“Nova Era”: a ponta de um iceberg

Autor: Miguel A. Pastorino P.

(Este artigo é um resumo daquele publicado em novembro de 2004 no quinzenário católico “Entre Todos”, da Arquidiocese de Montevidéu, após a Consulta Internacional sobre Nova Era realizada na Cidade do Vaticano de 14 a 16 de junho de 2004)

Em fevereiro de 2003, o Pontifício Conselho para o Diálogo Interreligioso do Vaticano publicou um relatório, o primeiro sobre o fenômeno da “New Age” (Nova Era), intitulado “Jesus Cristo Portador da Água Viva…” e também faria publicar o segundo, continuação daquele, sob o título “Reflexão Pastoral sobre a Nova Era”, resultante da Consulta Internacional que ocorreu na Santa Sé, no mês de junho de 2004, da qual participei juntamente com outros 21 especialistas de outros países e membros da Cúria Romana.

Ainda que muito se tenha escrito nos anos de 1990 sobre a Nova Era e ainda que o Vaticano tenha publicado a sua própria reflexão, devemos considerar que a Nova Era assume na América Latina e no Uruguai [e também no Brasil – NdoT] características, expressões e ênfases particulares em relação à sua manifestação europeia e norte-americana, e que é necessário conhecer.

A propagação, nas livrarias e supermercados, de deselegantes prateleiras exibindo livros de auto-ajuda, esoterismo, segredos espirituais, magia, reiki, gurus orientais, astrologia, terapias curativas, “insight”, técnicas de adivinhação, anjos e um sem fim de temas exóticos direta ou indiretamente ligados ao religioso é um fato para qualquer um de nós. Este “boom” literário nada mais é que a ponta de um iceberg cuja parte maior se oculta em águas mais profundas e obscuras.

O QUE É A NOVA ERA?

A “New Age” (Nova Era) não é uma seita, nem uma religião. É uma corrente sociocultural vaga, dilatada e inexata, onde confluem, acriticamente e sem espírito de concordância, uma ampla misturada de ingredientes provindos das mais diversas fontes: religiões tradicionais, magia, terapias alternativas, gnosticismo, ocultismo, psicologia transpessoal, espiritismo, física quântica, ecologia, meditação, OVNIs, pensamento positivo, teosofia, mística, mestres espirituais…

É diante deste panorama que o eclético consumidor de Nova Era, ávido por experiências maiores, alérgico a toda manifestação espiritual que implique vínculos ou compromissos institucionais, adota e escolhe os elementos que melhor concordam com os seus desejos ou buscas pessoais.

Expansionista e mutante, sem fundadores concretos e visíveis, sem expressões sociais e programáticas orgânicas, a Nova Era evolui silenciosamente, propagando-se no íntimo e na multiplicidade de cursos, artigos ocasionais, revistas, livros, oficinas, seminários, gurus, conferencistas e através de um extenso tecido de grupos pseudeo-religiosos e seitas. Suas ideias e práticas, sua literatura e “espiritualidade”, vão penetrando também nos poros das grandes religiões e igrejas históricas.

QUAL É SUA ORIGEM?

Como o leitor poderá conjecturar, as raízes da “New Age” se aprofundam nos séculos mais remotos da História. Porém, entre os precursores modernos deste complexo movimento, devemos citar Madame H. P. Blavatsky, fundadora da Sociedade Teosófica (1875), cujos postulados sobrevivem entre os líderes da Nova Era; e também Rudolf Steiner e Alice Bailey. Já mais recentemente, na década de 1960, as Comunidades “Esalen”, na Califórnia, e “Findhorn”, na Escócia, se constituíram de fato como centros experimentais e cunhas do atual movimento.

A Nova Era vem se infiltrando na intimidade de uma cultura ocidental fragmentada, desconsolada de si mesma, melancólica de suas próprias fontes, desacreditada da razão, desabitada de divindade, cansada, sem rumos certos. “Um mundo no qual não apenas não sabemos para onde nos dirigimos, como tampouco para onde deveríamos nos dirigir (…) Ignoramos quais serão os elementos que darão forma ao futuro (…) O antigo século não terminou bem” (Eric Hobsbawn). A maioria das pessoas que se sentem estimuladas e atraídas pela “New Age” procura autenticamente um sentido transcendente para a vida, o amor, a paz interior, o consolo físico e espiritual em meio destas sociedades espiritualmente ressecadas. Parafraseando Chesterton, podemos dizer que quando alguém deixa de crer em Deus, não necessariamente deixará de crer, mas que começará a crer em qualquer coisa.

