Posso casar-me na Igreja com um divorciado que já se casou na Igreja?

Fui batizada, fiz primeira comunhão na Igreja Católica Apostolica Romana, gostaria de me casar vestida de noiva, sonho de toda uma vida, mas a Igreja Romana não casa divorciados. Teria algum jeito de eu casar com meu noivo que é divorciado e já casou-se uma vez no religioso na Igreja Romana? (F.)

Realmente, não existe qualquer problema para você que é (e sempre foi) solteira (=nunca casou na Igreja). No entanto, sendo seu namorado casado na Igreja e divorciado no civil, continua ele sendo visto como “casado” pela Igreja Católica, já que esta não reconhece o divórcio (ela admite, sim, a separação de corpos como medida extrema, mas sem a dissolução do vínculo matrimonial, em obediência a 1Coríntios 7,10-11 – o que naturalmente impede as partes de contraírem um novo matrimônio).

A doutrina católica, com efeito, sempre ensinou que o matrimônio é indissolúvel, ou seja, que nenhum poder humano ou eclesiástico pode separar aquilo que Deus uniu eficazmente pelo sacramento do matrimônio (Mateus 19,6; Marcos 10,9). Por isso, Jesus é categórico: “Quem repudia sua mulher e se casa com outra, comete adultério contra a primeira” (Marcos 10,11-12; v. tb. Lucas 16,18). Por isso os noivos, quando contraem o matrimônio *prometem* – um ao outro e vice-versa – que permanecerão “fiéis, na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, amando e respeitando por todos os dias de suas vidas, até que a morte os separe”. E, como diz o antigo ditado: “Promessa é dívida”!

Isso, porém, não significa que todo e qualquer casamento celebrado na Igreja seja indubitavelmente válido (embora essa seja a presunção canônica, por questões óbvias). De fato, é possível a ocorrência de certos vícios ou impedimentos, que atentem contra o sacramento do matrimônio (às vezes, até mesmo sem que as partes ou a Igreja tenham conhecimento), tornando-o nulo perante os olhos de Deus e também da Igreja. Dessa forma, mesmo que a “cerimônia de casamento” tenha sido celebrada na Igreja, perante o padre ou outro ministro eclesiástico qualificado, e ainda que os noivos tenham declarado seu “sim eterno” diante de toda a comunidade ali reunida, havendo a presença de uma dessas várias causas de nulidade, o matrimônio é tido por absolutamente nulo (isto é, não existente!); Em outras palavras: o que ali ocorreu foi mera cerimônia, não o sacramento matrimonial…

O Direito Canônico aponta todas as causas de nulidade do matrimônio… Ora, pode ser que alguma(s) delas tenha(m) ocorrido por ocasião do casamento do seu namorado. Por isso, seria muito bom que vocês (ou apenas ele) procurasse(m) o Vigário Judicial da Diocese em que mora(m) e expusesse(m) o caso para ele. Se o Vigário Judicial verificar a possibilidade (eu disse “possibilidade”) de existência de uma causa de nulidade, fornecerá então instruções para a abertura de um Processo Canônico de Nulidade Matrimonial, perante o Tribunal Eclesiástico competente, com vistas a obter o decreto de nulidade.

A decretação de nulidade é o reconhecimento oficial da Igreja de que um determinado casamento contraído perante ela de fato não ocorreu (não havendo sacramento, é nulo de pleno direito). Conseqüentemente, as partes consideradas no processo jamais foram casadas de fato – ainda que o registro civil diga que são “divorciadas” -, sendo, na verdade, solteiras para a Igreja e, portanto, livres para contraírem o matrimônio (não estaríamos então falando de “contraírem um novo matrimônio”, mas de “contraírem um único matrimônio”, logo após a Igreja reconhecer a existência da nulidade matrimonial).

Com tudo isto, queremos afirmar que a Igreja jamais poderá “anular” um matrimônio (ou seja: tornar sem efeito algo que anteriormente era plenamente válido). O que ela faz, na realidade, é verificar – através do processo de nulidade matrimonial – as condições em que determinado matrimônio se celebrou e constatar a existência ou não do sacramento. Constatada a existência do sacramento, este é válido e não poderá ser anulado (pela razão pleiteada) por quem quer que seja (nem as partes, nem a Igreja e, muito menos, o Estado); inexistindo o sacramento, o matrimônio é nulo e as partes são livres para contraírem matrimônio com quem quiser ou, também, convalidar a união tida por nula, quando isto é possível.

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