José Luís de Jesús Miranda e a seita “Crescendo em Graça”

INTRODUÇÃO

“Porque virão muitos usurpando o meu nome, dizendo: ‘Eu sou o Cristo’, e enganarão a muitos” (Mateus 24,5)

Desde o momento em que Lutero proclamou a livre interpretação da Bíblia, surgiu toda espécie de movimentos sectários interpretando a Bíblia a seu modo particular e pregando toda gama de doutrinas. Na minha opinião, um dos mais surpreendentes movimentos é a seita “Crescendo em Graça”, fundada por José Luís de Jesús Miranda, sendo que em seu currículum verifica-se: dependente de heroína, delinquente, presidiário, pregador pentecostal e pastor batista “semeador de igrejas” (isso tudo ele reconhece no seu “testemunho”).

Porém, ao que parece, sua “fulgurante” carreira não poderia parar aí. E o que pensaria vocês se algum conhecido se autoproclamasse a encarnação do Apóstolo Paulo (ano 1998)? Porém, como ser o Apóstolo não lhe fosse o suficiente, que tal se autodeclarasse Jesus Cristo Homem (ano 2005)? E que tal, por último, tornar-se a Besta e Anticristo (ano 2007), levando seus seguidores a tatuar a marca da besta (666)?

Contudo, o que mais assombra não é o fato de alguém estar pregando tais loucuras, mas sim o fato de existir quem creia nelas. Conheci um, por exemplo, que há anos pregou umas certas “21 Teses da Verdadeira Doutrina Cristã” e apenas convenceu a sua devota esposa e um outro pobre coitado. Mas este não é o caso do “Ministério Internacional Crescendo em Graça”, que começou como uma pequena comunidade evangélica e evoluiu para uma seita que compreende atualmente mais de 300 congregações em 13 países do mundo, um canal de televisão que transmite 24 horas por dia, mais de 250 programas de rádio e acima de 100 mil seguidores que louvam e proclamam José Luís como “o Rei dos reis”, “a Besta”, “Jesus Cristo Homem”, “o Paizinho” e por aí vai.

Como pode tanta gente acreditar nesta personagem que se autoproclama Jesus Cristo? É algo difícil de se acreditar. Creio, assim, ser oportuno fazer um resumo das doutrinas que este grupo sectário prega e alguns dos argumentos que podemos usar caso encontremos pela frente algum de seus membros.

JESUS CRISTO HOMEM?

José Luís de Jesús Miranda narra que na noite de 17 de dezembro de 1973 teve uma visão onde observou com clareza dois imensos homens vestidos de branco que rodeavam a sua cama… ‘O Rei dos reis e Senhor dos senhores virá esta noite para ungir-te para o ministério’, disseram os dois seres simultaneamente.

Logo após este anúncio, diz que uma figura extraterrestre começou a emergir da luz… Aquela criatura surrealista era o próprio Deus… A criatura continuou flutuando em sua direção, até que entrou em seu interior e se fundiu com o seu espírito… Na manhã seguinte, despertou em sua própria cama, em seu próprio quarto… Porém, ele já não era ele mesmo! Jesus Cristo havia retornado!

O certo é que esta versão maluca da segunda vinda de Cristo não coincide absolutamente com o que o próprio Jesus e os Apóstolos pregaram em seu tempo:

“Aparecerá, então, no céu, o sinal do Filho do Homem. Então todas as tribos da terra baterão no peito e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com grande poder e glória” (Mateus 24,30).  

“Jesus respondeu: ‘Tu o disseste. Além disso, eu vos digo que de agora em diante vereis o Filho do Homem sentado à direita do Todo-Poderoso, vindo nas nuvens do céu'” (Mateus 26,64).  

“Então verão o Filho do Homem vindo nas nuvens com grande poder e glória” (Marcos 13,26).  

“Jesus respondeu: ‘Eu sou. E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Todo-Poderoso, vindo com as nuvens do céu’? (Marcos 14,62).  

“…Homens da Galiléia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu? Esse Jesus que, do meio de vós, foi elevado ao céu, virá assim, do mesmo modo como o vistes partir para o céu? (Atos 1,11).  