Porém, é necessário assinalar que muitos dos precursores, gurus e difusores da Nova Era fazem parte de uma verdadeira “conspiração” contra as grandes religiões, especialmente as monoteístas (Judaísmo, Cristianismo e Islamismo), às quais não se opõe frontalmente, mas anuncia simples e alegremente tê-las superado e sucedido, apresentando-se como a única religião, ou melhor dizendo, a “espiritualidade” do futuro, pós-cristã, manifestando-se como uma espiritualidade cósmica e “holística”, como um “despertar para uma nova consciência”, respeitosa por seus adeptos, pois a única lei é a da própria subjetividade dos seus fiéis.

A CRISE CULTURAL E A CRISE DAS RELIGIÕES

A crise da modernidade, com sua alergia à autoridade, à burocracia, às mediações institucionais colocou em crise todas as instituições modernas, entre elas, as grandes igrejas. O lugar destas é ocupado pelas chamadas “vias alternativas”, seja na área médica, seja na política ou religiosa.

A lógica instrumental da tecnoeconomia foi, por sua vez, colonizando a cultura, convertendo tudo em mero produto de consumo. Também “o divino” se volta ao mercado em úteis embalagens descartáveis. Os clientes incitados, desejosos de uma dose refrescante para a alma, vão sucessivamente abraçando uma e outra técnica espiritual, ou várias de uma só vez, com a mente e o bolso fixos em sua eficácia. Um negócio florescente e múltiplo se levantou entre nós, pródigo em fantasias, temas e livros enfervescentes – turbulentamente protegendo como novas, doutrinas e ideias mundanas, quando não milenaristas – em prolíficos grupos sectários e movimentos pseudo-religiosos com aparência empresarial – ou empresas com aparência religiosa?

Ao invés de nos vermos enriquecidos com a diversidade e identidade de cada uma das religiões; no lugar de preservar sua história, raiz e tradição; ao invés de assistirmos ao diálogo entre elas, a “New Age” vai demolindo todas, uma por uma, dissolvendo-as e transformando-as numa única espiritualidade cósmica, sem limites ou configurações definidos. Por outro lado, os fundamentalismos integristas são, no fundo, uma reação extrema e perigosa contra esse impulso de dissolução e desfocagem religiosas. Uma estratégia a mais da globalização do pensamento único em sua expressão religiosa?

UMA ESPIRITUALIDADE DE MERCADO

Nesta corrente, cada um se sente livre para incorporar ao seu credo pessoal aquelas vivências, práticas e ofertas que considera convenientes, já sem jugo, já sem censores, já sem instituições nem mediações que se interponham no caminho. Uma religiosidade adequada ao sistema neoliberal que coloniza todos os âmbitos com sua lógica instrumental, transformando tudo em algo que se possa usar segundo o capricho individual, a gosto do freguês? Um deus à minha imagem e semelhança?

A “New Age” não aceita nenhuma verdade que esteja fora do âmbito da própria experiência. Uma liberdade que deriva do Dogmatismo da pura subjetividade: aquilo que eu gosto, o que eu sinto… Porque gosto, porque sinto assim. Mera intimidade de sensações prazeirosas. Uma “espiritualidade” que não somente não une, como também nos afasta cada vez mais uns dos outros, que vai aprisionando cada um de nós num ego esotérico e recôndito, onde já não há espaço para o “próximo que nos molesta”. Uma espiritualidade que concorda com a mentalidade consumista, em que não sobra tempo para olhar para o outro, mas tão somente satisfazer as próprias necessidades.

A ERA DE AQUÁRIO E A TRADIÇÃO GNÓSTICO-ESOTÉRICA

O próprio nome “New Age” remete para uma concepção astrológica da História. O tempo atual é o da passagem da Era de Peixes (que corresponderia à Era Cristã) para a de Aquário (que corresponde à da Nova Era). Com a chegada astrológica de Aquário nascerá uma nova humanidade, uma nova ordem social, uma nova forma de viver e compreender a religiosidade, uma era de paz, fartura e harmonia…, uma Nova Era onde as religiões clássicas – sobretudo o Cristianismo – atingirão o seu término e um novo paradigma emergirá, pronto para nos revelar os seus segredos.

