Por que Romana?

– “Às vezes me pergunto: Por que Roma? Quais os motivos que levaram os Apóstolos e Padres da Igreja a levar a sede para Roma? Seria uma estratégia de expansão?… No Evangelho, Cristo vai da Galileia a Jerusalém, capital do mundo judeu. Nos Atos dos Apóstolos, a Igreja vai de Jerusalém a Roma, capital do mundo pagão. Roma do tempo do Império era chamada (cf. Apocalipse) de “Babilônia”. Lá onde os cristãos foram mais perseguidos; lá onde seu líder, o encarregado de cuidar das ovelhas, primeiro papa Pedro, foi crucificado e enterrado (hoje basílica de São Pedro). (…) Roma (antiga) foi uma perdição total, um antro de pecado, capital do mundo pagão. Lá o pecado era abundante. Então… seria esta a resposta?: ‘Onde abundou o pecado, superabundou a graça’ (Romanos 5,20). Pode não ser a resposta correta, mas com certeza foi um dos motivos!”[1].

a) O fato é que nós, católicos, cremos num Deus que é capaz de transformar: águas amargas em doces (cf. Êxodo 15,23-25); veneno, em vida; uma prostituta, numa fidelíssima esposa. Assim, é que, a Roma ímpia e acossadora dos cristãos se tornou a Roma defensora da Sacra Religião Cristã.

A Grande Prostituta, e que tinha sete dominadores (ou sete reis/colinas, cf. Apocalipse 17,9), tornou-se a grande Testemunha da Fé no Ressuscitado; à semelhança daquela pecadora, Maria Madalena, a qual havia sido dominada por sete demônios (cf. Lucas 8,2) e que se transformou na fervorosa anunciadora do Cristo Ressuscitado. O que Deus operou em Maria Madalena, similarmente, Ele operou naquela iníqua Urbe, cidade que tanto absorveu do sangue dos mártires de Deus, que ela própria acabou, como que, sendo santificada por esse mesmo sanguíneo…

Destruído foi o orgulho do paganismo, pois, de inicialmente perseguidora – como o fora também o próprio Apóstolo Paulo – passou a ser a mais incansável difusora e propaladora da Santa e Divina Fé. Cidade na qual – segundo a Tradição – tanto aquele a quem “fora confiado o evangelho dos incircuncisos” (Gálatas 2,7), Paulo, como “o dos circuncisos” (Gálatas 2,7), Pedro, regaram-na com o líquido abençoado das suas veias!

b) Foi isso que Deus fez com a cruz – sinal de morte e maldição, a qual transmutou em signo de bênção e salvação -, podemos melhor compreender e visualizar o que Ele operou com relação ao Império Romano e, em destaque, com a Capital Imperial… A própria cruz, que era um instrumento de execução utilizado pela gentilidade, foi justamente o que fora tomado pelo Senhor, e pelos cristãos, como o grande símbolo missionário do seu Reino. É de se ter certeza ainda que Deus, na sua onisciência, já sabia (ou melhor, Ele que desde sempre sabe) que um dia, os romanos, que fincavam no solo do mundo cruzes de morte, fincariam, em lugar destas, cruzes de vida e redenção (os emblemas da fé cristã). E, assim, como do veneno da cobra a ciência dos homens produz o soro que salva; assim, também, da pestilenta Roma pagã, a Ciência Divina produziu a Roma Cristã.

Na boca dessa cidade pagã (espiritualmente falecida), como na do leão morto narrado no livro dos Juízes (cf. 14,8-9), viçou esse maravilhoso favo de mel (que comunica a precisa Palavra do Céu, alimento para pais e filhos) que é a Sé Romana. É nela que haveria de se conservar toda doutrina agradável a Deus, doce alimento para a humanidade; mas que, por ser palavra profética, é “amargo no estômago” (Apocalipse 10,9; Ezequiel 3,3).

c) – “A Igreja futura… que haveria de chamar-se ‘Igreja Romana’, começava, de forma misteriosa, em torno do Calvário, a função que viria a desempenhar no mundo. Os romanos imolavam a vítima e levantavam-na à vista da turba. Os futuros guardiões da unidade da Igreja recusarão rasgar a túnica de Jesus. Depositários da fé, serão os primeiros a escrever e a sustentar o principal dogma da nova crença: a realeza de Cristo… e assim, não parece que os romanos inauguravam e justificavam, embora de forma inconsciente, desde o Calvário, o seu destino imortal?”[2].

