O panteísmo de Star Wars

A Força: Deus e os Homens Intergaláticos – Comentário ao filme Star Wars I – A Ameaça Fantasma

Quem dera nenhum dos que estejam lendo esta nota vejam o filme Guerra nas Estrelas (GE), destinado primeiramente ao público adolescente. Seguramente, mesmo que não agrade muito este tipo de ficção científica, este thriller da indústria cinematográfica estadunidense nos enche os olhos freqüentemente.

Não obstante, minha intenção é que examinemos este filme como um fenômeno cultural, pois é um tipo de amostra de um modo de entender Deus, o mundo e o homem, que se transmite pela tela, entre outros meios. Neste sentido, além de sucesso de bilheteria e marketing, o filme GE desperta adesões, fanatismos que vão mais além das telonas. Mais especificamente, quero que analisemos suas alusões a conteúdos religiosos, os descrevamos e julguemos. Vamos, portanto.

A História

Este primeiro filme narra as ‘origens’ da série. O futuro Darth Vader e também futuro pai de Luke Skywalker era um pequeno e encantador menino chamado Anakin Skaywalker, nascido de uma mãe virgem que se chamava Shmi. São encontrados em seu distante planeta, chamado Tatooine, pelo mestre Jedi Quin-Gon Jinn, membro da comitiva da rainha de Naboo, Amidala, em viagem para a cidade-planeta capital de Coruscant, para se encontrar com o Senado Intergalático.

O menino os ajuda utilizando seus conhecimentos de mecânica e suas destrezas como competidor de corridas. Analisando seu sangue, suspeita-se que ele seja “o eleito”. Ganha sua liberdade e se junta ao mestre Jedi e a Obi-Wan Kenobi, aprendiz de Gon Jinn e logo mestre de Anakin. Conseguem libertar, momentaneamente, o planeta Naboo, que foi invadido pela Federação de Comércio. O menino tem um papel importante, mesmo que infortúito, nesta vitória parcial.

Uma Religião Light

Mesmo que não pareça à primeira vista, estamos diante de um filme com um conteúdo, digamos assim, “religioso”. Encontramos expressões tipicamente religiosas: orações, lugar sagrado, profecia e revelação. Mais ainda: Discretamente nos introduz a imagem do Divino. Este descobrimento levou inclusive a revista Time a apresentar uma entrevista com seu autor, onde apresentou um sugestivo título de “Teologia da Guerra nas Estrelas“.

Este fenômeno, aparentemente curioso, está incluído no “retorno das religiões”, que é característico da chamada “Nova Era”. Esta nova era, como mentalidade e sensibilidade, manifesta-se de diversas formas, também no cinema. Uma de suas características mais importantes é o de ser uma espécie de “renovação” entre o científico e o ilustrativo. Um pouco de espiritualidade oriental, outro de pseudociência, uma pitada de elementos cristãos, uma porção de astrologia. Tudo isto vira uma verdadeira “salada”, bastante vaga e ambígua, que vai pouco a pouco ganhando a apreciação dos desencantados povos do fim do século.

Outra de suas características é a de fazer perder-se a noção de Deus, não pelo caminho do ateísmo, mas pela sua diluição. Em GE, Deus é diluído na indefinida idéia da Força. O sagrado tem esta forma.

Uma mostra da chamada força no filme: a força é extraordinária, a força nos guiará, deve-se concentrar na força, se se deixar silenciar pode escutar sua vontade. E não duvidemos de seu retoque “litúrgico”: que a força de acompanhe

O que dizer disto tudo? Como interpretar criticamente estas vagas ilusões aos sagrado?

Estamos diante do que classicamente se chama de panteísmo? O que é isso? É a afirmação de que tudo é Deus? De que existe uma grande unidade do universo, da qual o homem faz parte, e esta unidade é o divino?

Este “Deus” não é um Deus “transcendente”, que está além de nós e de tudo. Tudo é Deus. E, consequentemente, não é um Deus “pessoal”, distinto em nós, que se pode conversar, que podemos chamar. Este “Deus” panteísta somente é uma “energia” que invade tudo. Neste filme esta energia é a Força.

