Reflexão Patrística – “As duas vindas de Cristo” (São Cirilo de Jerusalém, +386)

“Anunciamos a vinda de Cristo: não apenas a primeira, mas também a segunda, muito mais gloriosa. Pois a primeira revestiu um aspecto de sofrimento, mas a segunda manifestará a coroa da realeza divina.

Aliás, tudo o que concerne a nosso Senhor Jesus Cristo tem quase sempre uma dupla dimensão. Houve um duplo nascimento: primeiro, ele nasceu de Deus, antes dos séculos; depois, nasceu da Virgem, na plenitude dos tempos. Dupla descida: uma, discreta como a chuva sobre a relva; outra, no esplendor, que se realizará no futuro.

Na primeira vinda, ele foi envolto em faixas e reclinado num presépio; na segunda, será revestido num manto de luz. Na primeira, ele suportou a cruz, sem recusar a sua ignomínia; na segunda, virá cheio de glória, cercado de uma multidão de anjos.

Não nos detemos, portanto, somente na primeira vinda, mas esperamos ainda, ansiosamente, a segunda. E assim como dissemos na primeira: ‘Bendito o que vem em nome do Senhor’ (Mateus 21,9), aclamaremos de novo, no momento de sua segunda vinda, quando formos com os anjos ao seu encontro para adorá-lo: ‘Bendito o que vem em nome do Senhor’.

Virá o Salvador, não para ser novamente julgado, mas para chamar a juízo aqueles que se constituíram seus juízes. Ele, que ao ser julgado, guardara silêncio, lembrará as atrocidades dos malfeitores que o levaram ao suplício da cruz, e lhes dirá: ‘Eis o que fizestes e calei-me’ (Salmo 49,21).

Naquele tempo ele veio para realizar um desígnio de amor, ensinando aos homens com persuasão e doçura; mas, no fim dos tempos, queiram ou não, todos se verão obrigados a submeter-se à sua realeza.

O profeta Malaquias fala dessas duas vindas: ‘Logo chegará ao seu templo o Senhor que tentais encontrar’ [Malaquias 3,1]. Eis uma vinda. E prossegue, a respeito da outra: ‘E o anjo da aliança, que desejais. Ei-lo que vem – diz o Senhor dos exércitos; e quem poderá fazer-lhe frente, no dia de sua chegada? E quem poderá resistir-lhe, quando ele aparecer? Ele é como o fogo da forja e como a barrela dos lavadeiros; e estará a postos, como para fazer derreter e purificar’ [Malaquias 3,1-3].

Paulo também se refere a essas duas vindas quando escreve a Tito: ‘A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens. Ela nos ensina a abandonar a impiedade e as paixões mundanas e a viver neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade, aguardando a feliz esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo’ [Tito 2,11-13]. Vês como ele fala da primeira vinda, pela qual dá graças, e da segunda que esperamos?

Por isso, o símbolo da fé que professamos nos é agora transmitido, convidando-nos a crer naquele que ‘subiu aos céus, onde está sentado à direita do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os mortos; e o seu reino não terá fim’ [cf. Credo Niceno-Constantinopolitano].

Nosso Senhor Jesus Cristo virá portanto dos céus, virá glorioso no fim do mundo, no último dia. Dar-se-á a consumação do mundo,e este mundo que foi criado será inteiramente renovado!” (Catequese 15,1-5).

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