Para invalidar o celibato, alguns cristãos evangélicos afirmam que Paulo era casado e, para apoiar sua afirmação, dizem que ele era membro do Sinédrio, que fazia tal exigência para os seus integrantes.
O fundamento deste argumento estaria, portanto, em Atos 26,10:
“O que também fiz em Jerusalém. E havendo recebido poder dos principais dos sacerdotes, encerrei muitos dos santos nas prisões; e quando os matavam eu dava o meu voto contra eles”.
Os irmãos evangélicos “livremente interpretam” que São Paulo aqui diz que ele mesmo votava no Sinédrio. Isto seria verdade? Para analisar referido argumento, preparamos este breve estudo.
ANALISANDO OS ARGUMENTOS
Comecemos a partir da leitura de 1Coríntos 7,1-8, onde São Paulo é questionado acerca do matrimônio. Aqui ele explica a sua posição sobre o matrimônio e o celibato:
“Passemos aos pontos sobre os quais me escrevestes. Bom seria que o homem não tocasse em mulher. Todavia, para evitar a fornicação, tenha cada homem a sua mulher e cada mulher o seu marido. O marido cumpra o dever conjugal para com a esposa; e a mulher faça o mesmo em relação ao marido. A mulher não dispõe do seu corpo; mas é o marido quem dispõe. Do mesmo modo, o marido não dispõe do seu corpo; mas é a mulher quem dispõe. Não vos recuseis um ao outro, a não ser de comum acordo e por algum tempo, para que vos entregueis à oração; depois disso, voltai a unir-vos, a fim de que Satanás não vos tente mediante a vossa incontinência. Digo isso como concessão e não como mandamento” (1Coríntios 7,1-6).
Após explicar como deve ser um matrimônio, São Paulo diz:
“Quisera que todos os homens fossem como eu mesmo” (1Coríntios 7,7a).
Mas, anteriormente, não estava falando sobre o matrimônio? Que o marido pertence à mulher e a mulher ao marido?
Que quer dizer quando fala: “Quisera que todos os homens fossem como eu mesmo”?
Encontramos a resposta nos versículos seguintes:
“Mas cada um recebe de Deus o seu dom particular; um deste modo; outro, daquele modo. Digo, porém, aos solteiros e às viúvas que lhes é bom se ficarem como eu” (1Cor. 7,7b-8).
Se é verdade que Paulo era viúvo, por que não disse então: “Digo, porém, às solteiras e aos viúvos que lhes é bom se ficarem como eu”?
Quanto ao argumento de que os membros do Sinédrio eram casados, alguns afirmam que esta regra não era válida a não ser depois da época de Paulo (cf. Longnecker, “The Ministry and Message of Paul”, Grand Rapids, Zondervan, 1971, pp. 23-24).
Não consta que Paulo fosse membro do Sinédrio, caso contrário o Novo Testamento certamente teria mencionado que foi expulso por ser blasfemo ou apóstata.
Analisemos agora Atos 26,10:
“O que também fiz em Jerusalém. E havendo recebido poder dos principais dos sacerdotes, encerrei muitos dos santos nas prisões; e quando os matavam eu dava o meu voto contra eles”.
Paulo diz aqui que tinha o poder que lhe fora dado pelos “principais dos sacerdotes”, ou seja, que o Sinédrio havia lhe encarregado de perseguir aos cristãos (isto não prova que Paulo fosse membro do Sinédrio; prova apenas que foi “enviado” a perseguir os cristãos) e, a seguir, diz que depois de mortos [os cristãos], ele contribuía com o seu voto. Poderia o Sinédrio votar contra ou a favor de uma pessoa morta? Coisa ilógica…
Além disso, será que um membro do Sinédrio se encarregaria pessoalmente de perseguir os cristãos, de percorrer longas distâncias a fim de encontrá-los? A função de um membro do Sinédrio era interna e não externa; suas funções eram interpretar, julgar, expulsar algum membro… Reuniam-se numa espécie de Tribunal para legislar.
O Sinédrio era composto por 71 membros, entre eles também o sumo-sacerdote (Atos 23,1-5); originalmente era composto por saduceus e fariseus. Parece que havia uma terceira espécie de componente do Sinédrio: os anciãos, homens de prestígio aos quais se reconhecia uma certa autoridade, embora não fossem chefes por vocação religiosa (cf. Marcos 15,1; Atos 4,5; 8,27-28; 23,14; 24,1; 25,15).
Em Atos 7,58 encontramos Paulo presenciando a morte de Estêvão e nesta passagem ele não se mostra como membro do Sinédrio:
“E, expulsando-o da cidade, o apedrejavam. E as testemunhas depuseram as suas vestes aos pés de um jovem chamado Saulo”.
Aqui vemos Paulo como cúmplice passivo da morte de Estêvão; mas é tão somente chamado “jovem”…
PAULO ERA CERTAMENTE FARISEU
“E pondo Paulo os olhos no Sinédrio, disse: ‘Irmãos, até o dia de hoje tenho andado diante de Deus com toda a boa consciência’. Mas o sumo-sacerdote Ananias mandou aos que estavam junto dele que o ferissem a boca. Então Paulo lhe disse: ‘Deus te ferirá, parede branqueada. Tu estás aqui assentado para julgar-me conforme a Lei e contra a Lei me mandas ferir?’ E os que ali estavam disseram: ‘Injurias o sumo-sacerdote de Deus?’ E Paulo respondeu: ‘Não sabia, irmãos, que era o sumo-sacerdote, porque está escrito: não dirá mal do príncipe do teu povo’. E Paulo sabendo que uma parte era de saduceus e outra de fariseus, clamou no Sinédrio: ‘Irmãos, eu sou fariseu e filho de fariseus. Pela esperança na ressurreição dos mortos sou agora julgado'” (Atos 23,1-6).
Por que Paulo não gritou: “Irmãos, eu sou membro do Sinédrio”?
Por fim, é bom mencionar que a Biblioteca Judaica aponta que Paulo era fariseu, mas NÃO diz que era também membro do Sinédrio.
CONCLUSÃO
Não consta que Paulo fosse membro do Sinédrio, não há a menor prova excetuando suposições e a evidência bíblica aponta o desejo de Paulo de que todos os homens fossem célibes como ele mesmo era. Ele não poderia estar afirmando que desejava que todos os homens fossem viúvos, mas que aqueles que estivessem em estado de celibato continuassem célibes para servir ao Reino de Deus sem divisão:
“Mas cada um recebe de Deus o seu dom particular; um deste modo; outro, daquele modo. Digo, porém, aos solteiros e às viúvas que lhes é bom se ficarem como eu” (1Coríntios 7,7b-8).
“E bem quisera eu que estivésseis sem preocupações. O solteiro se preocupa das coisas do Senhor, em como há de agradar ao Senhor. O casado se preocupa das coisas do mundo, de como há de agradar à sua mulher; está portanto dividido. A mulher solteira e a virgem se preocupam das coisas do Senhor, de como ser santa no corpo e no espírito. Mas a casada se preocupa das coisas do mundo, de como há de agradar ao marido. E digo isto para proveito vosso, não para vos enlaçar, mas para mover-vos ao que é mais digno e conveniente, para vos unirdes ao Senhor sem divisão alguma” (1Coríntios 7,32-35).
Traduzido para o Veritatis Splendor por Carlos Martins Nabeto diretamente do site http://www.apologetica.org