Um querido protestante nos enviou o questionamento abaixo (grafado em preto) acerca do catolicismo. Em azul, segue a nossa resposta.
No amor não há medo antes o perfeito amor lança fora o medo; porque o medo envolve castigo; e quem tem medo não está aperfeiçoado no amor.”
O Deus católico é um Deus exclusivista, não inclusivista. É um Deus implacável, que precisar ser “amansado” pelos santos e por Maria. É um Deus que não ama incondicionalmente, mas que condiciona o Seu amor ao cumprimento de determinadas exigências. É um Deus do medo, mais do que do amor.
Caro M., começo esta resposta com uma pergunta bastante direta: de onde foi que você tirou esta afirmação acima? Como em outras oportunidades eu já pude te dizer, o catolicismo é objetivo, e doutrina católica é aquilo, e somente aquilo, que a Igreja ensina.
E, em nenhum momento, a Igreja ensina que Deus é “exclusivista”, “implacável”, “amansável”, ou qualquer outro adjetivo neste sentido. Ao contrário, a Doutrina bimilenar da Igreja é bastante diversa. Veja-se, por exemplo, o que diz o Catecismo da Igreja Católica acerca dos protestantes:
“Os que hoje em dia nascem em comunidades (protestantes) que surgiram de tais rupturas ‘e estão imbuídos da fé em Cristo não podem ser argüídos de pecado de separação , e a Igreja católica os abraça com fraterna reverência e amor… Justificados pela fé recebida no batismo, estão incorporados em Cristo (…)
O Espírito Santo serve-se destas igrejas e comunidades eclesiais como meio de salvação cuja força vem da plenitude de graça que Cristo confiou à Igreja Católica.” (CIC §§ 818-819)
Com relação à afirmação de que o “Deus católico é exclusivista”, há um comentário bastante oportuno que eu gostaria de fazer. Segundo o catolicismo, em princípio, a Igreja é, sim, necessária à salvação. “Fora da Igreja, não há salvação”, é a fé dos cristãos desde os primórdios do cristianismo. No entanto, segundo este mesmo catolicismo, quem, não conhecendo a Deus e à Sua Igreja, sem culpa a ela não adere, pode, da mesma forma salvar-se. Esta pessoa, que vive em uma ignorância invencível, seguindo a Lei Natural que Deus colocou nos corações de todos os homens, acaba por fazer parte do Corpo Místico de Cristo.
Portanto, se a afirmação de que “fora da Igreja não há salvação” soa como uma fé “exclusivista”, é necessário que reconhecemos que a definição do que seja “Igreja” para estes fins é bastante elástica. E, portanto, “inclusivista”.
Passemos, agora, ao protestantismo. Caro M., se você ainda não o notou, o protestantismo é a mais exclusivista de todas as religiões. Ora, o segmento protestante que mais cresce afirma, com todas as letras, que ou a pessoa “reconhece Jesus como seu Salvador” e ganha o Reino dos Céus, ou não o reconhece e vai para o inferno.
Nesta teologia rastaqüera, não há, sequer, espaço para a dúvida invencível. Não importa que o indivíduo jamais tenha ouvido falar em Jesus Cristo; não importa que ele jamais O tenha conhecido. Não fez a profissão de fé, aceitando-O, não se salva. E ponto final! Ou seja, fora da aceitação de Jesus como Salvador pessoal não há salvação!
Nesta teologia rastaqüera, um ocidental, pelo simples fato de ser ocidental, tem muito mais chances de se salvar do que um pobre habitante da Ásia central, pelo simples fato de este íltimo morar longe dos círculos cristãos.
E que dizer, então, das igrejas protestantes que aceitam a balela da predestinação? O que pode ser mais exclusivista do que a predestinação dos justos e dos injustos? Para esta outra teologia (tão ou mais rastaqüera que a primeira) Deus já decidiu, antes de todos os tempos, quem se salva e quem não se salva. E não há nada que possamos fazer a respeito, pelo que até esta troca de mensagens entre nós é uma solene perda de tempo. Afinal, fora da eleição de Deus não há salvação! E, novamente, não há espaço, sequer, para qualquer dúvida invencível.
