Leitor protestante acusa-nos de “preconceito” com relação ao Protestantismo

Caro amigo, gosto de consultar esse site, porém vejo que vocês generalizam no que tange à fé reformada. Não seria isso preconceito religioso? Comparar os neopentecostais com os históricos, isso é tendencioso ou falta de conhecimento histórico e teológico, ainda mais quando vocês denominam protestantes os mórmons e as Testemunhas de Jeová… (Eduardo)

Prezado Eduardo,

A paz de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.

Agradecemos pelo contato e ficamos felizes em saber que você nos consulta com freqüência. Pedimos a Deus para que a leitura dos nossos artigos contribua para que você compreenda cada vez melhor a fé católica.

Quanto à sua mensagem, de fato, entre as inúmeras denominações protestantes, umas são mais sérias e mais dignas de respeito do que outras. Não obstante, todos os grupos cristãos não-católicos têm algo em comum: baseiam-se, todos eles, em uma interpretação particular da Escritura Sagrada. Os luteranos, como o próprio nome já diz, seguem as diretrizes de Martinho Lutero; os calvinistas, as de João Calvino; os presbiterianos, as de Calvino e de John Knox; os adventistas do sétimo dia, as de Ellen White; as testemunhas de Jeová, as de Charles T. Russell; e assim sucessivamente. Todos esses grupos, em maior ou menor grau, rejeitam a autoridade e a tradição católicas, preferindo seguir seus fundadores (e eventuais sucessores).

Você provavelmente retrucará: mas o que, afinal, faz a interpretação católica ser mais verdadeira — ou melhor, a única verdadeira — em comparação com as demais? De onde vem essa “pretensão” da Igreja Católica? Ora, historicamente, essa “pretensão” remonta a Cristo e aos Apóstolos. Trata-se, aqui, de um fato histórico, contra o qual não há o que objetar. Mas não é só do ponto de vista histórico que a Igreja Católica tem preeminência sobre as demais denominações cristãs. E nesse momento peço que acompanhe com atenção o raciocínio a seguir.

De um modo geral, o protestantismo baseia-se na idéia de que qualquer indivíduo, em sã consciência, é capaz de apreender a verdade cristã mediante a leitura direta (isto é, sem nenhuma mediação) da Bíblia, com o auxílio do Espírito Santo. Em outras palavras, de acordo com o protestantismo, todo cristão não só pode como deve estudar, ele mesmo, a Escritura Sagrada, a fim de que, com o auxílio do Espírito Santo, compreenda tudo aquilo que é necessário para a salvação de sua alma. E ressalte-se que, para essa compreensão, a textos extra-bíblicos (como, por exemplo, os escritos patrísticos, resoluções dos primeiros Concílios Ecumênicos e textos dos próceres da Reforma, como Lutero e Calvino) podem até ajudar, mas são absolutamente dispensáveis. Tudo está na Bíblia, eis o que preceitua o fundamental princípio protestante do Sola Scriptura.

Agora, eu lhe pergunto: como pode ser verdadeira essa norma eminentemente protestante, se essa mesma norma deu origem a dezenas ou centenas de denominações ou “igrejas” cristãs? Em outras palavras, como é possível que a leitura da mesma Bíblia, sob o auxílio do mesmo Espírito Santo, tenha dado origem a interpretações tão variadas?

Pode-se replicar esse questionamento argumentando-se que, embora haja muitas divergências entre as muitas confissões cristãs, existe um núcleo que é comum a todas as denominações. Desse núcleo fariam parte, por exemplo, a natureza trinitária de Deus e a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo (embora as Testemunhas de Jeová, que se consideram cristãs e que também seguem a Bíblia — como uma tradução diferente da usual, a bem da verdade — rejeitem esses dois dogmas). Todavia, há que se perguntar: como podemos saber se esse núcleo, essa espécie de “mínimo denominador comum” doutrinário, representa tudo que os cristãos necessitam saber e seguir a fim de alcançar a salvação? Será que, ao nos limitarmos a esse substrato comum a todas as confissões cristãs (se é que podemos saber, com um mínimo de precisão, em que consiste tal substrato), não corremos o sério risco de deixarmos de lado elementos da revelação cristã fundamentais para o nosso destino eterno? Será que, assim fazendo, não estaríamos desprezando tesouros nos quais a Igreja sempre creu e que foram confiados por Nosso Senhor Jesus Cristo aos Apóstolos e aos primeiros cristãos?

E mais: a quem caberia, no fim das contas, determinar esse “mínimo denominador comum”? A que igreja(s)? A que “organismo ecumênico”? Ou tal tarefa ficaria a cargo de cada cristão individualmente? Mas já vimos que esse primado da individualidade, tipicamente protestante, necessariamente conduz a interpretações as mais díspares e variáveis!

Pelo exposto, uma conclusão se impõe: sem a existência de uma instância objetiva, ou seja, sem uma instância que esteja acima e além dos indivíduos e das interpretações individuais, torna-se literalmente impossível conhecermos a verdade cristã tal como ela foi revelada por Nosso Senhor Jesus Cristo e tal como Ele quis que a conhecêssemos e seguíssemos, para além das nossas opiniões e interpretações individuais. E aqui já podemos vislumbrar a singularidade da fé católica face às demais confissões cristãs, especialmente no que diz respeito à veracidade doutrinária. Com efeito, foi precisamente para que a verdade acerca de Revelação cristã não ficasse à mercê dos gostos, das opiniões e das interpretações individuais (ou subjetivas) que Nosso Senhor Jesus Cristo escolheu doze Apóstolos, aos quais incumbiu da insigne missão de guiar a Igreja, e isso sob a chefia do Apóstolo S. Pedro. Como os Doze não poderiam estar para sempre entre nós, e para que a Igreja não ficasse acéfala (isto é, sem uma chefia visível), fez-se necessária a legítima sucessão apostólica, constituindo-se assim o Magistério da Igreja, o qual garante a ortodoxia cristã, sob a infalível assistência do Espírito Santo.

Em suma: somente na Igreja Católica Apostólica Romana, com sua diversidade de ritos e de movimentos e ordens religiosas (cada qual com ênfases e carismas específicos), pode-se encontrar unidade e objetividade doutrinárias, as quais é impossível encontrar entre os protestantes, por mais sérios e piedosos que sejam.

Na esperança de que você possa compreender a radical diferença entre a Igreja Católica e as demais confissões cristãs, despeço-me desejando-lhe graça e paz da parte de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
Marcos M. Grillo

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