“Vede! Ele vem com as nuvens, e todo olho o verá…” (Apocalipse 1,7).  

“Eis o que temos a vos dizer, de acordo com a palavra do Senhor: nós, os vivos, que ficarmos em vida até a vinda do Senhor, não passaremos à frente dos que tiverem morrido. Pois o Senhor mesmo, à voz do arcanjo e ao som da trombeta de Deus, descerá do céu. E então ressuscitarão, em primeiro lugar, os que morreram em Cristo; depois, nós, os vivos, que ainda estivermos em vida, seremos arrebatados, junto com eles, sobre as nuvens, ao encontro do Senhor, nos ares. E, assim, estaremos sempre com o Senhor. Reconfortai-vos, pois, uns aos outros com estas palavras” (1Tessalonicenses 4,15-18).   

Contudo, neste caso em específico, acaso todo olho viu [José Luís] descer do céu ao som da trombeta de Deus? Os mortos ressuscitaram e alguém foi arrebatado às nuvens ao encontro do Senhor?

BESTA, ANTICRISTO, 666?

Como se isso já não bastasse, no dia 21 de janeiro de 2007, durante uma pregação ao vivo pela Internet, logo após ler Apocalipse 13,16-18, reconheceu por si mesmo ser a Besta, o Anticristo, e mostrou sua tatuagem “666” em seu braço. Seguindo o seu exemplo, seus seguidores também tatuaram o “666”, assinalando que tal não é satânico, pois o mal e o pecado não existem. Ainda inscreveram em si as letras “SSS” (=Seiscentos e Sessenta e Seis), que significariam “Salvo sempre Salvo” numa interpretação literal do texto bíblico, embora este tenha sido escrito originalmente em grego. Quanto a isto, em seu “testemunho” diz:

“Pronto está a questão do 666. Durante anos este número provocou temores e pertubações. No Apocalipse, o Apóstolo João declara que o 666 é o número de seu nome. O ‘nome’, no sentido bíblico da palavra, tem a ver com diversos aspectos relacionados a uma pessoa. Neste caso, não é difícil imaginar que o ‘número de seu nome’ poderia muito bem revelar pistas acerca do lugar e da data em que essa ‘besta’ apareceria”.

A razão evidente do porquê até agora ninguém o tinha associado com o Anticristo ou a Besta e muito menos ter se tatuado com o 666 é que o Apocalipse não enxerga estas figuras como personagens benignos:

“Filhinhos, esta é a última hora. Ouvistes dizer que o Anticristo virá. Com efeito, muitos anticristos já se apresentaram ? por isso, sabemos que chegou a última hora. Eles saíram do nosso meio, mas não eram dos nossos, pois se fossem realmente dos nossos, teriam permanecido conosco. Mas precisava ficar claro que eles todos não são dos nossos. Vós recebestes a unção do Santo, e todos vós tendes conhecimento. Se eu vos escrevi, não é porque ignorais a verdade, mas porque a conheceis, e porque mentira alguma provém da verdade. Ora, quem é mentiroso, senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? Este é o Anticristo: aquele que nega o Pai e o Filho” (1João 2,18-22).   

“Adoraram o Dragão, porque tinha entregue o poder à Fera. E adoraram a Fera, dizendo: ‘Quem é igual à Fera? Quem pode lutar contra ela?’ A Fera recebeu uma boca para proferir arrogância e blasfêmias. Recebeu também poder para agir durante quarenta e dois meses. Então abriu a boca em blasfêmias contra Deus, blasfemando contra o seu nome e a sua Morada e contra os que moram no céu. Foi-lhe permitido combater contra os santos e vencê-los, e recebeu poder sobre toda tribo, povo, língua e nação” (Apocalipse 13,4-7).   

Neste sentido, também todo o capítulo 14:

“E um terceiro anjo os acompanhava, clamando em alta voz: ‘Se alguém adora a Fera e sua estátua e recebe sua marca na fronte ou na mão, esse vai beber também o vinho do furor de Deus, servido sem mistura na taça da sua ira. Será atormentado com fogo e enxofre diante dos santos anjos e do Cordeiro. A fumaça do seu tormento subirá para sempre, e, dia e noite, não terão descanso aqueles que adoram a Fera e sua estátua, e quem quer que leve a marca com o seu nome'” (Apocalipse 14,9-11).   

