou, simplesmente porque agora estavam realizando a sua vontade.

 

Por isso os companheiros de Judas Macabeu, apesar do pecado, morreram piedosamente, e ele, por crer na ressurreição dos mortos, mandou realizar a oração expiatória em favor deles, o que seria supérfluo se não cressem nesta ressurreição.

?Ora, sob a túnica de cada um encontraram objetos consagrados aos ídolos de Jânia, proibidos aos judeus pela lei: todos, pois, reconheceram que fora esta a causa de sua morte.  Bendisseram, pois, a mão do justo juiz, o Senhor, que faz aparecer as coisas ocultas,  e puseram-se em oração, para implorar-lhe o perdão completo do pecado cometido. O nobre Judas falou à multidão, exortando-a a evitar qualquer transgressão, ao ver diante dos olhos o mal que havia sucedido aos que foram mortos por causa dos pecados. Em seguida, fez uma coleta, enviando a Jerusalém cerca de dez mil dracmas, para que se oferecesse um sacrifício pelos pecados: belo e santo modo de agir, decorrente de sua crença na ressurreição, porque, se ele não julgasse que os mortos ressuscitariam, teria sido vão e supérfluo rezar por eles. MAS, SE ELE ACREDITAVA QUE UMA BELA RECOMPENSA AGUARDA OS QUE MORREM PIEDOSAMENTE, era esse um bom e religioso pensamento; eis por que ele pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres de suas faltas? (2 Mac 12,40-46)

Desta forma percebemos que os companheiros de Judas Macabeu não permaneceram no pecado, ainda que os tivessem cometido. Deus não os rejeitou nas suas orações de ajuda e escutava seus louvores. Morreram por causa do pecado, mas não cometendo o pecado, mas sim praticando a vontade de Deus. Por isso eles estavam passíveis de uma purificação, e não destinados ao inferno, a pena eterna.

 

Sabemos que Deus não resiste ao pecador que se dirige a Ele:

?Meu sacrifício, ó Senhor, é um espírito contrito, um coração arrependido e humilhado, ó Deus, que não haveis de desprezar? (Sl 50,19)

Sabemos que Deus ?destrói a casa dos soberbos? (Pv 15,25) e que ?Deus resiste aos soberbos, mas dá sua graça aos humildes? (Pr 3,34).

 

Não podemos negar que os soldados de Macabeu, ainda que carregassem ídolos, não se humilharam diante de Deus e o louvaram. E sabemos que todo pecado é passível de perdão.

 

Mas os protestantes poderiam dizer que o pecado da idolatria leva incondicionalmente à morte e suponhamos que eu aceite esta definição. Sabemos que o pecado da idolatria está enumerado ao lado do pecado do adultério (1 Cor 6,9).

 

Todo mundo aqui sabe da história de adultério de Davi com a esposa de Urias. Pois bem. Sobre isso vejam o que aconteceu:

?Natã disse então a Davi: Tu és esse homem. Eis o que diz o Senhor Deus de Israel: ungi-te rei de Israel, salvei-te das mãos de Saul, dei-te a casa do teu senhor e pus as suas mulheres nos teus braços. Entreguei-te a casa de Israel e de Judá e, se isso fosse ainda pouco, eu teria ajuntado outros favores. Por que desprezaste o Senhor, fazendo o que é mau aos seus olhos? Feriste com a espada Urias, o hiteu, para fazer de sua mulher a tua esposa, e o fizeste perecer pela espada dos amonitas. Por isso, jamais se afastará a espada de tua casa, porque me desprezaste, tomando a mulher de Urias, o hiteu, para fazer dela a tua esposa. Eis o que diz o Senhor: vou fazer com que se levantem contra ti males vindos de tua própria casa. Sob os teus olhos, tomarei as tuas mulheres e dá-las-ei a um outro que dormirá com elas à luz do sol!? (2 Sm 12,7-11)

Segundo o entendimento protestante, Davi estaria destinado ao inferno definitivamente.

 

Mas vejamos a seqüência da história.

