“Sobre a família” (CNBB: 20.03.1975)

APRESENTAÇÃO

O presente documento foi elaborado e promulgado pela Comissão Representativa da CNBB, reunida extraordinariamente em Brasília, de 18 a 20 de março de 1975. Possa ele contribuir para orientar e encorajar a quantos, em nosso País, querem trabalhar pela valorização e defesa da Família, da sua santidade e estabilidade.

Guiou sempre os Bispos em suas considerações a Palavra de Deus. Na sua luz deve ser lida e meditada a argumentação.

O bem-estar da Sociedade está intimamente ligado ao bem-estar da Família.

+ Aloísio Lorscheider
Presidente da CNBB

Brasília, 20 de março de 1975.

 

INTRODUÇÃO

1. A XIV Assembléia Geral da CNBB, reunida em Itaici, SP, de 19 a 27 de novembro de 1974, incluiu, com prioridade, no seu novo Plano Bienal, a Pastoral da Família. Essa decisão reflete a crescente preocupação do Episcopado brasileiro com relação à família.

2. Atendendo à orientação definida pela Assembléia Geral, a Comissão Episcopal de Pastoral (CEP), responsável direta pela elaboração e execução do Plano de Pastoral, em sua sessão ordinária de fevereiro próximo passado, aprovou um texto, que situa o problema da família no seu contexto contemporâneo e projeta determinadas linhas de ação, que podem ser assim resumidas:

  • a) Criar condições para que a família possa realizar sua tríplice missão de formadora de pessoas, de evangelizadora e de construtora da sociedade.

  • b) Levar em consideração a evolução pela qual passa a instituição familiar e bem assim os novos valores que surgem.

  • c) Colaborar na realização de estruturas sociaìs que permitam às famílias marginalizadas atingir condìções mínimas de estabilidade.

  • d) Incentivar e aprimorar a pastoral junto aos casais cristãos, a começar pela preparação séria para a consciente celebração do sacramento do matrimônio (Cf. Plano Bienal 75/76).

3. Entretanto, nessa mesma sessão, a Comissão Episcopal de Pastoral é informada, oficialmente, pela Presidência da CNBB, da iminência da apresentação, no Legislativo Federal, do projeto de emenda do artigo 175 § 1 da Constituição, relativo à indissolubilidade do casamento. Ante este fato novo, julgou a Presidência da CNBB, que era seu dever convocar uma reunião extraordinária da Comissão Representativa (CR) do Episcopado brasileiro.

4. A posição da Hierarquia da Igreja não pode ser a do silêncio e da omissão. Ela tem de levantar a voz profética em conformidade com os “princípios e luzes que promanam de Cristo” (GS 46), para guiar os fiéis e todos os homens na busca da solução de seus problemas.

Por tal motivo, a Igreja, embora compreendendo a importãncia das leis que procuram dar proteçâo às vítimas de lares desajustados ou desfeitos, não deixou de manifestar sua preocupação pelos impactos negativos de tais leis, no sentido de enfraquecer o apoio à família legítima e desvirtuar o vínculo conjugal.

5. Agora, entretanto, o problema sai do plano da legislação comum e atinge a Constituição. Não que, para a Igreja, as Constituições sejam intocáveis. As Constituições mudam, como também os tempos e as circunstâncias. Contudo, a emenda do divórcio toca em elementos que até hoje têm sido considerados básicos em nossa cultura, como bem comum e fundamental da brasilidade. A Igreja não deseja envolver-se num problema de revisão constitucional, mas julga seu dever falar quando esta revisão compromete um valor que transcende o arbítrio dos legisladores.

6. Reunidos, pois, em sessão extraordinária, nós os membros da Comissão Representativa queremos, de início, esclarecer:

  1. Estamos convencidos de que as propostas de emenda constitucional 04/75 e 05/75 virão afetar gravemente a família brasileira.

  2. Num debate desta natureza, cujas implicações tendem sempre a transcender os termos em que é inicialmente formulado, podem inserir-se outros interesses nos quais não queremos envolver-nos.

  3. Se a questão do divórcio ofereceu a oportunidade para nossa convocação, não queremos perder de vista o amplo quadro no qual ele se situa e que envolve o próprio papel da família na sociedade de massa, a posição da mulher na disciplina do casamento, a prioridade do âmbito familiar para a educação e, especialmente, a real condição da família brasileira nas camadas majoritárias de sua população.

  4. Não permitiremos, em especial, que a meta prioritária da Pastoral da Família venha desviar-nos de nossa permanente preocupação quanto ao respeito devido aos direitos humanos. Pela mesma razão, defendendo a família indissolúvel, não deixaremos de sustentar, com igual energia, a significação da escola livre, do sindicato autônomo, da auto-organização das formas profissionais rurais, dos direitos da inteligência ao exercício da crítica social ou da expressão das minorias validamente configuradas no contexto da vida social, a abolição total e definitiva das torturas, dos sequestros e das prisões arbitrárias.

