Meus artigos, realmente, não estavam sedimentados sobre uma base claramente magisterial, não havia citações papais, bíblicas ou patrísticas, entretanto, esse déficit se deu porque o alvo dos textos eram os interessados em economia e política, não necessariamente católicos e cristãos. Não obstante, a análise ali feita estava erguida sobre o entendimento sacro da missão do Estado, do Mercado e da Sociedade. A Igreja, ao defender a subsidiariedade, ratifica a necessidade de autonomia das esferas individuais para que assim, sem o domínio estatal, haja progresso e desenvolvimento livre dos homens. Do mesmo modo, a Mater Ecclesia define o papel do Estado, principalmente na promoção da ordem, da justiça e na defesa da moral e da ética.
A Igreja condenou o socialismo, pelo seu caráter destrutivo intrínseco, assim como anatemizou o liberalismo, por ser o promotor do relativismo, não obstante, o capitalismo quando dirigido por princípios morais claros, o mercado quando livre, mas norteado por um sólido entendimento ético, se transformam em dignos sistemas econômicos. A Igreja não poderia condenar o capitalismo, afinal o capitalismo não é uma doutrina política, mas um sistema, uma realidade que nasceu da própria experiência humana. Ainda vale frisar que a condenação ao liberalismo não foi motivada porque o Magistério repudiava o Estado mínimo ou o Livre-Mercado, mas simplesmente porque teóricos liberais acreditavam na possibilidade da existência de uma economia liberal separada dos princípios de moralidade. O problema não se encontra, assim, no arcabouço liberal, mas na tentativa de desvencilhar moral e mercado, como se houvesse a capacidade de uma economia ser auto-regulada sem um forte motor ético. As citações abaixo nos ajudam a entender a visão da Igreja sobre a liberdade econômica e individual e a missão do Estado na sociedade.
- “Deve-se respeitar o princípio de subsidiariedade: uma sociedade de ordem superior não deve interferir na vida interna de uma sociedade de ordem inferior, privando-a das suas competências, mas deve antes apoiá-la em caso de necessidade e ajudá-la a coordenar a sua ação com a das outras componentes sociais, tendo em vista o bem comum.” (Sua Santidade, o Papa João Paulo II. Encíclica Centesimus Annus, nº 48).
- “É verdade que a norma fundamental do Estado deve ser a persecução da justiça e que a finalidade de uma justa ordem social é garantir a cada um, no respeito do princípio da subsidiariedade, a própria parte nos bens comuns. Isto mesmo sempre o têm sublinhado a doutrina cristã sobre o Estado e a doutrina social da Igreja.” (Sua Santidade, o Papa Bento XVI. Encíclica Deus Caritas Est, de 25 de dezembro de 2005, nº 26).
- “Não precisamos de um Estado que regule e domine tudo, mas de um Estado que generosamente reconheça e apóie, segundo o princípio de subsidiariedade, as iniciativas que nascem das diversas forças sociais e conjugam espontaneidade e proximidade aos homens carecidos de ajuda.” (Sua Santidade, o Papa Bento XVI. Encíclica Deus Caritas Est, de 25 de dezembro de 2005, nº 28).
- “A doutrina social da Igreja considera a liberdade da pessoa no campo econômico um valor fundamental e um direito inalienável a ser promovido e tutelado: ‘Cada um tem o direito de iniciativa econômica, cada um usará legitimamente os seus talentos, a fim de contribuir para uma abundância proveitosa a todos e recolher os justos frutos dos seus esforços’. Tal ensinamento põe em guarda contra as conseqüências negativas que derivariam da mortificação ou negação do direito de iniciativa econômica: ‘A experiência demonstra-nos que a negação deste direito ou a sua limitação, em nome de uma pretensa “igualdade” de todos na sociedade, é algo que reduz, se é que não chega a destruir de fato, o espírito de iniciativa, isto é, a subjetividade criadora do cidadão’. Nesta perspectiva, a iniciativa livre e responsável no campo econômico pode ser definida como um ato que revela a humanidade do homem enquanto sujeito criativo e relacional. Tal iniciativa deve gozar, portanto, de um espaço amplo. O Estado tem a obrigação moral de pôr vínculos estreitos somente em vista das incompatibilidades entre a busca do bem comum e o tipo de atividade econômica iniciada ou as suas modalidades de realização.” (Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 336).
Com o triunfo do mais genuíno discurso socializante e estatista na grande mídia, que gerou má informação, as pessoas passaram a nutrir uma visão totalmente deturpada do Estado mínimo e do Livre Mercado. Claro que, se nós fossemos levar em conta apenas as teorias liberais, a defesa dessas duas pilastras do capitalismo seria um absurdo, mas quando colocamos o fermento moral as coisas mudam de figura. De todo modo, como já ensinava os teóricos da Escola Austríaca – que se basearam no tomismo – não existe Liberdade sem princípios morais intrínsecos à própria existência. O Estado mínimo continua sendo Estado, com isso deve manter a ordem, a justiça, monopolizar o poder policial e, se necessário, estimular investimentos em setores e regiões que não são do interesse privado. Livre Mercado, por sua vez, não quer dizer que é o reino do imoral e do anti-ético, ao contrário, a sua idéia de Liberdade parte do entendimento de que o indivíduo é formado com valores naturais. Entretanto, com o triunfo de uma ótica econômica de negócios e especulação, os teóricos da ciência econômica se distanciaram do estudo filosófico, essencial para uma compreensão universal da realidade.
Só quero pontuar que não entendi o motivo de tanto escândalo por conta dos meus artigos. Não sabia que existiam leitores sensíveis à temática econômica e política. Devemos sim tomar posição, condenar o erro, criticar a estatolatria petista, o esquerdismo doentio brasileiro, e só não tomamos partido porque no Brasil não tem nenhuma bandeira partidária que represente com firmeza e integridade os princípios católicos. Eu, realmente, não tenho receio em defender as privatizações, a redução do Estado brasileiro, a promoção da liberdade, da moral, da ética, a afirmação do Livre-Mercado, mesmo sendo temas já colocados na cartilha do politicamente incorreto – privatização é quase palavrão por aqui. Combater a ação coercitiva do Estado, que esmaga as famílias, ideologiza o governo e controla a economia, é também dever do cristão, afinal esse é o mesmo Estado que se agiganta para controlar a sociedade e suplantar a Religião.