?Davi disse a Natã: Pequei contra o Senhor. Natã respondeu-lhe: O Senhor perdoa o teu pecado; não morrerás. Todavia, como desprezaste o Senhor com essa ação, morrerá o filho que te nasceu.. O Senhor feriu o menino que a mulher de Urias tinha dado a Davi, e ele adoeceu gravemente. Davi suplicou ao Senhor pelo menino; jejuou e passou a noite em sua casa prostrado por terra, vestido com um saco. Os anciãos de sua casa, de pé junto dele, insistiam em que ele se levantasse do chão, mas ele não o quis, nem tomou com eles alimento algum. Ao sétimo dia, morreu o menino? (2 Sm 12,13-18a)

Vemos que Davi ?desprezou o Senhor? pelo seu pecado, e foi castigado com a morte do seu filho (pena temporal). Porque então deveríamos negar que o mesmo ocorreu com os companheiros de Macabeu? Sabemos de antemão que Deus não faz acepção de pessoas e que Davi não morreu apenas por ser Davi, mas porque reconheceu o erro, quis permanecer ?na amizade de Deus?. Da mesma forma os soldados de Judas Macabeu.

 

Mas ainda é bom atentar para um interessante fato. Os protestantes dizem que o costume de orar pelos mortos é um costume pagão e que poucos judeus o faziam.

 

Bem, já mostrei que não era nada de costume pagão, mas não mostrei a outra parte. Na verdade não são poucos judeus que faziam a oração pelos mortos, mas muitos judeus fazem a oração pelos mortos, mantendo este ?costume pagão? até os dias de hoje.

 

Os judeus possuem uma oração feita após a morte de alguém, por esse alguém!

 

Os judeus ortodoxos acreditam que exista um lugar de purificação final que chamam de ?Gehenom?. Quando morre um judeu ocorre a prática do ?Taharh? onde se realiza a ?Chevra kaddisha — gmilat khessed shel emet? que podemos abreviar por ?Chevra Kadisha? ou simplesmente ?Kaddish?. Nesta oração os judeus pedem a clemência pelos pecados que a pessoa cometeu. Rezam esta oração por 11 meses.

 

Vamos agora para Mt 12,31-32

?Por isso, eu vos digo: todo pecado e toda blasfêmia serão perdoados aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não lhes será perdoada. Todo o que tiver falado contra o Filho do Homem será perdoado. Se, porém, falar contra o Espírito Santo, não alcançará perdão nem neste século nem no século vindouro?

O argumento protestante entende esta passagem desta forma: ?Em Mateus 12.31, Jesus simplesmente enfatiza a gravidade do pecado contra o Espírito Santo, dizendo que o perdão é impossível, não importando o tempo e o espaço?.

 

O Evangelho de Mateus no mostra um belo confronto entre os fariseus e Cristo. Estes o estavam acusando de possuir autoridade sobre os demônios pelo poder de Belzebu, que é o príncipe dos demônios (Mt 12,24). Vejamos:

?Mas, ouvindo isto, os fariseus responderam: É por Beelzebul, chefe dos demônios, que ele os expulsa?

E por isso Jesus os adverte quanto ao pecado contra o Espírito Santo (Mt 12,31-32).

 

O que se diz por ?tempo e espaço? Jesus diz por ?neste século ou no século vindouro (que virá)?. Se este pecado, o contra o Espírito Santo, é o único que não pode ser perdoado nem neste século nem no século que virá (a Bíblia TEB traduz esta parte como ?mundo vindouro?, assim com traduções protestantes), é porque existem pecados que poderão ser perdoados no século vindouro.

 

Para auxiliar o entendimento desta passagem devemos ler Mt 5,23-26:

?Se estás, portanto, para fazer a tua oferta diante do altar e te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar e vai primeiro reconciliar-te com teu irmão; só então vem fazer a tua oferta. Entra em acordo sem demora com o teu adversário, enquanto estás em caminho com ele, para que não suceda que te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao seu ministro e sejas posto em prisão. Em verdade te digo: dali não sairás antes de teres pago o último centavo?

Com entender as últimas palavras: dali não sairás até teres pago o último centavo?

 

Jesus está se referindo a uma imagem escatológica. O Juiz jogará quem ainda tem alguma dívida numa ?prisão?. Jesus alerta para não haver demora no ?acordo com o teu irmão?, pois o ?juiz? está a caminho.

 

De onde é ?dali??

 

Ora, sabemos que do inferno ninguém sai. É um dos dois únicos lugares eternos. Sabemos também que no céu ?nada de impuro pode entrar? (Ap 21,27). Deste lugar há possibilidade de sair, mas sob o ?pagamento até do último centavo?, ou seja, até que o que causou a sua ?entrada? seja equacionada. Não pode ser o inferno, pois de lá ninguém sai, não pode ser o céu, pois se ainda se têm ?algo a pagar? lá não se entra. Somente a existência de um estado intermediário, temporário, uma purificação final, dá sentido a esta passagem.

