Teologia da Libertação: “Nem só de pão vive o homem”

As Cinzas da Teologia da Libertação

Parece que alguns esqueceram esta afirmação de Jesus Cristo: “Nem só de pão vive o homem” (Mateus 4). É urgente uma mudança de visão para reequilibrar a ação pastoral.

INTRODUÇÃO

Há alguns dias, me chegou a notícia da realização de mais um Congresso da Associação de Teólogos João XXIII, que é na verdade um evento de teólogos progressistas ou liberais onde o denominador comum é o ataque contra a hierarquia da Igreja. Nessa ocasião, a hierarquia foi acusada de estar desaparecida, em uma espécie de “inverno eclesial”. O evento comemorou também o 25º aniversário da dita Associação; entre seus fundadores e promotores encontram-se sacerdotes religiosos e diocesanos.

Em seus congressos, ao longo dos anos, participaram os principais promotores da Teologia da Libertação, inclusive alguns que representam as versões mais radicais dessa corrente teológica: o peruano Gustavo Gutiérrez, o bispo mexicano Samuel Ruiz, o catalão Pedro Casaldáliga, o ex-ministro sandinista Fernando Cardenal, J.L.Segundo etc. Da mesma forma, com idéias afins, não poderíamos deixar de mencionar outros promotores de maior ou menor relevo como Leonardo Boff (Brasil), Jon Sobrino (El Salvador), Hans Küng (Alemanha), Rosemary Radford Ruether (Estados Unidos), Julio de Santa Ana (Uruguai), Sergio Arce (Cuba), Maria-Pilar Aquino (México), Marcos Villamán (República Dominicana), Liliana Gallo (Colômbia), Eduardo de la Lerma (Argentina), Sixto García (Estados Unidos), Enrique Dussel (Suiça), Fernando Torres (Colômbia) Juan José Tamayo e J.M.Vidal (Espanha). Outros semelhantes são: Tissa Balasuriya, Marcelo Barros, Teófilo Caebestreno, Oscar Campana, Víctor Codina, José Comblin, Lee Cormie, Eduardo de la Serna, José Estermann, Benedito Ferraro, Eduardo Frades, Luis Arturo Garcia, Ivone Gevara, Diego Irarrazabal, João Batista, María e José Ignacio Vigil, Carlos Mesters, Pablo Richard, Luis Rivera, Paulo Suess, Luiz Carlos Susin, Faustino Teixeira, José María Vigil etc.

É, pois, aproveitando o 25º Aniversário de um dos meios de difusão da chamada Teologia da Libertação que compartilho as seguintes reflexões:

1. DA PANACÉIA À DECADÊNCIA. GRAÇAS A DEUS!

Creio que ninguém pode duvidar que houve contribuições positivas desta corrente religiosa para a Igreja. De fato, o Papa João Paulo II chegou a dizer para os bispos do Brasil que ela “era necessária”. Também não se pode negar o seu influxo no campo teológico e pastoral a nível mundial. No entanto, ao mesmo tempo, não podemos esquecer o que foi assinalado pela Congregação para a Doutrina da Fé em 1984, então presidida pelo card. Joseph Ratzinger, atual Papa Bento XVI, que afirmava:

“A presente instrução possui um fim mais preciso e limitado: atrair a atenção dos pastores, teólogos e todos os fiéis sobre os desvios e riscos de desvio, ruinosos para a fé e para a vida cristã, que implicam certas formas da Teologia da Libertação que recorrem, de modo insuficientemente crítico, a conceitos tomados de diversas correntes do pensamento marxista.

Esta advertência de maneira nenhuma deve ser interpretada como uma desautorização de todos aqueles que querem responder generosamente e com autêntico espírito evangélico à ‘opção preferencial pelos pobres’. De maneira nenhuma poderá servir de pretexto para aqueles que se entrincheram numa atitude de neutralidade e de indiferença perante os trágicos e urgentes problemas da miséria e da injustiça. Pelo contrário, obedece à certeza de que os graves desvios ideológicos que assinala conduzem inevitavelmente para trair a causa dos pobres.

Hoje, mais do que nunca, é necessário que a fé de numerosos cristãos seja iluminada e que estes estejam decididos a viver integralmente a vida cristã, comprometendo-se na luta pela justiça, liberdade e dignidade humana, por amor aos seus irmãos deserdados, oprimidos ou perseguidos. Mais do que nunca, a Igreja se propõe a condenar os abusos, as injustiças e os ataques à liberdade, onde quer que se registrem e de onde provierem, e a lutar, com seus próprios meios, pela defesa e promoção dos direitos do homem, especialmente na pessoa dos pobres” (Libertatis Nuntius, Instrução sobre alguns Aspectos da Teologia da Libertação).

Deste modo, o então Cardeal e atual Papa Bento XVI sintetizava a razão do documento, pois unido aos elementos positivos, já nessa época se manifestavam vários elementos contrários à fé cristã em algumas correntes dessa teologia.

Não há dúvida de que o influxo da Teologia da Libertação se deixou sentir no positivo e no negativo em muitas esferas eclesiais. Graças a Deus, os influxos negativos dessa corrente, em sua versão mais radical, estão se desvanecendo em razão das mudanças sócio-políticas ocorridas no mundo e dos diferentes mecanismos eclesiais que o magistério da Igreja adotou.

Alguns mecanismos eclesiais que ajudaram a diminuir o seu influxo negativo foram:

  • A nomeação de bispos que estão em maior sintonia com o Magistério da Igreja e em comunhão com o Papa;
  • A publicação de documentos orientadores sobre o tema, como a “Instrução sobre alguns Aspectos da Teologia da Libertação” e um outro chamado “Liberdade Cristã e Libertação”;
  • A “Apostolos Suos”, de 1998, sobre “a natureza teológica e jurídica das Conferências Episcopais” para precisar seu papel e evitar maiores desvios;
  • A “Ex Corde Ecclesiae”, de 1990, sobre as universidades e institutos de formação católica, para reforçar sua identidade ou catolicidade unidas ao Magistério;
  • A “Instrução sobre a Vocação Eclesial do Teólogo”, de 1990, para demonstrar sua complementariedade ao permanecer unido ao Magistério eclesiástico;
  • O “Catecismo da Igreja Católica”, que apresenta o que devemos crer, viver e celebrar de maneira orgânica e sistemática;
  • Sobretudo, a “Dominus Iesus”, de 2000, que esclarece os elementos cristãos essenciais para se evitar o relativismo e o subjetivismo teológico e pastoral.
  • A notificação direta, de 2006, “sobre os Erros nas Obras do pe. Jon Sobrino SJ”, o qual é um dos maiores promotores da Teologia da Libertação;
  • Por fim, o documento “Respostas a algumas Questões acerca de certos Aspectos sobre a Doutrina da Igreja”, de julho de 2007.

