Educar para poder instruir

Educação pode ser sinônimo de instrução. Pode também dizer respeito a boas maneiras e à preparação para a vida em sociedade. Esta ambiguidade faz que seja cada vez mais comum um grave erro, com que sofrem os professores; espera-se que quem tem o dever de instruir a criança cumpra o dever dos pais de prepará-la para a vida em sociedade.

Ora, preparar para a vida na sociedade – de que a escola faz parte – significa, em última instância, aprender a ceder. Aprender a ouvir “não”, até que não seja sequer necessário ouvi-lo. Quero trocar de carro; minha conta bancária diz “não”. Quero andar de bicicleta; meus joelhos bichados gritam “não”. Quero ler Confúcio no original; minha ignorância do chinês ri “não”.

Compete aos pais acostumar os filhos a este simples fato da vida: “sim” é a exceção, e “não” é a regra. Assim se pode cultivar os bons hábitos e coibir os maus, até que o jovem seja capaz de fazê-lo por conta própria.

O papel da escola é outro, e para que seja possível cumpri-lo o aluno deve vir educado de casa. Aos professores compete instruir: treinar a mente do aluno no uso da razão, apresentar-lhe os fatos e ferramentas da nossa civilização. Para isso, o aluno deve já ser capaz de comportar-se em sociedade, deve ter já a expectativa do “não” que o faz educado. A educação é pré-requisito da instrução.

Sem aquela, esta sofre. Não é por acaso que hoje 38% dos universitários sejam analfabetos funcionais; passaram pelos bancos escolares, mas não foram instruídos por não terem trazido de casa aquilo que possibilitaria que o fossem. O sistema escolar se vê impossibilitado de cumprir sua missão e transformado em uma espécie de guarda-móveis onde os pais se livram por algumas horas diárias dos pequenos tiranos que, por falta de educação, têm em casa.

Ao cabo de tantos anos, um diploma atesta uma instrução inexistente. Concluído o ensino médio, a entrada na universidade é quase garantida, facultada que é por tudo, menos pelo grau real de instrução. O professor universitário que queira instruir seus alunos já sabe que não farão mais que ler, protestando, uma cópia de um ou dois capítulos de cada livro, no mais das vezes sem entender o que leram. Ao fim do curso, outro diploma quase garantido os aguarda.

É um processo que só tem vítimas: os pais, que têm tiranos em casa; os professores, que não conseguem instruir quem não foi educado; o Brasil, que se vê coalhado de diplomados e desprovido de instruídos. E assim ficamos nas mãos dos demagogos da política e do consumo.

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