 

Com isso podemos passar para 1 Cor 3,12-15 para complementar este entendimento.

?Agora, se alguém edifica sobre este fundamento, com ouro, ou com prata, ou com pedras preciosas, com madeira, ou com feno, ou com palha, a obra de cada um aparecerá. O dia (do julgamento) demonstrá-lo-á. Será descoberto pelo fogo; o fogo provará o que vale o trabalho de cada um. Se a construção resistir, o construtor receberá a recompensa. Se pegar fogo, arcará com os danos. Ele será salvo, porém passando de alguma maneira através do fogo?

Desta forma os protestantes interpretam: ?O assunto de 1 Coríntios 3.15 gira em torno dos cristãos que hão de comparecer ao Tribunal de Cristo (Bema – palavra grega que significa pódio). Não para sermos julgados, mas, sim, galardoados. Nesse Tribunal, as pessoas receberão suas recompensas de acordo com as obras que realizaram (Ver 2 Co 5.10)?.

 

A passagem diz que no dia do julgamento nossas obras aparecerão, e o fogo provará o trabalho de cada um.

 

O argumento protestante diz que os cristãos hão de comparecer ao tribunal, mas não para serem julgados.

 

Pra que serve o fogo, então?

 

A recompensa que o texto se direciona é a nossa salvação. O autor da obra que foi provada pelo fogo e que provou ser resistente, receberá a salvação. Porém se a obra de alguém ?pegar fogo?, por ter ?construído com madeira feno e palha?, este não será recompensado da mesma forma que o anterior. Ele deverá arcar com os danos da sua obra ?queimada?, pois estava imperfeita, vacilante. Entretanto sua salvação está assegurada, porém ?como que passando pelo fogo?.

 

O que São Paulo quer dizer?

 

Ele não está se referindo ao inferno, pois as pessoas que se submeterão a este ?fogo purificador? serão salvas, enquanto que aqueles condenados ao inferno estão para sempre perdidos. E também não pode ser o céu, pois ele se refere a ?arcar com os danos?, e no céu ninguém ainda ?arca com os danos? de nada, pois lá Deus ?enxugará toda lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição? (Ap 21,4)

 

A Bíblia nos mostra que Deus é um ?fogo devorador? (Hb 12,28). O que São Paulo quer dizer é que Deus, quando nos traz a si após a morte para o julgamento, há um processo de purificação pelo fogo da presença de Deus. É Deus quem nos purifica das obras imperfeitas, simbolizadas na madeira, na palha e no feno. E esta purificação é necessária, porque, como já mostrei, a Bíblia diz que no céu (a Nova Jerusalém) ?nada de impuro pode entrar? (Ap 21,27). Esta imagem bíblica da pessoa sendo purificada pelas suas obras imperfeitas, mas obtendo a salvação, é o puro ensino da Igreja Católica sobre o purgatório.

 

Uma das maiores objeções ao purgatório é que dizem que ele nega o sacrifício de Cristo. Este sacrifício foi suficiente? Claro! É suficiente para nos redimir e permitir que o Espírito Santo nos santifique. Esta é a obra do Espírito Santo, nos purificar e nos santificar. O purgatório não é uma ?segunda chance? de salvação, pelo qual aqueles que rejeitaram a Cristo possam ?ganhar a salvação?. Jesus é claro em dizer que aquele que se recusa a segui-lo é culpado: ?Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado; por que não crê no nome do Filho único de Deus? (Jo 3,18). A purificação final somente é concedida aos que se reconciliaram com Deus nesta vida.

 

Os protestantes citam Fl 1,21-23 e 1 Cor 5,8 para defender a máxima de que quando o cristão morre automaticamente vai para o céu.

 

Fl 1,21-23 (versão TEB)  

?Pois para mim viver é Cristo e morrer um ganho. Mas se viver neste mundo me permite um trabalho fecundo, não sei o que escolher. sinto o desejo de partir e estar com cristo, o que é muito preferível?

Ora, Paulo exprime o desejo de ?sair? do corpo e estar com Cristo, mas qual cristão não o quer??? Paulo exprime o seu desejo, mas não significa que de fato o obtenha. Por isso não há porque entender que sair do corpo é o mesmo que estar automaticamente no céu. E este versículo não serve para refutar a doutrina do purgatório, pois de uma forma ou de outra todas as almas no purgatório estão em direção ao céu, da mesma forma como ficaram à espera do paraíso as principais figuras do Antigo Testamento. Hb 11,13.16: ?Todos estes morreram sem ter alcançado a realização das promessas…Por isso Deus não se envergonha de ser chamado seu Deus; de fato, ele preparou-lhes uma cidade?.

