História
O fundamentalismo é um movimento protestante iniciado nos fins do século 19 início do século 20. Foi uma reação contra o assalto de um criticismo racionalista iniciado por estudiosos alemães cuja intenção era sobrepujar a crença na inerrância bíblica. Algumas denominações protestantes buscaram refúgio em um literalismo semântico que aparentemente protegia a bíblia do ataque destes estudiosos agnósticos. A simplicidade e aparente claridade desta abordagem tem recentemente influenciado muitos católicos, que quase nunca entendem as bases doutrinárias da Igreja Católica. Eles estavam buscando a ordem em meio ao caos doutrinário causado por teólogos heterodoxos que somente visavam arruinar a fé cristã. Em muitas áreas dos EUA as maiores denominações são de católicos e ex-católicos.
O fundamentalismo bíblico, hoje em dia, refere-se à interpretação bíblica com um rígido literalismo, não levando em conta o contexto de determinada passagem, a Sagrada Escritura em sua totalidade, e a Sagrada Tradição. Este método de interpretação, o literalismo, não deve ser confundido com o sentido literal das Escrituras, que a Igreja sempre afirmou. Um exemplo de literalismo é o mal uso de Ef 2,8-9:
Porque é gratuitamente que fostes salvos mediante a fé. Isto não provém de vossos méritos, mas é puro dom de Deus. Não provém das obras, para que ninguém se glorie
Os fundamentalistas geralmente citam este versículo como uma prova de que somos salvos somente pela fé, rejeitando, portanto, a necessidade das boas obras. Entretanto o versículo nunca afirma que somos salvos apenas tendo fé. Esta falsa idéia é plenamente rejeitada em Tiago 2,24:
Vedes como o homem é justificado pelas obras e não somente pela fé?
O que São Paulo está afirmando é que somos salvos pela graça através da fé, que encaixa perfeitamente com a doutrina católica, #161:
É necessário, para obter esta salvação, crer em Jesus Cristo e naquele que o enviou para a nossa salvação. Como, porém, sem fé é impossível agradar a Deus (Hb 11,6) e chegar ao consórcio dos seus filhos, ninguém jamais pode ser justificado sem ela, nem conseguir a vida eterna, se nela não permanecer até o fim (Mt 10,22; 24,13)
A respeito do uso da passagem de Efésios para justificar a doutrina da Sola Fide sem a necessidade de boas obras, esta mesma cai por terra quando, logo mais, lemos no versículo 10 do mesmo capítulo:
Somos obra sua, criados em Jesus Cristo para as boas ações, que Deus de antemão preparou para que nós as praticássemos
Este é apenas um exemplo de como os fundamentalistas concebem a sua teologia da Sagrada Escritura. Citam passagens fora do contexto para poder sustentar sua posição, que é contrário ao sentido literal do texto sagrado. Outro exemplo desta tendenciosa leitura bíblica é a rejeição à massiva de que Jesus está se referindo ao seu corpo e sangue no discurso eucarístico (Jo 6,25-71). Iniciando de um ponto de vista teológico, que afirma que o texto não pode significar o que Jesus está dizendo, a passagem é distorcida para dar um significado meramente figurativo às palavras de Jesus. Entretanto, à medida que alguém estuda profundamente a passagem, mais convincente se torna a interpretação de que Jesus não está falando metaforicamente.
O fundamentalismo bíblico também cria uma falsa tensão entre a verdade da divina revelação e a verdade científica. O Catecismo # 159 declara que:
Ainda que a fé esteja acima da razão, não poderá jamais haver verdadeira desarmonia entre um e outro, portanto, se a pesquisa metódica, em todas as ciências, proceder de maneira verdadeiramente científica, segundo as leis morais, na realidade nunca será o posta à fé
Dessa forma, quando Jesus está dizendo que o grão de mostarda é o menor entre as sementes (cf. Mt 13,32) não está dando um laudo científico. Com isso, a inerrância bíblica não é desafiada quando os botânicos dizem que há sementes menores. Similarmente, é um grave erro afirmar que Deus criou o mundo porque o Gênesis diz que Ele criou o mundo em seis dias. Ora, pode ser que sim, mas também pode ser que não. A Bíblia não destaca o problema e a ciência somente oferece teorias e especulações. Em outras palavras, como Deus criou é irrelevante para a criação contada em Gênesis. Que Deus criou e que há uma relação entre Deus e a humanidade é o verdadeiro foco da narração bíblica, e não ciência.
A Inerrância Bíblica
A Igreja Católica ensina que a Bíblia é a palavra de Deus e contém a palavra que é Deus (cf. #s 101-104). A inerrância bíblica deriva do fato de que Deus é o seu autor primário. Ele não pode enganar nem ser enganado. Pelo Seu Espírito Santo, Ele preservou os autores sagrados do erro durante a redação dos livros que hoje formam o cânon das Sagradas Escrituras (cf. #s 105-107).
Cada porção da Bíblica é inerrante. Esta verdade foi proclamada em 1893 pelo Papa Leão XIII em sua Encíclica Providentissimus Deus, enfatizado pelo Papa Benedito XV em Spiritus Paraclitus (1920) e reafirmado em 1943 pelo Papa Pio XII na Encíclica Divino Afflante Spiritu. O Catecismo, citando o Concílio Vaticano II, faz a seguinte afirmação (#107):
Portanto, já que tudo o que os autores inspirados ou os hagiógrafos afirmam, deve ser tido como afirmado pelo Espírito Santo…fielmente e sem erro a verdade que Deus em vista de nossa salvação quis fosse consignada nas Sagradas Escrituras
O sentido literal das Escrituras, ao contrário à interpretação literalista, é o que fora diretamente expresso pelos autores inspirados (Comissão Bíblica Pontifícia, 1993, A Interpretação da Bíblia pela Igreja), o sentido literal leva em consideração que o Senhor usa uma figura de linguagem conhecida como hipérbole. Uma apropriada interpretação literal deve levar em consideração as regras da época, a intenção do autor, o gênero literário e o contexto histórico. Entretanto a interpretação literalista efetuada pelos fundamentalistas não leva estas características em consideração.
Existem dificuldades na Bíblia? Sim, e quando se defrontar com elas, não há conselho melhor do que o dado por Santo Agostinho:
Aprendi a receber estes livros que agora são chamados canônicos com tamanha reverência e honra que eu mais firmemente creio que nenhum dos seus autores cometeu algum erro no que escreveu. Se porventura encontro algo nas Escrituras que aparentem ser contrárias à verdade, presumo que ou o codex está incorreto, ou o tradutor não seguiu o que foi dito, ou fora eu quem não a entendi apropriadamente (Carta a Jerônimo)