É interessante notar que Lutero, Zvinglio e Calvino, autores da Reforma Protestante no século XVI, deixaram belas expressões de estima e louvor a Maria SS.
Martinho Lutero ( 1483-1546)
Lutero foi formado na tradição católica, que lhe ensinou a veneração a Maria, veneração que ele guardou até o fim da vida . Eis alguns de seus depoimentos:
Em seu comentário sobre o Magnificat ( Lc 1,46-55), escreve: “Ó bem-aventurada Mãe, Virgem digníssima, recorda-te de nós e obtém que também em nós o Senhor faça essas grandes coisas!”
Ao referir-se a Mt 1,25, observa: “Destas palavras não se pode concluir que, após o parto, Maria tenha tido consórcio conjugal. Não se deve crer nem dizer isto” (Obras de Lutero, edição Weimar, tomo 11, pg. 323).
Por isto Lutero se insurgia contra aqueles que lhe atribuíam a doutrina de que “Maria, a Mãe de Deus, não tenha sido virgem antes e depois do parto, mas tenha gerado Cristo e outros filhos com contato com José” (Weimar, tomo 11, pg. 314). Os irmãos de Jesus, mencionados no Evangelho, são parentes do Senhor (Weimar, tomo 46, pg. 723); Tischreden 5, nº 5839). O reformador prometia 100 moedas de ouro a quem lhe provasse que a palavra ‘almah em Is 7,14 não significa virgem ( Weimar, tomo 53, pg. 640 ).
A respeito das virtudes de Maria, dizia: “A bem-aventurada Virgem via Deus em tudo; não se apegava a criatura alguma; tudo, Ela o referia a Deus… Por isto é puríssima adoradora de Deus, Ela que exaltou Deus acima de todas as coisas” ( Weimar, tomo 1, pg.60s ).
No fim de sua vida, aos 17/01/1546, Lutero exclamou um sermão muito agitado: “Não se deve adorar somente o Cristo? Mas não se deve honrar também a Santa Mãe de Deus? Esta é a mulher que esmagou a cabeça da serpente. Ouve-nos, pois o Filho te honra; Ele nada te nega. Bernardo foi longe demais ao comentar o Evangelho… Só a respeito de Cristo está dito: ‘Ouvi-o’ e: ‘Eis o Cordeiro de Deus’… Isto não foi dito a propósito de Maria, nem dos anjos, nem de Gabriel” ( Weimar, tomo 51, pg. 128s).
Vê-se que até os últimos dias Lutero guardou certa devoção à Mãe de Deus… Que ele invocou no seu comentário ao Magnificat: “A mesma amantíssima Mãe de Deus queira obter a graça para mim, a fim de que possa expor o seu cântico com proveito e profundidade” (Weimar, tomo 7, pg. 545 ).
No tocante às imagens, Lutero excluía a adoração e a idolatria, mas não as proibia; afirmava que as proibições feitas no Antigo Testamento não afetavam os cristãos ( Weimar 7.10, p. 440-445; tomos 28, pp.677s). Censurava os iconoclastas como fanáticos e sectários furiosos ( Weimar, tomos 18, pp. 70.80-82). Considerava as imagens como a Bíblia dos pobres e tinha-as como muito adequadas tanto à natureza humana psicossomática quanto ao modo como Deus costuma tratar os homens.
Até o fim da vida, Lutero pregou em festas de Nossa Senhora: a da Purificação (2 de fevereiro) e a da Anunciação (25 de março) sempre lhe foram caras, ao passo que as da Assunção e da Natividade de Maria somente até certa fase de sua evolução religiosa.
João Calvino ( 1509-1564)
Calvino em Genebra (Suíça) foi muito mais radical do que Lutero na Alemanha. Imprimiu notas pessoais à Reforma, entre as quais as do presbiterianismo.
Em relação a Maria, professa a Maternidade virginal:
“Professo que da genealogia de Cristo não se pode deduzir que Ele foi Filho de Davi a não ser através da Virgem” (Calvini Ópera 2,351).
