Uma possível resposta

Em muitas situações uma resposta longa a uma dúvida apresentada desestimula a sua leitura e faz o efeito contrário do pretendido: não “responde” nada; mais por um aspecto de “dificuldade de abordagem”, do que má-vontade para saber.

No mais das vezes uma resposta mais simples e direta cria a abertura necessária para o leitor procurar por mais dados, por mais informações, por mais verdade sobre o tema. 

Uma resposta mais abrangente e pormenorizada cabe melhor dentro de um espaço para artigos do que para tirar a dúvida de leitores. Como o tema é realmente importante – a devoção aos Santos – achei por bem lançar aqui o texto. Creio que seja do interesse de todos os nossos leitores saber a verdadeira dimensão da Comunhão dos Santos.

Deixei o texto em forma de resposta omitindo o nome do leitor para caracterizar uma franca e fraterna conversa: como tem que ser um proveitoso “dedo-de-prosa” entre amigos.

Espero que seja de bom proveito a todos.

Caríssimo C., salve Maria, a Mãe de Nosso Senhor.

Antes de tudo queremos agradecer a sua carta: pequenos gestos são sinais de grandes almas – denota humildade em endereçar-nos suas duvidas sobre o tema da Comunhão dos Santos, sua devoção e iconografia. Fiz aqui um recolho de alguns fragmentos sobre tão nobre ato de fé que, espero, cumpra a sua função de lhe esclarecer sobre a verdadeira face do tema.

Muitas vezes temos uma percepção literal daquilo que presenciamos e compreendemos de forma diversa do que realmente se sucede: tomamos um pelo outro – foi o que parece que você entendeu sobre os Santos do Senhor. O Cardeal Newman nos lembra que “são anjos disfarçados, são servidores de Deus que aparecem de tempos em tempos, difundindo luz a sua volta, enquanto peregrinam rumo ao Céu” e é bem caracteristicamente próprio eles possuírem uma aureola, uma coroa de luz que é como uma marca distintiva que Deus lá põe para nos lembrar de Sua santa humanidade, que Cristo remiu o mundo e o Espírito Santo baixou no Dia de Pentecostes.

Há uma certa hostilidade cheia de ressentimento no trato de matéria tão maravilhosa. Não se trata de atribuir essa repulsa pelos Santos como decorrente do abuso que se faz em certos lugares e por certas pessoas. Claro que o exagero em atribuir aos Santos um lugar mais alto do que Deus é totalmente condenável! Mas não podemos tomar a coisa pelo seu bagaço. Certamente é preciso combater esses abusos. Mas a exagerada insistência nesse ponto ruim não autoriza uma condenação geral, não autoriza a se negar o bem que lá existe, de sua exata posição na hierarquia dada por Deus aos seres. Por exemplo: condenar a razão pelo uso deturpado e pervertido que os racionalistas lhe atribuem não é correto, devemos, sim, criticar o uso errôneo da razão a luz do alto e legitimo valor que ela possui, ao status que Deus conferiu a ela.

Fiquemos com algumas palavras de Dietrich von Hildebrand: ” O exagero nas preces de intercessão aos Santos e o papel dos Santos na vida religiosa em nada diminui a importância das preces de intercessão. Muito menos vale dizer que se diminui o inefável dom de Deus, que os Santos representam e sua grande e essencial importância no Corpo Místico de Cristo.

Mais ainda, cada Santo é um extraordinário dom de Deus a nós. Somos privilegiados em testemunhar o triunfo de Cristo no ser humano e comprovar a essência da santidade. Aquele que não sente isso como dádiva admirável, e que não se sente inebriado em ver assegurado, na personalidade de cada Santo, um lampejo da glória sobrenatural, realmente não ama a Cristo e não é de fato um católico, muito menos um cristão.

Eles fazem confrontar os homens com o ethos da santidade e perturbam aqueles que interpretam os fins da vida crista ao modo de cada qual.