O catolicismo fez reviver, no cristianismo, o farisaísmo que Cristo tanto criticou. Em nome da “verdade” e da “sã doutrina”, transformou a mensagem de vida e liberdade de Cristo num legalismo insensível. Os versículos abaixo são insofismáveis:
“Onde está logo a jactância? Foi excluída. Por que lei? Das obras? Não; mas pela lei da fé.” (Romanos 3, 27)
“Pois Cristo é o fim da lei para justificar a todo aquele que crê.” (Romanos 10, 4)
“Sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, mas sim, pela fé em Cristo Jesus, temos também crido em Cristo Jesus para sermos justificados pela fé em Cristo, e não por obras da lei; pois por obras da lei nenhuma carne será justificada.” (Gálatas 2, 16)
“É evidente que pela lei ninguém é justificado diante de Deus, porque: O justo viverá da fé.” (Gálatas 3, 11)
“Pois toda a lei se cumpre numa só palavra, a saber: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo.” (Gálatas 5, 14)
“Porque não recebestes o espírito de escravidão, para outra vez estardes com temor, mas recebestes o espírito de adoção, pelo qual clamamos: Aba, Pai!” (Romanos 8, 15)
“Para a liberdade Cristo nos libertou; permanecei, pois, firmes e não vos dobreis novamente a um jogo de escravidão.” (Gálatas 5, 1)
Na análise destes textos “insofismáveis” você comete um equívoco bastante comum entre os protestantes. Aliás, pode-se dizer que este equívoco é a mãe de todo o protestantismo, e, se o Espírito Santo realmente ajudasse todos os crentes quando os mesmos lêem a Bíblia, o protestantismo sequer chegaria a ter tido existência.
Basicamente, você confunde “obras da Lei Mosaica” ( de que falam todos os versículos acima) com obras de caridade, necessárias e essenciais à salvação (de que nos fala a epístola de São Tiago). Ora, meu caro M., a Igreja jamais ensinou que as obras da lei mosaica são necessárias à salvação dos cristãos. Os fariseus o ensinavam, mas o catolicismo jamais o ensinou.
Aliás, se você me permite uma pequena observação, a desnecessidade de tais obras foi definida, solenemente, pelo primeiro Papa, no primeiro Concílio Ecumênico da História, narrado em At 15.
Pode-se, portanto, afirmar que a desnecessidade da lei mosaica é o primeiro dos dogmas católicos. Dogma este seguido por todos os protestantes de todos os tempos, mas que (gostem eles disto ou não) só goza da solidez que o caracteriza devido à hierarquia da Igreja que o defendeu contra os primeiros hereges judaizantes.
Viu como é injusta a tua acusação?
O catolicismo jactancia-se de sua catolicidade (universalidade) mas, na realidade, tem pouco de universalista, posto que exige que todas as culturas, povos e raças submetam-se aos padrões da religião de Roma. Em outras palavras, o catolicismo seria universalista como o antigo Império Romano, em seu ímpeto dominador, o fora. Aliás, ambos, o Império Romano e a Igreja católica, têm sua sede em Roma.
O catolicismo é universalista porque destinado às pessoas de todos os povos. A Igreja católica é a única instituição religiosa firmemente estabelecida em todos os continentes; é a única que agrega homens de todas as culturas e línguas; é a única que, desde o seu princípio, não tem a sua geografia estabilizada. Ela sempre avança, e, mesmo nestes tempos difíceis, tem assistido um notável crescimento em lugares tão díspares quanto os EUA e a África.
Eis porque Santo Agostinho já dizia que, quando os adversários da Igreja a chamam de Católica, sem o perceberem, estão confessando a sua universalidade. Estão confessando que ela é a única destinada a todos os homens.
A você inclusive, caro M….
Por fim, o catolicismo quer, sim, ganhar todos os corações para Cristo. Talvez seja isto que você chama de “ímpeto dominador”. E, se o faz, é porque recebeu, de seu Mestre, esta missão: Ide, fazei discípulos meus a todas as Nações.
Será que você nos culpará por cumprirmos o que Cristo nos ordenou?
É uma pena que as riquezas espirituais acumuladas pela Igreja ao longo dos séculos sejam esmaecidas, soterradas por tão terrível legalismo.
A história da Igreja nega esta tua afirmação. TAnto as nossas riquezas espirituais nunca foram soterradas que, desde a era apostólica, a Igreja tem forjado santos e esantas, conhecidos no mundo interio (mesmo entre os não católicos; mesmo entre os não cristãos) e que, no fundo e em essência, são os únicos responsáveis pela existência da civilização. Mesmo hoje é assim.
