O cânone do Antigo Testamento é o cânone usado pelos judeus de língua grega no tempo de Cristo. Os judeus de língua grega usavam a tradução chamada Septuaginta, que segundo a tradição foi traduzida do hebraico por setenta sábios em setenta dias, cada um trabalhando isoladamente e chegando todos ao mesmo texto.
Os próprios judeus a consideram inspirada.
Mais de um século depois de Cristo, devido à destruição do templo de Jerusalém, os sabios fariseus se reuniram em Yavné (ou Jâmnia, de acordo com a língua) na Galiléia, e começaram a efetuar um trabalho de re-centralização da religião grega, que era antes centrada no Templo.
Sem o Templo (substituído por Deus pelo Sacrifício incruento da Santa Missa), os fariseus se viram forçados a procurar estabelecer regras mais rígidas de vida, ampliando ainda mais a “cerca em torno da Lei”. Note-se que das seitas judaicas, só sobrara o farisaísmo; saduceus e essênios já tinham sido destruídos ou assimilados a outras crenças, mas os fariseus, com seu apego à exegese bíblica, foram os que menos sofreram com a derrota diante dos romanos.
Entre as decisões tomadas pelos fariseus, que não aceitaram a Cristo, por volta do ano 120 d.C. estava uma fixação do cânone Bíblico. Como o cristianismo estava crescendo enormemente, ele fixaram um cânone bíblico que propositadamente impediria a aceitação como Palavra de Deus do Novo Testamento. Os critérios por eles usados foram:
1 – o livro deveria estar disponível em hebraico (o que não era o caso de alguns livros cujo original hebraico havia sido perdido; o do Eclesiástico foi reencontrado recentemente na Guenizá do Cairo), e só o hebraico seria usado na liturgia e estudo bíblico; isso já botava de fora todo o NT
2 – o livro não deveria ser mais recente que 440 a.C.; Idem
3 – O livro deveria ter sido escrito na terra de Israel; isso também serviu como arma contra os criatãos, impossibilitando aceitar a imensa maioria dos textos do NT.
Evidentemente esses critérios não eram seguidos pelos cristãos, que não tinham mais nada a ver com os fariseus que não aceitaram a Jesus como o Cristo. O cânone cristão na verdade ainda não havia sido fixado, mas era usado o texto da septuaginta (citado nos evangelhos – inclusive os deuterocanônicos – e fonte de muitas exegeses impossíveis apenas com o texto hebraico).
Quando foi feita por São Jerônimo (padroeiro dos tradutores! S. Jerônimo, rogai por nós e dai-nos paciência para que traduzamos apropriadamente este chatíssimo manual de contabilidade que ora nos perturba a paciência!) a tradução latina da Bíblia, chamada Vulgata (feita por ser necessário que houvesse uma versão que o vulgo, ignorante do hebraico e do grego, pudesse ler), ela continha a íntegra dos textos confiados por Deus à Sua Igreja, incluindo no AT os sete livros que Lutero depois arrancou.
Todas as Bíblias desde então continham estes livros; uma prova disso é a Bíblia de Gutemberg (tem um exemplar na Biblioteca Nacional) e outras Bíblias ainda mais antigas. O cânone bíblico sempre foi o mesmo, desde que se julgou necessário ter um, por volta de quatrocentos anos d.C.
Lutero, porém, ao fazer a sua revolta, resolveu traduzir a Bíblia para o alemão. Ora, ao contrário de S. Jerônimo, que pôde usar manuscritos muito antigos, Lutero tinha à sua disposição apenas manuscritos recentes dos judeus, que evidentemente não continham os livros que os fariseus arrancaram do cânone bíblico muito depois de Cristo.
Além disso para ele era muito interessante eliminar do seu cânone alguns livros que iam contra algumas de suas invencionices, como a falsa noção de não haver um Purgatório, negada na Palavra no livro dos Macabeus, a falsa noção de não ser necessário evitar o pecado, negada por Deus no Eclesiático, etc.
Ele cogitou também em eliminar de “sua” bíblia a Epístola de Tiago, já que nela se diz claramente que não apenas a fé salva.
Essa epístola acabou ficando, mas ele falsificou a epístola aos Romanos, introduzindo a palavra “apenas” na frase que dizia que a fé salva. O mais engraçado é que a única vez que esta palavra aparece no NT é em Tg, exatamente no sentido oposto. Devido ao problema enorme causado pela revolta protestante, à qual se aliaram os príncipes que desejavam poder desobedecer ao Papa e massacrar os camponeses, e os ricos, que desejavam viver luxuriosamente de usura e exploração sem sentimentos de culpa, foi feito o Concílio de Trento, em que se julgou necessário explicitar entre outras coisas o cânone bíblico (que não mudou – basta ver qualquer edição ou exemplar manuscrito da Bíblia antes de Lutero), a importância da Tradição e do Magistério, a verdadeira doutrina sobre a Graça, enfim, vários pontos da Doutrina ensinada por Cristo e pelos Apóstolos que estavam sendo negados pelos hereges protestantes.
- Fonte: A Hora de São Jerônimo