O embrião é um de nós

Em síntese: No mês de agosto[/96] foram destruídos na Inglaterra 3.300 embriões, que haviam sido guardados em baixa temperatura, mas, após cinco anos de congelamento, não foram solicitados nem pelos doadores das sementes vitais humanas nem por médicos e pesquisadores. O fato chamou a atenção da opinião pública, que não deixou de implorar clemência para as criancinhas. – Estudos recentes, entre os quais se distingue uma pesquisa realizada na Itália sob a chefia do Dr. Francesco D’Agostinho, chegam repetidamente à conclusão de que, logo após a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, existe um novo ser humano a ponto que dizem os pesquisadores: “O Embrião é um de nós”. Essa mesma Comissão orientada pelo Dr. D’Agostinho repele, com base na ciência (e não na fé), a manipulação da reprodução humana, principalmente as mais recentes modalidades da mesma: a clonagem e a hibridação “homem-animal-irracional”; tais experiências redundam em degradação da pessoa humana, equiparada à condição do animal irracional (que copula sem amor e sem compromisso), como também acarreta a destruição de numerosos viventes humanos (verdadeiramente humanos, embora do tamanho da cabeça de um alfinete).
 

O Papa João Paulo II tem-se pronunciado a respeito, apelando para cientistas e juristas, a fim de que levem em conta a dignidade singular da reprodução humana, a qual é fruto de uma doação amorosa e total de duas pessoas portadoras de traços transcendentais.

No mês de julho[/96] a opinião pública mundial foi interpelada pelo casos de milhares de embriões humanos condenados a morrer na Inglaterra, pois ninguém se interessou por eles. Podiam parecer cabecinhas de alfinete insignificantes, sem importância e sem valor humano. – Nas páginas que se seguem, o caso será passado em revista; ao quê acrescentaremos as conclusões de um estudo feito por cientistas italianos que afirmam: “O embrião é um de nós”.

1. Os embriões sacrificados na Inglaterra

A fecundação artificial em proveta tem sido praticada com freqüência na Inglaterra por dois motivos:

  1. há casais estéreis, que por uma razão qualquer não podem procriar, embora desejem ter um filho; daí o recurso a alguma das modalidades da fecundação artificial;

  2. esta também é praticada para produzir criancinhas cujos tecidos e órgãos serão aproveitados no tratamento de adultos carentes de algum enxerto ou transplante.

Todavia, para obter um embrião sadio e aproveitável, são postas em atividade numerosas sementes humanas, das quais podem resultar alguns embriões – sadios uns, defeituosos outros. Os cientistas interessados aproveitam apenas uns poucos desses embriões e deixam os outros conservados em baixa temperatura, à espera de que alguém os solicite para experimentação médica ou para uma gestação normal. Os embriões podem manter-se vivos durante muito tempo; as leis inglesas, porém, não permitem que embriões não procurados ou solicitados sejam guardados por mais de cinco anos. A razão disto é principalmente o elevado custo financeiro que o congelamento impõe aos pesquisadores; aliás, o custo é sempre mais caro, porque o “estoque” de embriões aumenta de mês para mês.

Os jornais nos deram notícia de que, na quarta-feira 31 de julho [de 1996], à meia-noite, terminava o prazo para pedidos de clemência em favor de embriões fadados à destruição na Inglaterra.

2. “O embrião é um de nós”

O Comitê Nacional de Bioética da Itália publicou recentemente um documento intitulado “Identià e Statuto dell’Embrione Umano” (Identidade e Estatuto do Embrião Humano). Apresentou-o à imprensa o Dr. Francesco D’Agostinho, Presidente do mencionado Comitê. A tese conclusiva desse texto, resultante de estudos protraídos por mais de um ano e meio, soa: “O Embrião é um de nós”, é uma pessoa, é gente. Mais explicitamente aí se lê: “O Comitê chegou unanimemente a reconhecer o dever moral de tratar o embrião humano, desde a fecundação, segundo os critérios de respeito e tutela que se devem adotar em relação aos indivíduos humanos aos quais se atribui comumente a característica de pessoa”.