É de impressionar que, nos desígnios do Altíssimo, de fato, o Cordeiro de Deus tivesse sido imolado, não pelas mãos d’algum judeu, mas pelas mãos de romanos – ou seja, da gentilidade (obviamente, os soldados romanos inconscientemente ‘realizavam’ o verdadeiro e perfeito sacrifício de toda História). Assim, os “ministros” de tal sacrifício (em que se travestira, misteriosamente, aquela cruenta execução) estarão perpetuamente ligados ao nome ‘romano’… E se a maior autoridade judaica (o sumo sacerdote) havia considerado Jesus culpado; em contrapartida, a maior autoridade romana (presente em Israel), Pôncio Pilatos, o considerara inocente. Portanto, é da boca da autoridade ‘romana’ que a verdade foi proferida. Por ele (pelo poder romano) é que foi proclamada a pureza do “cordeiro” que veio a ser sacrificado – cumprindo a exigência da Lei, que exigia a avaliação e atestado de perfeição do que haveria de ser sacrificado.

“Os soldados, quando crucificaram Jesus, tomaram suas roupas e repartiram em quatro partes, uma para cada soldado” (João 19,23). Ora, as vestimentas de Cristo faz as vezes das peles dos animais que eram sacrificados; e, como tais, cabiam aos sacerdotes – que agora, no sacrifício da Nova Aliança, era realizado por soldados ROMANOS; coube a estes a função de novos “levitas”. Dizem até que: “A cruz havia sido erguida de tal sorte que Jesus voltava as costas a Jerusalém e olhava para o Ocidente, para a cidade Eterna”[3]. Para Roma!

d) Até no seu nascimento, Nosso Senhor quis estar associado à Roma, isto é, ao Império Romano; pois nasceu durante um censo romano:

– “Naquele dias apareceu um edito de César Augusto, ordenado o recenseamento de todo mundo habitado… E todos iam se alistar, cada um em sua própria cidade. Também José subiu da cidade de Nazaré, na Galileia, para a Judeia, na cidade de Davi, chamada Belém, por ser da casa e da Família de Davi, para se inscrever com Maria, sua mulher, que estava grávida” (Lucas 2,1-5)

de sorte que, segundo a Bíblia, o Sagrado Casal de Nazaré foi registrado em um documento ROMANO. E, assim, o cumprimento da profecia do nascimento do Messias está escrituristicamente associado a um edito de ‘César’.

Junto ao estabelecimento da Antiga Aliança houve também, associado, um censo: só que hebraico (cf. Números 1,1-2). Agora, porém, como era a gentilidade que assumiria, de forma maciça a Nova Aliança, eis que em seu surgir houve um novo censo, gentílico. O novo Povo de Deus (que é também o Corpo Místico de Cristo), principiado e figurado por Maria e José, tivera que se submeter a ele. A um censo ROMANO! Censo que – acredito eu – mui adequadamente poderia ser chamado de ‘CATÓLICO’; haja vista que está escrito que o mesmo era um “recenseamento universal”: “em todo mundo habitado” (Lucas 2,1). Recorde-se que a palavra “católico” quer dizer “universal”.

e) Muitos outros elementos igualmente apontariam ou, pelo menos, indicariam a romanização já profetizada nos textos sacros. Não a toa, a fé que é sobredestacada por Cristo em sua Missão Pública é a de um centurião (militar) romano:

– “Quando o centurião mandou alguns amigos dizerem… ouvindo isso, Jesus ficou admirado e, voltando-se para a multidão que o seguia, disse: ‘Eu vos digo que nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé’” (Mateus 8,10).

