A Teologia da Inquisição segundo São Tomás de Aquino (Parte 2/6)

1.1.2)        Da Heresia e da Apostasia

 

Retornando, pois, ao objeto específico deste estudo, e continuando a nossa distinção entre os infiéis, é preciso dizer que existem ainda aqueles que, muito embora como os outros, desprezem e resistam à , outrora haviam crido: são os hereges e todos os apóstatas: “Outros, porém, são infiéis que outrora tiveram fé e a professam: como os hereges e todos os apóstatas.”[1]

 

Quem é então o herege? Quem o apóstata? O que os diferencia? Para compreendermos bem estas duas realidades, precisamos discriminar qual seja o conceito de no Aquinate.

 

 

 

1.1.2.1) Do Conceito de

 

Quem crê, diz Tomás, crê, antes de tudo, na palavra de outrem. Por isso, em qualquer forma de crença, a pessoa em que se crê precede à palavra na qual se crê. A , portanto – antes mesmo de ser uma adesão a uma palavra – é um ato pessoal, no qual uma pessoa se fia na palavra de outra pessoa:

 

Ora, como o que crê adere à palavra de outro, considera-se como principal e fim, em qualquer espécie de crença, aquele em cuja palavra assentimos; e, como quase secundário, aquilo que admitimos por querermos assentir à palavra de outro.[2]

 

Desta feita, no ato de fé, aderimos à palavra, não em virtude de termos atestado, demonstrativa e evidentemente a sua veracidade, senão porque, quem no-la diz, é digno de nosso assentimento:

 

Nesse gênero de fé, que, em oposição à anterior, poderemos chamar de autoridade, o motivo que determina o assentimento não é a evidência de que o testemunho é verdadeiro e de que aquele que o prestou, atualmente, no caso concreto, não faltou à verdade, mas a autoridade habitual da testemunha que, pela sua ciência e veracidade, tem direito a uma adesão dócil das nossas inteligências.[3]

 

No caso da fé cristã, ocorre algo análogo. Com efeito, o crente cristão, não é senão aquele que adere, por um ato da vontade, a Cristo e, por isso mesmo, a doutrina de Cristo. Antes de aderir às palavras, o ato de implica, portanto, um assentimento à pessoa de Cristo. Em outras palavras, quem aderiu às palavras de Cristo é porque já assentiu, ipso facto, a pessoa de Cristo. Em uma palavra, em Cristo inseparáveis são a pessoa e a doutrina.[4] Ele é, pois, o fundamento da nossa. O original latino, não deixa dúvida quanto a isso: “Sic igitur recte fidem Christianam habet sua voluntate assentit Christo in his quae vere ad eius doctrinam pertinent.” (“Assim, pois, aquele que possui a verdadeira fé cristã adere ao Cristo por sua vontade, naquilo que verdadeiramente pertence à doutrina de Cristo”).[5] Pe. Penido – o maior tomista brasileiro – no seu excelente tratado sobre o Mistério da Igreja, confirma a doutrina de Santo Tomás, com a seguinte exortação ao testemunho cristão:

 

Ora, a doutrina a testemunhar não é apenas teoria senão vida, e vida que consiste em aderir a outra vida: a vida pessoal de Cristo. A pessoa de Platão ou de Aristóteles, por exemplo, distingue-se de sua doutrina. Não assim Cristo: ‘Eu sou o caminho, a verdade, a vida’, diz ele (Jo 14, 6). Aderir à verdade cristã, é aderir à pessoa de Cristo, é viver de Cristo, ter em si o pensamento e o amor de Cristo.  (…) Logo, testemunhar o cristianismo não pode reduzir-se a repetir fórmulas cristãs, nem mesmo a aceitar essas fórmulas. Testemunhar, é aceitar a pessoa mesma de Cristo, entregando-se a ele, observando o que ele prescreveu.”[6]

 

1.1.2.1.1) Da Corrupção da

                                    

Há, por conseguinte, duas formas de atentar contra a retidão da fé: “Portanto, da retidão da fé cristã  podemos desviar-nos de dois modos.”[7]  Há aqueles que, por não aderirem a Cristo, não assentem, tampouco, à doutrina de cristã. É o caso dos pagãos e judeus: “De um modo, por não querer aderir ao próprio Cristo (…). E isso pertence à espécie de infidelidade dos pagãos e dos judeus.”[8] Entretanto, existem aqueles que, muito embora aderindo a Cristo, erram, contudo, assentindo a coisas que Cristo não ensinou, mas que lhes foi sugerido pela mente:

 

De outro modo, quando embora se tenha a intenção de assentir à doutrina de Cristo, erramos elegendo não o que Cristo verdadeiramente ensinou, mas o que é sugerido pela própria mente.[9]

 

O ato de fé, já nos escolásticos – e maximamente em Tomás – está tão intimamente ligado à pessoa de Cristo, que o Angélico chega a dizer que o herege que descrê, ainda que seja numa verdade de – mesmo que continue crendo em todas as outras – já não possui a virtude infusa da fé.[10] Sem embargo, desfalece nele – do hábito da fé – a sua razão formal, ou seja, a razão pela qual ele existe como tal. E a razão formal da está nisto: tomar por infalível a verdade primeira – que é a pessoa de Cristo, enquanto Deus revelado – como esta é manifestada – também infalivelmente – seja pela Sagrada Escritura, seja  pela Doutrina da Igreja. Estas, de fato, são as fontes pelas quais a verdade primeira chega até nós.[11] A adesão a elas, por conseguinte, é o que específica o hábito da fé, isto é, sem tal adesão, o dito hábito não pode subsistir[12]:

O objeto formal da fé é a verdade primeira, manifestada nas Sagradas Escrituras e na doutrina da Igreja. Por isso, aquele que não adere como a uma regra infalível e divina à doutrina da Igreja, que procede da verdade primeira revelada nas Sagradas Escrituras, não tem o hábito da fé, mas aceita as verdades da fé de modo diferente que pela fé.[13]

 

O que distingue a teologia escolástica – especialmente a tomista – da teologia protestante e católica modernista, não reside no fato de a pessoa de Cristo ser o fundamento da. De fato, tanto para Tomás como para Lutero, crer significa, antes de tudo, crer em uma pessoa.[14] O que liberta a teologia do Angélico, do subjetivismo protestante e do romantismo modernista, é o fato de que, a pessoa de Cristo, em Tomás, possui neste mundo, um pontífice supremo, que lhe faz às vezes e que fala em seu nome.[15] Sendo seu único representante, este pontífice é quem nos discrimina, por conseguinte, qual seja a sua verdadeira doutrina: “Ora, esta Cabeça é o próprio Cristo, do qual o soberano pontífice faz as vezes na Igreja.”[16]  Tanto é assim que, somente quando a Igreja universal – pela autoridade do seu Pastor Supremo – declara como de fé divinamente revelada dada verdade, é que quem a rejeita – com pertinácia – passa a cair em heresia, tornando-se herético:

 

Assim, alguns Doutores dissentiram (…) sobre certas questões pertinentes à fé, mas ainda não definidas pela Igreja. Contudo, depois de definidas pela autoridade da Igreja universal, quem pertinazmente as rejeitasse seria considerado herético. E essa autoridade, reside principalmente no Sumo Pontífice (…).[17]

 

Na teologia do Angélico, Cristo, a Sagrada Escritura, a Doutrina da Igreja e o Sumo Pontífice estão, pois, indeclinavelmente ligados. Cristo, como verdade primeira, a Sagrada Escritura e a Tradição Apostólica, como fontes da revelação da verdade primeira e o Credo da Igreja – definido e determinado pela autoridade do Sumo Pontífice – como explicação e explicitação, fiel e infalível, das fontes da Revelação (Sagrada Escritura e Sagrada Tradição), procedentes, estas por sua vez, da verdade primeira, que é precisamente Cristo. Sobre a finalidade do Magistério, declina Penido:

 

Assim, a finalidade do Magistério não é de todo revelar verdades novas, sobrepor-se à Escritura, mas tão só manifestar o sentido genuíno dessa Palavra divina, à qual a Igreja inteira – docente e discente – se submete sem restrições. (…) apresentar autenticamente a nossa fé, o seu objeto revelado.[18]


[1] Idem. Ibidem. II-II, 10, 8, C.

[2] Idem. Ibidem. II-II, 11, 1, C. Joseph Pieper. Crer, Esperar e Amar. trad. Luiz Jean Lauand. Disponível em: <http://www.hottopos.com.br/notand4/crer.htm>. Acesso em: 18/02/2007: “Quem em sentido próprio crê, aceita um conteúdo como verdadeiro, como real, pelo testemunho de alguém; assim, a razão de que eu creia em algo é que creia em alguém.”

[3] Leonel Franca. A Psicologia da Fé. p. 49.