7. Não cabe à Hierarquia da Igreja impedir a abertura do debate de questões de conteúdo moral vinculadas a valores humanos fundamentais, nem pretende ela envolver-se num processo meramente político. Cabe-lhe no entanto anunciar a fé que ilumina um sistema de valores sem os quais a atividade política, também ela sujeita às leis morais, não teria condições de prover ao bem comum.

 

1. ASPECTOS SÓCIO-POLÍTICOS

1.1 – A indissolubilidade do vínculo: exigência do progresso social

8. Vivemos numa sociedade pluralista. O fato é invocado em abono da tese, segundo a qual, em tal contexto cultural, nenhum grupo ou instituição pode pretender ìmpor sua filosofia de vida, exercendo pressões no sentido de dar estrutura legal às decorrências de sua filosofia.

Entretanto, exatamente porque vivemos numa sociedade pluralista e pretendidamente laicizada, nós, os bispos da Igreja, nos julgamos no direito e no dever de expor e de defender a doutrina a respeito do matrimõnio e da família, doutrina que se inspira na Palavra de Deus, da qual a Igreja tem consciência de ser guardiã e testemunha, na experiência da condição essencial da pessoa humana e na própria natureza do matrimônio. Ela sabe que não é por decreto que o casamento se torna indissolúvel. Ela afirma que todo matrimônio é por sua natureza indissolúvel.

9. A sociedade moderna se caracteriza por um processo de massificação que reduz a pessoa humana a uma simples função de um imenso mecanismo anônimo. Nesta conjuntura, a família se apresenta como o grande fator de personalização, como o corpo intermediário no qual cada ser humano tem condições de atingir uma certa plenitude, por se sentir acolhido na sua absoluta singularidade. Assim, defendendo a família, a Igreja se antecipa à angustiosa busca do homem moderno, no sentido de se preservar como pessoa, contra a massificação do grande complexo urbano industrial.

10. A palavra da Igreja não está, pois, marginalizada em face às exigências da evolução da sociedade de massa. Ao contrário, torna-se precursora dos direitos da diferenciação social. Sentimo-nos na obrigação de por-nos sempre mais a serviço do nosso povo, ajudando a iluminar os direitos dessa diferenciação. De outro lado, a Igreja se manifesta sobre essa matéria na ampla visão da instituição da família e de seu papel personalizante na sociedade global, vìsão essa que a Igreja interpreta como uma exigência dos Sinais dos Tempos, uma mensagem a todos os homens de boa vontade e um convite a uma profunda meditação sobre o papel real da família na sociedade de hoje.

11. Se o homem moderno, inserido nessa sociedade, parece perder real vínculo comunitário, não deixa ele de participar de uma civilização essencialmente solidária.

Diante de tal realidade em evolução, faz-se mister encontrar as visões do mundo e a compreensão das instituições que exprimam a sua condíção atual e não venham anacronicamente refletir uma política e uma concepção que emergiu nos primórdios da sociedade industrial do século XIX.

A visão liberal comporta a compreensão meramente contratualista do casamento, de que resulta a afirmação da dissolução do vínculo, ao arbítrio dos cônjuges. Na visão do mundo correspondente à sociedade de nossos dias, impõe-se a idéia da família como instituição. A instituição familiar tem efeitos e responsabilidades para além da estrita vontade dos cônjuges.

12. A família-instituição, transcendendo à mera íntenção dos cônjuges, apresenta-se hoje como o órgão privilegiado de personalização. A família é redescoberta pela sociedade moderna como forma de vida essencial à sua estabilização.

13. No momento em que o meio social põe à prova formas de associação não autênticas, os grupamentos fundamentais, entre os quais a família é primordíal, vêem realçado o seu papel na nova constelação de forças da sociedade urbana.

Dir-se-ia mesmo que, quanto mais complexa a vida urbana da sociedade ìndustrial, tanto mais é exigido da família, como elo primeiro da vida social.

14. É na revalorização da família que está, pois, o princípio ordenador e a base da verdadeira personalização. Sem ela a pessoa, pela variedade exasperada das novas condições de pressão social, logo à saída do meio familiar, será presa fácil dos estereótipos, das condutas programadas, das mobilizações de massa.

15. Nesses termos compete à Igreja trazer à sociedade brasileira a contribuição de uma visão da realidade capaz de superar a anacrônica concepção liberal do casamento.

16. As reivindicações divorcistas são só aparentemente progressistas. A indissolubilidade da família é uma das exigências de sua inserção na modernidade de nossa época como instítuição fundamental da sociedade de massa.

17. A sociedade moderna, cada vez mais pluralista, exige o reconhecimento dos vários grupos intermédios, que enfeixam e preservam os liames específìcos da vida do homem e de sua promoção.