Mas, como conceber que a Igreja primitiva tenha sucumbido às tentações de poder e fausto que Cristo venceu no deserto? Como aceitar que a Igreja de Cristo, outrora perseguida pelo mundo, tenha se tornado um império, com relações íntimas com reis, imperadores, tiranos e poderosos? Como imaginar que a mensagem de amor, de fraternidade e de liberdade de Cristo tenha se transformado num legalismo exclusivista? Como conceder que os primeiros apóstolos, com a humildade, a singeleza e a intrepidez que lhes caracterizavam, tenham se transformado numa hierarquia faustosa e jactanciosa? Como aceitar que a Igreja de Cristo, a quem fora prometida assistência infalível do Espírito Santo, possa ter se corrompido (enquanto instituição gerida por homens)?
O parágrafo acima é cheio de injustiças e de inverdades. Em primeiro lugar, a Igreja jamais sucumbiu às tentações de fausto e de poder. O fato é que é fé cristã que Deus instituiu duas ordens de poder para os homens: o espiritual (confiado à Igreja) eo temporal (dado aos governantes). E é vontade de Deus que estas duas ordens caminhem juntas. Durante a Idade Média (tão difamada pela intelligentsia comunista que, infelizmente, predomina no ocidente), foi exatamente isto que aconteceu. O poder secular e o espiritual andaram, muitas vezes, lado a lado.
Mas sejamos justos, M.. Historicamente, não foi a Igreja que se aproximou do poder secular; foi o poder secular que aproximou-se da Igreja, afastando-se lentamente durante a chamada “Idade Moderna”, até que, na “Idade Contemporânea”, encontrar-se dela totalmente divorciado. E, seguindo este caminho, há sérios e ameaçadores indícios de que este poder temporal, divorciado da Igreja, lenta mas continuamente, já começa a persegui-la e a odiá-la.
Portanto, a Igreja não sucumbiu a ninguém. Ela está onde sempre esteve. O movimento pendular de “perseguição-aproximação-comunhão-distanciamento-perseguição” estásendo percorrido pelo poder secular.
Além disto, é errado dizer que a Igreja foi “outrora perseguida”. As perseguições feitas a católicos (em todos os quadrantes do mundo) nunca cessaram. Literalmente, dezenas de milhjares de católicos são martirizados anualmente no mundo, sob o silêncio complascente da imprensa ocidental.
Por fim, parece-me que você, como muitos, aceitou o engodo de que a hierarquia católica, na história, se caracteriza por luxo e arrogância. Ledo engano. Embora tenhamos tido (claro que sim!) bispos e papas “faustosos e jactanciosos”, em geral, a hierarquia católica é marcada por homens santos, cientes de sua missão, e que dão a vida para proteger seu rebanho dos erros e das heresias.
Israel, a nação escolhida pelo próprio Deus (IHVH), rejeitou a promessa, afastando-se do seu Deus. Se tal aconteceu com Israel, por que não pode ter acontecido com a Igreja de Cristo (enquanto instituição gerida por homens, isto é, como Igreja visível)? Bem, se isso não aconteceu já nos primeiros séculos do cristianismo, ou nos idos da Idade Média, ao menos parece ter acontecido no século XX. É o que defendem os tradicionalistas contrários ao CV-II (que chamam a Igreja pós-conciliar de “a outra”). E se tal aconteceu no século XX, por que não pode ter acontecido antes?
Como você, com toda a certeza já sabe, a Igreja não pode ter se afastado de Cristo porque o próprio Cristo o garantiu (Mt 16, 18). E, como eu já tive a oportunidade de te dizer em outra mensagem, ainda que se admita em tese esta possibilidade (que, se verificada, implodiria todo o cristianismo), é necessário que, concretamente, verifiquemos se isto ocorreu ou não. E como poderemos verificá-lo? Simples: lendo os escritos dos cristãos primitivos e sabendo, com toda a certeza, em que eles criam. Depois, comparemos esta fé primitiva com os atuais ensinamentos da Igreja. Bingo! Teremos certeza de que o aludido afastamento não ocorreu.