O “grande segredo” dos movimentos gnósticos, sempre reservados a uma elite, agora é vendido no “mercado religioso”. Através de uma iniciação progressiva em um certo conhecimento (“gnosis”, em grego), se alcança a verdade oculta: “somos a divindade”. Eis aqui as três etapas desta consciência: “Deus está dentro de mim”, logo “Deus e eu somos uma mesma realidade” e, finalmente, “Eu sou Deus”.

A consciência do “Eu sou” é a consciência da própria divindade. É a consciência panteísta (de “pan”, tudo; e “theos”, Deus). Por esta via espiritual, Deus não é uma Pessoa. Trata-se agora de uma energia impessoal, que tudo invade e da qual fazemos parte. Já não há diferença, “tudo é a divindade”, tudo é “energia”.

Esta concepção se alimenta da milenária tradição esotérica (do grego “esoteros”, o oculto), a qual canoniza toda uma série de personagens de duvidosa reputação e grandes mestres dos ocultismo ocidental, junto a magos, alquimistas, maçons, rosacruzes e teósofos. Círculos herméticos, lojas maçônicas e sociedades ocultas sempre caminharam trilhas paralelas às das religiões tradicionais, buscando segredos ocultos e uma filosofia perene. Contudo, a Nova Era faz do esoterismo algo exotérico, isto é, público. Isso explica a difusão de tanta literatura sobre anjos, cabala, alquimia, livros apócrifos e a fascinação pela bruxaria e religiões pré-cristãs (celtas, egípcios, assírios etc.).

Seguindo seus precursores teósofos, a Nova Era colocou ênfase também nas religiões transpersonalistas (que chamamos “orientais”), como o Budismo e o Hinduísmo, das quais a Nova Era toma os elementos que mais lhe interessam, descontextualizando-os da sua cosmovisão original.

Não se interessam pela ascese, nem pelo sacrifício, mas apenas criam uma religiosidade para homens e mulheres de sucesso, onde não há fracassos, nem fraqueza, nem erro. Extraem das religiões do Oriente apenas aquilo que lhe convém.

ECOLOGIA MÍSTICA, CANALIZAÇÃO E MESTRES ASCENDIDOS

Uma nova sensibilidade ecológica, de caráter animista e panteísta – nosso planeta recebe o apelativo de Mãe Terra (a primordial deusa Gaia) – dá um colorido à atmosfera “New Age”, sacralizando toda a natureza ao ponto de divinizá-la.

A prática do “channeling” (canalização) faz parte do variado e pitoresco panorama da Nova Era. É uma versão moderna de espiritismo onde, por meio de certas “técnicas”, se invocam espíritos de falecidos, bem como de anjos, extraterrestres e “seres de luz”(?). Obras de ampla difusão como “Um Curso em Milagres” ou o “Livro de Urantia” são frutos de vozes tagarelas do além, que falam a partir do outro mundo. Se trataria, por acaso, de edições “post mortem”?

Os adeptos da Nova Era pretendem abrir suas mentes generosamente para numerosos “mestres espirituais” ou “ascendidos”, guias da humanidade, que lhes ditariam em sua consciência o que devem fazer, pensar ou sentir, de tal maneira que cada um apela para o seu “mestre” ou “anjo” para justificar suas ações ou decisões irracionais. Estes “mestres ascendidos”, avatares, são irmanados e justapostos uns com os outros em uma perplexa e solidária enumeração: Henoc, Elias, Moisés, Paracelso, El Moriá, Noé, Maacoã, Pitágoras, Confúcio, Jesus de Nazaré, Hermes Trismégisto, Elohim, Buda, Niquiren, Maomé, Krishna, Melquisedec, Maitreia, Rei Artur, Minerva, Mabucodonosor, Serápis Bei, Lady Rowena, São João Batista, Elifas Lévi, Sanat Kumara, Arcanjo Miguel, M. Eckhart, Nanak, Francis Bacon, Virgem de Fátima, Conde de Saint Germain… e ainda algum extraterrestre. Todos eles seriam manifestações do único “cristo-cósmico”.

Sob o título de “Metafísica Cristã” – que de cristã não tem nada – livretos e cursos inundam o nosso meio, num clima e linguagem espiritualmente abertos, positivos e agradáveis, mas que não são nada mais que instâncias de iniciação ao esoterismo, à confusão irracional e uma certa periculosidade psicológica para quem a pratica. Talvez esta seja uma das mais delirantes manifestações “new agers” na América Latina (e de maior difusão em Montevidéu, no Uruguai [e em todo Brasil]).

