Por que a Igreja deve se preocupar com a família?

Em 1965, no Concílio Vaticano II, a Igreja já se preocupava com a perda de referências, com o relativismo e individualismo que acometiam a humanidade.

A constituição Gaudium et Spes apontava, já naquela época, a urgência de se promover a dignidade do matrimônio e da família. As diretrizes para a promoção da família vieram com a Exortação Apostólica pós-sinodal Familiaris Consortio, do Papa João Paulo II, em 1981, que faz um urgente apelo: “Família, torna-te aquilo que és”.

E o que é a família?

A família é a célula mater da sociedade, o seu agente transformador, o espaço para o desenvolvimento físico, espiritual e psicológico do homem. Sendo a família o centro da sociedade, o Estado vem depois da família. O conjunto das famílias constitui o Estado. Por isso o Estado não tem o poder de colocar as mãos em características fundamentais do instituto familiar, mas somente providenciar que a família sobreviva como instituição natural da sociedade.

Ao longo da história, nas culturas que mais se destacam, há disposições em defesa da família como sociedade natural fundada sobre o matrimônio. A título de exemplo, podemos citar que já no V sec. a.C. os textos confucianos nos falam da família como fundamento do Estado. Se a família não vive conforme as virtudes, também o Estado não pode estar bem. Também na antiga Grécia, já antes de Homero, o matrimônio era considerado o fundamento da sociedade.

A família, por meio do casamento, era a condição indispensável para a propagação da espécie humana. Do Direito Romano, herdamos os vocábulos matrimônio, que deriva do latim matris munus (ou munium) para evidenciar o papel importante da mulher na família; e cônjuge (coniugium) (o homem e a mulher estão unidos no mesmo compromisso).

Quando a Igreja se preocupa com a família, não age fora do seu campo de ação. A Igreja faz parte da estrutura social e por isso tem o direito de exprimir a sua palavra sobre esta fundamental instituição. De fato, se a família vai mal, tudo vai mal.

O fato é que o matrimônio leigo e família leiga (no senso de laicista) não existe. Têm uma profunda conotação religiosa, já reconhecida seja pelos gregos seja pelos romanos. Estes dois povos tiveram bem claro a existência da lei natural (lex naturalis) precedente às leis dos homens (lei positiva). Estavam convencidos de que existia um direito anterior, uma lei não escrita, precedente às leis formuladas pelos juristas. Nós, católicos, sabemos que acima das leis dos homens, há a lei Divina.

O laicismo corrente prega que coloquemos a “cidadania” acima da família, do matrimônio, do afeto. Não há necessidade de grandes tratados sociológicos para expor o erro nesta posição. Nosso Senhor e Mestre nos ensinou a reconhecer as falsas doutrinas e os falsos profetas pelos seus frutos: Ao olharmos ao nosso redor, na medida em que as famílias vão se desintegrando, resultado de uma cultura individualista que leva ao amor livre fora do matrimônio, ao divórcio, à desvirtuação do amor conjugal, ao descuido na educação dos filhos; na medida em que se transferem para a escola, para os meios de comunicação de massa e para o Estado, o encargo da formação humana, de valores e virtudes, mais e mais vemos o aumento da violência, em níveis chocantes. Olhamos os jornais e vemos agressões a idosos, a crianças pequenas, entre alunos nas escolas, entre marido e mulher. A vida vai perdendo o valor e leis vão sendo criadas na tentativa vã de impor pelo Direito o que não se ensinou pelo exemplo.

Os ditos ‘formadores de opinião’ pretendem elevar à categoria de avanço histórico, de modernidade, o que para toda pessoa sensata é exatamente a consagração do caos familiar. Por isso, a Igreja peca por omissão quando não realiza o trabalho de “profeta”, que é exortar à conversão, à volta aos desígnios de Deus; é necessário expor as mazelas da família para então trabalhar na sua restauração. Nas palavras do Beato João Paulo II:

“Amar a família significa descobrir os perigos e os males que a ameaçam, para poder superá-los. Amar a família significa empenhar-se em criar um ambiente favorável ao seu desenvolvimento. E, por fim, […], é dar-lhe novamente razões de confiança em si mesma, nas riquezas próprias que lhe advém da natureza e da graça e na missão que Deus lhe confiou. ‘É necessário que as famílias do nosso tempo tomem novamente altura! É necessário que sigam a Cristo’”.

Compete ainda aos cristãos a tarefa de anunciar com alegria e convicção a «boa nova» acerca da família, que tem necessidade absoluta de ouvir e de compreender sempre mais profundamente as palavras autênticas que lhe revelam a sua identidade, os seus recursos interiores, a importancia da sua missão na Cidade dos homens e na de Deus”.

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NOTAS: Fontes: Exortação Apostólica pós-sinodal Familiaris Consortio de S.S. João Paulo II; O Matrimônio na História da Humanidade, Mons. Vitaliano Mattioli (via ZENIT); “Família, torna-te aquilo que és”, Dom Rafael Llano Cifuentes, 1995.

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