Além disso, os sínodos, consistórios e visitas “ad limina” auxiliaram a reforçar a identidade e fidelidade ao Magistério da Igreja, tão atacado pelos “teólogos liberais” e sua teologia em “chave libertadora”. Antes vista como a grande solução (panacéia), passou à decadência e agora está quase que em estado vegetativo.

Teólogos renomados deixaram sua cátedra uma vez que sua “doutrina” ou “versão” do Evangelho na verdade não era compatível com a fé da Igreja. Graças a Deus, vemos reduzir cada vez mais seus promotores, revistas, ideólogos, congressos, associações, seguidores, bispos, lemas, teólogos etc.

Os elementos negativos de sua versão mais radical estão desaparecendo do mapa eclesial por “extinção” e não “poucas dores de cabeça”. Ao mesmo tempo, seus elementos positivos vêm sendo integrados, ainda que não da forma como deveria ocorrer.

Como disse muito bem o sacerdote Miguel Revilla acerca do 25º aniversário [da Associação]: “Que bom que seja celebrado entre eles e se felicitem mutuamente, deixando em paz os milhões de católicos que seguem o ensino do sucessor de Pedro e não o magistério progressista [da Teologia da Libertação]”. Deus respondeu à oração de um profeta de nossos tempos, o pe. Flaviano Amatulli, que denunciando os abusos de alguns pastores e líderes “libertacionistas” disse: “Senhor: liberta-nos dos libertacionistas!”. Graças a Deus, as ações anteriormente assinaladas e outras mais da parte daqueles que se mantiveram fiéis ao Magistério da Igreja reduziram os danos e seus promotores têm desaparecido da esfera eclesial. Porém, ainda restam algumas cinzas…

2. ONDE HOUVE FOGO, RESTAM CINZAS…

Esta é a razão principal deste artigo. Se onde houve fogo restam cinzas, é inevitável que onde houve um grande incêndio restem também uma quantidade ainda maior de cinzas.

E esse é o grande problema eclesial de nossos dias!

Mas neste caso devemos dizer também: “Onde houve gelo, o frio tende a cair”, parafraseando uma “teóloga” da libertação que no mencionado Congresso disse que havia um “inverno eclesial”. É indubitável que há lugares e ambientes onde isso ocorre, entretanto isso se dá precisamente – como consequências secundárias – pelo fato de muitos seminários, institutos e universidades católicas terem adotado, durante muito tempo, essa corrente teológica. Assim, ainda que esta não esteja mais presente fisicamente, restaram suas “cinzas” ou o “gelo”.

Entre os grandes problemas e desafios enfrentados pela Igreja atualmente, já não se enumeram os “teólogos da libertação ou liberais”, nem a corrente teológica por eles promovida. Não! O problema grave, de proporções internacionais, são as “cinzas” ou seqüelas que deixaram dentro de amplos setores eclesiais e que muitos não estão conseguindo perceber. Como missionário em diversos países de todo o continente [americano] nestes quase 18 anos, pudemos analisar o desenvolvimento e impacto da “Teologia da Libertação” e constatamos tristemente que as “cinzas” são maiores e mais graves do que alguns imaginam. E se queremos enfrentar [esses problemas] com visão cristã neste início de milênio, precisamos apontar [essas cinzas] e colocá-las de lado para que a luz de Cristo possa brilhar com plenitude.

3. PRIMEIRA CINZA: O EXCESSIVO HORIZONTALISMO DA FÉ

A partir do Concílio Vaticano II, novos ventos sopraram na Igreja, servindo para impulsioná-la a viver sua fé em conformidade com os tempos atuais. No entanto, ao mesmo tempo, surgiram grandes desequilíbrios em razão de uma má interpretação do mesmo, ou melhor, pela polarização de alguns aspectos teológico-pastorais. Entre estes, cabe destacar a sobrevalorização da dimensão horizontal da fé, polarizado pela Teologia da Libertação, onde a opção pelos pobres se converteu no eixo central do ser e do dever teológico-pastoral.

Quase imperceptivelmente, sem nos darmos conta, o valor positivo da projeção social do Evangelho ou promoção humana foi se convertendo no “eixo” sobre o qual gira a pastoral. A Teologia da Libertação, com uma “opção pelos pobres” baseada na luta de classes e em um reducionismo da salvação em favor da libertação, foi desaparecendo pelas causas já apontadas. Porém, a “cinza” ficou manifesta como se fosse algo positivo transformando-se em um excessivo “horizontalismo da fé”, atualmente muito mais perigoso e extenso em amplos setores eclesiais.

Já o papa João Paulo II e alguns bispos apontaram no documento “Igreja na América”, fruto do Sínodo [da América]:

“De outro lado, como assinalaram alguns Padres sinodais, deve-se perguntar se uma pastoral orientada de modo quase exclusivo às necessidades materiais dos destinatários não esteja defraundando a fome de Deus que têm esses povos, deixando-os assim em uma situação vunerável diante de qualquer oferta supostamente espiritual. Por isso, ‘é indispensável que todos tenham contato com Cristo mediante o anúncio querigmático gozoso e transformador, especialmente através da pregação na liturgia'” (nº 73, Exortação Apostólica Ecclesia in America).

É triste, mas é certo. Se uma meia-verdade pode produzir mais dano que uma mentira, um desequilíbrio pastoral permanente pode ser mais danoso que uma heresia, a qual é mais simples de ser detectada. Uma mentalidade simplista e ingênua poderia pensar: “Que mal poderia haver em se fazer uma opção pelos pobres, os órfãos, os imigrantes, os analfabetos, os oprimidos, os indígenas…? Que mal poderia surgir quando a pastoral é centrada em hospitais para enfermos, asilos para idosos, centros de atendimento para aidéticos, casas para mães-solteiras, entidades de assessoria legal para imigrantes, restaurantes para os pobres, escolas de alfabetização, escolas-oficinas de costura e carpintaria, fundações de assistência social, escolas católicas, órgãos de defesa dos direitos humanos, abrigos para mulheres mal-tratadas, dispensários médicos em zonas marginalizadas?

O que há de mal? Quase nada. Mas se formos ler de novo e com atenção, falta a razão principal de todo o anterior e o que distingue a Igreja de ser uma mera organização de promoção humana. Falta JESUS CRISTO! Todas as linhas de ação mencionadas acima podem ser adotadas também por um ateu, um muçulmano ou um seguidor da Nova Era. Um humanismo com verniz de Cristianismo.