Em conseqüência, o Comitê proclamou “moralmente ilícitas”:

  • a produção de embriões para fins de experimentação médica ou para fins comerciais ou industriais;

  • a produção múltipla de seres humanos geneticamente idênticos mediante a fissão geminada ou clonagem;

  • a criação de “quimeras” ou de indivíduos constituídos de células de origem genética diversa;

  • a produção de híbridos “homem-animal-irracional”;

  • a transferência de embriões humanos para útero de animal irracional e vice-versa.

Ainda com unanimidade o Comitê classificou “como moralmente lícitas eventuais intervenções terapêuticas em embriões, desde que destinadas a proteger a vida e a saúde dos mesmos. Reconheceu também como legítima a experimentação em embriões mortos por aborto.

Alguns membros do Comitê estenderam a iliceidade a:

  • a supressão ou manipulação nociva de embriões;

  • o diagnóstico anterior ao implante, destinado a suprimir os embriões, caso sejam tidos como ineptos para a vida;

  • a formação, em proveta, de embriões que não sejam destinados ao implante no útero materno.

Sobre o congelamento de embriões pronunciou-se o Comitê nestes termos:

    “O Comitê afirma que o respeito pela vida do embrião deve merecer prioridade sobre outros valores e que, portanto, devem ser definidas normas jurídicas aptas a garantir aos embriões não aproveitados a possibilidade de vida e desenvolvimento”.

O Dr. Francesco D’Agostinho comenta o significado de suas conclusões para o foro legislativo da Itália:

    “O nosso trabalho tem caráter consultivo, na expectativa de que o Parlamento regulamente a matéria com suas leis. Indicamos princípios normativos,… sugeridos numa perspectiva ética destinada a orientar; toca aos legisladores continuar o trabalho. O importante é que o Parlamento não se perca em questões filosóficas, mas considere algumas linhas de ação concreta, como, por exemplo, a proibição de se produzirem embriões além do necessário. O que espero, é que o problema não seja ulteriormente adiado; está suficientemente amadurecido para que os nossos políticos o levem a sério. Além disto, a questão está madura também no plano internacional; faço votos para que a Itália seja reconhecida como pioneira nesta área de pesquisas”.

Acrescentou o Dr. Francesco D’Agostinho:

    “O Comitê rejeita a experimentação indiscriminada feita em embriões. No fundo, tem-se aqui uma questão de controle público sobre a atividade dos pesquisadores. A sociedade tem o direito de saber o que fazem os cientistas; não podemos continuar a dar carta branca aos cientistas; eles devem tornar-se conscientes dos valores e dos problemas éticos ligados às suas pesquisas”.

Como se vê, o bom senso se pronunciou, lembrando a escala de valores que a ciência sem consciência tem esquecido; o ser humano não é máquina, nem é equiparável a outros viventes deste mundo; tem alma espiritual e, por isto, transcende a matéria e suas técnicas reprodutivas. O ser humano tem um ideal de vida, que ele abraça com inteligência e amor; é da inteligência e do amor do homem e da mulher comprometidos entre si que nasce a prole; esta é a expressão da doação íntima de marido e mulher.

A propósito tem-se manifestado o Papa João Paulo II, do qual vão citadas algumas reflexões sob o título abaixo:

3. A palavra de João Paulo II

Aos 24 de maio[/96] o Santo Padre dirigiu aos participantes do Simpósio sobre a encíclica Evangelium Vitae (Evangelho da Vida) as seguintes palavras:

    “Diante do humanismo ateu, que desconhece ou até mesmo nega a dimensão essencial do ser humano, ligada à sua origem divina e com o seu destino eterno, é tarefa do cristão e, sobretudo, dos Pastores e Teólogos, anunciar o Evangelho da vida, segundo o ensinamento do Concílio Vaticano II, que, atingindo com uma frase lapidária as profundezas do problema, afirmou: Na realidade, o mistério do homem só se esclarece verdadeiramente no mistério do Verbo encarnado (Gaudium et Spes, 22).