É precisamente neste contexto que assume toda sua importância a doutrina das comunidades intermédias, princípio básico do pensamento social da Igreja. Sua validade é realçada pela falência de substitutivos da família nas tarefas de integração do indivíduo à sociedade. É o que vem demonstrar, por exemplo, o abandono crescente da legislação permissiva na etapa mais recente de consolidação dos sistemas socialistas, forçados a reverem sua doutrina clássica ante a dissolução da família.

18. Uma visão da família aberta ao futuro, considera portanto que o casamento exige a fundação de uma legítima instituição social, que deixa às partes formadoras, no limite da liberdade, tão somente a sua constituição. Os contraentes são livres para contratar, mas não o são para dissolver o vínculo matrimonial. Por sua implicação social, o vínculo matrimonial transcende o arbítrio dos cônjuges, em razão das funções que lhe competem nos mecanismos de coesão interna do núcleo familiar, de diferenciação social, de adaptação e de integração exigidos pela vida coletiva em nossos tempos.

1.2 – Razões e contra-razões dos divorcistas

    1.2.1 – O divórcio: mimetismo cultural

    19. Faría prova de mimetismo cultural pretender trazer o divórcio para o Brasil, com base no fato de que ele já foi adotado pela grande maioria dos povos ditos civilizados. A instituição generalizada do divórcio não dirime a questão do seu valor ético. As nações não se devem reger por maiorias estatísticas, mas por imperativos morais.

    Mais ainda, a instituição generalizada do divórcio não prova que uma lei divorcista seja em si boa. Seria mesmo desastrosa num país em cujo povo existe uma forte tradição familiar, num país no qual a família é a instituição que assume a proteção e a primeira educação da prole, pela carência inclusive de outros órgãos eficazes de assistência social.

    Ninguém duvida, nem mesmo os divorcistas, que uma lei de divórcio afeta seriamente a estrutura da família. Seria um contra-senso social abalar essa estrutura sobretudo num país, como o Brasil, onde a família, em nível de povo, é muitas vezes a única instituição em condições de desempenhar funções sociais indispensáveis.

    1.2.2 – A quem interessa o divórcio

    20. Neste contexto, a quem interessa realmente no Brasil uma lei divorcista? Não haverá impostura em pleitear para nosso povo uma lei que vìrá apenas trazer facilidades suplementares a determinada camada da sociedade, para a qual o dispositivo constitucional da indissolubilidade pouco ou nada representa? A verdade é que para a grande maioria, para o povo humilde e simples, o problema não é o de dispor de instrumentos legais para desfazer a família. O problema real consiste exatamente em ter ou não ter os meios para constituir família e condições mínimas de dignidade na estabilidade.

    1.2.3 – Os casos dramáticos

    21. Leva-se freqüentemente o debate para o terreno emocional, e se faz referência aos casos dramáticos daqueles que vivem uma vida em comum que já se tornou intolerável, sobretudo para o cônjuge inocente, sem perspectivas de poder reconstruir um novo lar para uma nova família. A Igreja quer tornar-se ainda mais sensível a estes dramas que constituem uma preocupação constante de sua pastoral familiar, porque ela está atenta ao fato de que, ao lado da família ordenada e feliz, cresce o número dos lares desajustados. Reconhece que, através de seus Tribunais Eclesiásticos especializados, deverá procurar sempre mais e melhor uma solução humana dos casos concretos, dentro dos imperativos canônicos e pastorais. Neste sentido, já se vem elaborando, na Igreja, uma jurisprudência mais atenta à complexidade com que os problemas hoje se apresentam, especialmente os que dizem respeito às causas que justificam a declaração da nulidade de casamento, podendo mesmo vir a oferecer oportunamente subsídios para a atualização da própria lei civil. Entretanto, nesse mesmo terreno emocional, a Igreja estranha que se omita qualquer referência ao fato de que uma lei divorcista comprovadamente abre a porta ao escapismo fácil daqueles que se sentem simplesmente cansados do outro consorte, cuja única falta, muitas vezes (e muito mais do que se admite), reside numa juventude ou numa beleza perdidas.

    1.2.4 – Os impasses da permissividade

    22. Por uma lei divorcísta estaríamos entrando num plano inclinado que conduziu a graves impasses as autoridades complacentes de socìedades permissivas. Tais autoridades começam a sentir que a pressão da permissividade, buscando munir-se de proteções legais, não tem limites. A responsabilidade pública das autoridades constituídas sente hoje todo o alcance das ameaças geradas pela complacência inicial. Assim se chegou à adoção do divórcio por mera desistência ou por comum acordo, à legislação do aborto, ao reconhecimento legal do homossexualismo, à total tolerância com relação a uma pornografia degradante.

    1.2.5 – A absurda inversão

    23. Não se trata de discutir a eventual necessidade de uma separação ou de uma declaração de nulidade de um matrimõnio que, de fato, nunca existiu. Trata-se de saber se o Estado, que tem o dever de criar condições, não no interesse de uns poucos, mas para a verdadeira dignidade de todos, pode criar, pela lei do divórcio, uma situação que, servindo a poucos privilegiados, prejudica a maioria. A incompreensão de alguns não justifica a demolição institucionalizada dos últimos amparos e estímulos de uma vida mais digna, mais responsável, mais comunitária.