 

É-nos questionado também sobre o destino de São Dimas, o ?bom ladrão? da tradição cristã. Sobre esta questão lemos em Lc 23,43: ?Jesus lhe respondeu: ?Em verdade eu te digo, hoje, estarás comigo no paraíso??. Bem, sabemos que a salvação depende somente da graça de Deus, sem a participação anterior de nossas obras. O ladrão no momento mais crítico da paixão de Cristo o defendeu ?…mas ele não fez nada de mal? (v. 40) e apelou para Jesus ?Jesus, lembra-te de mim quando vieres como Rei? (v. 42) então Jesus aceitou sua oração ?Em verdade eu te digo, hoje, estarás comigo no paraíso? (v. 43). O que aconteceu é que, pelo menos implicitamente, o bom ladrão pediu a Cristo pela sua salvação. Devido a esta sua atitude de reconhecimento do pecado e da fé, ele recebeu o perdão de todos os seus pecados e penas temporais. Portanto não havia necessidade de purgatório para ele.

 

Portanto este texto não serve para refutar a doutrina do purgatório.

 

Dizem ainda ?O purgatório é uma invenção papista – inspirada por Satanás – das mais perniciosas porque ela termina por perverter a soteriologia bíblica inteiramente ao inverter o sentido da expiação dos pecados, tirando o foco da cruz de Cristo e Sua obra substitutiva, transferindo-o para o homem em uma suposta obra auto-expiatória, através de sofrimentos em um processo de purificação pós-morte.?

 

De fato Cristo nos conseguiu tudo para nossa salvação através de seu sacrifício na cruz, entretanto Ele em lugar algum nos impede de termos parte de nossa salvação através de sacrifícios, seja na terra, seja no purgatório. Deus escolheu para nós a melhor forma de alcançarmos o paraíso, que é participar com o seu filho em nossa salvação, e Ele faz isso, em parte, por permitir que carreguemos nossas próprias cruzes e nos permitindo sofrer: ?Agora encontro minha alegria nos sofrimentos que suporto por vós; e o que falta às tribulações de Cristo, eu os completo em minha carne em favor do seu corpo que é a Igreja? (Cl 1,24). Qual a necessidade de Paulo sacrificar sua carne se o sacrifício de Cristo não o levaria a isto? O purgatório não é algo que desvie este único sacrifício de Cristo, mas é onde nós poderemos terminar nossa purificação, nossa santificação, pelo poder de Deus e não nosso, sem a qual ninguém vê a Deus, se assim precisarmos.

 

A propósito, algum protestante aceita a teologia do purgatório?

 

Bem, alguns…

 

O teólogo anglicano C.S. Lewis escreveu em sua ?Carta a Malcom?, refutando a posição protestante contra a necessidade do purgatório:

?Nossas almas exigem o purgatório, não é mesmo? Não nos quebraria o coração se Deus nos dissesse, ?é verdade, meu filho, que tu não cheiras bem, que tuas vestes são surradas e derramam lama e lodo, mas aqui somos caridosos e ninguém irá te reprovar por você ser assim, muito menos te enviará de volta. Regozije-se conosco?. Por acaso não responderíamos ?Com submissão meu Senhor, e se não houver nenhuma objeção, eu prefiro me limpar antes?. ?Há sofrimento, sabias disso??. ?Ainda assim, meu Senhor??.

Jerry L. Walls, professor de filosofia e religião no Asbury Theological Seminary ? presbiteriano – escreveu um artigo à revista teológica protestante ?First Things? chamado ?Purgatório para Todos? (Purgatory for Everyone) onde ele analisa a teologia protestante sobre a justificação pela fé e o purgatório. Ele diz: ?Alguns protestantes continuam insistindo em dizer que o purgatório rejeita a justificação pela fé? e que ?é uma inovação separar justificação de santificação?. Ele ainda diz que ?pelo fato de a justificação não nos tornar efetivamente justos, é simplesmente irrelevante que se negue o purgatório?.

 

O purgatório não é uma invenção papista, como foi atentado. Qual foi o Papa que ?inventou? o purgatório? E sobre os antigos e os atuais judeus, que rezaram pelos mortos e ainda o fazem utilizando o Kaddish? Os judeus e cristãos ortodoxos, ainda que não contenham a doutrina do purgatório, entendem perfeitamente a existência de uma purificação final.