ENTRE NOVELAS, MANUAIS DE AUTO-AJUDA E REVISTAS DE MODA

Entre os autores ligados ao movimento, direta ou indiretamente, podemos mencionar: Madame Blavatsky, Annie Besant, Rudolf Steiner, Alice Bailey, Eileen Caddy, Marylin Ferguson, Michael Murphy, David Spangler, Louise L. Hay, a notável atriz Shirley McLaine, Claudio María Domínguez, Enrique Barrios (com seus livretos sobre “Ami, o menino das estrelas”), e até sacerdotes católicos como Ricardo L. Gerula e Lauro Trevisan.

Mas as ideias da “New Age” subjazem e se propagam nas novelas, que se constituem em best-sellers editoriais, como as de Brian Weiss e Dan Brown. Casos como “A Novena Revelação” (e seguintes) ou o famoso “O Código da Vinci” (desprezável quanto à sua qualidade literária), são certamente um emblema da agitação e inquietação por onde navega a Nova Era, que ingressa em mais de um leitor vacilante ou incauto.

Multiplicam-se toda espécie de livros e artigos de autores duvidosos sobre temas sibilinos e gnósticos, evangelhos apócrifos deturpados, conhecimentos secretos supostamente “escondidos” pela Igreja Católica, cursos de parapsicologia, adivinhação, controle mental, piramidologia, xamãs, viagem astral, cabala, ufologia, radiestesia etc. E assim vão se preenchendo as prateleiras das livrarias e as gôndolas dos supermercados, com toneladas dessas publicações.

Como o leitor pode inferir, na área espiritual da “New Age” cabe todo tipo de semente e qualquer um pode ser semeador. Por exemplo, se alguém se aproxima das palestras promovidas por suas Associações Culturais, poderá ver títulos como “Fé iluminada e não dogmática”, “Transmutando a energia”, “O Arcanjo São Miguel e o nosso mestre Saint Germain”, “Invocação do raio violeta”, “Tarô angélico” etc.

Ademais, a má fé de muitos comerciantes faz com que se aproveitem da desinformação e ingenuidade de muitas pessoas em assuntos religiosos.

MAGIA E OCULTISMO COM FACHADA CIENTÍFICA

A cosmovisão da Nova Era pretende ser holística, integradora, e obter a fusão entre religiões e ciência. Procura assim empregar uma linguagem pseudo-científica e se orgulha de apresentar temas espírituais com uma roupagem científica e vice-versa. Isto explica a promoção de todo tipo de terapias alternativas e pseudo-terapias, tal como é o caso, por exemplo, da “terapia de vidas passadas”. Supostos psicólogos ensinam técnicas hipnóticas para regressar a essas supostas vidas anteriores. E assim encontramos toda espécie de fetichistas, astrólogos, videntes e bruxos renomados, portando títulos nebulosos como “parapsicólogo” ou “terapeuta”.

Por trás está o velho anseio da magia e da ciência: possuir técnicas que permitam manipular tudo para o próprio benefício. E para sustentar os seus postulados como “cientistas”, recorrem à psicologia de James e Jung, à física quântica de F. Capra, e a alguns escritos de Lessing, Teilhard de Chardin, Maslow, A. Huxley e muitos outros.

Não esqueçamos que a religião (qualquer que seja) pretende religar o homem, colocá-lo em relação [com Deus] e daí se deprende uma ética para com o outro e até com o meio em que se vive, ao contrário da magia, que é meramente instrumental, funcionalista e desinteressada do bem comum.

DA MEDITAÇÃO À LOUCURA…

Ainda que algumas terapias de suposta origem oriental (chamadas “alternativas” ou “complementares”) possam conter elementos valiosos, é necessário dizer que, no contexto em que são apresentadas e vividas pela “New Age” no Ocidente, a maioria delas causaram graves lesões psicológicas e sequelas espirituais em muitos de seus adeptos, bastando mencionar que as viagens astrais, a invocação de mestres ascendidos, as meditações de hiperventilação e expansão da consciência, as regressões hipnóticas e a quase totalidade dos métodos de controle mental têm gerado delírios místicos ou de influência, esquizofrenias, desdobramentos de personalidade e vários outros estados psicopatológicos.

