A divindade de Cristo

  • Autor: Martin J. Scott, sj
    Fonte: Livro “Things Catholics Are Asked About” (1927) / Site “Una Fides, One Faith” (http://net2.netacc.net/~mafg)
    Tradução: Carlos Martins Nabeto

O dia 25 de dezembro recorda o nascimento de Cristo. Chamamos esse dia de “Natal”, que significa “a Missa de Cristo”, pois nesse dia a Missa é celebrada em comemoração ao nascimento do divino Nebê em Belém.
Foi uma maneira estranha de o Criador ingressar no Seu próprio mundo. A sabedoria humana ditaria um ingresso mais glorioso. Somente Deus poderia se humilhar a ponto de nascer num estábulo, no meio de animais. Nenhum homem, dono de sua própria condição, faria sua primeira aparição no cenário mundial como um bebê indefeso e como um estranho rejeitado.

  • “Ele esteve no mundo e o mundo foi criado por Ele, mas o mundo não o conheceu. Ele veio para o que era seu, mas não foi recebido”.

Ninguém, a não ser Deus, poderia inaugurar o maior empreendimento do mundo de maneira tão imprópria. Cristo é o ponto de divisão da História: datamos nossos anos antes ou depois de Cristo. Ele também é o ponto de divisão do homem, pois todos os homens estão com Ele ou contra Ele. Vê-se assim que Cristo é a personalidade mais importante do mundo. Ele tem agora ainda mais seguidores, que O amam devotamente, mais do que qualquer governante que já tenha vivido, não importando quão poderoso ou amado tenha sido.

Napoleão já foi elogiado pela devoção do seu povo a ele. Ele porém respondeu:

  • “Não me falem de lealdade e devoção. Há alguém que morreu numa cruz há quase 2000 anos e que teve e tem agora mais devotos fervorosos do que qualquer monarca que já tenha vivido. Há hoje milhões que estão prontos para dar a vida pelo Crucificado; milhões hoje vivem e trabalham para Ele em todas as partes do mundo. Nenhum rei jamais foi servido com tanta fé e generosidade quanto Aquele que disse: ‘O meu Reino não é deste mundo’, e cuja coroa era de espinhos, e cujo trono era a cruz”.

À maneira de pensar do homem, Cristo escolheu meios frágeis para estabelecer o Seu reino. Mas a sabedoria do mundo é loucura e a loucura da cruz é sabedoria. Hoje, Cristo é o fator dominante da vida e o Seu Reino conta com fiéis seguidores de todas as nações do mundo. As duas maiores e mais alegres solenidades da civilização são aquelas que comemoram o Seu nascimento e a Sua ressurreição. O Natal e a Páscoa são tributos vivos à influência de Jesus Cristo no mundo. Os grandes personagens da Antiguidade são apenas nomes: Alexandre e César, com todo seu poder e pompa, são apenas recordações. Quem morreria hoje por César ou Alexandre? Mas, literalmente, milhões morreriam de boa vontade por Cristo. Em todo os séculos, desde o início do Cristianismo, os seguidores de Cristo têm sofrido calúnias, confiscos de propriedades, prisões, torturas e até morte por Seu Nome. Ninguém, exceto Deus, poderia inspirar tal lealdade de forma contínua e por tanto tempo.

Mesmo que Cristo nunca tivesse realizado um milagre, temos nesta devoção eterna a Ele um milagre perpétuo e uma prova de que Ele era quem afirmava ser: o Filho de Deus. Tudo o que realmente vale na civilização atual é resultado de Cristo no mundo. Os sábios antigos e os de várias épocas deixaram sua impressão em certas nações e períodos, mas Cristo deixou sua impressão na humanidade, em todo o mundo e por todo o tempo. Não podemos ser indiferentes a Cristo. Os homens O amam ou O odeiam. Ele predisse: “Quem não está comigo está contra mim”. E assim tem sido durante todas as épocas. Cristo foi amado e odiado violentamente em todas as épocas.

Ainda hoje é assim. Enquanto milhões vivem para Cristo e estão prontos para morrer por Ele, outros milhões O blasfemam e se opõem diabolicamente a Ele. O mundo odeia a Cristo porque Ele não o atende. O mundo amaria a Cristo se Ele atendesse ao que se quer. O mundo quer ser lei para si mesmo, fazer da autoindulgência o princípio da vida. Mas Cristo veio nos dar algo mais do que este mundo poderia oferecer da melhor maneira:

  • “Para todos que O recebem, Ele dá o poder de se tornarem filhos de Deus”.

