Questões sobre o Batismo (Parte 3/12): Será a água a única matéria do Batismo?

  • Autor: São Tomás de Aquino
  • Fonte: Suma Teológica, Parte III, Questão 66
  • Tradução: Dercio Antonio Paganini

Objeção 1 – Parece que a água não é propriamente a matéria do Batismo, pois no Batismo, de acordo com Dionísio (Ecl. Hier, V), e Damasceno (De Fide Orth. IV), existe um poder de iluminação. Mas essa iluminação é uma característica especial do fogo. Todavia, o Batismo pode ser conferido com fogo em vez de água e, além do mais, enquanto João Batista disse enquanto profetizava o Batismo de Cristo (Mt. 3-11): “Ele irá batizá-Lo no Espirito Santo e pelo fogo…”

Objeção 2 – Entretanto, a eliminação dos pecados pelo lavamento está contida no Batismo, mas muitas outras coisas além da água é utilizada no lavamento, tais como, vinho, óleo, sal etc. Assim sendo, o Batismo pode ser conferido também com essas substâncias, e consequentemente a água não é a única matéria do Batismo.

Objeção 3 – Sabe-se que os Sacramentos da Igreja apareceram ao lado de Cristo pendurado na cruz, como afirmado anteriormente (perg. 62, art. 5), mas não apenas a água apareceu, mas também o sangue, e assim pode-se pressupor que o Batismo pode também ser aplicado com sangue, e isto significa que assim teremos uma maior afirmação do efeito do Batismo pois está escrito (Ap 1-5): “(Quem) lavou-nos de nossos pecados pelo Seu sangue…”

Objeção 4 – Santo Augustinho (cf. Orações Principais, IV-3) e Bede (Exposit. In Lc. III-21) dizem: Cristo pelo “toque de Sua mais pura matéria dotou as águas com uma virtude regeneradora e limpadora… “, mas todas as águas não estão conectadas com as águas do Rio Jordão, o qual foi tocado pelo corpo de Cristo; consequentemente, parece que o Batismo não pode ser conferido com qualquer água, e portanto, por isto, a água não é a única substância do Batismo.

Objeção 5 – Se a água como tal fosse a única matéria do Batismo, não seria necessário fazer nada à água antes de utilizá-la para um Batismo; mas, em Batismos solenes, a água utilizada é exorcizada e abençoada. Assim sendo, temos a impressão que a água como tal, não é a única matéria do Batismo.

Ao contrário, nosso Senhor diz (João 3-5): “Se as pessoas não renascerem pela água e pelo Espírito Santo, elas não poderão entrar no reino de Deus”.

Eu respondo que: Por Divina instituição, a água é a única substância do Batismo, pelas seguintes razões:

Primeiro, pela razão da verdade natural do Batismo, que é uma regeneração à vida espiritual, e isto responde à natureza da água em um grau especial: uma vez que as sementes, das quais provêm todas as coisas vivas, como pessoas, plantas e animais, são umedecidas e semelhantes à água. Por esta razão, alguns filósofos sustentam que a água é o princípio de todas as coisas.

Segundo, com vistas aos efeitos do Batismo, ao qual corresponde as propriedades da água, pelo motivo de sua umidade, ela limpa, e então ela adequadamente causa a limpeza dos pecados. Pelo motivo de sua baixa temperatura, ela tempera o calor supérfluo, enquanto certamente mitiga a conseqüência da sede. Pelo motivo de sua transparência, ela é suscetível á luz, daí sua adaptabilidade ao Batismo como “Sacramento de Fé”.

Terceiro, em virtude de a água ser apropriada para o significado dos mistérios de Cristo, pelos quais nós somos justificados, como diz Crisóstomo (Hom. XXV em João) em João 3-5: ‘Se as pessoas não renascerem…” e “Quando nós mergulhamos nossas cabeças sob a água como uma espécie de túmulo, nosso velho corpo fica enterrado, e submerso, e oculto, e então ele levanta novamente e é renovado”.

Quarto, como a água é universal e abundante, sua matéria está disponível para nossa necessidade deste sacramento, pois pode ser encontrada em qualquer parte.

Réplica à Objeção 1: O fogo ilumina ativamente, mas quem é batizado não pode vir a ser um luminoso, mas é abrilhantado pela fé, que “chega pela audição” (Rm 10,17). Consequentemente a água é muito mais apropriada que o fogo para o Batismo.

Mas quando encontramos uma citação como “Ele o batizará no Espirito Santo e no fogo”, podemos entender o fogo, como diz Jerônimo (In Mat. II), querendo dizer o próprio Espírito Santo, O Qual aparece sobre os discípulos sob a forma de línguas de fogo (At 2-3). Ou também podemos entender o significado de tribulação, como diz Crisóstomo (Hom. III in Mt.): “devido às tribulações, os pecados são lavados”. Ou ainda, como diz Hilário (Super Mat. II) que “quando nós somos batizados no Espírito Santo” nós também ficamos “perfeitos pelo julgamento do fogo”.

Réplica à Objeção 2: Vinho e óleo não são comumente utilizados para lavar como a água, bem como não o fazem eficientemente; em vez disso, se objetos são lavados por eles, ficam com o cheiro característico, que não é o caso da água. Além disso, eles não são tão universais e abundantes como a água.

Réplica à Objeção 3: A água saiu do lado de Cristo para nos purificar e o sangue para nos redimir. Entretanto o sangue pertence ao sacramento da Eucaristia, enquanto a água pertence ao Batismo. Assim sendo, o Batismo recebe a virtude de sua força do poder do sangue de Cristo.

Réplica à Objeção 4: O poder de Cristo foi colocado em todas as águas, não porque elas estivessem interligadas, porém pela sua espécie, como diz Santo Agostinho em um sermão da Epifania (App. Serm. CXXXV): “A benção que se seguiu após o Batismo do Salvador, como um rio místico, aumentou o curso de todas as correntes e preencheu os canais de todas as primaveras”.

Réplica à Objeção 5: A benção da água não é essencial ao Batismo, mas faz parte de uma certa solenidade, por meio da qual a devoção do fiel é estimulada e a astúcia do demônio é obstruída com o impedimento provocado pelo efeito batismal.

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