Parto em casa

Manifestações estão na moda. Talvez isto seja um sintoma da completa falta de representatividade política da população, talvez seja simplesmente o fruto de uma educação gerenciada há algumas décadas por gente que acha que “cidadania” quer dizer ficar pedindo tudo ao governo.

Semana passada, contudo, houve uma manifestação interessante em muitas cidades do país: em reação à denúncia feita pelo Conselho Regional de Medicina do Rio contra o dr. Jorge Kuhn, que defendeu na tevê que ter os filhos em casa é uma boa ideia, grupos de mulheres ganharam as ruas com cartazes. Não creio que comovam os doutores, mas é certamente uma causa tão boa quanto é injusta a denúncia que as moveu.

A sociedade atual medicaliza demais a vida e a morte. Tanto a reprodução – controlada por hormônios artificiais quando não é feita em laboratório – quanto o nascimento e a morte, tudo é abandonado nas mãos frias dos médicos.

Ora, nada mais natural que nascer e que morrer. Desde que o mundo é mundo, as pessoas nascem e morrem. E desde que o mundo é mundo estes momentos são melhor vividos em um ambiente familiar, não em salas assépticas com maquininhas fazendo “bip” e tubos cravados nas veias.

Uma amiga minha teve sua caçula em casa; foi um parto feliz. Se houvesse algum problema, ela sempre poderia ter se deslocado ao hospital mais próximo. Como não houve, não foi necessário colocar-se nos domínios de um desconhecido envelopado em roupas verdes, com uma máscara a cobrir o rosto como um bandido de filme antigo.

Médicos têm uma função importantíssima na sociedade, que é tratar das doenças; o problema é só que parto não é doença. Pode haver, e há, partos problemáticos, em que é necessária a presença deles, como é necessária a ação de médicos quando alguém se queima gravemente na cozinha, bate com o carro, bebe demais… Mas isso não é razão para que se cozinhe no hospital, não em casa; ou para que só se dirija com um médico ao lado.

Ao contrário, até: a excessiva medicalização de coisas tão naturais quanto o parto acaba gerando outros problemas, como as cesarianas desnecessárias, feitas para que seja possível agendar o parto e facilitar a vida do médico. A própria presença em um hospital – que, convenhamos, é um lugar cheio de gente doente – aumenta o perigo de infecções.

Em francês, as parteiras são ditas sages-femmes, “mulheres sábias”. Conheço uma dessas sapientíssimas mulheres; ela “aparou”, décadas atrás, uma criança que nos é muito querida: sua neta, a minha esposa.

Que muitas outras surjam!

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