    Este urgente empenho interpela de maneira singular os juristas cristãos, levando-os a fazer com que se manifeste, nos setores da sua competência, o caráter intrinsecamente frágil de um Direito fechado à dimensão transcendente da pessoa. O fundamento mais sólido de todas as leis que tutelam a inviolabilidade, a integridade e a liberdade da pessoa, reside, com efeito, no fato de esta ter sido criada à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1,27).

    A este propósito, um problema que investe diretamente o debate entre biólogos, moralistas e juristas é constituído pelos direitos fundamentais da pessoa, que devem ser reconhecidos a todos os sujeitos humanos, durante o inteiro arco da sua vida e, de modo particular, desde o seu surgir.

    O ser humano – como evocou a instrução `Donum vitae’ e como reconfirmou a Encíclica `Evangelium vitae’ – `deve ser respeitado e tratado como uma pessoa desde a sua concepção e, por isso, desde esse mesmo momento, devem-lhe ser reconhecidos os direitos da pessoa e, primeiro de todos, o direito inviolável de cada ser inocente à vida’ (Carta Encíclica `Evangelium vitae’, n0 60: AAS 87 [1985], 469; cf. Instrução `Donum vitae’, 1: AAS 80 [1988], 79).

    Esta afirmação encontra plena correspondência nos direitos essenciais, próprios do indivíduo, reconhecidos e salvaguardados na Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 3).

    Apesar da distinção entre as ciências envolvidas e, reconhecendo que a atribuição do conceito de pessoa pertence a uma competência filosófica, não podemos deixar de reconhecer como ponto de partida o estatuto biológico do embrião, que é um indivíduo humano, com a qualidade e a dignidade próprias da pessoa.

    O embrião humano tem direitos fundamentais, ou seja, é titular de elementos constitutivos indispensáveis para que a atividade conatural a um ser possa desenvolver-se em conformidade com um princípio vital que lhe é próprio…

    Pelo mesmo motivo, considero dever fazer-me novamente intérprete destes direitos inalienáveis do ser humano desde a sua concepção, para todos os embriões que, não raro, são expostos a técnicas de congelamento (crioconservação), tornando-se em muitos casos objetos de pura experimentação ou, pior ainda, destinados a uma programada destruição com o consentimento legislativo.

    De igual modo, confirmo como gravemente ilícito para a dignidade do ser humano e da sua vocação à vida, o recurso aos métodos da procriação que a Instrução “Donum vitae” definiu como inaceitáveis para a doutrina moral.

    A iliceidade de tais intervenções no princípio da vida e sobre embriões humanos já foi afirmada (cf. Instrução `Donum vitae’, 1,5; II.), mas é necessário que os princípios sobre os quais se fundamenta a própria reflexão moral sejam reconhecidos também a nível legal.

    Portanto, faço apelo à consciência dos responsáveis do mundo científico e, de maneira particular, aos médicos, para que seja posto termo à produção de embriões humanos, tendo em conta o fato de que não se entrevê uma saída moralmente lícita para o destino humano dos milhares de milhares de embriões congelados, que, contudo, são e permanecem sempre titulares dos direitos essenciais e, por conseguinte, devem ser tutelados sob o ponto de vista jurídico como pessoas humanas.

    A minha voz dirige-se também a todos os juristas a fim de que se prodigalizem para que os Estados e as Instituições internacionais reconheçam juridicamente os direitos naturais a partir da aparição mesma da vida humana e, além disso, se façam defensores dos direitos inalienáveis que os milhares de embriões `congelados’ intrinsecamente conquistaram no momento mesmo da fecundação.

    Os próprios Governantes não podem subtrair-se a este empenhamento, para que o valor da democracia, que afunda as suas raízes nos direito invioláveis reconhecidos a cada indivíduo humano, seja salvaguardado desde as suas origens”.

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