[4] Que Cristo seja a própria Revelação de Deus e que assentir aos seus ensinamentos é aderir à sua própria pessoa Pe. Penido – o mais notável teólogo tomista brasileiro – não deixa sombra de dúvida: Maurílio Teixeira Leite Penido. Op. Cit. p. 276: “(…) O divino Mestre identifica-se à própria doutrina – ‘Eu sou a verdade’ – enquanto o sábio se distingue da sua descoberta e o filósofo do seu sistema. Tanto assim que podemos adotar uma teoria sem lhe conhecer o autor, enquanto aceitar o ensinamento de Cristo é aderir à pessoa de Cristo: a sua revelação é ele mesmo.” (O itálico é nosso).

[5] Tomás de Aquino. Suma Teológica. II-II, 11, 1, C.

[6] Maurílio Teixeira Leite Penido. Op. Cit. p. 254. Idem. Op. Cit. p. 257: “Devemos testemunhar esta santidade, fazendo resplandecer a verdadeira face de Deus e da Igreja, pela adesão à pessoa de Cristo, e a observância do que ele prescreveu.” (O itálico é nosso).

[7] Tomás de Aquino. Suma Teológica. II-II, 11, 1, C.

[8] Idem. Ibidem.

[9] Idem. Ibidem.                                                                                                                    

[10] Sobre este mesmo ponto, doutrina Pe. Penido: Maurílio Teixeira Penido. Op. Cit. p. 178: “(…) para ser herege basta haver perdido a virtude da fé, negando uma só verdade revelada, ainda que admitindo as demais.” O Próprio Aquinate não é menos claro quanto a isso: Tomás de Aquino. Suma Teológica. II-II, 5, 3, C: “O herege que descrê de um artigo de fé não tem o hábito da fé, nem da formada, nem da fé informe.”

[11] Aqui cabe um esclarecimento de primeira ordem. O fundamento da nossa, como vimos, é única e exclusivamente a autoridade de Deus.  Ele é a causa única do nosso assentimento: Idem. Ibidem. II-II, 1, 1, C: “(…) pois a fé da qual falamos não dá o seu assentimento a alguma coisa a não ser que seja revelado por Deus (…)”. Idem. Suma Contra os Gentios. I, IX, 3(53): “Ora, não cremos em verdades que excedem a capacidade da razão humana, a não ser que tenham sido reveladas por Deus.” No entanto, permanece sendo verdade que só cremos no que a Igreja afiança como verdade divinamente revelada. Sobre certas verdades contidas nas Escrituras, mas que não constam nos artigos de fé, diz Santo Tomás, que não somos obrigados a crer nelas – explicitamente salvo quando forem definidas como matéria de fé: Idem. Suma Teológica. II-II, 2, 5, C: “Quanto às outras verdades, o homem não é obrigado a crê-las explicitamente mas só implicitamente ou como predisposição de espírito para crer tudo o que está contido na Sagrada Escritura. Somente somos obrigados a crê-las explicitamente, quando nos constar que são matéria de fé.” E quem define o que é de fé divinamente revelada? (O itálico é nosso). Responde o Angélico: Idem. Ibidem. II-II, 1, 10, C: “Como já explicamos, uma nova publicação do Símbolo é necessária para evitar erros que surgem. Tem autoridade para fazê-lo quem pode determinar em última instância o que é de fé, para que todos possam a ela aderir de maneira inabalável. Isto, porém, é da alçada do Sumo Pontífice (…)”. (O itálico é nosso). Objetam os protestantes: mas, com isso, vocês não substituem a revelação pela doutrina do Magistério da Igreja? Não! Sem embargo, O Magistério da Igreja – sendo o único depositário da fé apostólica – é também o único capaz de nos discriminar, infalivelmente, o que Deus de fato revelou. Portanto, o que é por ele indicado como revelado, torna-se a condição de nosso assentimento. No entanto, a causa de crermos no que o Magistério nos propõem, não é outra senão Deus mesmo. Doutrina Penido: Maurílio Teixeira Leite Penido. Op. Cit. p. 282 e 283: “Os protestantes, ao acusarem o magistério eclesiástico de substituir-se à Revelação, confundem, pois, causa e condição. O motivo da fé católica é única e exclusivamente a palavra veraz de Deus. (…) Todavia, a fim de conhecer o que Deus disse em verdade; para não confundir palavra divina e palavra humana; para não tomar os cismas de nossa imaginação por comunicações do alto – à semelhança de protestantes e espíritas – torna-se indispensável que nos seja designado, pela Igreja, o que devemos ter como autenticamente revelado. A autoridade de Deus fundamenta a fé; a autoridade da Igreja indica qual o objeto da fé – a verdade a crer – para que seja seguro o assentimento.” (Os itálicos são nossos). Também Penido, como não poderia deixar de ser, adere a Santo Tomás dizendo que, a quem cabe, em última instância, definir o que é de fé divina, é o sucessor de Pedro: Idem. Ibidem. 342: “(…) não se mantém a fé em Deus pura e genuína por muito tempo, sem a fé em Cristo; nem a fé em Cristo, sem a fé na Igreja; nem a fé na Igreja, sem a fé no primado de Pedro.”