Nada mal, porém…
Nada mal, se fôssemos uma organização de assistência pública.
Nada mal, se fôssemos um órgão governamental de promoção social.
Nada mal, se fôssemos um centro autônomo de prevenção ao câncer.
Nada mal, se fôssemos uma divisão da Cruz Vermelha.
Nada mal, se fôssemos uma organização não-lucrativa de assessoria legal.
Nada mal, se fôssemos uma fundação para o desenvolvimento social.
Nada mal, se fôssemos um instituto de liderança sócio-política.
Nada mal, se fôssemos apenas uma Organização Não-Governamental…

O problema não está em fazer o que foi apontado, mas que a realidade em muitas dioceses e paróquias de todo o continente é que existe um desequilíbrio pastoral, que se preocupa em cobrir as necessidades materiais, criando um vazio espiritual que está sendo preenchido pelas seitas e pela Nova Era. Como disse certo teólogo americano: “Em diversos lugares da América, a Igreja Católica fez opção pelos pobres… E os pobres fizeram opção pelos pentecostais”. Óbvio! O pobre e necessitado encontra refúgio para suas necessidades materiais na Igreja Católica, mas não encontra especialistas na mesma proporção para as suas necessidades espirituais; terminam, assim, procurando uma seita evangélica ou até mesmo um bruxo ou astrólogo para curar os seus males [espirituais].

Muitas “Martas” preocupadas com o material e poucas “Marias” aos pés do Mestre. Não se trata de acabar ou diminuir o primeiro, mas aumentar o segundo dada a grave urgência. A “primeira cinza” da Teologia da Libertação que deve ser varrida é “uma pastoral orientada de modo quase exclusivo para as necessidades materiais dos destinatários, que acaba por defraudar a fome de Deus que esses povos têm”, tal como indicou o documento “Igreja na América”.

Temos defraudado o homem de hoje, pois ao vermos tão de perto o sofrimento humano, desfocamos o valor do divino:

  • Avançamos na projeção social da fé, mas perdemos na dimensão pessoal do Evangelho;
  • Ganhamos na promoção humana, mas perdemos na promoção divina;
  • Redescobrimos o valor do homem, mas esquecemos da supremacia de Deus;
  • Melhoramos na ordem temporal, mas pioramos na ordem espiritual;
  • Supervisionamos a ortopráxis, mas nos desinteressamos pela ortodoxia;
  • Defendemos a vida humana, mas deixamos de defender a fé divina;
  • Enriquecemos a prática da caridade, mas empobrecemos a ação pastoral;
  • Falamos de libertação, mas silenciamos a salvação;
  • Especializamo-nos nas necessidades materiais, mas viramos novatos nas necessidades espirituais;
  • Valorizamos o corpo, mas descuidamos a alma;
  • Pusemos os pés na terra, sim; mas nosso coração deixou de estar no céu.

Se você duvida disso ou pensa em duvidar, leia antes as notícias diárias da Agência Fides, fundada “para dar a conhecer as obras das missões”. Acesse durante 5 dias consecutivos as notícias divulgadas ali e em outros meios eclesiais e perceba como 4 entre 7 notícias dizem respeito a obras de promoção humana. Até os meios católicos estão vendo mais “notícia” nas questões sociais do que nas evangelizadoras.

Se faltam vocações e missionários ou se as congregações religiosas estão diminuindo, nem se fala. Sejamos honestos e deixemos de culpar o materialismo, o secularismo ou o hedonismo. O problema não vem de fora, mas de dentro. Nos setores onde caíram as “cinzas” da Teologia da Libertação vivida como uma sobrevalorização da promoção humana, ali é que se paga  as conseqüências: algumas congregações de religiosos e religiosas, algumas dioceses, alguns seminários, algumas universidades “católicas” e alguns centros de formação. A infidelidade a Deus demonstrada por um desinteresse ao eminentemente espiritual tem um [alto] preço a ser pago.

Irmão sacerdote,
Irmã religiosa,
Irmão bispo,

Devemos pedir perdão ao homem atual por desfraudá-lo do bem supremo: o próprio Deus. Porém, sobretudo, pedir perdão a Deus, pois a medida do homem não se encontra no próprio homem, mas na altura de Jesus Cristo.

Não podemos calar a verdade sobre o homem, a verdade sobre a Igreja e a verdade sobre Deus. É por isso que as pedras (=seitas e Nova Era) estão gritando (cf. Lucas 19,40).

Se na sua diocese, instituto religioso ou paróquia isao não acontece, não se preocupe. Como dizemos no México: “Te digo, João, para que me entendas, Pedro”. O horizontalismo da fé é uma “cinza” da Teologia da Libertação que deve ser removida com urgência. Tal como o convite feito há alguns dias atrás por Sua Santidade Bento XVI: “…não apenas para os jovens, mas também para as comunidades e os próprios pastores de ‘tomar cada vez mais consciência de um dado fundamental para a evangelização: onde Deus não ocupa o primeiro lugar, ali onde não é reconhecido e adorado como o Bem supremo, a dignidade do homem se põe em perigo'”.

4. SEGUNDA CINZA: A PERDA DO SAGRADO

Como conseqüência lógica da “cinza” anterior, brota a segunda como efeito inevitável. A última página escrita pelos “teólogos liberais” se converte na cinza onde a dimensão vertical na teologia e na pastoral brilha por sua ausência.

É óbvio que ao desequilibrarmos a dimensão horizontal da fé [supervalorizando-a] acabamos infravalorizando o plano vertical da mesma. Por isso, hoje em dia é muito comum nas “homilias” não se falar do céu, da salvação, do purgatório, da conversão pessoal, do juízo, do pecado mortal, da imoralidade, do valor da Bíblia, dos sacrilégios, do adultério, da castidade, da vida eterna e muito menos do inferno e de Satanás. Novíssimos, postrimerias, realidades últimas ou escatologia – não importa o nome – isso e tudo o que cheira a “espiritual” está em último lugar na escala dos temas a ser pregados na homilia dominical; são esquecidos ou silenciados por não poucos sacerdotes, bispos e, sobretudo, pelos teólogos.

