Maçonaria , seus conceitos e crenças

    A versão do escritor francês, em sua obra VOYAGE EN ORIENT (1851), segue de perto o ritual dramatizado que, a partir de 1723, acompanha a investidura no Grau de Mestre Maçom. Este precedente concretamente documentado prova que o ritual da morte de Hiram Abif (descendente de Tubal-Caím) não simplesmente inventado pelos fundadores da então Grande Loja da Inglaterra, como muitos escritores Maçônicos e profanos acreditam. Como acabamos de ver, a lenda de Tubal-Caím existe de fato e de forma espontânea, como conto popular na tradição das mais diversas culturas.Além dessas referências meramente lendárias e míticas, existem fontes mais consistentes sobre o assunto, como o Velho Testamento e o ZOHAR, compêndio de filosofia cabalística, que compartilha com o SEPHER YETZIRAH a reputação de ser o mais antigo tratado sobre as doutrinas esotéricas do povo Hebreu.

    A única referência a Tubal-Caím pode ser encontrada no Gênesis – IV, 22 “E Zila teve também a Tubal-Caím, mestre de toda obra de cobre e de ferro; e a irmã de Tubal-Caím foi Naema”. É oportuno lembrar aqui o relato do Gênesis é mítico e necessita de um comentário. Recapitulemos, portanto, os dados do Antigo Testamento da Bíblia: o pai de Tubal-Caím é Lamech (que foi, também pai de Noé), filho de Metuchael, filho de Menchael, filho de Irade, filho de Enoque, Filho de Caím. São, portanto sete gerações. Mas quem é o pai de Caím, ancestral de nosso Hiram? Eis aqui uma informação que fará tremer muitos francos-maçons cândidos, para os quais Hiram é uma espécie de Cristo: “Por filhos de Elohim designa a escritura os filhos de Caím. Pois quando Samael coabitou com Eva, comunicou-lhe sua corrupção, da qual tornou-se grávida. Foi então que ela pariu Caím, cujo o rosto era completamente diferente dos outros homens, e todos que descenderam de sua estirpe foram chamados filhos Heloim (ZOHAR, I-37 a). Assim, Tubal-Caím constitui a sétima geração nascida de Samael e Eva. Trata-se, portanto, de um filho adúltero. O leitor familiarizado com a Cabala (Zohar e Sepher Yetzirah) e sua árvore sefirótica, poderá projetar aí essa filiação e, naturalmente, irá compreender muita coisa. Assim, Hiram, por seu pai Ur, descendente de Tubal-Caím e, por ele, em linha reta, de Caím e de Samael.

    Este na tradição Judaíca, é o Anjo Rebelde, o Tentador, o Grande Adversário, a respeito de quem o profeta afirma: “Fui eu quem criou o obreiro que sopra os carvões de fogo dos quais necessitam para sua obra”. (Isaias, LIV,16). A lenda de Tubal-Caím é, pois, um mito metalúrgico e, a partir desta constatação, podemos medir a responsabilidade assumida pelos ferreiros e artífices em metais ao intervirem no obscuro processo de crescimento mineral. Cumpria-lhes, a qualquer preço, justificar a sua intervenção e, para isso, deviam pretender substituir e apressar, com os processos metalúrgicos, a obra da Natureza. Ao acelerar o processo de crescimento dos metais, o ferreiro e o ourives precipitam o ritmo temporal.

    O tempo geológico é transformado em tempo vital. Essa audaciosa concepção metalúrgica se prestaria muito mais à simbologia Maçônica do aperfeiçoamento moral da Humanidade do que o mito arquitetônico, afinal, preferido pelos primeiros maçons aceitos. Hiram, como sabemos, não era arquiteto, mas ferreiro, isto é, metalúrgico (Reis 7,7-1/Crônicas II, 4-16).

    Mas os fundadores da Grande Loja da Inglaterra quiseram-no arquiteto. Pelo rito da recepção no grau de mestre Maçom, ele renasce no novo Mestre Arquiteto, quando este se levanta do túmulo simbólico. E, então – acredita-se, este recebe verdadeiramente o espírito Maçônico, espírito de tolerância, espírito adogmático. O leitor racionalista terá, necessariamente, alguma dificuldade em admitir essa lenda edificada com fragmentos bíblicos, cabalísticos e outros de origem vária. Mesmo para um espírito tolerante torna-se bastante claro que não se pode basear uma conclusão racional num relato mítico, sem raízes históricas demonstradas, por mais antigo, tradicional e venerável que ele seja. Só os adeptos das religiões reveladas – o Judaísmo, o Cristianismo e o Islã, em cuja tradição a Maçonaria se inclui necessariamente – não discutirão essa fundamentação.


*Alberto Ricardo Schmidt Patier é obreiro da Loja Miguel Archanjo Tolosa, Redator-Chefe do Jornal “EGRÉGORA” e Membro das Academias Maçônicas de Letras do Distrito Federal e do Brasil.

 

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