O Primado Petrino e a Infalibilidade

“Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação” (2Pd 1,20).  Por causa do risco de se criarem heresias a partir de falsas interpretações da Bíblia, o Espírito Santo inspirou o apóstolo Pedro a escrever o versículo acima. O próprio Cristo já havia advertido contra os erros e os falsos profetas (cf. Mt 24,11.24-25).

De fato, para proteger a Igreja, e guiar os crentes no caminho da verdade (cf. Jo 16,13), o Espírito de Deus usa de vários recursos. Um deles é a regra de fé e prática contida na Bíblia Sagrada (cf. 2Tm 3,16-17) ? note que a Escritura nunca afirmou ser a única regra de fé e prática. Aceita por todos os cristãos, das mais variadas igrejas e denominações, a Escritura vem, por suas linhas, provar a existência de outro instrumento de proteção do Corpo de Cristo.

Nem sempre aceito fora dos arraiais romanos, da forma como os Pais da Igreja ensinavam desde os primeiros séculos, a instituição do Primado Petrino constitui a salvaguarda da doutrina bíblica.

Ao constituir a Igreja Cristã, rompendo com a Sinagoga, o Senhor Jesus estabeleceu um corpo diretivo, um colégio de apóstolos com o dever de ensinar a sã doutrina e interpretar aquilo que a própria Bíblia definiria, anos mais tarde, como não sendo passível de particular opinião dogmática (cf. 2Pd 1,20). Obviamente que, sendo a Escritura um livro para nos guiar no caminho da santificação, ela deve ser lida, entendida e interpretada. Todos, por termos o Espírito Santo, temos acesso à interpretação das palavras contidas no Livro Sagrado.

Porém, como forma de não sairmos da ortodoxia, devemos estar em unidade com o ?fundamento dos apóstolos? (Ef 2,20). E o que é estar em unidade com os apóstolos, senão adequar as convicções pessoais advindas da leitura e estudo bíblicos ao ensinamento apostólico dos doze ou de seus sucessores, os bispos?

Para que a doutrina apostólica seja considerada o balizador das questões teológicas, deve-se crer, pela lógica, que ela é dotada de uma graça especial de Deus de infalibilidade.

Como visto em outros estudos (cf. “Tradição, Sucessão Apostólica e Magistério”), houve um tempo em que a Bíblia não tinha sido plenamente redigida, nem aprovados os livros canônicos. Pela doutrina da infalibilidade da Palavra de Deus, sabemos que, uma vez aprovada num concílio, a Bíblia passou a ser considerada infalível. Mas, no tempo em que só havia Palavra oral, ou seja, doutrina apostólica, como se dava a exposição da verdade? Sem a Bíblia escrita, Deus devia proporcionar uma outra forma de sustentação de Seu Verbo (cf. Jo 1,1), que é eterno.

E foi pela Tradição, i.e., ensinamento dos apóstolos e de seus sucessores, também infalível. Ou Deus permitiria um tempo de confusão em Seu Povo, justamente no início da pregação do Evangelho?

Contudo, vez por outra, um apóstolo discordava de outro em questões teológicas (cf. At 15,1-2). Por causa dessas coisas, o Senhor Jesus já havia escolhido Pedro como líder dos apóstolos: “Pois também eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão sobre ela” (Mt 16,18).

Todas as igrejas que aceitam o primado de honra de Pedro e seus sucessores, como as ortodoxas, monofisitas, nestorianas e vétero-católicas, além, é claro, da católica romana, citam esse verso como a base para sua crença. Porém, somente a visível Una e Santa Igreja Católica e Apostólica, unida a Roma, estende para o versículo 19 os poderes do primado de Pedro: “E eu te darei as chaves do Reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus…”. E Jesus, ao contrário do que argumentam os nossos irmãos protestantes, não estava se referindo a Si como pedra, pois não estaria usando uma linguagem clara ao mudar o nome de Simão para Pedro e, na mesma sentença, falar de outro assunto sem ligação com essa mudança.

Defendem ainda, os irmãos separados que, no grego (língua do Evangelho) o nome Pedro é “petrus” (pedra pequena) e a pedra sobre a qual foi edificada a Igreja é “petra” (pedra grande), ou seja, não seria Pedro e sim Jesus (“petra”) ou a afirmação de Pedro sobre a divindade do Messias.