Os seguidores das cinzas da Teologia da Libertação radical chamam:

  • “Fanático religioso” àquele que crê nos exorcismos;
  • “Antiquado” ao sacerdote que passa horas no confessionário;
  • “Espiritualistas” aos que promovem cursos para aprender a orar;
  • “Fundamentalistas” àqueles que promovem o uso da Bíblia na pastoral;
  • “Conservadores” aos que estimam em alto grau o sentido sagrado e sacrificial da Missa;
  • “Retardados” àqueles que falam de Satanás como um ser espiritual;
  • “Pré-conciliares” aos que decidem defender a fé;
  • “Ignorante” aquele que fala da escatologia transcendente da Escritura.

Todavia, no ano passado, durante um congresso organizado pela Conferência dos Religiosos e Religiosas do Peru (CONFER), ramo local da Conferência Latino-Americana dos Religiosos e Religiosas (CLAR), foi lançado em Lima um duro ataque contra os novos carismas, espiritualidades e movimentos.

Em muitas dioceses, onde há líderes com essa forma de pensamento, são os movimentos eclesiais que sofrem os ataques, perseguições e obstáculos para o seu apostolado. Para eles, os piores são os cursilhistas, a Renovação Carismática, o MVC, os neo-catecúmenos, a defesa da fé, as oficinas de oração… Existem centenas de testemunhos e abusos conhecidos e vividos pessoalmente por sacerdotes ou líderes cuja única posição válida é a da Teologia da Libertação. Falam de “libertação” mas acabam sendo “opressores” no mesmo estilo do presidente Hugo Chavez.

Eis aí a grande “cinza” deixada pela Teologia da Libertação em seus 25 anos de vida. Imagine se tivesse durado 40 ou 50 anos… Sejamos honestos e sinceros; se queremos avançar, é urgente recuperar o valor inigualável do celestial. Ainda que a alguns isso lhes pareça “angelismo”, pouco importa a nós e pouco importa ao Papa. Importa a ti? Você deve decidir entre “agradar aos homens ou agradar a Deus” (Atos 5,29).

Com razão, ganha força a seguinte frase do agora Papa Bento XVI:

“Ter uma fé clara, baseada no credo da Igreja, costuma a ser rotulado como fundamentalismo”. Isso foi dito pelo Card. Ratzinger poucas horas antes de ser eleito sucessor de São Pedro.

Por que devemos nos queixar da falta de compromisso do leigo, da escassez de vocações sacerdotais, do materialismo reinante, da redução de membros da vida religiosa e da pouca atração da vida sacerdotal se naquilo que deveríamos ser especialistas – no sagrado ou religioso – o temos eliminado, expulsando-o como se fosse um estrangeiro indesejado? Nós mesmos, [sacerdotes], em muitos ambientes, lugares e setores eclesiais, temos visto o claramente sagrado como um obstáculo a mais.

Igualmente, há algum tempo atrás, disse o então Card. Ratzinger: “Esta Europa, cristã de nome, é há 400 anos, a cunha de um novo paganismo. A imagem da Igreja na era moderna está caracterizada fundamentalmente no fato de que se converteu em uma igreja de pagãos. Já não se trata, como outrora, de pagãos convertidos ao Cristianismo, mas de uma igreja de pagãos que se intitulam todavia cristãos, porém que na realidade se converteram em pagãos”. O mesmo podemos dizer da América e nada mais se pode esperar quando o sagrado é passado para o segundo, terceiro ou último plano. Como diria João Paulo II: “Se não há lugar para Cristo, não há lugar para o homem”.

Tampouco sobre este aspecto podemos deixar de mencionar Paulo VI quando disse:

“Não há verdadeira evangelização enquanto não se anuncia o nome, a doutrina, a vida, as promessas, o reino, o mistério de Jesus de Nazaré, Filho de Deus. A história da Igreja a partir do discurso de Pedro na manhã de Pentecostes, se mistura e se confunde com a história deste anúncio. Em cada nova etapa da história humana, a Igreja, impulsionada continuamente pelo desejo de evangelizar, não tem mais que uma preocupação: a quem enviar para anunciar o mistério de Jesus? em qual linguagem anunciar este mistério? como expandir e chegar a todos aqueles que devem escutar? Este anúncio – querigma, pregação ou catequese – adquire uma posição tão importante na evangelização que, com freqüência, é na realidade um sinônimo. No entanto, não deixa de ser um aspecto” (Evangelii Nuntiandi nº 22).

Esquecer o importante para atender o urgente não é um bom princípio pastoral. É necessário voltar ao Deus que dá vida e sentido à missão da Igreja e a toda autêntica teologia.

“A finalidade da missão é uma humanidade transformada em uma glorificação viva de Deus, o culto verdadeiro que Deus espera: este é o sentido mais profundo da catolicidade, uma catolicidade que já nos foi doada e para a qual, no entanto, devemos avançar sempre de novo. Catolicidade não apenas expressa uma dimensão horizontal, a reunião de muitas pessoas na unidade; inclui também uma dimensão vertical: somente dirigindo nosso olhar a Deus, somente abrindo-nos a Ele, podemos chegar a ser realmente um” (Bento XVI, Homilia na Festividade de São Pedro e São Paulo, 29.05.2005).

Não seria por esta “falta” de olhar a Deus que isto ocorre: a pouca importância em visitar o Santíssimo; a falta de templos expiatórios onde sempre esteja exposto o Jesus sacramentado; o desaparecimento de muitos lugares de adoração noturna por falta de apoio do sacerdote e desinteresse das pessoas; a redução das vocações à vida religiosa; a ausência da “hora santa” em muitas paróquias ou a pouca assistência à mesma e a irreverência na Sagrada Eucaristia mediante os inúmeros abusos litúrgicos?

Como disse um irmão em Cristo: “Reconheçamos quão mal temos interpretado a criatividade e a participação que exige o nosso tempo. A Igreja de Nicéia, a Igreja de Constantinopla, a Igrela de Latrão, a Igreja de Trento e a Igreja do Concílio Vaticano II são as mesmas. A Igreja Católica, Apostólica e Romana não nasceu há meros 40 anos”. A Igreja de Cristo, como sua esposa (Efésios 5,25), nasceu de sua crucificação e não pode ser outra Igreja.

Irmão sacerdote,
Irmão bispo,

Perder o valor do sagrado é forçar as pessoas buscarem nas “amantes espirituais” (=seitas) o que não lhes manifestamos sobre a presença divina e salvadora de Jesus Cristo. O povo não está apenas sedento de paz e justiça; o povo está sobretudo sedento de Deus e o vazio deixado pelo materialismo, o consumismo e o capitalismo… Ou reajustamos a dimensão vertical da nossa fé, como diz o Papa, ou aumentarão as seitas e a Nova Era.

