Maria, pois, acreditou que, estando para ser em breve Mãe de Deus, sua pureza não sofreria dano algum. Como duvidaria desta concepção tão original, aquela a quem é prometida a eficácia do poder do Altíssimo? A sua fé e confiança são ainda confirmadas pelo testemunho de um milagre anterior: a inesperada fecundidade de Isabel. De fato, quem tornou uma estéril capaz de conceber, pode também fazer com que uma virgem conceba.
Portanto, a Palavra de Deus, que é Deus, o Filho de Deus, que no princípio estava com Deus, por quem tudo foi feito e sem ela nada se fez [cf. João 1,2-3], a fim de libertar o homem da morte eterna, se fez homem. Desceu para assumir a nossa humildade, sem diminuir a Sua majestade. Permanecendo o que era e assumindo o que não era, uniu a verdadeira condição de escravo à condição segundo a qual Ele é igual a Deus; realizou assim entre as duas naturezas uma aliança tão admirável que, nem a inferior foi absorvida por esta glorificação, nem a superior foi diminuída por esta elevação.
Desta forma, conservando-se a perfeita propriedade das duas naturezas que subsistem em uma só pessoa, a humildade é assumida pela majestade, a fraqueza pela força, a mortalidade pela eternidade. Para pagar a dívida contraída pela nossa condição pecadora, a natureza invulnerável uniu-se à natureza passível; e a realidade de verdadeiro Deus e verdadeiro homem associa-se na única pessoa do Senhor. Por conseguinte, Aquele que é ‘um só mediador entre Deus e os homens’ [1Timóteo 2,5], como exigia a nossa salvação, morreu segundo a natureza humana e ressuscitou segundo a natureza divina. Com razão, pois, o nascimento do Salvador conservou intacta a integridade virginal da Sua Mãe; ela salvaguardou a pureza, dando à luz a Verdade.
Tal era, caríssimos filhos, o nascimento que convinha a Cristo, poder e sabedoria de Deus. Por este nascimento, Ele é semelhante a nós pela Sua humanidade, e superior a nós pela Sua divindade. De fato, se não fosse verdadeiro Deus, não nos traria o remédio; se não fosse verdadeiro homem, não nos serviria de exemplo.
Por isso, quando o Senhor nasceu, os anjos cantaram cheios de alegria: ‘Glória a Deus no mais alto dos céus’; e anunciaram: ‘paz na terra aos homens por Ele amados’ [Lucas 2,14]. Eles veem, efetivamente, a Jerusalém celeste ser construída pelos povos do mundo inteiro. Por tão inefável prodígio da bondade divina, qual não deve ser a alegria da nossa humilde condição humana, se até os sublimes coros dos anjos se rejubilam?” (Sermão 1: Na Natividade do Senhor 2.3; PL 54,191-192).