Uma das propriedades essenciais do matrimônio rato e consumado é a indissolubilidade. Duas são as características que devem existir para um matrimônio ser considerado indissolúvel: de um lado, o caráter sacramental (matrimônio rato) e, de outro, a consumação. Com efeito, no momento em que um destes requisitos falta, o matrimônio pode ser dissolvido. Concentrando nosso estudo na dissolução do matrimônio rato e não consumado, devemos perguntar, em primeiro lugar, o que vem a ser um matrimônio rato ou sacramental. O matrimônio rato não é nada mais que o matrimônio celebrado validamente (qualquer que seja sua forma) entre pessoas batizadas, tanto católicas como não-católicas.
Cânon 1141: O matrimônio rato e consumado não pode ser dissolvido por nenhum poder humano, nem por nenhuma causa além da morte.
Portanto, a ausência da consumação é o que fundamentará este estudo: a dissolução do matrimônio não consumado por dispensa, conhecida comumente como “dispensa super rato“. Apesar da denominação, não de trata de autêntica dispensa e, ademais, pode-se dar a dissolução de um matrimônio rato e não consumado no caso em que o vínculo conjugal não seja sacramental. Expliquemos o porquê destas afirmações:
(1) Não se trata de dispensa, entendida esta conforme o cânon 85, como relaxamento da norma. Na dispensa super rato não se relaxa a norma da indissolubilidade do matrimônio, mas desaparece o matrimônio em si (o vínculo conjugal). Trata-se de uma dispensa ad casum, que atua por via da graça e não da justiça, podendo o Romano Pontífice negar a sua concessão, inclusive quando certos os extremos alegados;
(2) A dispensa de matrimônio rato e não consumado pode aplicar-se tanto ao matrimônio entre batizados, como ao matrimônio entre uma parte batizada e outra não batizada. Portanto, não há dispensa, nem aplicação exclusiva ao matrimônio sacramental.
Esta possível dissolução é reconhecida no cânon 1142:
Cânon 1142: O matrimônio não consumado entre batizados, ou entre parte batizada e parte não batizada, pode ser dissolvido pelo Romano Pontífice, a pedido de ambas as partes ou de uma delas, ainda que a outra se oponha.
Matrimônios aos quais pode ser aplicada a dispensa super ratio
Como já adiantamos, dois são os tipos de matrimônio que podem ser dissolvidos através deste tipo de dispensa:
1. Matrimônio entre dois batizados: o batismo recebido pode ser tanto católico como não-católico.
Simultaneamente existem duas possibilidades dentro desta suposição:
(a) Que os cônjuges sejam batizados no momento de contrair matrimônio (clara suposição de matrimônio rato desde o princípio).
(b) Que os dois cônjuges não sejam batizados no momento da celebração do matrimônio, sendo só posteriormente batizados (nesta última suposição, será necessária a inconsumação até a recepção do batismo).
2. Matrimônio entre batizado e não-batizado: da mesma forma que no caso anterior, a parte batizada poderá ser tanto católica como não-católica.
Existem aqui também duas modalidades:
(a) Quando no momento de contrair matrimônio um dos cônjuges já tinha recebido o batismo;
(b) Quando ambos os contraentes não eram batizados no momento de contrair matrimônio, recebendo um deles, posteriormente à celebração das núpcias, o batismo, sem que até então tenha havido cópula conjugal.
Disso tudo, podemos concluir os casos em que não se poderá aplicar essa dispensa:
(a) Matrimônio sacramental consumado;
(b) Matrimônio entre não-batizados (matrimônio não-sacramental);
(c) Matrimônio nulo.
Requisitos para a aplicação da dispensa super rato
Quatro são os requisitos exigidos explicitamente pelo cânon 1142 para que seja possível este tipo de dissolução:
1º – Matrimônio válido;
2º – O batismo de, pelo menos, um dos cônjuges;
3º – A inconsumação do matrimônio;
4º – A justa causa.
O matrimônio não estará consumado se não se produziu a cópula conjugal a partir do momento da válidade celebração do mesmo (ou, então, a partir do momento da recepção do batismo). A cópula perfeita, que implica na consumação do matrimônio, consiste na realização, de modo humano, do ato conjugal apto a, por si, gerar prole. Portanto, não se entenderá consumado o matrimônio quando inexiste algum tipo de relação carnal, ou quando a cópula praticada não é suficiente; tampouco quando ocorreu de uma forma que não pode ser considerada humana. No que diz respeito à prova da inconsumação, remetemos o estudioso às Litterae circulares “De proceso super matrimonio rato et non consummato”, de 20 de dezembro de 1986.
O quarto requisito necessário para a aplicação da dispensa super rato é a justa causa, que também será objeto de investigação ao longo do procedimento que precede à dispensa. A justa causa não constitui um requisito novo, vez que já era exigida pelos cânones 1119 e 1975 do Código de 1917. Na codificação atual, é referida nos cânones 1142 e 1698.
Dentro da doutrina canônica, Gasparri cita os seguintes exemplos de justa causa:
1. Dissociação de ânimos sem esperança de reconciliação (aversão entre os cônjuges);
2. Temor de um provável escândalo futuro (incluídas as “rixas” entre as famílias dos cônjuges);
3. Provável suspeita de impotência;
4. Matrimônio civil de uma das partes;
5. Indício da falta de consentimento ou de outro impedimento dirimente;
6. Possibilidade de contrair enfermidade contagiosa;
7. Periculum perversionis moralis;
8. Ter contraído matrimônio;
9. Pedido de dispensa de ambos os esposos.
Em determinadas ocasiões são váras as causas que ocorrem para a concessão da dispensa; concretamente, há uma sentença – “coram TeodoriI” – que afirma que quando são várias as causas concorrentes “dispensatio facilius obtinetur” (Dec. 33-34, 1942, 340, nº 4 in fine.).
Fonte: Es.Catholic.Net. Tradução: Carlos Martins Nabeto.