Ele deixou o céu e tornou-se homem, para que o homem se tornasse, em certo sentido, divino. O mundo se opõe a Cristo porque os seus princípios são diretamente opostos aos Dele. O mundo estabelece esta vida como objetivo do homem. Cristo proclama que esta vida é provação e que a sepultura não é o fim, mas o ponto de partida do homem. Entre os seguidores desses dois padrões antagônicos, sempre deve haver uma inevitável oposição. Quem está certo: Cristo ou o mundo? Essa é a grande pergunta. A maior!

Se Cristo é Deus, não há dúvida sobre quem está certo. Por isso é que a questão mais vital para cada indivíduo é a sua atitude em relação a Cristo e a sua relação com Cristo. Se Cristo é Deus, Ele deve ser honrado como Deus, crido como Deus, servido como Deus. Ele é Deus? O sumo sacerdote fez essa pergunta pessoalmente a Cristo e ouviu a resposta: “Eu sou”. Por essa resposta, ele foi acusado de blasfêmia e considerado culpado de morte. Ele foi levado a Pilatos, falsamente acusado de se fazer rei. Pilatos perguntou-lhe: “És rei?” Cristo respondeu: “Eu sou, mas o meu Reino não é deste mundo”. Pilatos não encontrou nenhuma falta Nele, mas para satisfazer os seus acusadores, ele O condenou à morte depois de tê-lo proclamado inocente.

Este é o único caso nos anais da Justiça em que o juiz, após declarar solenemente o acusado inocente, o condenou à morte. Cristo foi crucificado por proclamar ser Deus. Ele quis dizer que era Deus no verdadeiro sentido. Ele foi bem compreendido pelos acusadores, caso contrário não teria sido acusado de blasfêmia, cuja penalidade era a morte. Cristo era quem afirmava ser? Ele deu a melhor prova de que era quando morreu por Sua declaração. Os homens não morrem por uma mentira. Cristo proclamou solenemente ser Deus e morreu por assim proclamá-lo. Devemos crer Nele?

Os maiores oponentes da divindade de Cristo afirmam que Ele é o único ser perfeito que já existiu neste mundo. Eles afirmam que Dele é a mente mais equilibrada conhecida pela humanidade. Eles O aclamam como o personagem mais exaltado e virtuoso já registrado pela História.

Esse ser perfeito, distinto pelo mais profundo intelecto e pela mais elevada virtude, declarou solenemente ser Deus e selou o Seu testemunho com Seu Sangue. Visto que esse ser perfeito não pode ser um impostor ou um louco, conclui-se da admissão dos Seus oponentes que Cristo é Deus. Este ser perfeito não mentiria, nem estaria sob uma ilusão doentia. Cristo proclamou ser Deus. Se Ele não era Deus, era impostor ou louco. Mas todos admitem que Ele foi a pessoa mais correta que já viveu, e também a mais sã. Seus próprios oponentes, durante Sua vida, foram forçados a admitir Sua santidade exaltada e Sua maravilhosa mentalidade. “Qual de vocês pode Me acusar de pecado?”, foi o desafio feito a eles, e foram obrigados a ficarem calados. Novamente eles disseram, referindo-se à Sua mentalidade: “Nunca um homem falou como este Homem fala”. De toda humanidade, somente Ele poderia apontar para Si mesmo como modelo de conduta: “Aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração”. Além disso, Ele Se proclamou como padrão da verdade: “Eu sou a luz do mundo”, “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Que arrogância e que insanidade se Ele não fosse Deus! Mas Santo como era Cristo e mentalmente perfeito, Sua divindade reside em algo mais do que a Sua palavra. Cristo sabia que ao afirmar ser Deus, estaria fazendo uma afirmação surpreendente. Os judeus tinham tanta reverência por Deus que nunca pronunciavam Seu nome, pronunciando em vez disso um termo substitutivo: “Adonai”. Foi esse Sumo e Todopoderoso que Cristo afirmou ser. Não é de admirar que os judeus ficassem surpresos com Suas reivindicações e resistissem a elas. Cristo, que conhecia a ideia exaltada de Deus, fez todos os esforços para que lentamente acreditassem Nele. Ele compreendia a magnitude das Suas reivindicações e a necessidade de fundamentá-las. Por conseguinte, disse-lhes que eles tinham o direito de exigir Dele a confirmação da Sua palavra. Por isso, Ele procedeu para confirmar Sua afirmação, como faria um cientista: pela prova. “Se não acreditais em Mim, crede pelo menos nas obras que Eu faço: elas dão testemunho de Mim”. Seus milagres foram a evidência que Ele forneceu para sua reivindicação. Qualquer homem poderia dizer ser Deus, mas ninguém a não ser Deus poderia fazer as coisas que somente Deus poderia fazer. Cristo deu vista aos cegos, fez o aleijado andar, purificou o leproso, curou o surdo, ressuscitou os mortos trazendo-os à vida; Ele comandou a natureza como apenas o Senhor da natureza poderia fazer, ordenando que a tempestade cessasse e os elementos [naturais] acalmassem. Os ventos e as ondas O obedeciam.