Recuperar o valor do sagrado e sobretudo o imenso valor da Missa é “unir o céu e a terra” (Ecclesia de Eucaristia nº 8).

Será esta perda ou diminuição do sagrado manifestado em sintomas como: o fato de que a grande maioria dos movimentos que têm surgido nas últimas décadas não foram fundados por sacerdotes nem religiosos; ou o fato de que os abusos na Eucaristia, assinalados no documento sobre as normas litúrgicas, manifestam esta perda do sagrado dentro do sacratismo.

Às vezes, na pastoral, se critica que muitas paróquias desenvolvem sua pastoral de forma “sacramentalista”, isto é, centradas no cultual ou relacionada com os sacramentos. No entanto, cremos que o problema é ainda maior, pois já nem sequer “nisso” somos especialistas, já que a queixa constante de muitos leigos é o pouco apreço ou desinteresse pelas “coisas sagradas” da parte de muitos sacerdotes. Talvez no caso do padre Pio, com sua incrível força de atração de milhares ou milhões para a sua obra, não é por seus “estigmas”, mas porque nele viram refletido o ideal de um sacerdote que viveu em plenitude seu sacerdócio, como deveria fazer qualquer outro sacerdote.

E em honra à verdade e em um ambiente de sã autocrítica, falemos a verdade: Não há crise de vocações sacerdotais. A partir da perspectiva que estamos abordando, trata-se melhor de uma crise de fé em muitos pastores, manifestada por uma sobrevalorização da dimensão horizontal da fé e uma queda da verticalidade da mesma. São “cinzas” da Teologia da Libertação que muitos ainda seguem sem perceber e já não podemos nos calar sob pena de sofrer outras conseqüências.

Uma prova simples e 100% infalível de que não existe uma crise de vocações é o fato indiscutível de que os institutos religiosos, seminários, dioceses e movimentos que reequilibraram a dupla dimensão da fé não sofrem de falta de vocações. Por que os Legionários de Cristo, Lumen Dei, Apóstolos da Palavra, Servidores da Palavra, Escravos da Eucaristia, Instituto do Verbo Encarnado, Servas dos Sagrados Corações, Opus Dei e inclusive o Neo-Catecumenato têm vocações sacerdotais nos mesmos lugares onde os outros não as tem? A resposta é muito simples para aquele que deseja a verdade: o fator comum entre eles é que a todo “sagrado” estão lhe dando seu justo valor na forma de viver, crer, celebrar e defender a fé. Reequilibraram a dimensão vertical e horizontal da fé. Ao contrário, há outros que não o fazem e pagam as conseqüências. Todos os acima mencionados e outros ainda desenvolvem uma grande obra de promoção humana, porém, removeram também as “cinzas” e manejam a dupla dimensão simultaneamente.

Não se pode querer ter vocações sacerdotais e religiosas sem se manifestar com clareza o divino da nossa fé. Não se pode colher onde não foi semeado. Evangelizar e sacralizar o sagrado, ainda que pareça ser redundante, é uma prioridade.

Temos assim o que disse Nosso Senhor Jesus Cristo: “Aquele que pode, que entenda”; ou como dizemos no México: “Sapateiro, aos teus sapatos”.
5. TERCEIRA CINZA: OS LIBERAIS EM VIAS DE EXTINÇÃO

No início do artigo, mencionamos que um dado irreversível é o desaparecimento “por extinção” dos teólogos da libertação, pois não possuindo a semente da vida, não há quem queira seguir os seus passos. Embora eles aleguem que [estão desaparecendo] pela “perseguição”, na verdade [desaparecem] pela “extinção”, pois não há quem dê um passo a frente por algo que venha desaparecer.

No entanto, se queremos ser mais precisos e realistas, não devemos perder de vista que ainda existem alguns de seus seguidores em quase todo o mundo. Dois ou três em cada diocese já não declaram abertamente sua filiação à Teologia da Libertação para não prejudicar seus interesses pessoais. O grave, aliás, não é que sejam muitos. Não! O grave é que se encontram em postos chaves nas dioceses, seminários, institutos de teologia etc., e a partir daí, nem fazem nem deixam fazer, filtrando sutilmente sua ideologia.

Calar esta verdade não é típico de cristãos e deixá-la passar sem fazer nada é uma traição ao Evangelho. As características comuns dessas pessoas se manifestam de diversas maneiras e graus, porém geralmente são estas:

  • Preocupam-se mais com a linguagem inclusiva do que pela sagrada Eucaristia.
  • Atacam constantemente a hierarquia da Igreja.
  • Falam de ecumenismo como se fosse indiferentismo.
  • Se alguém fala contra a Teologia da Libertação, então é pior; a pessoa tem que sair dali pois acaba sendo vista como alguém pior que um herege.
  • Se alguém não se alinha [com a Teologia da Libertação] é rotulada como retrógrado pré-conciliar.
  • Os exemplos a serem imitados são Boff, Gutierrez, Sobrino, Casaldáliga… A pessoa pode falar mal do Papa, mas nunca pode falar mal destes outros, pois farão o impossível para expulsá-la da sua paróquia ou diocese.
  • Formam círculos de isolamento entre seus companheiros afins. Isto lhes serve para proteção, mas também para atacar e não deixar entrar em sua esfera nenhum “papista”, qualificado desta maneira aqueles que estão em comunhão com o Santo Padre.
  • Atacam pelas costas, pois perderam a capacidade de dialogar.
  • Chamam todo grupo de CEB’s (=Comunidades Eclesiais de Base), quer uma comunidade de evangelização, quer um grupo de oração ou círculo bíblico… Fazem isto porque como já quase não existem nem crescem, dão essa aparência ao relatar que em sua diocese existem CEB’s.
  • “Desmistificam” – segundo eles – a Palavra de Deus.
  • Sentem-se defraudados pela eleição do Cardeal Ratzinger como novo Pontífice.
  • Pensam nos pobres, mas vivem como ricos.
  • Têm o escritório como lugar favorito para o apostolado.
  • Pensam pelos pobres ao invés de deixá-los pensar por si mesmos.
  • A falta da vivência da fé provoca nestes uma asfixia espiritual, pois ninguém dá o que não tem.
  • Para eles, Ratzinger era um “atraso” e a “Dominus Iesus” uma contradição; agora alguns não sabem o que fazer ou se dedicam a outras tarefas.
  • Sua teologia moral é questão de atitudes e o aborto e a homossexualidade coisas sem importância.
  • Sua teologia tem como plataforma um disfarçada análise marxista da realidade, onde a “luta de classes” é o principal.
  • Nos “possuídos” apenas vêem uma patologia psicológica; nos “estigmatizados”, uma projeção psicossomática; e nos “místicos”, indivíduos com sérios transtornos mentais.
  • A Bíblia para eles é secundária e deve ser lida sob a chave libertacionista. Sua interpretação tende a considerar quase tudo como simbólico e o Magistério da Igreja é deixado de lado, pois dizem que não é infalível e por isso mesmo não deve ser obedecido.
  • Nunca falam de Satanás e exorcismo; “Deus os livre disso!”.
  • Amam a “libertação”, mas desconhecem a doutrina social da Igreja.
  • Já não afirmam serem aderentes à Teologia da Libertação, mas seus corações e atos dependem dela.

