O fracasso conjugal não implica em nulidade do matrimônio

Por ocasião da solene inauguração do Ano Judicial [de 2004], o novo Decano da Rota Romana, acompanhado pelos juízes, promotores de justiça, defensores do vínculo, oficiais e advogados desse órgão, deixaram o Palácio da Chancelaria – sua sede habitual – e se dirigiram ao Palácio Apostólico, para participarem do tradicional encontro com o Supremo Legislador da Igreja, o Santo Padre.

É comum o Papa propor algumas reflexões para os servidores desse Tribunal, acerca dos aspectos fundamentais do matrimônio: sua índole natural, indissolubilidade, dignidade sacramental… No discurso deste ano, João Paulo II abordou o favor iuris de que goza o matrimônio, ou seja, a presunção de sua validade até que se prove o contrário.

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Monsenhor Stankiewicz

Entrevistamos o novo Decano da Rota Romana, monsenhor Antoni Stankiewicz, de origen polonesa, prelado auditor do Tribunal desde 1978. Ele acaba de suceder a monsenhor Raffaello Funghini, que há poucos meses assumiu a presidência do Tribunal de Segunda Instância do Estado da Cidade do Vaticano.

P: Em seu discurso anual, o Santo Padre se referiu a um problema muito difundido hoje em dia: o daquele que pressupõe a invalidade do matrimônio em razão do fracasso da vida conjugal. O que o senhor poderia comentar a esse respeito?

MS: Falando acerca do favor matrimonii, o Santo Padre classificou como errônea a tese segundo a qual o fracasso do matrimônio presume a sua nulidade desde o princípio. Essa tese – segundo o papa – induz à busca intrumental dos “capítulos de nulidade” para justificar o pronunciamento judicial, baseando-se unicamente no fato do fracasso matrimonial. No entanto, a declaração de nulidade pressupõe a existência da incapacidade original ou do defeito essencial do consentimento de um dos futuros esposos no momento da celebração do matrimônio.

P: Como evitar os matrimônios nulos?

MS: Para prevenir que haja fracassos matrimoniais, onde de fato pode ocorrer verdadeira nulidade, João Paulo II tem exortado aos párocos e a seus colaboradores que, na preparação dos noivos para o matrimônio, verifiquem com mais seriedade a existência dos requisitos necessários para o casamento, especialmente os que se referem ao consentimento e às disposições reais para o matrimônio. As investigações pré-matrimoniais – segundo o papa – não devem ficar no nível de uma prática exclusivamente burocrática para a admissão às núpcias.

P: O Santo Padre chegou a citar a conveniência de não se celebrar o matrimônio em alguns casos?

MS: Sim, o papa pediu para que se negue o acesso ao matrimônio sempre que o pastor de almas comprovar que os futuros esposos demonstram querer rejeitar claramente o que a Igreja pretende fazer quando celebra o matrimônio entre batizados. Isto ocorre quando os nubentes não querem se comprometer, em seu consentimento conjugal irrevogável, a dedicar toda a sua vida a um amor indissolúvel, aberto para a procriação e a fidelidade.

P: Quais são as competências da Rota Romana?

MS: Ela é a instância superior para toda a Igreja, em grau de apelação para a Sé Apostólica; provê a unidade da jurisprudência e, mediante suas sentenças, ajuda os Tribunais de grau inferior, sendo, assim, um ponto de referência obrigatório. Todas as suas decisões são colegiais.



Causas examinadas

P: Quantas causas o Tribunal examina, aproximadamente, a cada ano?

MS: Pelos últimos dados que tenho, posso afirmar que ao longo do ano judicial de 2003 foram examinadas 1.618 causas no Tribunal da Rota Romana.

P: E quais são as principais causas de nulidade?

MS: Entre os principais “capítulos de nulidade”, são cada vez mais freqüentes o da incapacidade psíquica de uma das partes; a seguir vêm os capítulos sobre a simulação total ou parcial e os vícios de consentimento, especialmente a coação e o dolo.

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