A respeito de Mt 1,25 escreve: “Jesus é dito primogênito unicamente para que saibamos que Ele nasceu da Virgem” (CO 45,645).
A propósito Is 7,14: ” O profeta teria feito coisa muito fria e insípida se, depois de anunciar algo de novo e insólito entre os judeus, acrescentasse: ‘Uma jovem conceberá’. É assaz claro, portanto, que ele fala da Virgem, que havia de conceber não conforme as leis ordinárias da natureza, mas por graça do Espírito Santo” ( CO 36,156s).
Calvino exalta as virtudes de Maria quando escreve: “Quando a Virgem disse: ‘Eis a Serva do Senhor’, ela se ofereceu e entregou totalmente a Deus, para que se servisse dela conforme os direitos de Deus. ‘Faça-se em mim’: entendo estas palavras como expressão de que Maria estava persuadida do poder de Deus e voluntariamente se dispunha a atender ao seu chamado; acreditou na promessa do Senhor, cuja realização Ela não somente esperava, mas também pedia ardorosamente” ( CO 45,30).
Ao comentar a frase: “Bem-aventurada me dirão todas as gerações”, julga que Maria assim “proclamava uma tão grande dádiva de Deus que não era lícito silenciá-la… Reconhecemos que este dom foi altamente honroso para Maria. De boa vontade seguimo-la como mestra e obedecemos aos ensinamentos e preceitos da Virgem” ( CO 45,38).
Ulrico Zvinglio ( 1484-1531)
Zvinglio em Zürich (Suíça) iniciou uma reforma, que foi posteriormente absorvida pelo Calvinismo. Escreveu:
“Creio firmemente que, segundo o Evangelho, Maria, como Virgem pura, gerou o Filho de Deus e no parto e após o parto permaneceu para sempre Virgem pura e íntegra. Também acredito firmemente que ela foi por Deus exaltada acima de todas as criaturas Bem-aventuradas (homens e anjos) na eterna bem-aventurança” (Zwinglii Opera 1,424).
Os “irmãos do Senhor” eram, para Zvinglio, “os amigos do Senhor” ( ZO 1,401}.
Declarou: “Estimo grandemente a Mãe de Deus, a Virgem Maria perpetuamente casta e imaculada” ( ZO 2,189).
Amman, discípulo e contemporâneo de Zvinglio, declarou: ” Maria foi preservada de toda mancha e culpa: do pecado original, do pecado mortal e do pecado atual”.
Heinrich Bullinger, sucessor de Zvinglio, testemunhou:
“Cremos que o corpo puríssimo da Virgem Maria, Mãe de Deus é templo do Espírito Santo… foi levado pelos anjos ao céu”.
Em conclusão, Zvinglio: “Quanto mais crescem a honra e o amor de Cristo entre os homens, tanto mais crescem também a estima e a honra de Maria, que gerou para nós um tão grande e propício Senhor e Redentor” (ZO 1,427s).
Como se vê, os mestres da Reforma foram muito mais fiéis a Maria do que os seus discípulos, “reformadores da Reforma do século XVI”. Todavia no protestantismo contemporâneo nota-se uma volta às origens, da qual vai aqui transcrito um espécimen, tirado de um Catecismo luterano:
“Maria faz parte do Evangelho… É apresentada como aquela que ouviu de maneira exemplar a palavra de Deus, como a serva do Senhor que diz Sim à palavra de Deus, como a cheia de graça que por si mesma nada é, mas que é tudo por bondade de Deus. É, com efeito, o modelo original dos homens que se abrem a Deus e se deixam enriquecer por Ele, o modelo original da comunidade dos fiéis, da Igreja… ‘Concebido por obra do Espírito Santo, nascido da Virgem Maria’: é uma verdade que confessamos de Jesus; conseqüentemente, confessamos também que Maria é a Mãe de Nosso Senhor” (Evangelischer Erwachsenenkatechismus, sob a direção de W. Jehtsh, Gütersloh).
É de esperar que o movimento de volta às fontes tem a sua feliz continuidade no protestantismo.