Agora imagine estes irmãos, com algumas destas características, que continuam sendo reitores de seminários, diretores de institutos de teologia, superioras de comunidades religiosas, coordenadores da pastoral vocacional, professores de universidades católicas, vigários de pastoral, associados da pastoral juvenil, diretores espirituais em seminários, coordenadores ou secretários em órgãos diocesanos… Por isso estamos assim…

Oito exemplos disto:

A. Há poucos anos, teólogos liberais da Associação de “Teólogos” João XXIII redigiram uma carta em que pediam a renúncia do Papa João Paulo II. Eles mesmos atacam constantemente a hierarquia. O problema, todavia, é que muitos deles são professores em universidades católicas, em faculdades de teologia e em seminários, onde se “forma” ou “deforma” os sacerdotes desta época em que vivemos. Não é necessário pensar muito para se imaginar as conseqüências.

B. Também há alguns anos, um superior geral de uma conhecida ordem religiosa foi entrevistado por uma agência “católica” de notícias e disse: “A HERESIA atual é o abandono dos pobres, a injustiça etc.”. Ou seja, segundo ele, a missão eclesial é não deixar que haja pobres no mundo. Se assim pensa o superior geral, o que não pensarão muitos dos religiosos dessa Congregação espalhados pelo mundo e que “formam” os agentes de pastoral das paróquias…

C. Teólogos da libertação se reuniram na Universidade de Notre Dame para “refletir” sobre o fenômeno proselitista das seitas e seu crescimento. Sua conclusão foi: para as seitas não crescerem, dever-se-ia permitir a ordenação de mulheres sacerdotisas, admitir sacerdotes casados e considerar normal o homossexualismo praticado por alguns sacerdotes. Com essa espécie de “catedráticos” e “teólogos”, não fazem falta os inimigos!

D. Pouquíssimo valorizado é o sagrado em alguns setores eclesiais. Há alguns dias saiu a notícia de um bispo cujo “companheiro” homossexual o denunciou por alguns problemas ocorridos entre eles. O surpreendente neste caso não foi esse fato em si, mas alguns católicos que com toda a tranqüilidade afirmaram que isso fazia parte de sua vida privada e o que importava é que o bispo estava sempre comprometido com “as causas dos pobres”. Pelo visto estes irmãos em Cristo já não consideravam mais o sagrado, como também a moral. O importante para eles era “a Igreja dos pobres”, a “opção pelos pobres”, as “causas dos pobres”, o “pecado social”, a “injustiça social”… O resto podia ser desconsiderado.

E. Os livros escritos por teólogos desta linha, com seus concebidos erros e ataques ao Magistério da Igreja, são normalmente vendidos nas livrarias católicas de muitos países. Autores como Leonardo Boff, Clodóvis Boff, Gustavo Gutierrez…

F. Há alguns dias, um bispo austríaco renunciou, pois em sua diocese havia muitas queixas acerca de uma série de abusos que estavam ocorrendo na liturgia. O Vaticano anunciou que o bispo de Linz, mons. Maximilian Aichern, de 72 anos, renunciou a diocese que governava desde 1982. Sua renúncia foi aceita de acordo com a norma do cânon 40 do Código de Direito Canônico, que justifica esta renúncia em razão de “enfermidade ou outra razão grave”. A renúncia geralmente é feita após os 75 anos. De fato, há alguns dias um amigo nos informou sobre um certo professor de religião que ensinava e defendia em um colégio católico a homossexualidade como algo normal no Cristianismo.

G. Em diversos lugares do continente, existem institutos de teologia ligados às dioceses, onde há professores que apóiam esta corrente teológica embora os alunos tentem se fortalecer na fé, para lutar por sustentá-la apesar de seus mestres atacarem o Papa e o Magistério da Igreja. Às vezes, os próprios sacerdotes preferem não enviar os leigos comprometidos de sua paróquia. Agentes de pastoral “aprendem” erros como: o Magistério da Igreja não é importante; qualquer religião vale a mesma coisa; o importante não é evangelizar, mas erradicar a pobreza; [a Igreja] deve se atualizar e ordenar mulheres sacerdotisas; o homossexualismo não é um mal, mas uma opção de vida; a fé não precisa ser defendida, mas sim os pobres; a Bíblia serve apenas para a fé subjetiva; a Igreja Católica está repleta de erros…

H. Poucos meses antes da Conferência Geral dos Bispos em Aparecida (Brasil), um sacerdote que atua como comunicador em um escritório do Vaticano para a América Latina disse: “Da Igreja Católica, comunidade das comunidades, se espera excelência e exemplo em cada ação que humaniza a sociedade secularizada…. Não se trata de encarar a idéia de que nossa Mensagem de Salvação deve ser buscada pelos demais, já que é certo que a nossa missão é ‘ir evangelizar todos os rincões da terra’; este mandato divino se traduz em ser discípulos que utilizam os instrumentos que a Divina Providência nos colocou à disposição, assim como faria o Apóstolo das Gentes, Paulo de Tarso”. Assim, segundo este sacerdote e comunicador, o evangelizar pode ser “traduzido” em humanizar a sociedade e o porém é que muitos pensam como ele. Por isso estamos assim. Não há dúvida de que todos os sacerdotes, bispos, religiosos, professores de seminários e líderes leigos devem dar uma boa lida e estudada na carta magna sobre a evangelização: a “Evangelii Nuntuandi” (Para Anunciar o Evangelho), do Papa Paulo VI. Isto porque muitos conceitos básicos e fundamentais estão sendo deformados com graves conseqüências.

Por tudo isso, muitos sacerdotes preferem não enviar os fiéis de sua paróquia para esses “institutos católicos”. Óbvio, pois ao invés de formar… “deformam” a fé cristã. Não se esqueça, todavia, que restam alguns “liberais” em diversos graus por aí. Contudo, os que ainda existem continuarão promovendo um grande dano à Igreja. Oremos para que se convertam à plena comunhão com a Igreja, unindo-se ao Magistério eclesial do Papa, ou seja, Bento XVI. Ao mesmo tempo, é urgente que os bispos tomem conhecimento deste assunto, pois a eles foi confiado o rebanho, para conduzí-lo ao redil de Jesus Cristo.