Certa vez, “vieram ter com Ele, quatro homens conduzindo um paralítico. E não podendo aproximar-se Dele, por causa da multidão, descobriram o telhado onde estava e, fazendo um buraco, baixaram o leito em que jazia o paralítico. E Jesus, vendo a fé deles, disse ao paralítico: ‘Filho, perdoados estão os teus pecados’. E estavam ali assentados alguns dos escribas, que arrazoavam em seus corações, dizendo: ‘Por que este diz blasfêmias assim? Quem pode perdoar pecados senão Deus?’ E Jesus, conhecendo logo em seu espírito que assim arrazoavam entre si, lhes disse: ‘Por que arrazoais sobre estas coisas em vossos corações? O que é mais fácil? Dizer ao paralítico: Estão perdoados os teus pecados; ou dizer-lhe: Levanta-te, toma o teu leito e anda? Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma o teu leito e vai para tua casa’. E levantou-se; e tomando logo o leito, saiu na presença de todos, de sorte que todos se admiraram e glorificaram a Deus, dizendo: ‘Nunca vimos tal coisa'” (Marcos 2,3-12).

Nesta ocasião, Cristo ofereceu a prova conclusiva de que era Deus. Ele admitiu que somente Deus podia perdoar o pecado e, a seguir, passou a mostrar que havia perdoado o pecado e que, consequentemente, era Deus. Se uma pessoa diz a outra: “Perdoados estão os teus pecados”, não há provas de que os pecados foram perdoados. Mas Cristo, a fim de mostrar que realmente perdoou o pecado quando pronunciou as palavras de perdão, fez algo que provou que as Suas palavras tinham poder e que realizavam o que significavam.

Qualquer um poderia dizer para o paralítico: “Perdoados estão os teus pecados”, mas somente Deus poderia dizer ao homem prostrado: “Levanta-te e anda”. Para mostrar que as Suas palavras de perdão realizaram o que era espiritual e invisível, Ele operou, com uma mera expressão, a cura instantânea de um paralítico incurável, algo visível para todos. Era como se Ele tivesse dito: “Para que saibais que Eu sou Deus e tenho poder para perdoar pecados, curarei, por uma frase, esse paralítico. Se a minha palavra lhe der uma restauração imediata da saúde do corpo, sabereis que o Minha palavra também perdoou os pecados dele”. Então, voltando-se para o paralítico, Ele expressou a palavra de poder, a Palavra de Deus: “Levanta-te!” O aleijado ficou de pé com a palavra do Criador. E Cristo realmente tinha perdoado os pecados.

Cristo era Deus: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus, todas as coisas foram feitas por Ele… E o Verbo se fez carne e habitou entre nós”.

O ser perfeito, Cristo, cuja mentalidade e santidade eram inacessíveis, não apenas declarou ser Deus, como também confirmou a Sua declaração com obras de Deus. Toda a sua vida pública foi um registro de ações divinas. Por isso, disse aos judeus: “Se não acreditais em Mim, crede nas obras que eu faço: elas dão testemunho de Mim”. O último e maior milagre de Cristo foi realizado como uma confirmação direta e derradeira da Sua divindade. Pouco antes de ressuscitar Lázaro dentre os mortos, Ele declarou que faria isso como prova de que a Sua missão era de Deus Todopoderoso: “Para que saibam que Tu Me enviaste”. Após declarar que deveria ser uma confirmação da verdade das Suas reivindicações, voltou-se para a tumba onde jazia Lázaro morto, falecido já há quatro dias e em estágio de putrefação; e com uma voz poderosa, exclamou: “Lázaro, vem pra fora!” E o cadáver saltou para a vida à chamada do Criador; Jesus devolve a Marta e Maria o seu amado irmão, agora instantânea e totalmente restaurado para elas!