O Concílio Vaticano II, por não ter definido nenhum ponto de doutrina, nã poderia ter afastado a Igreja da doutrina de Cristo. Ele não foi dogmático, mas pastoral, e portanto, a doutrina católica nele exposta é a mesma professada nos dezenove séculos anteriores.
Com relação aos “tradicionalisatas”, os mesmos, por colocarem-se frontalmente contra um Concílio Universal da Igreja, tornaram-se cismáticos e, portanto, não podem ser considerados como católicos verdadeiros. Eles, numa certa medida, retomam, em sua natureza, os erros de Lutero. O cisma é uma pequena heresia, de substância idêntica às adotadas por todos os protestantes desde que o pai da “Reforma” resolveu colocar-se no lugar do Magistério Universal da Igreja.
“Porque, se com a tua boca confessares a Jesus como Senhor, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, será salvo.” (Romanos 10, 9)
“Qualquer que confessar que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece nele, e ele em Deus.” (I João 4, 15)
Segundo o catolicismo, ainda que um crente clame de todo o seu coração e de toda a sua alma pelo nome do Senhor Jesus, não poderá ser salvo se não pertencer à Igreja católica. Ainda que confesse que Jesus Cristo é o Senhor, a Encarnação de Deus, tendo morrido e ressuscitado para nos salvar, estará condenado ao inferno, caso não “volte” para a “única e verdadeira Igreja de Cristo”.
Caro M., você sabe que eu respeito, imensamente, a tua inteligência. No entanto, por vezes, acho que você faz afirmações bastante inconsistentes. A tua exegêse bíblica, segundo a qual todo o que confessar que Jesus é o Cristo de Deus será salvo, não possui qualquer respaldo bíblico ou empírico.
Afinal de contas, o próprio Jesus Cristo, na Bíblia, nos ensinou que nem todo o que chamá-lo de Senhor será salvo. É necessário fazer a vontade de Deus para tanto. Em Mt 25, Ele nos diz que, no dia do julgamento, serão condenados muitos dos que os anunciavam nas praças, fazendo milagres em Seu nome.
Portanto, não basta crer em Jesus e invocar o Seu nome para sermos salvos. Até porque muitas religiões não cristãs crêem nAquele nome, e O invocam freqüentemente, estando, contudo, alheias à salvação dispensada pelo Senhor.
Os espíritas crêem em Jesus e (falo-o como testemunha ocular de muitas reuniões espíritas que eu já assisti) invocam o Seu nome em todas as suas reuniões. Muitas das seitas new age também o fazem. Fazem-no os Mórmons. Fazem-nos grupos de homossexuais que fundam igrejas.
Aliás, e para sermos o mais suscinto possível, como você bem sabe, os próprios demônios acreditam em Jesus, e têm certeza da Sua divindade…
Não, M.. Não basta “crer e invocar” para sermos salvos. É necessário, sobretudo, obecermos a Deus. E Ele quis fundar uma única igreja. Ele deseja a unidade entre os Seus fiéis.
Sobretudo, Ele confiou estes fiéis aos cuidados de Pedro e dos apóstolos.
Portanto, aquele que, voluntariamente, aparta-se da Igreja Católica, ainda que creia em Jesus Cristo, está colocando-se, também voluntariamente, contra os planos do Senhor. E, ainda que “creia e invoque” não poderá salvar-se.
O Deus católico supera, em tirania, o mais terrível dos deuses. O Deus de amor, apresentado e personificado por Cristo Jesus, tornou a ser, no catolicismo, o Deus vingativo do Antigo Testamento.
Em resposta, sugiro que você leia os parágrafos 218-221 do Catecismo. Assim, você poderá ver que, para o catolicismo, Deus é Amor e misericórdia. O que não quer dizer que ele seja pusilânime.
Afinal, o mesmo Deus que foi capaz de , por Amor, dar-se numa Cruz é Aquele que tratou os vendilhões do templo a chutes e chicotadas. É o mesmo que se dirigia aos fariseus chamando-os de víboras.
Na verdade, o “Deus do Antigo Testamento” é o mesmo Deus do Novo Testamento. Amoroso, fiel, misericordioso; mas igualmente poderoso e temível. Assim, se na Antiga Aliança Deus tinha escolhido um povo para Si, e apenas um povo, na Nova Ele também o fez. E, como eu já te disse, confiou-o a Pedro.
Espero ter sido de alguma utilidade.
Fique com o Senhor,
Alexandre.