O ROSÁRIO: ORIGEM E SIGNIFICADO
O costume de rezar em breves fórmulas de oração consecutivas constitui uma das expressões da religiosidade humana, independentemente do Credo que alguém professa. Entre os cristãos, tal hábito já estava em uso entre os eremitas e monges do deserto nos séculos IV e V. Tomou incremento especial no Ocidente: no fim do século X, havia entre os fiéis o costume de rezar o “Pai-nosso” certo número de vezes consecutivas. Esta prática teve origem, provavelmente, nos mosteiros, onde muitos cristãos professavam a Vida Religiosa, mas não estavam habilitados a seguir a oração comum, que compreendia a recitação dos salmos.
Para favorecer esses exercícios de piedade, foi-se aprimorando a confecção das “correntes” que serviam à contagem das preces. Esses instrumentos eram chamados “Paternoster” tanto na França como na Alemanha, na Inglaterra e na Itália ou, menos freqüentemente, “numeralia, fila, computum, preculae”. Os seus fabricantes constituíam prósperas corporações, ditas dos “Paternostries” ou dos “Paternosterer”.
Ao lado de tal prática, ia-se desenvolvendo entre os fiéis outro importante exercício de piedade, o costume de saudar a Virgem Santíssima; repetiam a saudação do anjo a Maria – “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo” (Lc 1,28) -, acompanhada das palavras de Isabel – “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre” (Lc 1,42). A invocação subseqüente – “Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém.” – ainda não estava em uso na Idade Média.
Em conseqüência, por volta do ano 1150, os fiéis conceberam a idéia de dirigir à Maria, 150, 100 ou 50 saudações consecutivas, à semelhança do que faziam repetindo a oração do Senhor. Cada série de saudações – intercalada pela oração do “Pai-nosso” – devia constituir uma coroa de rosas ofertada à Virgem Santíssima; daí os nomes de “rosário” e “coroa” que se foram atribuindo a tal prática; também chamada “Saltério da Virgem Santíssima”, conforme as séries de 150, 100 ou 50 “Pais-nossos”, que faziam as vezes de Saltério dos irmãos conversos nos mosteiros.
Por volta de 1408, o monge cartuxo Henrique de Egher, ou de Calcar, redigiu um poema intitulado “Psalterium Beatae Mariae”, no qual estimulava a recitação de um “Pai-nosso” antes de cada dezena de “Ave-Marias”. Esta forma encontrou espontânea aceitação e tornou-se comum entre os fiéis.
Posteriormente, houve a associação da meditação à recitação vocal das “Ave-Marias”. O dominicano Alan de La Roche, por volta de 1475, sugeria a recitação de 150 mistérios, que percorriam os principais aspectos da obra da Redenção, desde o anúncio do anjo à Maria até a morte da Virgem Santíssima e o juízo final.
Durante séculos, a maneira de celebrar o “Saltério de Maria” variou muito. Papel de relevo na orientação geral desta prática do Rosário coube à benemérita Ordem de São Domingos, à qual foi sempre muito caro esse exercício de piedade; através de Irmandades do Rosário, assim como por meio de pregações, escritos, devocionários, os dominicanos difundiram largamente a devoção.
Foi, finalmente, um Papa dominicano, São Pio V (1566-1572) quem deu ao Rosário a sua forma atual, determinando tanto o número de “Pais-nossos” e “Ave-Marias” como o teor dos mistérios que o devem integrar. O Santo Pontífice atribuiu à eficácia dessa prece a vitória naval de Lepanto, que, aos 7 de outubro de 1571, salvou de grande perigo a Cristandade ocidental; em conseqüência, introduziu no calendário litúrgico da Ordem de São Domingos a festa do Rosário sob o nome de “Festa de Nossa Senhora do Rosário”. A solenidade foi, em 1716, estendida à toda a Igreja. A devoção foi, daí por diante, mais e mais favorecida pelos Pontífices Romanos, merecendo especial relevo o Papa Leão XIII, que determinou que fosse o mês de outubro dedicado à recitação do Rosário.
Em outubro de 2002, o Papa João Paulo II, através da Carta Apostólica “Rosarium Virginis Mariae” propôs que se acrescentasse outros cinco mistérios àqueles até então contemplados no Rosário (mistérios gozosos, dolorosos e gloriosos), chamados “mistérios luminosos” (ou da luz), que compreendem a vida pública do Salvador (do Batismo no Jordão até o início da Paixão). Esta sugestão teve o objetivo de ampliar o horizonte do Rosário, afim de que seja possível a quem o recita com devoção penetrar ainda mais a fundo no conteúdo da Boa Nova e conformar sempre mais a própria existência àquela de Cristo.
Por fim, é importante notar que o Rosário não é uma oração meramente vocal. A repetição das mesmas preces tem o objetivo de criar um clima contemplativo, que permita a meditação e o aprofundamento dos grandes mistérios da nossa fé, associados a cada dezena do Rosário. O aspecto meditativo ou contemplativo é essencial à recitação do Rosário.