Chesterton certa vez disse algo acertado para este assunto: “Desde o momento em que os homens deixaram de crer em Deus não significa que não crêem mais em nada, pelo contrário, agora crêem em tudo”. A “religião”, o panteísmo, consiste em “inserir-se” nesta totalidade, em fazer-se “um com o universo”.

Não há lugar para atribuir nada a ninguém, se não há pessoas senão o inefável “Tudo”. Não vale a pena questionar-se por “nada”: de onde viemos, para onde vamos, porque de nada adiantará. Por outro lado não podemos esquecer que o filme também aborda o “lado negro”, uma versão do que o “mal”. Quem o representa se mostra como o adversário, com seus chifres (Darth Maul). Também possui seus sequazes que seguem a obra do “príncipe das trevas”.

Algumas Questões de Nossa Fé

Como julga a nossa fé diante destas sugeridas idéias do divino?

Deus não é o universo, mas seu criador. O Deus em que cremos é transcendente, não se confunde à sua criação. O Deus que se manifestou e que implantou Seu reino neste mundo não é alguém sem nome, mas a comunhão de pessoas. Não é anônimo, mas o que possui “o nome acima de todos os nomes” (Fl 2,9).

Ele mesmo nos revelou seu nome por Moisés na Antiga Aliança, por Seu filho feito homem na Nova Aliança. É o único que é Pai, Filho e Espírito Santo. Quando Deus revela Seu nome se torna “invocável” e assim o transcendente vem a nós. Mas o que dizer da força? Assim definimos Deus? Não. Nosso “Deus é amor”, como afirma São João, tem entranhas de misericórdia, é compassivo. Sua força revela na fraqueza, como recorda São Paulo (2 Cor 2,9). O Todo-Poderoso se revela na humildade, na impotência da cruz.

Da Força aos Fortes

Outro extremo destas questões. Sabemos bem que que não é possível separa a idéia e o conceito de Deus da idéia e conceito do homem, já que ele é Sua imagem criada. Até poderíamos inventar: “Diz-me o que dizes de Deus e te direi o que crês da humanidade”. Que imagem humana surge da força? O filme nos mostra o bem e o mal. O homem forte. Por isso se chama à série “Guerra”. Segundo esta visão, o combate está incrustado na natureza humana, o conflito, o vencer pela força.

A relação entre os seres humanos não será de fraternidade nem de reconhecimento de si mesma como imagem de Deus nos demais. Se relacionarão segundo a lei do mais forte. O fraco é descartado, nada pode o salvar. Um pouco de tudo isto aparece no filme de uma forma evidente. O parlamento galático é inoperante, portanto o diálogo deve ser abandonado. A Federação do Comércio, com seu exército de Droids, ataca impunemente e quer conseguir à força seus interesses econômicos. A imposição vélica triunfa sobre a negociação pacífica. O guerreiro se impõe ao político.

Alusões Cristãs

Não quero terminar estas abreviações sem ao menos mencionar outro elemento que aparece neste episódio: a alusão a diversas realidades cristãs. São elas:

O menino – Anakin – nascido de uma virgem, referência à Nossa Sagrada Mãe de Deus, Maria Santíssima (Lc 1,36);
É chamado “o eleito”, como uma menção ao Filho de Deus na cena do batismo (Mt 3,17);
Ele trará o equilíbrio, que soa como “o ano da graça do Senhor” (Is 61,2; Lc 4,19), o jubileu que Cristo proclama?
Relembrando João Batista, há dúvidas quanto à sua identidade: “será ele?” (Mt 11,3);
E, finalmente, inicia, sob a orientação de seu mestre Obi-Wan, seu aprendizado Jedi. A Escritura também nos diz que o Filho único é um aprendiz (Jo 5,19-20).

Termino este comentário relembrando da necessidade de sermos críticos, de saber distinguir e analisar as coisas, em especial ao que tem a ver com os meios de comunicação que não são somente “o que vemos”, mas também “com o que vemos”. A luz da fé nos faz ver coisas e julgarmos segundo Deus, como tentamos fazer aqui.

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