Contudo, se o Evangelho foi escrito em grego, Jesus falava, entretanto, o aramaico, e, nesse idioma, o verbete “pedra” não tem gênero, de modo que deduzimos claramente que Jesus se referia a Pedro como pedra da Igreja, e que a distinção em grego foi apenas para haver concordância. Afinal, a situação exigia que se usasse uma palavra feminina (“petra”), não por causa da diferença entre as “pedras” (em tamanho ou importância), mas por simples regra gramatical da língua helênica.

Na Bíblia, temos outros três ocasiões de mudança de nome: Abrão, tem seu nome mudado para Abraão (cf. Gn 17,5) e Jacó para Israel (cf. Gn 32,28). A terceira vez que Deus muda o nome de alguém, é justamente a passagem acima, mudando o nome de Simão para Pedro. Em todos os casos, a mudança do nome está intimamente associada a posição de liderança diante do Povo de Deus. Abraão foi o Pai do Povo Hebreu e também, por sua descendência, surgiu  o povo árabe, através de seu filho, Ismael, com a escrava Agár.

Israel, Jacó, filho de Isaac, foi o líder do Povo também, o pai das doze tribos que constituiram o povo, denominado justamente, raça israelita.

No NT, temos São Pedro, colocado, também, numa posição pastoral e de líder do povo renascido no Espírito Santo, pai dos Apóstolos, também em número de doze. Através da hermenêutica e, mais propriamente, da exegese escriturística, podemos compreender com maior clareza essa missão, pois podemos ver a citada associação entre a mudança nominal e a vocação de governo do rebanho.

Para confirmar essa ligação, o texto sagrado nos leva a crer através de várias passagens. É notável o destaque que o Senhor Jesus dá a Pedro, nas Escrituras. Foi Pedro quem andou sobre as águas para certificar-se de que era o Mestre quem estava vindo (cf. Mt 14,25-29). Ele era um dos três apóstolos a presenciar a transfiguração (cf. Mc 9,2-13) e o que tomou a palavra, como um líder, na ocasião (cf. Mt 17,4). Foi ele o que negou Jesus, como forma de explicitar que, mesmo infalível em doutrina, pode errar em questões pessoais (cf. Mt 26,69-75).

Sempre que Jesus quer dar destaque, fala-se, por exemplo, “levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu” (Mt 26,37). Por que não citar os outros nomes, e somente o de Pedro? Por certo, o evangelista Mateus, na época da redação de seu Evangelho, por volta do ano 60 d.C., já reconhecia a autoridade de Pedro sobre os crentes. Essa autoridade é vista em grandes momentos do livro de Atos: na escolha de Matias como apóstolo, Pedro é quem dirige a reunião (cf. 1,15-22); é Pedro quem faz o primeiro discurso querigmático, numa notável demonstração de autoridade (cf. 2,14); é ele quem realiza o primeiro milagre após o Pentecostes (cf. 3,1-7); Pedro explica sobre os milagres (cf. vv. 12-26), num ato que demonstra claramente que é ele o responsável pela nascente comunidade cristã; é Pedro quem repreende Ananias (cf. 5,3-4), numa posição de líder da Igreja, e também a Simão, o mago (cf. 8,18-20); Pedro é quem tem a experiência do derramamento do Espírito Santo nos gentios (cf. 10,1-48), como uma espécie de orientação do Senhor, e, como líder, decide (cf. vv. 44-48) e explica-se perante a Igreja (cf. 11,1-18); é também Pedro quem primeiro fala no concílio de Jerusalém (cf. 15,1-35).

Por esses fatos, constatamos que era realmente Pedro o dirigente da Igreja, e que sua palavra era a manifestação da infalível vontade de Deus (cf. Mt 16,19). Confirmado pelo Senhor Jesus como o pastor de toda a Igreja (cf. Jo 21,15-17), Pedro torna-se o bispo de Antioquia, e no fim de sua vida, estabelece sua sede em Roma. É de Roma que sagra seu sucessor, que, segundo a História, continua a linha apostólica de líder da Igreja e detentor das chaves do Reino, portanto infalível nas questões de doutrina, uma salvaguarda da verdade da salvação pelo Sangue de Cristo. Pecadores e cometendo muitos erros, Pedro e seus sucessores não erram no que se refere a doutrinas. Não permitiria Deus que o inferno vencesse

Sua Igreja (cf. Mt 16,18)!!!

Líder de todos os crentes, quer aceitem, quer não, o bispo de Roma, patriarca do Ocidente e papa da cristandade, é o símbolo de unidade e baluarte da doutrina contra os falsos profetas!


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