Além disso, o primeiro lar pagão a receber uma visita apostólica foi o de um outro centurião romano! E o apóstolo aí enviado, pelo próprio Altíssimo, foi justamente Pedro:

– “O centurião Cornélio… recebeu de um santo anjo o aviso para chamar-te à sua casa” (Atos 10,22).

E até quem fez uma notável confissão, no Calvário, foi também um outro centurião:

– “O centurião [romano], que se achava bem defronte dele… disse: ‘Verdadeiramente este homem era Filho de Deus!’”(Lucas 23,47).

Todos, homens afeitos às armas!… Todos, ligados ao Poder Romano!

f) Certamente, quando ainda estava no mundo, Maria (a Mãe do Senhor) já intercedia para que as ‘muitas águas’ (Apocalipse 17,1.15) que representavam o Império Romano e os povos que o compunham fossem transformadas em ‘vinho bom’, alcançando com isso que o Nome de seu Divino Filho, Jesus Cristo, fosse glorificado entre as nações; ela que é o protótipo da Igreja e – como costumo dizer – a primeira Igreja do Deus Vivo, a que primeiramente recebeu o Cristo dentro de si (e falo aqui, antes, do fato dela tê-lo recebido primeiramente pela fé, no coração; pois foi crendo, que o Verbo se fez carne em seu benditíssimo seio; Foi a fé em Deus, que ela nutria, que a fez receptáculo de Deus em sua carne).

Sem dúvida, a mulher do Apocalipse é a Virgem Mãe do meu Senhor, Maria Santíssima; entretanto, nada obsta que, por figuração, represente a própria Igreja do Altíssimo que também é Mãe e Virgem, como já dizia Santo Agostinho[4]… E que descrição magnífica! Poder-se-ia vislumbrar aqui, a despeito da romanicidade da Ecclesia de Deus, porquanto a ela foram dadas as “asas de uma grande águia” (Apocalipse 12,14) que, coincidentemente, é o emblema-mor do Império Romano!

g) Está escrito na Epístola aos Romanos:

– “Todas as Igrejas de Cristo vos saúdam” (Romanos 16,16).

A respeito disto, curiosamente a “Bíblia de Jerusalém” traz o seguinte comentário:

– “A fórmula, insólita em São Paulo, demonstra a veneração que ele devota à Igreja de Roma”[5].

De fato, a expressão “todas as igrejas saúdam” não aparece em nenhum outro escrito paulino… Também Santo Inácio de Antioquia, pelo ano 110 d.C., de modo incomum, saúda a Igreja de Roma assim:

– “À Igreja que preside na região dos romanos, digna de honra, digna ser chamada feliz, digna de louvor, digna de sucesso, digna de pureza; que preside ao amor, que porta a lei de Cristo, que porta o nome do Pai: eu a saúdo em nome de Jesus Cristo”.[6] [Saudações ímpares que igreja nenhuma em todo o mundo recebeu, em momento nenhum…]

ADENDOS

1. A titulação Romana da Igreja refere-se ao lugar onde se encontra a suprema autoridade visível dela, isto é, onde se encontra a Sé Papal… No entanto, o termo ‘romano’ traz em si, em certa medida, o próprio significado da catolicidade ou universalidade da Igreja, haja vista:

– “A palavra ‘romano’ aplicava-se a todas as pessoas que possuíam cidadania romana independentemente da língua, raça, cultura ou lugar de nascimento. São Paulo, por exemplo, era judeu de Tarso, na Cicília, mas também cidadão romano”[7].

Por conseguinte, não é um vocábulo restrito topograficamente à cidade de Roma. De modo que alguém podia ser romanp sem ter nascido, vivido ou conhecido pessoalmente a chamada ‘Cidade Eterna’!