Torna-se evidente, nesses textos, a diferença entre a Besta e o Cordeiro, fora as desagradáveis consequências daqueles que se tatuaram com a marca da Besta.

Mais adiante, a história não acaba nada bem para a Besta e para aqueles que ostentam a sua marca:

“Vi então a Fera reunida com os reis da terra e seus exércitos, para combater contra o Cavaleiro e seu exército” (Apocalipse 19,19).  

“A Fera, porém, foi aprisionada, junto com o falso profeta, que realizava milagres a seu serviço, seduzindo todos os que haviam recebido a marca da fera e adorado a sua estátua. Ambos foram lançados vivos no lago de fogo com enxofre ardente” (Apocalipse 19,20).  

“Vi então tronos, e os seus ocupantes sentaram-se e receberam o poder de julgar. Vi também aqueles que foram decapitados por causa do Testemunho de Jesus e da Palavra de Deus e os que não tinham adorado a fera, nem a sua estátua, nem tinham recebido na fronte ou na mão a marca da fera. Eles voltaram a viver, para reinarem com Cristo durante mil anos” (Apocalipse 20,4).  

“O Diabo, que tinha seduzido a todas elas, foi atirado no lago de fogo e enxofre, onde já se achavam a Fera e o falso profeta. Lá eles serão atormentados noite e dia, por toda a eternidade” (Apocalipse 20,10).  

É óbvio que este senhor não é Jesus Cristo e ainda que pudesse muito bem ser qualificado como “besta”, não é tampouco a Besta sobre a qual tratam estes textos bíblicos; até porque desta última se diz:

“Ela realiza grandes milagres, até mesmo o de fazer descer fogo do céu sobre a terra à vista de todos. Por causa do poder de fazer esses milagres, ela consegue seduzir os habitantes da terra” (Apocalipse 13,12).  

Ora, este indivíduo simplesmente nunca fez nada. Quando foi pedido a este senhor que fizesse algum milagre ou apresentasse algum sinal, respondeu: “O maior milagre sou eu”.

O PECADO NÃO EXISTE?

Em um conjunto de estudos bíblicos bem seleto que publicaram, fazem uso de diversos textos bíblicos fora do contexto para afirmar que o pecado foi eliminado e já não mais existe. Entre eles, citam: Zacarias 3,9: “…naquele dia, tirarei da terra a iniquidade”; Jeremias 31,34: “…porque perdoarei suas maldades e não farei mais caso de seus pecados”; Hebreus 9,26: “Mas foi agora, na plenitude dos tempos, que, uma vez por todas, ele se manifestou para destruir o pecado pela imolação de si mesmo”.

Mas esses textos referem-se ao perdão do pecado, o que é bem diferente da destruição definitiva do pecado; o pecado existirá sempre que nós, neste mundo, pudermos desobedecer a Deus.

Os textos da Escritura que fazem referência ao pecado são bastante abundantes para que possamos comentá-los todos. Poderíamos apenas mencionar:

“Se dissermos que não temos pecado, estamos enganando a nós mesmos, e a verdade não está em nós. Se reconhecemos nossos pecados, então Deus se mostra fiel e justo, para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça. Se dissermos que nunca pecamos, fazemos dele um mentiroso e sua palavra não está em nós” (1João 1,8-10).   

“Se teu olho direito te leva à queda, arranca-o e joga para longe de ti! De fato, é melhor perderes um de teus membros do que todo o corpo ser lançado ao inferno” (Mateus 5,29).  

“Como insistissem em perguntar, Jesus ergueu-se e disse: ‘Quem dentre vós não tiver pecado, atire a primeira pedra!'” (João 8,7).

“De fato, já denunciamos que todos, judeus e gregos, estão sob o domínio do pecado, como está escrito: ‘Não há justo, nem mesmo um só'” (Romanos 3,10).  