[12] No que diz respeito a esta verdade, também não nos falta com a clareza o Mestre: Idem. Ibidem: II-II, 5, 3, C: “E a razão disso é que a espécie de qualquer hábito depende da razão formal do objeto. Se esta desaparece, desaparece também a espécie do hábito.”

[13] Idem. Ibidem. Neste mesmo sentido, não deixa dúvidas as observações do Pe. Leonel Franca, declinando-nos os “porquês”: Leonel Franca. A Igreja, A Reforma e a Civilização. p. 240: “Quem rejeita uma só verdade contida na revelação já não tem fé. A fé é o assentimento da nossa inteligência a uma verdade, afiançada pela autoridade de Deus. Escolher dogmas é por acima da autoridade a própria razão, é crer em si, não em Deus.

[14] Joseph Pieper. Op. Cit. trad. Luiz Jean Lauand. Disponível em: <http://www.hottopos.com.br/notand4/crer.htm>. Acesso em: 18/02/2007: “Na verdade, porém, o que sempre se tem dito na grande tradição do pensamento cristão é: ‘Aquele que crê aceita o depoimento de alguém’e “A fé dirige-se sempre a uma pessoa”. Duas citações: a primeira procede de Tomás de Aquino; a segunda, de Lutero. Com isso se mostra que, seja como for, neste ponto não há divergências entre o modo de ver do reformador e o do último grande mestre da cristandade ocidental ainda não dividida.”