A objeção de que Deus não necessita dessa intercessão, é tão ilógica quanto irrelevante. Sem duvida, Deus não necessita de intercessões para atender as nossas preces. Mas, a questão se Deus “necessita” de algo já implica falso antropomorfismo. Deus, em Sua onipotência, de nada necessita. A questão que importa saber é se essa foi a Sua vontade. Nesse caso, nossa tarefa consiste em apreciar a infinita beleza e gloria de Seus Dons. Os caminhos que Ele escolheu para a salvação da humanidade não exprimem uma necessidade Sua, mas Seu infinito amor. Assim, para aqueles que percebem a gloriosa beleza da Comunhão dos Santos, do Corpo Místico de Cristo, o fato de os Santos amorosamente intercederem por nos, no Céu, a questão de saber se isso era necessário é despropositada. Essa intercessão não é indispensável nem essencial à nossa salvação e Deus poderia ter disposto as coisas de outro modo. Devemos, entretanto, louva-lO pela intercessão dos Santos, pura dádiva de Seu inefável amor.

As orações dirigidas aos Amigos de Deus, como as maravilhosas Ladainhas dos Santos, nas quais invocamos sua intercessão junto a Deus são apenas flores afetuosas que brotam e adornam a oração essencial diretamente dirigida a Deus. Isso se acha claramente expresso na Liturgia da festa de cada Santo.

Quem teve o coração tocado pela Sagrada Humanidade do Cristo, por Sua inefável santidade e sobrenatural beleza, tem de se sentir atraído por aqueles homens e mulheres que foram transformados n’Ele e em quem descobrimos um reflexo de Sua santidade.

?É uma veneração religiosa, resposta que se deve apenas aos que apresentam reflexos da Sagrada Humanidade de Cristo, prendados de todos os frutos da Graça?.

?Precisamos ter o espírito largo, para que a prisão do Oficio dos Santos vire clausura de amor, para tornar-se recanto de paz?.

 Recuperemos, pois, a nossa boa-vontade, a nossa boa fé integra e integral na alegria de poder contar com esses Santos e Santas do Senhor.

Com relação a o outro ponto de sua pergunta – as imagens – posso lhe afiançar que o problema está no seu entendimento do fato. Vejamos: quando Deus proíbe que se faca imagens, está Ele proibindo algo que seja uma Sua representação que O substitua como, por exemplo, o bezerro de ouro que os judeus adoraram enquanto Moisés estava no Monte.

Muitas vezes, por um contato estreito que temos com a ótica protestante (“hiper-espiritualidade”) e pelas deturpações de que “ouvimos falar”, somos tomados por uma “ira santa” que nos move a repelir certas coisas que, em principio, nos parecem erradas. Mais uma vez lhe digo que não podemos controlar e corrigir todos os abusos que são praticados usando-se o nome da fé nos Santos. O que podemos, devemos e fazemos é orientar e divulgar o máximo possível a verdadeira ortodoxia que a Santa Madre Igreja nos ensinou a cerca dos Santos. Isso não quer dizer que as imagens dos Santos são “abusivas”: são representações para que o fiel se fixe na atenção e na invocação quando de suas orações.

Veio-me agora um exemplo sobre as imagens: eu tenho uma esposa e uma filhinha que amo. Quando quero “lembrar delas”, traze-las mais próximo ao coração, eu pego uma foto (na verdade tenho sete delas) que tenho e que guardo na carteira. Tanto mais para as imagens dos Santos: nos Santos, esses amigos de Deus, temos a nossa ínfima humanidade exaltada em dignidade e amor, são verdadeiros marcos de eternidade no espírito humano; e pergunto: por que não lembrar dos Santos pelas suas imagens? Por que não traze-los mais perto de nós pelas suas fotos, suas estatuas, suas pinturas? Os Santos são as poesias de Deus no mundo dos homens comuns: a métrica e a forma podem mudar, mas todas tocam os nossos corações.

Nos corações de Jesus, Maria e José;

MARCUS PIMENTA

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