2. Mas dirão: o título romano não é dogmático!!… Se não é, então, quisera que o fosse… Acaso eu não posso desejar algo dessa monta, ainda que nunca venha a acontecer?

Digo mais: quão excelente seria também se, a partir do próximo Romano Pontífice, os Papas eleitos assumissem o nome de Pedro; de sorte que, quando Cristo voltasse, o nome do último Vigário seu seria igualmente PEDRO (seja Pedro II, seja Pedro III, seja Pedro IV, etc). E, assim, a Igreja iria, nominalmente, ‘de Pedro a Pedro’!!!

Também almejo que a chamada “Missa de São Pio V” seja realizada em todo o Orbe. E se não existir a possibilidade de celebrá-la em todos os santuários católicos do mundo inteiro, que ao menos nas Basílicas espalhadas pelo planeta houvesse a obrigatoriedade de uma celebração dessas nos domingos e nos mais dias de festas.

3. Ainda que Madalena não tivesse sido uma prostituta na carne (como vários afirmam), isso não impediria da mesma ter sido prostituta espiritualmente – isto é, servido a outros senhores (falsas divindades) e não o Deus Verdadeiro…

4. A Igreja é o Corpo de Cristo, conforme ensina-nos as Santas Escrituras:

– “Maria deu à luz corporalmente a Cabeça deste corpo. A Igreja dá à luz espiritualmente os membros dessa Cabeça. Nem em Maria nem na Igreja, a virgindade impede a fecundidade. E nem em uma nem em outra, a fecundidade destrói a virgindade”[8].

5. Disse Nosso Senhor Jesus Cristo:

– “Não penseis que vim trazer a paz a terra à terra. Não vim trazer a paz, mas a espada” (Mateus 10,34).

Se eu pudesse dar um presente que considerasse mui adequado ao Romano Pontífice, imitando o profeta Jeremias que presenteara a Judas Macabeu (líder do Povo de Deus), dar-lhe-ia uma espada dourada:

– “Jeremias entregou a Judas uma espada de ouro, pronunciando estas palavras enquanto a entregava: ‘Recebe esta espada santa, presente de Deus, por meio da qual esmagarás teus adversários’”(2Macabeus 15,15-16).

E desejaria que ele a trouxesse à cintura, embainhada… Fosse assim um signo da animosidade que há entre os Filhos da Luz e a Besta, a qual – segundo as Escrituras – deverá ser ferida por um gládio:

– “Besta que tinha sido ferida pela espada” (Apocalipse 13,14).

Será que a respeito do último pontífice da Igreja também se cumprirá o que foi dito:

– “Quando eras jovem, tu te cingias e andavas por onde querias; quando fores velho, estenderás as mãos e outro te cingirá e te conduzirá aonde não queres” (João 21,18)?

[É para se pensar…]

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NOTAS

[1] http://www.portaluniao.com/forum_viewtopic.php?29.5596.
[2] Concilium Legionis Mariae. “Legio Mariae”. Dublin, 3ª ed., 1961, p. 434.
[3] Cf. BOLO, “A Tragédia do Calvário”; in: Concilium Legionis Mariae. “Legio Mariae”. Dublin, 3ª ed., 1961, p. 434.
[4] Cf. AGOSTINHO DE HIPONA, Santo. “A Virgem Maria: cem textos marianos com comentários”. São Paulo: Paulus, 2ª ed., 1996, p. 97.
[5] BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo: Paulus, 1996, p. 2145.
[6] Cf. INÁCIO DE ANTIOQUIA. “Coleção Patrística: Padres Apostólicos”. São Paulo: Paulus, 2ª ed., 1995, p. 103.
[7] ENCICLOPÉDIA DELTA UNIVERSAL, vol. 13. Rio de Janeiro: Delta, 1982, p. 7018.
[8] “A Virgindade Consagrada” II,2; in: AQUINO, Felipe Rinaldo Queiroz de. “Por que sou Católico”. Lorena: Cléofas, 3ª ed., 2002, p.141.

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