6. AS SEITAS E A NOVA ERA: CONTAS A PAGAR MOTIVADAS PELO HORIZONTALISMO DA FÉ

Se para cada tese existe uma antítese; para cada ação uma reação; e para cada força centrífuga existe outra igual porém em sentido contrário chamada centrípeda, então os desequilíbrios na teologia e na pastoral produzidos pelas cinzas da Teologia da Libertação radical não fizeram por esperar.

Em relação ao avanço das seitas religiosas e da Nova Era, algo que precisamos sublinhar e que já está caindo em domínio público é o fato de que os vazios pastorais que possuímos estão sendo preenchidos pelas seitas fundamentalistas e pelo neopaganismo da Nova Era. São as contas que estão sendo cobradas de nós diariamente. Um antropocentrismo disfarçado de Cristianismo e uma perda do sagrado que esquece de colocar Deus no centro da fé não pode ficar sem pagar.

Muitos líderes católicos em todos os níveis têm se dedicado completamente à promoção humana e invertem os melhores recursos humanos e ecônomicos no seguinte:

  • ajuda ao indigente;
  • alimentação para os pobres;
  • criação de oficinas de formação técnica;
  • organização de cursos de alfabetização;
  • criação de organismos diocesanos de assessoria aos imigrantes;
  • apoio aos asilos de idosos;
  • criação de instituições católicas de apoio jurídico;
  • edificação de colégios católicos;
  • criação de centros de apoio às mães solteiras…

Por acaso isto é ruim? Logicamente que não!

Pelo contrário, é excelente e deve aumentar muito mais. O problema grave é que na área pastoral e de evangelização não estamos nos mesmos níveis e é também onde deveríamos ser especialistas. Não são poucos os casos onde há um verdadeiro horizontalismo da fé, onde a pastoral e a evangelização ocupam o quinto ou sexto lugar de importância na paróquia e na diocese.

Faz-se urgente equilibrar as forças e isso depende em algo grau dos líderes: bispos, sacerdotes e leigos.

Uma forma muito simples de medir quais são as prioridades na pastoral é verificar quanto dinheiro se reverte para a promoção humana e quanto para a evangelização, tanto em nível paroquial quanto diocesano. O resultado tem sido inacreditável. Muitos líderes são especialistas em promoção humana e débeis em pastoral. A grande maioria do dinheiro  revertido em muitos lugares vão para projetos de obras sociais. Existem dioceses onde há apenas um único centro de evangelização e 10 ou 20 obras de promoção humana: médicas, legais, assistenciais, educacionais, recreativas, sanitárias… Essas obras são más? Não! Porém o desequilíbrio é gritante, pois a pastoral profética ou evangelizadora não está na mesma proporção.

O líder católico é especialista em “caridade” e o líder protestante, em “evangelização”. Que maravilha! Por isso as seitas, apesar de todos os seus erros e absurdos doutrinários, continuam crescendo e não passam por problemas de falta de compromisso, falta de vocações, nem falta de recursos econômicos. Até os muçulmanos mais fundamentalistas estão crescendo em todo o mundo. Por isso, milhões de católicos têm abandonado a fé para ir fortalecer as fileiras do sectarismo. Ser líderes de visão é corrigir este aspecto, de outra maneira, alegremente continuarão a dizer: “Graças à Igreja Católica continuo a ter apoio legal, físico, alimentício e educacional; mas como também preciso de Deus, vou procurar aqueles que me o dão”. Como afirmou certo teólogo: “A Igreja fez a opção pelos pobres, mas os pobres fizeram opção pelos pentecostais”. A cidade de Chiapas, no México, é um exemplo disso e a verdade é que não são poucas as dioceses e paróquias onde a evangelização é mais pobre que os pobres. Nesses locais resulta que os especialistas no sagrado não são os líderes católicos, mas os pastores protestantes.

É urgente equilibrar este aspecto e “varrer as cinzas” acima mencionadas, se na verdade queremos acelerar o Reino de Deus na plenitude do Evangelho. Correções de fundo devem ser feitas, atentando para o que o Magistério da Igreja tem se pronunciado a respeito e aceitando a remoção das “cinzas”. Eis porque Jesus disse: “Nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mateus 4,4).

Chegamos a um nível tão extremo que as fundações e organismos católicos estão dispostos a apoiar economicamente projetos sociais, educativos, legais, juvenis e até habitacionais (!), mas a grande maioria não está disposta e nem pensa em apoiar economicamente projetos pastorais e de evangelização, missionários, estações de rádio, programas de televisão etc.

Brilham por sua omissão!

Se você duvida, basta consultar o diretório de fundações católicas para ver quantas fundações apóiam obras de promoção humana e quantas apóiam a evangelização. Os principais recursos humanos, econômicos e espirituais não estão sendo empregados para a evangelização, para colocar o sagrado em primeiro plano. Não será por isso que não estão surgindo vocações para o seminário e a vida religiosa em muitos lugares? Não será isto uma das razões para o crescimento das seitas? Não seria isto um fator que impede o crescimento da comunidade ou que resulta no fechamento dos templos católicos? Você não acredita que a falta de especialistas no sagrado cause a falta de compromisso econômico e pastoral dos católicos?

Pessoalmente estamos convencidos que sim! Não pode o homem de hoje querer se aproximar das “coisas celestiais” se apenas escuta falar das coisas terrestres, mesmo quando estas se tratam de obras de caridade promovidas para ajudá-lo. De fato, as comunidades protestantes que mais trabalham no pastoral não conhecem nenhum dos problemas anteriores e, ao mesmo tempo, os institutos religiosos católicos que equilibraram [as dimensões vertical e horizontal da fé] também não lhes faltam vocações, nem contribuições em dinheiro.

Ao contrário, as igrejas do protestantismo histórico que também caíram [no erro de pregar] um evangelho social sofrem as mesmas conseqüências e todas elas estão diminuindo o seu ritmo de crescimento.

É indubitável que este tema das seitas e o excessivo horizontalismo da fé nos mostra que o crescimento das seitas às custas da Igreja Católica é uma “conta” que está sendo paga pela falta de equilíbrio pastoral, provocado em boa parte pelas “cinzas” da Teologia da Libertação.