    24. A sociedade já gravemente ferida pela instabilidade e pela irresponsabilidade, não precisa de facilidades, mas de todas as formas justas e dignas de ajuda. O divórcio tudo facilita para aqueles que nem sempre buscam a dignidade e a corresponsabilidade maior na comunidade humana e trocam tão facilmente os valores invioláveis dos outros por seus próprios interesses. Ao mesmo tempo, ele em nada serve aos que tão imperiosamente precisam de orientação, de preparação, de ajuda que sustente os valores mais sublimes da vida.

    1.2.6 – Valores ou utilidades?

    25. O mal da humanidade não está na carência de recursos, mas em não saber ou querer bem empregá-los. O homem, ao esquecer os valores superiores capazes de orientar sua existência, e ao se entregar à insaciável sofreguidão de prazeres e de utilidades egoístas, não faz mais do que cavar a sepultura de sua própria felicidade.

    Os que têm o encargo de cuidar das condições do bem comum, como o tem o Estado, não podem assumir a atitude ambígua ou contraditória de facilitar, através de uma legislação divorcista, as tendências para a progressiva dissolução dos valores humanos, ao mesmo tempo que pretendem legislar no sentido de dar amparo à sociedade. O Estado não terá meios de impedir as conseqüências desastrosas desencadeadas pelas condições por ele mesmo criadas mediante Leis contrárias à verdadeira realização humana.

    26. Esta reflexão se impõe numa época em que, ao mesmo tempo que se prolonga cada vez mais a vida, se institucionaliza o extermínio de tantos seres humanos que ainda nem nasceram. Vivemos num mundo que possui recursos impressìonantes para a formação e a educação, mas que, em meio à funesta confusão dos egoísmos antagônicos, introduz a juventude numa sociedade, que é exatamente o contrário do que apregoam belas teorias. Estamos numa época em que tantos tomam conhecimento da sorte infra-humana de muitos, mas não sabem como deixar de se entregar ao esbanjamento absurdo, e deixam morrer os que não conseguem saciar-se com o que sobra do luxo que não lhes é lícito cobiçar.

    Ou o homem obedece a valores que o fazem ultrapassar a si mesmo e a seus interesses imediatos e assim se liberta, ou se escraviza e arruína toda a comunidade humana.

    1.2.7 – Os Filhos ou os Pais?

    27. É esta uma pergunta mal colocada. Reflete a atitude que contrapõe os interesses de uns aos de outros. É por aí que tem início a morte do amor. O amor é a capacidade de encontrar a felicidade exatamente no serviço ao outro. Os filhos vítimas do egoísmo dos pais, muitas vezes, não querem para si o que as disposições legais lhes podem garantir: escola, saúde, alimentação. Eles exigem para sì o que não é objeto de lei humana alguma: amor, carinho, compreensão, aprender a viver em confiança. Quantos jovens têm o melhor colégio, mas maldizem os próprios pais, dos quais nunca receberam o valor maior da vida: o exemplo do amor altruísta, o respeito por sua intocável dignidade e a aspiração a uma verdadeira superação de toda indignidade humana. É por isso que a geração jovem começa a descrer da sociedade dos oportunìstas que não se empolgam com valores humanos e espirituais.

    1.2.8 – A sorte da mulher

    28. O igualitarismo que o divórcio pretende promover não condiz com a justa emancipação da mulher, nem mesmo a promoção sócio-política e cultural, por mais indispensável que seja, atinge ainda o último direito, a última necessidade da mulher: a de ser o princípio de compreensão, de comunhão na sociedade; a de encontrar a total e irrestrita confiança como ambiente indispensável para que desabroche a sua feminina e materna capacidade de amar e de conduzir a humanidade, das utilidades meramente materiais aos valores que ultrapassam o indivíduo e servem ao bem de todos.

    29. A experiência desmente a fácil propaganda e demonstra que a mulher, inúmeras vezes, é a mais prejudicada pela irresponsabilidade conjugal. Ela não precisa de mais uma experiência; ela precisa descobrir a grandeza humana, num clima no qual possa revelar o valor maior da vìda.

    30. Também nesse particular se verifica que o divórcio privilegia uns e desampara outros, porque subtrai ao cônjuge-vítima o último estímulo sério (a indissolubilidade), para um maior esforço do outro no sentido de construirem juntos a própria felicidade.

     

    2. ASPECTOS TEOLÓGICOS-PASTORAIS

    2.1 – A indissolubilidade do vínculo conjugal: Mandamento do Senhor

    31. Se a Igreja eleva a sua voz em defesa da perenidade da união conjugal, alicerce da estabilidade da família, é porque recebeu este mandamento do Senhor. Já na Antiga Aliança, pelo profeta Malaquias, Deus diz que detesta o divórcio (cf. Mal 2,13ss).