O especialista J. M. Baamonde, falando das induções a estados de transe, escreve: “Estas semelhanças, também, indicariam a inconveniência de se incentivar estes estados alterados da consciência, pelo risco implícito de gerar sérias perturbações psíquicas à raiz de personificações e automatismos inconscientes que, em certos casos, assumirão o caráter de delírios sistematizados (…) Uma das consequências mais habituais é a geração de brotos esquizofrênicos de intensidade diversa, em pessoas que assistem a estas seitas que contam com uma substrutura psicótica”[*].

NOVAS SEITAS PARA A NOVA ERA

Nos Estados Unidos a partir dos anos 1980 e no restante do mundo a partir dos anos 1990, as seitas de maior crescimento são precisamente aquelas que seguram a bandeira da Nova Era, prometendo e oferecendo toda espécie de bem-estar através destas técnicas “espirituais” – técnicas bem caras para o bolso e perigosas para a saúde. Muitos destes grupos se apresentam não como igrejas, mas como institutos ou centros de reabilitação pessoal, onde a linguagem pseudo-científica e as estratégias de marketing são simples fachada, sob a qual se esconde uma verdadeira seita destrutiva.

A AVALANCHE DO ESOTERISMO

A enorme rede de informação esotérica se tornou pública, distorcendo e gerando não pouca confusão, sobretudo para aqueles que não conhecem um mínimo de História das Religiões e não diferenciam a verdade da ficção literária e, principalmente, para aqueles cujo cristianismo que adotam não passa de um simples “verniz”.

Desta forma, desenvolveu-se uma avalanche de livros, filmes e conferências que oferecem novas interpretações aos conceitos e categorias teológicas do Cristianismo, esvaziando-os de seus conteúdos originais, recriando e resignificando tudo com chave ocultista e gnóstica, a ponto de querer “devolver” ao Cristianismo as “verdades secretas” escondidas durante séculos pela malvada Igreja Católica.

O esoterismo atual é um bom negócio para mais de um charlatão que se aproveita da ingenuidade de tantas pessoas sedentas de verdade, paz, amor e harmonia interior… de Deus.

A NOVA ERA DENTRO DA IGREJA

João Paulo II se pronunciou diversas vezes advertindo que o principal desafio para a Igreja é a penetração da Nova Era em sua própria pastoral. Retiros, catequeses, pregações, manuais daqui e dacolá estariam introduzindo o universo da “New Age”. E não são poucos os que se deixaram fascinar por “outras luzes coloridas” porque Jesus Cristo não lhes fez arder o coração. Será que os cristãos embaçaram o mistério de Cristo? Ocultamos a Fonte de água viva? Mascaramos com ideologias e racionalismos a fascinante presença de Jesus de Nazaré, o Filho de Deus, no mundo? Como Igreja, refletimos a luz que Cristo faz brilhar em seu rosto?

“CATÓLICOS NEW AGERS”?

Em muitos retiros, a Palavra de Deus é progressivamente deixada de lado; em seu lugar, cada vez mais, se propõem técnicas psicológicas, meditativas e esotéricas. Em várias paróquias se oferecem cursos de reiki e ioga quase nada purificados dos seus conteúdos orientais (karma, reencarnação, panteísmo, chakras…). O eneagrama (um diagrama de tipologia da personalidade) é outra destas técnicas promovidas, a qual teria se originado no misticismo sufi; polida, reinterpretada e difundida por iniciados em esoterismo (como Claudio Naranjo e Óscar Ichazo, fundador da seita Arica, ambos seguidores do ocultista Gurdjief), alguns jesuítas especialistas no tema, que foram devotos desta prática nos Estados Unidos, hoje lamentam sua ingenuidade.

Muitos catequistas, fascinados por novelas como as de Paulo Coelho, começaram – sem querer – a mudar aspectos fundamentais da fé. Alguns colégios [religiosos] presenteiam os adolescentes com uma cópia do livreto “Ami, o menino das estrelas”, cujo conteúdo apresenta a Era de Aquário e faz ver que Deus não é outra coisa senão um conjunto de vibrações energéticas.

