O problema da autoridade na “Sola Scriptura”

Autor: Alessandro Lima*.

A Reforma Protestante iniciada pelo monge agostiniano Martinho Lutero  promoveu no cristianismo o falso princípio da Sola Scriptura (Somente a Escritura). Segundo este falso princípio a Igreja deve ter como doutrina somente o que estiver fundamentado na Escritura.

É injusto dizer que Lutero tenha inventado a Sola Scriptura, estudos mostram que antes de Lutero outros teólogos já defendiam tal princípio, como é o caso de John Wicliff.

Este pilar da doutrina protestante apresenta vários problemas de sustentação, o que tem resultado na divisão do protestantismo em cada vez mais seitas com doutrinas cada vez mais divergentes. Este artigo vem tratar especificamente de um destes problemas que é o problema da Autoridade.

Até o séc XVI (quando surgiu a Reforma) comumente se cria que a Igreja Católica possuía autoridade para definir questões de moral e fé. A Igreja era tida como Mãe e Mestra dos Cristãos. Lutero vem no caminho contrário exatamente questionando esta autoridade. Para ele somente a Sagrada Escritura é a única autoridade em questões de fé e moral para o Cristão. Basicamente a doutrina Luterana da Sola Scriptura é composta pelos seguintes princípios:

– somente a Escritura deve ser usada como fundamento da Fé cristã;

– somente a Escritura é a autoridade única e última para o cristão.

Embora o primeiro princípio tenha deixado lacunas enormes quanto ao que é a Palavra de Deus no Protestantismo, o segundo princípio é a fonte das contínuas divisões no protestantismo.

Toda Lei possui a sua autoridade, pois foi criada para ser respeitada e tem como objetivo algum bem comum. Tal é o caso das Constituições Nacionais, das leis de trânsito, das leis penais e etc. No entanto toda lei (em qualquer lugar que seja) necessita de uma autoridade que a interprete e a faça cumprir. Na verdade toda Lei, por mais autoridade que possua, não possui autoridade sozinha, depende de uma outra autoridade para que os benefícios que foram objetos da Lei sejam alcançados. Por exemplo: como se resolveriam os casos penais sem a autoridade dos Juízes que analisam os casos, interpretam a Lei e dizem quem está certo e quem está errado? Provavelmente estes casos não se resolveriam nunca, pois as partes envolvidas dariam a interpretação da Lei segundo o seu entendimento.

Para exemplificar melhor imaginem uma batida no trânsito entre um carro e uma moto em um cruzamento. Sem a autoridade competente que vai avaliar a quem está correto e quem está errado, provavelmente cada um dos motoristas pegaria seu código de trânsito e começaria a dizer que ele está certo e o outro errado baseado no artigo “tal e tal”. Onde chegaríamos se o mundo funcionasse desta forma? Em lugar algum claro… Viveríamos num verdadeiro faroeste, com cada um aplicando o seu entendimento da Lei vigente, porque não existe nenhuma autoridade que tenha a autoridade de “ligar ou desligar” (cf. Mt 16,18-19).

É exatamente este problema que o Protestantismo vive. Como não existe uma autoridade que interprete oficialmente a Escritura, cada confissão protestante interpreta a Escritura conforme entende (ou convém) e a unidade doutrinária que é uma característica da verdadeira fé Cristã (cf. Ef 4,5) torna-se algo impossível. É claro que todo cristão deve ter acesso à Escritura e pode lê-la, no entanto sem um Magistério Oficial, é impossível chegar à unidade em questões de moral e fé.

O sr. Krogh Tonning famoso teólogo protestante norueguês, convertido ao catolicismo, no século passado já afirmava: “Quem trará à nossa presença uma comunidade protestante que está de acordo sobre um corpo de doutrina bem determinado ? Portanto uma confusão (é a regra ) mesmo dentre as matérias mais essenciais” ( Le protest. Contemp., Ruine constitutionalle, p. 43 In I.R.C., Franca, L., pg 255. 7ª ed, 1953).

Curiosamente o Protestantismo que se diz herdeiro da verdadeira fé primitiva, repugna a autoridade do Magistério da Igreja Católica, que é a autoridade que a Igreja Antiga se servia para chegar à unidade da fé. A realização dos inúmeros Concílios Regionais e Gerais (ou Ecumênicos) são a prova desta realidade; inclusive a palavra “Concílio” vem de “Conciliar”, que aplicado à realidade da Igreja Antiga, era a reunião dos Bispos do mundo inteiro que tinha o objetivo de acabar com a dúvida e alcançar a unidade doutrinária.

Felizmente o Pai da Sola Scriptura viveu o bastante para testemunhar e confessar os malefícios de sua doutrina: “Este não quer o batismo, aquele nega os sacramentos; há quem admita outro mundo entre este e o juízo final, quem ensina que Cristo não é Deus; uns dizem isto, outros aquilo, em breve serão tantas as seitas e tantas as religiões quantas são as cabeças” ( Luthers M. In. Weimar, XVIII, 547 ; De Wett III, 6l ).

Martinho Lutero percebeu que a autoridade da Sagrada Escritura não poderia se confundir com a autoridade de um Magistério Oficial que a interprete. Os anos que se passaram após a instituição da Reforma Protestante testificam bem que Lutero ao atacar a autoridade da Igreja como Mãe e Mestra de todos os cristãos, abalou grandemente os fundamentos doutrinários do Cristianismo. Ora, se abalamos o fundamento de uma casa acabamos por comprometer toda a sua estrutura. Não é à toa que São Paulo afirmava que “A Igreja é a Coluna e o Fundamento da Verdade”(1Tm 3,15).

Lutero que fez germinar no Cristianismo a semente da Sola Scriptura também deixou para a posteridade a solução do problema que causara: “Se o mundo durar mais tempo, será necessário receber de novo os decretos dos concílios (católicos) a fim de conservar a unidade da fé contra as diversas interpretações da Escritura que por aí correm” (Carta de Lutero à Zwinglio In Bougard, Le Christianisme et les temps presents, tomo IV (7), p. 289).

A conclusão de Lutero ecoa até hoje. Infelizmente continuamos constatando que a grande maioria dos protestantes continua dormindo com um barulho desses…

Autor: Alessandro Lima *.
* O autor é arquiteto de software, professor, escritor, articulista e fundador do Apostolado Veritatis Splendor.

 

* O autor é arquiteto de software, professor, escritor, articulista e fundador do Apostolado Veritatis Splendor.

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