A data do nascimento de Cristo

– “Qual a data exata do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo?” (Jerônimo – Guaratiba-RJ).

1. Quanto ao dia e ao mês em que nasceu Jesus, desde o séc. III os cristãos carecem de indicações seguras. O escritor Clemente de Alexandria (falecido antes de 215), por exemplo, apontava o dia 25 Pachon (=20 de maio) ou o 15 Tybri (=10 de janeiro) ou o 11 Tybri (=6 de janeiro), sendo esta última a data mais comumente aceita, conforme Clemente. Outro escritor, autor do «De pascha computus» (falsamente atribuído a São Cipriano, +258), indica a data de 29 de março. Santo Hipólito de Roma (+235) falava do dia 2 de abril do ano de 5500 após a criação do mundo. Prevaleceu, porém, no uso cristão a data de 25 de dezembro. Por que?

A data de 21 de março, equinócio da primavera, era tida, segundo as concepções dos antigos, como data inicial da Criação do mundo; foi, por conseguinte, considerada outrossim como data provável da Encarnação do Criador. Mais ainda: o profeta Malaquias (4,2) apresenta o Messias qual Sol de Justiça; por sua vez, Jesus se chama «a luz do mundo» (cf. João 8,12). Em consequência, os cristãos escolheram o quarto dia (conforme Gênesis 1,14-19, no quarto dia Deus fez o sol, a lua e as estrelas) da semana que começa a 21 de março, ou seja, o dia 25 de março, para comemorar a conceição do Salvador no seio de Maria Virgem. Daí decorria que o nascimento de Jesus havia de ser celebrado nove meses depois, isto é, aos 25 de dezembro. Foi talvez em meados do séc. IV que se implantou definitivamente a observância desta data em Roma.

É possível que sobre a escolha da data litúrgica tenha exercido influência o calendário civil de Roma. O Imperador Aureliano, em 274, introduziu a 25 de dezembro a celebração do “Sol Invictus” ou do deus Mitra. Em 362, o Imperador Juliano o Apóstata (+363) escreveu o opúsculo «De Sole Rege» (=”Sobre o Rei Sol”) a ser lido em Roma no dia 25 de dezembro, a fim de celebrar o sol. Ora, sabe-se que as autoridades da Igreja não raro procuravam santificar datas ou costumes famosos do culto pagão mediante uma celebração cristã; assim a fim de inculcar que Cristo é realmente o Sol de Justiça Invicto, único capaz de corresponder às aspirações dos homens, teriam escolhido o dia 25 de dezembro para a celebração litúrgica de Natal; os bispos costumavam não simplesmente extirpar os usos pagãos, mas, na medida do possível, os cristianizavam, servindo-se deles como de instrumentos pedagógicos que levassem o povo a compreender melhor o significado de Cristo.

2. Quanto ao ano do nascimento do Senhor, têm-se dados mais explícitos. Nos primeiros séculos do Cristianismo, contavam-se os anos a partir de diversos acontecimentos famosos da antiguidade: havia, por exemplo, a era das Olimpíadas, a era da fundação de Roma, a era de Diocleciano, a era bizantina.

Aconteceu, porém, que no séc. VI, o monge Dionísio o Exíguo ou Pequeno (+556), desejoso de calcular a data de Páscoa para os anos subsequentes, resolveu tomar como ponto de referência ou inicio de nova era o nascimento do Redentor, acontecimento de importância máxima na História. Pôs-se então a conjecturar a data deste a partir de indicações fornecidas pelos Santos Evangelhos: Lucas 3,1 refere que João Batista começou a pregar no ano 15º do reinado de Tibério: no ano seguinte a este, Jesus foi batizado, tendo aproximadamente trinta anos (cf. Lucas 3,23); por conseguinte, Dionísio recuou trinta anos a partir do 159 de Tibério, e chegou ao ano 754 da fundação de Roma, ano que ele indicou como sendo o do nascimento de Cristo e o inicio da era cristã, ainda hoje em voga.

Dionísio, porém, enganou-se:

a) Com relação a Lucas 3,1, não considerou que o ano 15º de Tibério se contava provavelmente a partir não da morte de Augusto, mas da elevação de Tibério ao trono na qualidade de «socius» ou companheiro de governo de Augusto (elevação que se deu dois anos antes da morte de Augusto). Já a este título terá cometido um erro de 2 anos na sua computação cronológica. Ademais, Dionísio parece ter entendido com demasiado rigor a fórmula «cerca de trinta anos», que indicaria a idade de Jesus. Já que, segundo o costume judaico, ninguém podia entrar na vida pública antes dos trinta anos, pode ser que o Evangelista tenha desejado indicar apenas que Cristo, ao começar seu ministério público, já tinha idade legal.

b) Dionísio não levou em conta a noticia consignada por Mateus 2,1: Jesus nasceu antes do falecimento do rei Herodes, o qual se verificou no ano de 750, ou seja, no ano 4º antes da era cristã. Ora Herodes passou doente os últimos meses de sua vida em Jericó, ao passo que os magos ainda o encontraram em Jerusalém (cf. Mateus 2,3); disto se conclui que a visita destes personagens à corte de Herodes se deve ter dado, pelo menos, por volta do ano 5º a.C. — Note-se outrossim que Herodes mandou matar todos os meninos que tivessem até dois anos de idade: supunha, portanto, que Jesus pudesse ter nascido havia dois anos. Admitindo que o monarca haja feito um cálculo largo, teremos que recuar um ano ou mais para além do ano 5º a.C., a fim de chegar ao ano em que Cristo nasceu. É o que leva os melhores exegetas a admitir que Jesus tenha vindo ao mundo por volta do ano 6° antes da Era Cristã, ou seja, cerca de 748 da era de Roma. Estas indicações se completarão no artigo “A estrela que guiou os Magos”.

  • Fonte: Revista Pergunte e Responderemos nº 3 – mar/1958
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