    32. No Evangelho o Senhor inculca a indissolubilidade do matrimônio. Na verdade, o matrimônio, entendido como comunidade de vida, instituída por Deus, do homem e da mulher, que se fundamenta no amor e fidelidade incondicionaìs de ambos os cônjuges, nunca mais pode ser dissolvido, segundo a vontade de Deus: “o que Deus uniu, jamais o homem pode separar” (Mt 19,6ss), quem se separa não poderá casar outra vez (cf. Mc 10,11).

    Fiel, como o apóstolo Paulo, a Igreja aceita a lei evangélica, (cf. 1Cor 7,10-16) porque ela sabe que essa leì procede da vontade amorosa e da sabedoria infinita de quem anela pela felicidade humana e constantemente ilumina os homens, descortinando-lhes novas dimensões de sua própria realidade humana. Ela traz luz e orienta a própria Igreja e todos os homens de boa vontade e faz descobrir nova dimensão do amor na unìão conjugal, que alcança seu ápice no matrimônio-sacramento, reflexo da união indissolúvel de Cristo com a sua Igreja (Ef 5,31-32).

    O Evangelho, de fato, desvenda o mistério original que trabalha, ativa e nutre por dentro os que vivem o amor matrimonial. Coloca-os inseridos no mistério criador e salvador, em nova condição existencial, na qual são absorvidas e transformadas as vidas individuais e as vontades pessoais libertas de seus caprichos egoístas. Surge e se instaura pelo casamento um ser novo, os dois, inseparavelmente, num só; os dois, irrevogavelmente, numa só carne, como diz a Bíblia (cf. Gên 2,24; Mt 19,6; Mc 10,8; Ef 5,31-32).

    33. Cristo se recusa a pactuar com a fraqueza humana. Sabe que, onde há fraqueza no homem, ali nascem também novas energias restauradoras, novos anseios e esforços por recuperar valores esquecidos ou perdidos. Nestas forças renovadoras que parecem recursos misteriosos de todo ser vivo, reconhecemos a graça pascal de Cristo que morrendo ressuscita e dá a vida até aos mortos (cf. Jo 11). À luz do Evangelho divisamos a graça do matrimônio elevado à plenitude de sacramento (cf. Ef 5,25-27.32). Pelo Evangelho descobrimos o apelo do amor nupcial para o vínculo estável. 0 Evangelho nos torna mais conscientes da enorme dificuldade em responder plenamente a esse apelo. Do Evangelho também haurimos a promessa e a esperança no dom de Deus de fidelidade absoluta ao compromisso assumido no casamento por todos os dias da vida, fidelidade na qual, em última análise, se funda e repousa a estabilidade da família.

    34. Baseando-se, pois, nas Sagradas Escrituras, a Igreja ensinou e ensìna a indissolubilidade do vínculo matrimonial, que adquire peculiar firmeza no matrimônio-sacramento (Cân. 1013 §2°). Mais: segundo a doutrina da Igreja, a indissolubilidade constitui uma das propriedades essenciais do matrimônio, de tal forma que sua exclusão traria consigo a nulidade do casamento.

    Assim se compreende que “a ação da Igreja sempre tem sido dirigida e continua a sê-lo ainda hoje no sentido de obter que esta propriedade essencial seja reconhecida e garantida mesmo pela legislação dos Estados no concernente não só no matrimônio-sacramento, mas a todo casamento válido” (Osservatore Romano nº 8, de 23.2.75, comentárìo p. 1).

    2.2 – A indissolubilidade do vínculo: exigência do amor

    35. Ao falar da família, a Igreja não pode admitir que a sua mensagem seja interpretada em dois níveis irredutivelmente separados, quais seriam o “natural” e o “sobrenatural”. É um fato que a Igreja proclama a sacramentalidade do matrimônio como valor altíssimo e novo. Todavia, a Igreja sempre afirmou igualmente que o sacramento do matrimônio não se substitui à realidade do compromisso matrimonial natural, nem a ela se sobrepõe, mas a santifica nas pessoas marcadas pela Fé e pelo Batismo. Por isso, a Igreja, quando fala do matrimônio, visa essencial e fundamentalmente a instituição conjugal e familiar na sua original intangibilidade.

    36. A doutrina da Igreja sobre o matrimônio tem por fundamento a sua inconfundível concepção da dignidade do homem, dignidade que se expressa plenamente no amor.