As “cinzas” servem para nutrir as “algas” e estas são consideradas como os primeiros organismos vivos que apareceram sobre a terra. Seguindo esta analogia, a “cinza” de nos centrarmos no humano, esquecendo o divino, está se convertendo no “nutriente” para que o homem regresse às primitivas religiosidades pagãs, que ressurgem através da Nova Era.

Por favor, não se esqueça novamente do nº 76 das conclusões do Sínodo da América, quando fala dos desafios das seitas. Os bispos e o Papa afirmam aí: “De outro lado, como assinalaram alguns Padres sinodais, deve-se perguntar se uma pastoral orientada de modo quase exclusivo às necessidades materiais dos destinatários não esteja defraundando a fome de Deus que têm esses povos, deixando-os assim em uma situação vunerável diante de qualquer oferta supostamente espiritual. Por isso, ‘é indispensável que todos tenham contato com Cristo mediante o anúncio querigmático gozoso e transformador, especialmente através da pregação na liturgia'”.

Ser líderes de visão é começar a reequilibrar os níveis de promoção humana e evangelização. A Igreja existe para evangelizar (Evagelli Nuntiandi nº 14). Estabelecer as bases da fé é essencial. De outro modo, documentos eclesiásticos virão e irão, mas se as bases não estiverem bem construídas, pouco efeito causarão. Não devemos nos esquecer que a Cruz tem um madeiro horizontal que abraça tudo o que se relaciona com a humanidade, mas também tem um madeiro vertical, que une o homem com a Divindade. E essa cruz tem um Deus-Homem que se chama Jesus Cristo.

Já é tempo de “cristianizar a Cristologia”, para que resplandeça a imagem perfeita do homem perfeito, Cristo Jesus.

É urgente possuir idéias claras e distintas na pastoral.

Não esqueçamos o que muitos teólogos liberais esqueceram e nos legaram como “cinzas”. Lembremos sempre que: “Na mensagem que a Igreja anuncia há certamente muitos elementos secundários, cuja apresentação depende em grande parte das mudanças de contexto. Tais elementos mudam também. Porém, existe um conteúdo essencial, uma substância viva, que não pode ser modificada ou deixada de lado sob pena de desnaturar gravemente a própria evangelização” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi nº 25). “A evangelização também deve conter sempre – como base, centro e cume de seu dinamismo – uma clara proclamação de que em Jesus Cristo, Filho de Deus feito homem, morto e ressuscitado, se oferece a salvação a todos os homens, como dom da graça e da misericórdia de Deus. Não uma salvação puramente imanente, à medida das necessidades materiais ou inclusive espirituais que se esgotam no quadro da existência temporal e se identificam totalmente com os desejos, as esperanças, os assuntos e as lutas temporais, mas uma salvação que ultrapassa todos esses limites para se realizar em uma comunhão com o único Absoluto Deus, salvação tanscendente, escatológica, que começa certamente nesta vida, mas que tem o seu cumprimento na eternidade” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi nº 26).

Que meus estimados teólogos da libertação me desculpem, mas as cinzas que deixaram provocaram seqüelas muito graves e a melhor maneira de varrer essas “cinzas” é deixá-las a descoberto, para que os os pastores, que devem “vigiar e apascentar o povo de Deus”, tomem ações concretas para colocar Deus como o centro da nossa fé. A Constituição “Lumen Gentium” exorta os bispos para que “com vigilância apartem da sua grei os erros que a ameaçam” (25a) e convida os leigos para “difundir e defender a fé” (11a).

Recuperemos a identidade da nossa missão para sermos fiéis ao Evangelho de Jesus Cristo.

“Queremos confirmar uma vez mais que a tarefa da evangelização de todos os homens constitui a missão essencial da Igreja; uma tarefa e missão que as mudanças amplas e profundas da sociedade atual tornam cada vez mais urgentes. Evangelizar constitui, com efeito, a felicidade e vocação própria da Igreja, sua identidade mais profunda. Ela existe para evangelizar, isto é, para pregar e ensinar, ser canal do dom da graça, reconciliar os pecadores com Deus, perpetuar o sacrifício de Cristo na Santa Missa, memorial de sua morte e ressurreição gloriosa” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi nº 14).

Com efeito, se alguém tem ainda alguma dúvida, recordemos o seguinte, já que as “cinzas” da Teologia da Libertação têm provocado o aumento do problema em graves dimensões, a ponto de muitos nem sequer enxergarem o problema que há muito tempo foi denunciado pelos bispos e pelo Papa:

“Não há razão para esconder, com efeito, que muitos cristãos generosos, sensíveis às dramáticas questões que trazem consigo o problema da libertação, ao querer comprometer a Igreja no esforço de libertação, têm sentido freqüentemente a tentação de reduzir sua missão às dimensões de um projeto puramente temporal; de reduzir seus objetivos a uma perspectiva antropocêntrica; [de reduzir] a salvação, da qual [a Igreja] é mensageira e sacramento, a um bem-estar material; [de reduzir] sua atividade – esquecendo toda preocupação espiritual e religiosa – a iniciativas de ordem política ou social. Se isto fosse assim, a Igreja perderia o seu significado mais profundo. Sua mensagem de libertação não teria qualquer originalidade e se prestaria a ser monopolizada e manipulada pelos sistemas ideológicos e partidos políticos. Não teria autoridade para anunciar, da parte de Deus, a libertação. Por isso, quisemos sublinhar na mesma alocução de abertura do Sínodo ‘a necessidade de reafirmar claramente a finalidade especificamente religiosa da evangelização’. Esta última perderia sua razão de ser se se deviasse do eixo religioso que a dirige: antes de mais nada, o reino de Deus, em seu sentido plenamente teológico” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi nº 32).

Estimado irmão bispo, sacerdote ou religioso,
Reitores de seminários e professores de teologia,
Agentes de pastoral e leigos em geral,

O Papa Bento XVI em pouquíssimo tempo [de pontificado] tem dito verdades urgentes e valiosas para vivermos a fé com autenticidade. Um desses convites é “não apenas para os jovens, mas também para as comunidades e os próprios pastores”, de “tomar cada vez mais consciência de um dado fundamental para a evangelização: onde Deus não ocupa o primeiro lugar, onde não é reconhecido e adorado como o Bem supremo, a dignidade do homem se põe em perigo”.

O rumo pastoral deve ser corrigido e preciso, não se esquecendo que “nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Jesus Cristo).

Deus te abençoe abundantemente. Não se esqueça que, para ser um autêntico cristão, devemos lutar para conhecer, viver, pregar, celebrar e defender a fé.

Facebook Comments

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.