São muitos os católicos que se sentem ofendidos ao serem observadas neles práticas direta ou indiretamente contrárias ao Evangelho de Jesus Cristo a às orientações da Igreja. Suas buscas espirituais sinceras não foram suficiente. Há que se voltar a afirmar que apenas Jesus Cristo é o Caminho, a Verdade e a Vida; que não existe outro Nome dado aos homens pelo qual possamos ser salvos (cf. Atos 4,12). Estamos necessitados de uma renovação pastoral que introduza os fiéis nos mistérios de Deus, que os disponha ao encontro pessoal e comunitário com o único Deus que salva, cura e liberta.

O GRANDE DESAFIO

O primeiro relatório do Vaticano afirma:

“Um convite para se encontrar com Jesus Cristo (…) terá mais peso se se percebe que quem o faz é alguém que foi profundamente tocado por seu próprio encontro com Jesus; porque o faz não uma pessoa que apenas ouviu falar Dele, mas alguém que está seguro que ‘Ele é realmente o Salvador do mundo’ (João 4,42)”.

Não é questão de copiar as seitas, nem em corroborar uma espiritualidade simplista e emocionalista, mas retornar à autêntica Fonte, Jesus Cristo, em toda sua verdade e sem cortes ou reducionismos ideológicos conservadores ou progressistas.

É urgente ler a sede de Deus em nosso povo e oferecer-lhe respostas eficazes. Não é questão de métodos, mas de testemunho; é questão de ver nos católicos o ardor de Jesus Cristo; de cristãos que vivam a paixão pelo pobre, pelo sofredor, que não fiquem [apenas] em discursos morais; de cristãos que irradiam o amor de Deus e a alegria de anunciar suas maravilhas. Somente assim os jovens poderão enxergar um Cristianismo para eles, que os mova a sonhar, a ser autênticos, a viver com um Deus vivo e verdadeiro. Somente assim encontrarão um Deus que lhes arranque de um mundo focado no consumo, no imediatismo e na superficialidade que congela tantos corações.

Uma tarefa como esta nos exige muita humildade e abertura para um Deus que não se cansa de insistir em nós com a primazia da Sua graça, do Seu amor e da Sua Palavra que nunca sai de moda.

Se há uma crise na Igreja, é esta uma crise de espiritualidade; e é aí que devemos nos renovar, retornando à Fonte, para não sairmos à procura de outros poços que vendam caricaturas da verdadeira experiência de Deus.

ORIENTAÇÕES SURGIDAS NA CONSULTA INTERNACIONAL

O documento do Vaticano (…), intitulado “Reflexão Pastoral sobre a Nova Era”, oferece elementos para discernir o uso das diversas técnicas promovidas pela Nova Era, que permitem tanto evitar as condenações injustas quanto os concordismos ingênuos. Alguns dos critérios contidos no Documento são:

1. Que a técnica seja aceita pelo conhecimento científico vigente;
2. que esteja livre de induzir patologias psíquicas e de deterioração da saúde mental;
3. que esteja livre de transmitir a ideologia religiosa da Nova Era;
4. que nos aproxime de Deus ao invés de nos afastar Dele; e
5. que possua um marco correto de referência doutrinária e moral.

O documento também exorta ao diálogo sadio e maduro entre as religiões, a inclusão do mundo das religiões e novos movimentos religiosos nos programas acadêmicos e de formação pastoral, a formação de guias espirituais e, sobretudo, a prioridade pastoral que devem ter os retiros e os centros de espiritualidade cristã. Convida também as igrejas a criarem grupos de estudo, nacionais e internacionais, sobre estes temas e a evitar toda propaganda “New Age” dentro de ambientes católicos.

O próprio Apóstolo São Paulo nos adverte:

“Prega a Palavra; insiste oportuna e importunamente; repreende, ameaça, exorta com toda paciência e empenho de instruir, porque virá tempo em que os homens já não suportarão a sã doutrina da salvação. Levados pelas próprias paixões e pelo prurido de escutar novidades, elegerão mestres para si. Afastarão os ouvidos da verdade e se lançarão às fábulas. Tu, porém, sê prudente em tudo: paciente nos sofrimentos, cumpre a missão de pregador do Evangelho; consagra-te ao teu ministério” (2Timóteo 4,2-5).

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Nota do Tradutor:
[*] Aqui, poder-se-ia traduzir também como “em pessoas que assistem a estes cultos que contam com uma substrutura psicótica”.

  • Fonte: Revista Fe y Razón nº 2, abril/2006
    Tradução: Carlos Martins Nabeto

 

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