    Pelo uso da sua liberdade, o homem busca o bem, a posse de valores que o elevem e o promovam. Ovando este bem ou este valor é uma coisa, o movimento da liberdade se consuma num gesto de posse. Ovando porém este valor é uma pessoa, o homem intui que ela não se rende a um gesto de posse, mas se oferece livremente em resposta, a um gesto de dom. O amor humano se revela assim como o encontro de um dom mútuo e total. Só a totalidade do dom inaugura um relacionamento de amor. Nesta totalidade está inscrita uma exigência imanente de irreversibilidade. O amor humano, na sua autenticidade original, transcende o tempo e não se deixa limitar pelas precauções de um calculismo egoísta. Um compromisso condicional inaugura, de fato, uma aproximação de egoísmos paralelos, da qual cada um dos cônjuges procura extrair para si a maior soma de satisfações pessoais. Esta contrafação do amor se dissolve quando o balanço hedonista apresenta um saldo negativo, liberando cada um dos cônjuges para uma nova aventura, votada ao mesmo fracasso. Defendendo a indissolubilidade como exigência do amor, a Igreja não se obstina numa irritante intolerância, mas procura defender a dignidade do amor humano contra sua própria fragilidade, para assegurar a experiência de uma verdadeira plenitude que se situa além das inevitáveis crises. Sem uma garantia de indissolubilidade, tais crises, que poderiam reduzir-se a episódios dolorosos mas passageiros, transformam-se em rupturas irreparáveis.

    37. Sem o amor irrestrito, pelo qual o homem se ultrapassa e ultrapassa as necessidades dos interesses efêmeros, não há comunhão autêntica. Porque só este amor leva a pessoa à maturidade, à libertação das raízes da escravidão do egoísmo. A comunhão humana, livre do capricho e do instinto, só existe quando há compromisso pelo bem do outro, dedicação ao valor do outro, que não se mede por nenhum interesse. Mas supõe a disposição para as implicações do amor, mesmo com sacrifício. Aí está a dimensão pascal do amor cristão.

    38. A vida só é verdadeiramente humana, se vivida em confiança. A juventude, sobretudo, exige um clima de confiança, cuja razão de ser não seja o cálculo, mas exclusivamente a dignidade do outro. Se não o encontra, a sua capacidade de conviver humanamente e a sua generosidade se atrofiam.

    No matrimônio o amor tende a se expandir em tal plenitude que compromete os cônjuges em todas as dimensões da vida. Isto só será possível se a confiança mútua tiver por fundamento valores pelos quais se sintam totalmente comprometidos na livre opção que fizeram por essa possibilidade única de um verdadeiro desabrochar humano.

    39. Sabemos que todos os homens de boa vontade são guiados pela graça de Deus toda vez que, em generosidade e gratuidade, se comprometem ao irrestrito respeìto mútuo e se dão verdadeira e religiosa confiança recíproca, mediante livre opção por um ideal de vida, que independe do seu arbítrio pessoal. Somente o homem que se emancipa das efêmeras arbitrariedades, está aberto ao mistério de Deus, tenha ele disso consciência ou não. É por isso que o casamento, digno desse nome, mesmo quando vivido por não cristãos, é abertura verdadeira para o sentido divino da existência a dois.

    40. O matrimônio que não se abre ao mais alto e absoluto ideal, que não supera o arbítrio, traz em si a causa da esterilidade espiritual e do fastio inevitável. Não podemos afirmar que a busca do ideal seja livre em nossas vidas, pois é o próprio homem que, no exercício de sua liberdade, tem necessidade do ideal. O caminho da realização e da felicidade humanas não coincide com os desvios fáceis que pretendem evitar os obstáculos e as dificuldades, mas que na realidade levam ao engano e à fatal ilusão.

    41. Não podemos deixar de mencionar aqui que o Evangelho conhece dois caminhos de realização e planificação humana no amor. Cada qual com o seu próprio dom (cf. 1Cor 7,7), ordena-se um ao outro, complementando-se na construção do Reino de Deus aqui no mundo, com vistas ao destino eterno. Um deles, o casamento em que dois seres humanos, significando o pacto indissolúvel do amor de Deus com a humanidade, concretizado no tempo pela doação total de Cristo, obediente até a morte de cruz (Fil 2,9; Jo 3,16; Jo 15,13; Ef 5,22-32), caminham juntos para Deus, numa só carne, produzindo frutos preciosos de vida, destinados a alegrar eternamente a casa do Pai.

    O outro, o do celibato ou castidade por causa do Reino de Deus (cf. Mt 19,12), que, numa tensão constante pelas coisas do Senhor (1Cor 7,32), esforça-se por conservar aceso nos corações humanos o fogo de amor divino trazido por Cristo à terra (Lc 12,49) difundido em todos os corações pelo dom do Espírito Santo (Rom 5,5). Este amor celibatário, também marcado pela renúncia e pela cruz, relembra às criaturas humanas, em suas várias condições existenciais, que só perdendo a vida por Cristo é que ela será de fato encontrada (Mt 10,37-39).

     

    3. TAREFAS QUE SE IMPÕEM PARA A PROMOÇÃO DA FAMÍLIA

    3.1 – Requisitos para uma política familiar

    42. A palavra da Igreja não pode expressar a sua preocupação tão somente com relação ao vínculo conjugal. Esta preocupação se insere necessariamente na pronta e irrestrita defesa de muitas outras reivindicações ditadas pelo seu compromisso fundamental com a sociedade aberta pluralista e em busca do ideal democrático.

