MT 1-2; LC 1-2 / SAGRADA FAMÍLIA – MÃE DE DEUS (ANO A)
Os primeiros capítulos dos evangelhos de Mateus e de Lucas são dedicados à infância de Jesus. Em Marcos e João, faltam estas histórias. Marcos inicia seu evangelho logo com a atividade de João Batista e o batismo de Jesus. João faz o mesmo, colocando, porém, na frente, o famoso “Prólogo”, que anuncia Jesus como Palavra de Deus encarnada e habitando no meio de nós (Jo 1,1-18).
Ora, no resto do evangelho, Mateus e Lucas trazem muitas vezes as mesmas matérias complementares ao evangelho de Marcos, que ambos seguem como fio condutor. Mas, quanto aos “evangelhos da infância” narrados por Mateus e Lucas, convém observar que eles não são idênticos. Trazem matérias diferentes. Vejamos só:
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O mesmo assunto, o nascimento de Jesus, é contado com enfoques diferentes. Se Mateus e Lucas concordam que Jesus nasceu em Belém (Mt 2,1; Lc 2,1-7), de Maria sendo virgem (Mt 1,18-25; Lc 1,26-38), os detalhes que eles narram são diferentes.
Segundo Mateus, José é o pai “oficial” de Jesus, que assim pode ser inserido na descendência de Davi. Mas José é avisado, em sonho, de que o filho que Maria traz no ventre vem de Deus (do Espírito Santo); e assim se cumpre a profecia do “Emanuel” (Is 7,14).
El Lucas, tudo isso é contado com muito mais amplidão, e não tanto na ótica de José, mas de Maria. É a ela que aparece o anjo (1,26-38). É em torno dela que gira a história da chegada em Belém, a busca de um lugar para pernoitar, a visita dos pastores (Lc 2,16: “encontraram Maria e José” – Maria em primeiro lugar!; Lc 2,19: Maria conserva essas palavras no seu coração, etc.). Também quanto à colocação do nome em Jesus, há uma sutil diferença: em Mt 1,25 é José que dá o nome; em Lc 2,21, José não aparece, mas Lucas diz que “deram o nome”. E depois Maria leva o menino ao Templo para os ritos da apresentação da criança e a purificação da mãe. Também em Lc 2,51 é a mãe de Jesus que guarda tudo no seu coração; do pai não se fala.
Podemos dizer que Mateus, escrevendo para os judeus-cristãos, está preocupado com uma questão judaica, como aliás todo o seu evangelho: deixar claro que, apesar de Jesus ser obra do Espírito de Deus, ele é mesmo o descendente de Davi, o Messias, ao qual os nobres do longe vêm prestar sua homenagem. Já Lucas, escrevendo para pessoas que talvez não conheçam a cultura e a religião judaica, concretiza muito mais a descrição, para que todos possam imaginar bem o acontecido. Como ele tem uma visão universal, indica bem as coordenadas na história universal (Lc 1,5; 2,1). Mostra também sua predileção pelos pobres, fazendo dos pastores do campo as primeiras testemunhas de Jesus (2,8-20), lembrando o velho Simão e a viúva Ana (2,25-38).
Não convém, pois, querer fazes dessas duas histórias da infância uma salada mista. Importa ler cada uma conforme o enfoque de seu autor e, assim, compreender a mensagem específica que cada autor nos quer transmitir.