[15] Na expressão de Penido, a hierarquia eclesiástica – maximamente o Papa – não é algo interposto entre nós e Deus, como inquinar certos protestantes. Tal como Cristo não era uma pessoa interposta entre Deus e nós, mas era Deus conosco (Emanuel), assim a Igreja não se interpõe entre Cristo e os fiéis; antes, ela é Cristo, misticamente entre nós: Maurílio Teixeira Leite Penido. Op. Cit. p. 272: “Cristo não é pessoa interposta entre Deus e nós, pois ele é Deus pessoalmente conosco – Emanuel. Tão pouco a Igreja se intromete entre Cristo e nós, por isso que ela é Cristo misticamente conosco.” (O itálico é nosso). Penido é claríssimo ao retomar a doutrina do Mestre: Maurílio Teixeira Leite Penido. Op. Cit. p. 342: “(…) há uma tal absorção da inteligência do Papa pela luz de Cristo, que, errasse o Papa, erraria Cristo. Falando ‘ex-catedrá’, o Pontífice torna-se órgão de Cristo. Não é mais um homem que ensina, mas o Verbo encarnado que ensina pelo sucessor de Pedro.” Reclamam os protestantes: significa então que o Papa não pode errar? Que ele é um deus na terra? De todo. Como pessoa privada, o Papa permanece errático, falível – suscetível ao pecado – como qualquer fiel. Doutrina Penido: Idem. Op. Cit. p. 343: “Como pessoa privada, o Papa – qual simples fiel – tem uma alma a salvar; é obrigado a crer no dogma que ele acaba de definir; a praticar a moral que ele acaba de propor. Pode infelizmente sucumbir ao pecado.” Há mais. Mesmo quando fala como Papa, mesmo quando fala à Igreja – mesmo ainda quando fala de e de costumes – não são todas as vezes que ele goza desta assistência infalível do Espírito Santo (É evidente que o Papa é sempre assistido pelo Espírito Santo. No entanto, esta assistência nem sempre o torna infalível, lhe imunizando de eventuais erros): Idem. Op. Cit. 342: “Logo, o Papa não é infalível como pessoa privada, ou falando a uma parte da Igreja, ou falando a toda a Igreja mas sem usar a sua autoridade suprema.” Somente quando fala ex-catedra, como Pastor e Doutor universal de todos os cristãos – a respeito das verdades a crer e das ações a praticar (e costumes) a fim de se alcançar a beatitude eterna – é que ele exerce e como encontra se revestido, do seu carisma de infalibilidade, procedente este, por sua vez, da assistência do Espírito Santo. Reza o Concílio Vaticano I: Denzinger. El Magisterio de La Iglesia: Manual de los Simbolos, Definiciones y Declaraciones de la Iglesia en Materia de Fe y Costumbres. n. 1839: “Assim, pois, Nós, seguindo a tradição recolhida fielmente desde o princípio da fé cristã, para a glória de Deus nosso salvador, para exaltação da fé católica e a salvação dos povos cristãos, com aprovação do sagrado Concílio, ensinamos e definimos ser dogma divinamente revelado: Que o Romano Pontífice, quando fala ex-catedra – isto é, quando cumprindo seu cargo de pastor e doutor de todos os cristãos, define por sua suprema autoridade apostólica que uma doutrina sobre fé e costumes deve ser sustentada pela Igreja universal -, pela assistência que lhe foi prometida na pessoa do bem-aventurado Pedro, goza daquela infalibilidade de que o Redentor divino quis que estivesse provida sua Igreja nas definição da doutrina sobre a fé e os costumes; e, portanto, que as definições do Romano Pontífice são irreformáveis por si mesmas e não pelo consentimento da Igreja.” (O itálico e a tradução, para o português, são nossas). Falaciosa é ainda a alegação de que o Papa é um déspota a nos apontar a verdade e o erro, a nos ditar o bem e o mal. Não. O Papa não “revela” “novas verdades”, nem tem uma infalibilidade onímoda ou poder ilimitado. Sua autoridade restringe-se, unicamente a conservar e explicar o dado revelado. Denzinger. Op. Cit. n. 1836: “(…) Pois não foi prometido aos sucessores de Pedro o Espírito Santo para que por revelação sua manifestassem uma nova doutrina, senão para que, com sua assistência, santamente custodiasse e santamente expusesse a revelação transmitida pelos Apóstolos, ou seja, o depósito da fé.” (A tradução, para o português, é nossa).

[16] Tomás de Aquino. Suma Teológica. II-II, 39, 1, C. Vale lembrar, que atentam contra a verdade, aqueles que assacam contra a Igreja a acusação de ter tirado o primado de Cristo Cabeça, quando esta afirma que o Papa é a sua Cabeça Visível.  Com efeito, o Papa é Cabeça, mas sempre subordinado a Cristo. À bem da verdade, Cristo é a Cabeça invisível e visível da Igreja. Em outras palavras, absolutamente falando, a Igreja só possui uma Cabeça: Cristo. No entanto, Cristo mesmo quis exercer o seu governo sobre a Igreja por ele fundada, de duas formas distintas. Enquanto cabeça invisível, de forma imediata. Enquanto cabeça visível, de forma mediata, isto é, através daquele que lhe faz às vezes, qual seja, o Sumo Pontífice. À que pese os cismáticos, esta é a fé da Igreja. Já Bonifácio VIII, insurge-se contra a doutrina bicéfala: Denzinger. Op. Cit. n. 468: “A Igreja é, pois, una e única, tem um só corpo, uma só cabeça, não duas, como um monstro, ou seja, Cristo e o Vigário de Cristo, Pedro, e seu sucessor (…)”.  (A tradução, para o português, é nossa). Doutrina magistralmente Pio XII: Pio XII. Mystici Corporis Christi. n. 39. Disponível em: << http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/encyclicals/index_po.htm >>. Acesso em 19/10/2007. “Nem se objete que com o primado de jurisdição instituído na Igreja ficava o corpo místico com duas cabeças. Porque Pedro, em força do primado, não é senão vigário de Cristo, e por isso a cabeça principal deste corpo é uma só: Cristo; o qual, sem deixar de governar a Igreja misteriosamente por si mesmo, rege-a também de modo visível por meio daquele que faz as suas vezes na terra; e assim a Igreja, depois da gloriosa ascensão de Cristo ao céu não está educada só sobre ele, senão também sobre Pedro, como fundamento visível. (…).”

[17] Tomás de Aquino. Suma Teológica. II-II, 11, 2, ad 3.

[18] Maurílio Teixeira Leite Penido. Op. Cit. p. 285.

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