    43. A defesa da indissolubilidade do vínculo conjugal, por parte da Igreja, vai, pois, ao encontro do mais fundamental dos Sinais dos Tempos que nos mostram o sentido querido por Deus da evolução da sociedade contemporânea, que é o serviço do homem. Ao avanço tecnológico, à melhoria da vida de relação, ao aperfeiçoamento dos mecanismos institucionais, deve corresponder o serviço ao homem e ao humanismo.

    44. Na perspectiva de uma política familiar global, a defesa do caráter institucional, e não meramente contratual, do casamento, não pode dissociar-se do empenho relativamente a outras exigências da política global da família, quais sejam principalmente:

    • a) Imediata promoção da igualdade da posição dos cônjuges dentro da família mediante eliminação das restrições ainda existentes, características da sociedade patriarcal. O projeto do novo Código Civil conserva traços de desequilíbrio, perante a lei dos direitos e deveres dos cõnjuges, no matrimônio. A eliminação desse desequilíbrio, em conformidade com o que preconizam os documentos do Concílio Vaticano II e dos Sínodos Episcopais de 1971 e 1974 mereceria o encômìo da Igreja.

    • b) Valorização do papel da família na educação de seus membros dentro de sua filosofia de vida.

    • c) A reiteração do primado da família nas determinações relativas à prole, face às políticas do controle demográfico.

    45. No contexto mais amplo das relações e interdependências sociais em que se insere a família, dever-se-ia levar em conta uma série de condiçôes para sua promoção e dignidade.

    46. Entre estas condições, mencionamos as seguintes:

    • A extensão progressiva do salário-família, vinculado à Previdência Social, a novos setores de beneficiários, entre os quais, especialmente, os trabalhadores rurais e alguns setores de trabalhadores inativos.

    • A melhoria substancìal do respectivo benefício sob várias formas alternativas ou acumulativas, implicando na elevação progressiva dos valores do salário-família e sua maior discriminação.

    • A amplìação do grupo dos dependentes a ser beneficiado pela Previdência Social.

    • Novas formas de amparo à mão de obra feminina, transferindo para a Previdência Social, como foi feito a respeito da indenização à gestante, outros ônus que ainda recaem sobre empresas isoladas, afetando negativamente a contratação de mulheres.

    • Aperfeiçoamento dos mecanismos securitários e assistenciais, no que tange, por exemplo, às aposentadorias, cujo nível ainda independe da existência e do vulto dos compromissos do segurado com a manutenção dos seus familiares.

    • Expansão do serviço social, no setor público e no setor privado, no sentido de levá-lo não só a indigentes avulsos como a famílias mais desfavorecidas.

    • Assistência social à infância subnutrida, mendicante, abandonada e delinqüente.

    • Atenção especial ao problema do desemprego e da colocação de trabalhadores casados, particularmente daqueles que têm pesadas obrigações familiares e que por motivo de idade encontram maior dificuldade de emprego.

    • Defesa da capacitação do menor e do seu problema legal.

    • Medidas de incentivo à fixação da família ao solo, através de uma política de autêntica reforma agrária.

    • Incentivo à legislação cooperativa com base familiar.

    • Defesa dos interesses da família no acesso à comunidade escolar.

    • No plano habitacional, deverão ser asseguradas, a todos, condições dignas de moradia, compatíveis com as necessidades impostas pela dimensão e característica de cada família e o exercício de suas funções essenciais. Assim, não poderão ser impostas soluções de moradia baseadas unicamente na renda familiar, mas, inversamente, sejam oferecidas condições de financiamento adaptáveis às possibilidades econômicas de cada família, que permitam assegurar-lhe moradia com um mínimo de condições de espaço e conforto, indispensáveis a uma forma digna de convivência familiar.

    • Controle da inflação monetária e correção da iniquidade na repartição das rendas, fatores dos mais erosivos da estabilidade econômica da família.

    47. São estes alguns dos aspectos mais urgentes de uma ampla política familiar, e que constituem, evidentemente, mais do que o divórcio, objetivos prioritários para todos os que estão sinceramente empenhados em salvaguardar a famílìa brasileira.

    Está nas mãos dos Congressistas uma grave responsabilidade quanto ao destino da família brasileira. Esperamos que sua lucidez conduza o problema segundo os legítimos anseios da coletividade nacional. Que deste debate, a família saia glorificada na afirmação de sua unidade e estabilidade.

    3.2 – Algumas sugestões para a Pastoral da Família

    48. A Igreja e, em particular, seus movimentos leigos na área familiar, empenhar-se-ão na elaboração de uma pastoral familiar realmente eficaz, concreta e objetiva, que ajude a construir a indissolubilidade, através do amadurecimento do vínculo conjugal e da superação ou neutralização das causas de desagregação familiar. Os programas devem tender a oferecer à família os meios para que ela seja uma comunidade realmente personalizante, pela formação e promoção daqueles que a integram, e possa desempenhar sua missão de evangelizadora e de promotora de um desenvolvimento humano e integral.