“Quem, pois, sabe fazer o bem e não o faz é réu de pecado” (Tiago 4,17).  

“Vós ainda não resististes até ao sangue, na vossa luta contra o pecado” (Hebreus 12,4)  

Os textos em que Paulo diz que morremos para o pecado dizem respeito ao fato de que a graça [de Deus] nos dá os meios para que este não nos domine; contudo, não significam que já não podemos pecar e, muito menos, que o pecado deixou de existir. Porém, para eles, quando São Paulo emprega o termo “pecado”, não o faz para se referir a uma desobediência a Deus mas simplesmente a um “errar o alvo”, o que na verdade é uma afirmação totalmente gratuita.

O DIABO JÁ NÃO EXISTE PORQUE FOI DESTRUÍDO?

Outra de suas afirmações é a de que o Diabo foi destruído e não mais existe; para isto, citam Hebreus 2,14: “Como os filhos têm em comum a carne e o sangue, também Jesus participou da mesma condição, para destruir, com a sua morte, aquele que tinha o poder da morte, isto é, o diabo”. Contudo a destruição de que se fala aqui não é um aniquilação literal, mas uma referência à vitória de Cristo sobre Satanás mediante seu sacrifício. As referências ao Diabo na Escritura são também abundantes (e não como um ser destruído):

“Revesti-vos da armadura de Deus, para que possais resistir às ciladas do diabo” (Efésios 6,11).  

“Ora, não convém que o servo do Senhor viva discutindo, mas que seja manso para com todos, pronto para ensinar, paciente. Com brandura, ele deve instruir os opositores, na esperança de que Deus lhes dê a graça da conversão. Assim para que conhecerão a verdade e voltarão à sensatez, livrando-se do laço do diabo que os apanhou e sujeitou à sua vontade” (2Timóteo 2,24-26).   

“Submetei-vos pois a Deus, mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” (tiago 4,7).  

“Sede sóbrios e vigilantes. O vosso adversário, o diabo, anda em derredor como um leão que ruge, procurando a quem devorar” (1Pedro 5,8).  

“Não tenhas medo dos sofrimentos que vais passar. O diabo lançará alguns dentre vós na prisão. Assim sereis colocados à prova. Tereis uma tribulação de dez dias. Sê fiel até à morte, e eu te darei a coroa da vida” (Apocalipse 2,10).  

“Assim foi expulso o grande Dragão, a antiga Serpente, que é chamado Diabo e Satanás, o sedutor do mundo inteiro. Ele foi expulso para a terra, e os seus anjos foram expulsos com ele” (Apocalipse 12,9).  

“Por isso, alegra-te, ó céu, e todos os que nele habitais. Mas ai da terra e do mar, porque o Diabo desceu para o meio de vós e está cheio de grande furor; pois sabe que lhe resta pouco tempo” (Apocalipse 12,12).  

OUTRAS DOUTRINAS

Entre outras de suas disparatadas doutrinas, encontram-se: a de que Adão era o Diabo; classificam a doutrina da Trindade como antibíblica e professam-se Modalistas (afirmando que Deus se manifestou de três formas diferentes, não havendo portanto Três Pessoas divinas); crêem na preexistência das pessoas como anjos, além de algumas outras doutrinas malucas que nem vale a pena mencionar…

O QUE PODEMOS FAZER?

O que coloca em evidência estes fatos é a nossa profunda ignorância em matéria religiosa e social. Já é grave quando alguém de outra religião questiona um católico e este, muitas vezes, não sabe o quê dizer, fica nervoso ou, inclusive, começa a duvidar da sua fé; porém, muito mais grave é alguém, em pleno século XXI, proclamar-se Deus e atrair as massas.

É hora de acordar, começar a levar a sério a própria fé. Não podemos continuar sendo “católicos de verniz”. Deve começar agora mesmo a trabalhar e evangelizar, porque milhões de pessoas encontram-se vuneráveis a qualquer sopro de doutrina e abandonam a Igreja diariamente. Não se deve esquecer tampouco a Apologética, tão desprezada hoje em dia – em tese, em razão do Ecumenismo – sendo que este e a Apologética são duas faces de uma mesma moeda.

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