 

Vejamos mais. O purgatório é a palavra latina para o hebraico Sheol e o grego Hades. E nas Escrituras nós podemos encontrar referências que mencionam um estado que não é nem o inferno e nem o céu. No Antigo Testamento este estado é descrito por Sheol, no grego Hades. Alguém pode até pensar que Sheol (Hades) é igual ao inferno no AT, mas a Bíblia faz a diferença, pois ?inferno? na Escritura é descrito como Gehenna, o lago de fogo dos condenados (Mc 9,434-47; Mt 5,22-30). A Escritura diz, no AT, que as almas dos justos e dos ímpios, iam para o Sheol:

?Um mesmo destino para todos: há uma sorte idêntica para o justo e para o ímpio, para aquele que é bom como para aquele que é impuro, para o que oferece sacrifícios como para o que deles se abstém. O homem bom é tratado como o pecador e o perjuro como o que respeita seu juramento? (Ecl 9,2)

E neste lugar não importa o que se havia feito anteriormente, é para lá que se vai depois da morte:

?Tudo que tua mão encontra para fazer, faze-o com todas as tuas faculdades, pois que na região dos mortos, para onde vais, não há mais trabalho, nem ciência, nem inteligência, nem sabedoria? (Ecl 9,10)

Esta posição sobre o Sheol é confirmada por São Paulo quando diz que ?foi na fé que todos (nossos pais) morreram. Embora sem atingir o que lhes tinha sido prometido? e esperavam no Sheol pelo que havia sido prometido ?Eles aspiravam a uma pátria melhor, isto é, à celestial. Por isso, Deus não se dedigna de ser chamado o seu Deus; de fato, ele lhes preparou uma cidade? (Hb 11,13.16).

 

Sabemos que Davi é servo de Deus, mas Lucas diz que ?Davi pessoalmente não subiu ao céu? (At 2,34), e sabemos que Davi não foi ao inferno. Muito menos foi para sair depois de lá.

 

Desta forma, o Sheol contém as almas daqueles que foram justos, mas também dos ímpios. Isto tudo mudou com a morte e ressurreição de Jesus. ?Porque Deus, que tinha para nós uma sorte melhor, não quis que eles (as almas no Sheol ? adendo meu) chegassem sem nós à perfeição?. Jesus veio e retirou as almas dos justos do Sheol e deixou os ímpios.

 

Como ele fez isso?

 

Depois que Cristo ?padeceu a morte na carne? (1 Pd 3,18) Ele desceu ao Sheol e ?foi pregar aos espíritos que eram detidos no cárcere, àqueles que outrora, nos dias de Noé, tinham sido rebeldes? (1 Pd 3,19) e Jesus pregava o Evangelho ?também aos mortos; para que, embora sejam condenados em sua humanidade de carne, vivam segundo Deus quanto ao espírito? (1 Pd 4,16)

 

Após isso o Sheol não desapareceu. Jesus diz:

?Pois estive morto, e eis-me de novo vivo pelos séculos dos séculos; tenho as chaves da morte e da região dos mortos? (Ap 1,18)

Esta região dos mortos é o Sheol (Hades) e Jesus não estaria segurando a chave de alguma coisa que não existe mais, lógico. E é esse Sheol, ou Hades ou ainda Purgatorium que os judeus ortodoxos, os católicos latinos e os ortodoxos orientais crêem ser o ?estado? onde ocorre a purificação final

 

Infelizmente, por falta de espaço neste artigo, preciso terminar a reflexão por aqui, sentido que sempre haverá algo mais a esclarecer, pois, de fato, a doutrina do purgatório é um belo exemplo dos mais insondáveis mistérios de Deus.

 

Para finalizar, queria propor uma questão aos protestantes:

At 9, 36-37;40-41

?Em Jope havia uma discípula chamada Tabita – em grego, Dorcas. Esta era rica em boas obras e esmolas que dava. Aconteceu que adoecera naqueles dias e veio a falecer. Depois de a terem lavado, levaram-na para o quarto de cima. Pedro então, tendo feito todos sair, pôs-se de joelhos e orou. Voltando-se para o corpo, disse: Tabita, levanta-te! Ela abriu os olhos e, vendo Pedro, sentou-se. Ele a fez levantar-se, estendendo-lhe a mão. Chamando os irmãos e as viúvas, entregou-lha viva?.

 

Por quem Pedro estava orando?

 

Rondinelly Ribeiro

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