Foi após esse milagre, testemunhado por um grande número de judeus proeminentes, que o povo aclamou a Cristo como Messias e, a caminho de Jerusalém, uma multidão O encontrou, agitando ramos com as mãos e levando-O em procissão à Cidade Santa. Isso alarmou os líderes judeus, que se opunham a Jesus como as trevas à luz, e planejaram matá-lo. Eles estavam convencidos, mas não se converteram, tal como acontece com muitos hoje. Membros do Conselho judaico tinham testemunhado o milagre e relatado, mas ao invés de se converter, o Conselho endureceu na oposição e malícia. Em vez de se converterem, [os membros do Conselho] tornaram-se pervertidos e tramaram falsas acusações e morte contra Jesus, e ainda, o assassinato de Lázaro, a prova viva do poder divino de Jesus:

  • “Muitos, pois, dentre os judeus que tinham vindo a Maria e que tinham visto o que Jesus fizera, creram nele. Mas alguns deles foram ter com os fariseus e disseram-lhes o que Jesus tinha feito. Depois os principais dos sacerdotes e os fariseus formaram Conselho e diziam: ‘Que faremos? Porquanto este homem faz muitos sinais. Se o deixamos assim, todos crerão nele e virão os romanos tirar-nos o nosso lugar e a nação’. E Caifás, um deles que era sumo sacerdote naquele ano, lhes disse: ‘Vós nada sabeis, nem considerais que nos convém que um homem morra pelo povo e que não pereça toda a nação’. Ora ele não disse isto de si mesmo, mas sendo o sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus devia morrer pela nação. E não somente pela nação, mas também para reunir em um corpo os filhos de Deus que andavam dispersos. Desde aquele dia, pois, consultavam-se para o matarem. (…) E os principais dos sacerdotes tomaram deliberação para matar também a Lázaro, porque muitos dos judeus, por causa dele, iam e criam em Jesus. No dia seguinte, ouvindo uma grande multidão, que viera à festa, que Jesus vinha a Jerusalém, tomaram ramos de palmeiras e saíram-lhe ao encontro; e clamavam: ‘Hosana! Bendito o Rei de Israel que vem em nome do Senhor'” (João 11,45-53; 12,10-13).

Os judeus não negaram os milagres de Jesus. Eles nada podiam contra a prova diante deles. Mas, tendo iniciado um plano maligno, não se afastaram dele. No fim, passaram a deliberar calúnias e assassinatos. Podemos perguntar: por que os escribas e fariseus rejeitaram Cristo em vista da prova dos Seus milagres? A mesma pergunta podemos fazer hoje. Milhares viram milagres inquestionáveis ​​em Lourdes. [O rabino] Zola, tendo testemunhado uma cura maravilhosa realizada ali, declarou que não acreditaria ainda que visse mil curas desse tipo. Se a crença não implicasse mudança de vida, muitos creriam. Mas não se pode crer em Cristo sem viver como Cristo prescreve. Com frequência, esse é o obstáculo.

Provas que persuadiriam e convenceriam em outros assuntos são desconsideradas quando envolve Cristo. Mas Cristo é Deus. Ele declarou que era Deus e confirmou a Sua declaração mediante ações que somente Deus poderia realizar. Milagres são a marca de Deus, que coloca o selo da aprovação divina na pessoa e missão de quem os realiza. Como Cristo realizou milagres, provou que a Sua missão vinha do alto. Os Evangelhos, que registram a missão de Cristo, são os documentos mais genuínos e autênticos da História. Este é o julgamento dos melhores estudiosos do mundo.

Em suma: Cristo, o único ser humano perfeito (intelectual e moralmente) que este mundo conheceu, declarou solenemente ser Deus, no verdadeiro sentido, e morreu por Sua declaração. Além disso, Ele confirmou a Sua Palavra por obras divinas e, ao longo da Sua vida, assumiu as prerrogativas de Deus, perdoando pecados, estabelecendo-Se como Juiz dos vivos e dos mortos e declarando que em todas as coisas era igual ao Pai. E mais: a Igreja que Ele estabeleceu está presente no mundo hoje e se estende a todas as nações e pessoas, sendo a Luz do mundo, o verdadeiro caminho da paz e o guia para a vida eterna. O Filho de Deus fez-se homem para que o homem se tornasse, em certo sentido, divino. Cristo não veio à Terra para nos dar fama, riqueza ou vida longa. Ele não possuía nenhuma dessas coisas. Ele veio para dar Sua vida: vida real, um compartilhamento da Sua própria vida eterna. Ele veio até nós em fragilidade e amor. Veio assim para ganhar o nosso amor, sabendo que se O amamos, O serviremos. Cristo foi um presente de Deus para a humanidade:

  • “Deus amou o mundo a ponto de dar o seu único Filho”.

Deus quer um presente nosso em contrapartida: o presente de uma vida reta por amor a Ele. Então, quando Cristo vier em poder, glória e justiça, teremos o prazer de encontrá-Lo, sabendo que Ele será nossa maior recompensa. O nascimento de Cristo como homem é o nosso nascimento como filhos de Deus. Através do Nenê de Belém, recebemos a maravilhosa herança pela qual “podemos nos tornar participantes da natureza divina” (2Pedro 1,4).

Não é, pois, de admirar que Cristo signifique tanto para a humanidade!

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