Os primeiros cristãos contra o aborto: exemplos para o cristão do século XXI

Os primeiros cristãos contra o aborto

Exemplos para o cristão do século XXI

Todos os Pais da Igreja e os primeiros apologistas e mestres cristãos falaram a favor da vida, e graças a sua influência o aborto e o infanticídio foram gradualmente desaparecendo da Europa.

Para qualquer um que tenha um mínimo de sensibilidade humana é claro que uma das pragas mais infectas, desastrosas e imundas de nossa sociedade em pleno século XXI é o aborto. A Igreja Católica, assim como a maioria das igrejas e comunidades eclesiásticas separadas, condena sem paliativos a aniquilação de seres humanos no seio de suas mães. Dado que a Bíblia não fala especificamente do aborto, embora obviamente haja indícios muito claros de que as Escrituras consideram que o feto é uma vida humana (Juízes 16,17; Salmo 22,9-10; Lucas 1, 15-16 e 41-44; Gálatas 1,15), é importante que estudemos o que acreditavam os primeiros cristãos a respeito deste tema. Seu testemunho é unânime e não deixa lugar a dúvidas na condenação do aborto. A Didaquê, que pôde ter sido escrita inclusive no século I, é possivelmente o primeiro testemunho patrístico em que se introduz veemente condenação:

“Hei aqui o segundo preceito da Doutrina: Não matará; não cometerá adultério; não prostituirá aos meninos, nem os induzirá ao vício; não roubará; não te entregará à magia, nem à bruxaria; não fará abortar a criatura engendrada na orgia, e depois de nascida não a fará morrer.” (Didaquê II)

Na Epístola de Barnabé, escrita na terceira década do século II, chama-se filho ao feto que está no ventre da mãe, se proíbe expressamente o aborto e lhe equipara ao assassinato:

“Não vacilará sobre se será ou não será. Não tome em vão o nome de Deus. Amará a seu próximo mais que a sua própria vida. Não matará a seu filho no seio da mãe nem, uma vez nascido, tirar-lhe-á a vida. Não levante tua mão, de teu filho, ou de tua filha, mas sim, desde sua juventude, ensinar-lhes-á o temor ao Senhor.” (Ep Barnabé XIX,5)

e

“Perseguidores dos bons, aborrecedores da verdade, amadores da mentira, desconhecedores da recompensa da justiça, que não se aderem ao bem nem ao julgamento justo, que não atendem à viúva e ao órfão, que valem não para o temor de Deus, se não para o mal, de quem está longe e remota a mansidão e a paciência, que amam a vaidade, que perseguem a recompensa, que não se compadecem do carente, que não sofrem com o aflito, prontos à maledicência, desconhecedores daquele que os criou, matadores de seus filhos pelo aborto, destruidores da obra de Deus, que fazem de si ao necessitado, que sobre atribulam ao aflito, advogados dos ricos, juízes iníquos dos pobres, pecadores em tudo.” (Ep Barnabé XX, 2)

O primeiro apologista latino Minúcio Félix, chama parricídio ao aborto em sua obra Octavius de finais do século II:

“Há algumas mulheres que, bebendo preparados médicos, extinguem os alicerces do homem futuro em suas próprias vísceras, e dessa forma cometem parricídio antes de pari-lo.”  (Octavius XXXIII)

O apologeta cristão Atenágoras é igualmente cortante em sua consideração sobre o aborto quando escreveu ao Imperador Marco Aurélio:

“Dizemos às mulheres que utilizam medicamentos para provocar um aborto que estão cometendo um assassinato, e que terão que dar contas a Deus pelo aborto… contemplamos ao feto que está no ventre como um ser criado, e, portanto como um objeto aos cuidados de Deus… e não abandonamos aos bebês, porque os que os expõem são culpados de assassinar bebês”
(Atenágoras, Em defesa dos cristãos, XXXV)

Os testemunhos se multiplicam. Assim lemos na Epístola a Diogneto, que os cristãos: “casam-se como todos outros homens e engendram filhos; mas não se livram de sua descendência (fetos)” (Ep a Diogneto V,6)

Tertuliano condena o aborto como homicídio e reconhece a identidade humana do não nascido:

“É um homicídio antecipado impedir o nascimento; pouco importa que se suprima a alma já nascida ou que a faça desaparecer no nascimento. Já é um homem aquele que o será.” (Apologeticum IX,8)

Já no século IV São Basílio vai inclusive mais à frente ao chamar assassinos não só à mulher que aborta, mas também quem proporciona o necessário para abortar, o qual seria perfeitamente aplicável a quem fabrica ou prescrevem a pílula abortiva:

“ As mulheres que proporcionam remédios para causar o aborto assim como as que tomam as poções para destruir aos meninos não nascidos, são assassinas”
(São Basílio, ep 188, VIII)

São Jerônimo trata a situação da mulher que morre enquanto procura abortar a sua criatura:

“Algumas, ao dar-se conta de que ficaram grávidas por seu pecado, tomam remédios para procurar o aborto, e quando (como ocorre freqüentemente) morrem de uma vez, entram no baixo mundo carregadas não só com a culpa de adultério contra Cristo mas também com a do suicídio e do assassinato de meninos. ” (São Jerônimo, Carta a Eustóquio)

Possivelmente o texto mais dramático em relação ao aborto seja um parágrafo que aparece no livro apócrifo conhecido como Apocalipse de Pedro. O livro certamente é de origem gnóstica, o qual supõe que não devemos considerá-lo com o mesmo valor que as citações anteriores, mas decidi copiar este pequeno parágrafo como amostra de até que ponto a condenação do aborto estava presente inclusive entre os heterodoxos dos primeiros séculos:

“Muito perto dali vi outro lugar estreito, onde foram parar o deságüe e o fedor dos que sofriam tormento, e ali se formava como um lago. Havia mulheres sentadas, inundadas naquela rede de esgoto até a garganta; e frente a elas, sentados e chorando, muitos meninos que tinham nascido antes de tempo; e deles saíam uns raios como de fogo que feriam os olhos das mulheres; estas eram as que tinham concebido fora do matrimônio e procuraram aborto.” (Ap Pedro 26)

Todos esses testemunhos contra o aborto têm um dobro valor para nós nas circunstâncias em que vivemos agora. Por um lado devem nos servir de aviso para que sob nenhum modo acomodemos a um estado de opinião em nossa sociedade cada vez mais favorável à aceitação do aborto como algo normal. Fazer tal coisa seria ir justo na direção oposta a que tomaram nossos antepassados na fé. Eles nem se calaram nem foram mornos na hora de condenar essa praga. Por outro lado, devemos ser sinceros e reconhecer que vivemos em um mundo onde grande parte do mais abominável paganismo antigo, o aborto e a profusão de todo tipo de amoralidade sexual, não só ressurgiu com força, mas também conseguiu “legitimar-se” socialmente jogando suas raízes inclusive nas legislações de nossos países. A Igreja, hoje igual à ontem, eleva sua voz contra esta infâmia. Poderia dizer que João Paulo II, paladino da cultura da vida e, portanto inimigo declarado da cultura da morte que impera em nossa sociedade, levou a condenação do aborto quase até o nível de dogma de fé na Encíclica Evangelium Vitae:

“Portanto, com a autoridade que Cristo conferiu a Pedro e aos seus Sucessores, em comunhão com os Bispos — que de várias e repetidas formas condenaram o aborto e que, na consulta referida anteriormente, apesar de dispersos pelo mundo, afirmaram unânime consenso sobre esta doutrina — declaro que o aborto directo, isto é, querido como fim ou como meio, constitui sempre uma desordem moral grave, enquanto morte deliberada de um ser humano inocente. Tal doutrina está fundada sobre a lei natural e sobre a Palavra de Deus escrita, é transmitida pela Tradição da Igreja e ensinada pelo Magistério ordinário e universal.”

Ninguém que se aprecie de ter o nome de cristão e o sobrenome de católico, pode justificar, passar, legislar ou colaborar, de forma ativa ou passiva, com o aborto. É nosso dever como cristãos combater na guerra para salvar milhões de inocentes. Eles não têm voz, não têm força para opor-se a quem deseja assassiná-los. Sejamos nós a voz e a força que, como no passado, vence a batalha pela vida, pela esperança e pelo amor para toda criatura humana desde sua concepção.

Fonte: Revista Arbil Nº 88

 

 

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