    49. Inicialmente, é urgente a elaboração de uma ação pastoral eficiente de educação para o amor, que deve começar nas famílias, nas atividades catequéticas orientadas para as crianças e pré-adolescentes, nos programas de formação de jovens e adolescentes realizados por movimentos especializados nessas áreas.

    50. Os cursos de preparação ao casamento, se bem realizados, podem se constituir em preparação imediata extremamente eficaz, por encontrarem terreno particularmente fértil e receptivo, nessa fase pré-matrimonial. Mas a realização destes cursos não deve fazer esquecer a necessidade de uma preparação remota, que deverá ser ministrada através dos movimentos de jovens, nas aulas de religião dos últimos anos do curso, e em outras ocasiões, dentro de uma visão vocacional.

    51. Programas concretos de apoio à família deverão ser desenvolvidos, de modo especial, logo após o casamento.

    Para tanto, deverão ser aproveitadas todas as oportunidades naturais de encontro da Igreja com as famílias que dela se aproximam. Oportunidade válida e adequada para tanto deveriam ser os encontros realizados com pais e padrinhos de crianças que vão se batizar.

    As atividades catequéticas paroquiais costumam incluir contatos sistemáticos com os pais. É esta uma oportunidade insubstituível para o aprofundamento do estudo das realidades da família para que enfrentem, com maiores possibilidades de êxito, as causas da desagregação familiar.

    Tais encontros se prestam a debates sérios sobre os problemas familiares; ao desenvolvimento do espírito crítico que prepare a família para a sua função de síntese das influências externas; à melhor compreensão dos pais em relação às funções essenciais da família num mundo em transformação, especialmente as funções afetivas e formadoras de pessoas; à coerência entre a fé que procuram transmitir aos filhos e os compromissos éticos que a fé supõe.

    52. Outras oportunidades de contato deverão ser incentivadas, através da realização de encontros de casais, cursos, ciclos de debates, com recursos a técnicas modernas de comunicação, que motivem a participação ativa das famílias num processo de crescimento e maturação com abertura crescente para a realidade social em que estão mergulhadas.

    53. Uma pastoral que se dirigisse somente às famílias consideradas cristãs, marcadas pelo vínculo sacramental, seria uma pastoral imperfeita, desvinculada da realidade.

    Grande número de famílias brasileiras não podem ser consideradas “famílias-cristãs”, no sentido estrito da expressão, mas grupos familiares nem sempre completos, aos quais faltam muitas vezes o vínculo jurídico ou sacramental. São grupos que preenchem os requisitos oficiais necessários, mas lhes falta o amor como base do inter-relacionamento pessoal: Todas essas famílias, quaisquer que sejam suas imperfeições e deficiências, deverão ser atingidas pela ação pastoral da Igreja, levando-se em conta carências, limitações e necessidades.

    54. Um dos recursos para que sejam atingidas todas as famílias será a presença atuante da Igreja e seus agentes de pastoral, nos meios de comunicação social, especialmente na TV, no rádio e no cinema.

    55. Por outro lado, devem ser incentivados e apoiados os institutos familiares e centros de orientação, dedicados ao aconselhamento conjugal e familiar, e a terapia psicológica, nos casos que o exijam.

    56. A complexidade da vida moderna e a diversidade de pressões internas e externas a que está sujeita a família, gerando tensões, torna cada vez mais necessária esta forma de apoìo.

    57. Ouanto aos recursos humanos, sempre escassos, cabe à Igreja e, em particular, aos seus movimentos familiares leigos, descobrir novas formas de engajamento apostólico, através da compreensão crescente, por todos os cristãos, de que a fé supõe o compromisso com a justiça e o amor ao próximo, que se consubstancia pelo serviço.

     

    CONCLUSÃO

    58. A Igreja, fiel a Cristo, defendendo a família, não luta por seus interesses, mas primeira e essencialmente pelo homem, e isto ela o faz em nome de Deus, que nos amou primeiro e nos deu a fé que nos ultrapassa. O remédio contra os males da sociedade não pode consistir em lhe subtrair o amparo e a proteção da Lei, mas em ensinar a todos e em estimular os fracos a terem a coragem de buscar sua própria dignidade.

    59. O próprio Deus, fazendo-se homem para realizar o desígnio de nossa salvação, quis nascer em uma família, pobre e humilde, e nela viver obscuramente a maior parte de sua vida. Foi numa família que Ele quis realizar sua experiência humana, participando plenamente de suas alegrias e sofrimentos e se identificando em tudo com nossa condição humana, menos no pecado. Foi a família que Ele quis consagrar como a mais pura expressão humana do mistério trinitário de três Pessoas em um só Deus, mistério da maìs perfeita distinção das pessoas na mais absoluta comunhão da natureza.

    60. É este mistério trinitário, em última análise, o protótipo da intercomunicação de amor que deve unir indissoluvelmente os que, no mundo, devem ser também a expressão vìva da íntima comunhão divina.

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