“Scripturarum thesaurus” (João Paulo II: 25.04.1979)

Constituição Apostólica
SCRIPTURARUM THESAURUS
que declara como típica e promulga a edição Neovulgata da Bíblia.

João Paulo, Bispo, Servo dos Servos de Deus, para perpétua memória

O TESOURO DAS ESCRITURAS, em que está encerrada a mensagem salvadora enviada por Deus aos homens na verdade, bem diz Santo Agostinho: “chegou-nos carta daquela cidade de que estamos afastados: ela é… que nos exorta a vivermos rectamente” (Enarr. in ps. XC, s. 2, 1; PL 37, 1159) — esse tesouro sempre e com razão o teve a Igreja na maior honra e o conservou com singular diligência. Ela, de facto, desde o princípio nunca deixou de velar por que o povo cristão gozasse da mais ampla liberdade para conhecer a palavra de Deus, sobretudo na sagrada Liturgia, em cuja celebração “goza da maior importância a Sagrada Escritura” (Conc. Vat. II, Const. Sacros. Conc. n. 24).

Assim, a Igreja ocidental preferiu às outras versões aquela que se costuma chamar Vulgata, a qual — feita, na maior parte, pelo insígne doutor São Jerónimo — foi “aprovada pelo uso de tantos séculos na mesma Igreja” (Conc. Trid., sess. IV; Enchir. Bibl., n. 21). Prova de tão grande estima encontra-se também no cuidado de estabelecer segundo as exigências críticas o seu texto com uma edição, que está ainda a ser preparada com o maior rigor pelos monges da Abadia de São Jerónimo em Roma, fundada com este fim por Pio XI, Nosso Predecessor de feliz memória (Const. Apost. Inter praecipuas, 15 de Junho de 1933; A.A.S., XXVI, 1934, pp. 85 ss.).

E, nos nossos dias, o Concílio Vaticano II, confirmando a honra prestada àquela edição chamada Vulgata (Const. Dei verbum, n. 22) e procurando que na Liturgia das Horas se tornasse mais fácil a compreensão do Saltério, estabeleceu que o trabalho da revisão do mesmo, felizmente começado, “fosse levado a termo quanto antes, respeitando a língua latina cristã e toda a tradição da Igreja” (Const. Sacros. Conc, n. 91).

Secundando estes objectivos, Paulo VI, Nosso Predecessor de recente memória, resolveu constituir, antes ainda do fim do mesmo Concílio, quer dizer, no dia 29 de Novembro de 1965, uma especial Comissão Pontifícia, encarregada de executar o mandato do mesmo Concílio ecuménico e de rever todos os livros da Sagrada Escritura; a fim de que a Igreja ficasse possuindo uma edição latina como o pedia o progresso dos estudos bíblicos, edição para ser usada sobretudo na liturgia.

Nessa revisão “teve-se em conta palavra por palavra o texto antigo da edição latina da Vulgata, quando os textos primitivos são referidos exactamente; tais como os apresentam as actuais edições críticas; mas esse texto foi prudentemente corrigido quando deles se afasta ou os refere com menor exactidão. Para isso, foi usado o latim cristão bíblico, de maneira que a devida estima da tradição se conjugasse com as justas exigências da ciência crítica” (Aloc. de Paulo VI, 23 de Dezembro de 1966; A.A.S., LIX, 1967, pp. 53 s.).

O texto, como resultou desta revisão — mais profunda nalguns livros do Antigo Testamento em que não pusera mãos São Jerónimo — foi editado em volumes separados desde 1969 a 1977, e é agora apresentado num só volume, em edição típica. Esta edição da Neovulgata poderá também servir como base das traduções nas línguas modernas que se destinem ao uso litúrgico e pastoral; e, para usarmos palavras de Paulo VI, Nosso Predecessor, “é lícito pensar que ela constituirá fundamento seguro em que se apoiem… os estudos bíblicos, sobretudo onde mais dificilmente se podem consultar bibliotecas especializadas e mais obstáculos se apresentam a que se multipliquem os estudos convenientes” (Cfr. Aloc. de 22 de Dezembro de 1977; cfr. o diário L’Osservatore Romano, 23 de Dezembro de 1977).

No passado, julgava a Igreja que a antiga edição da Vulgata bastava e constituía suficiente autoridade para transmitir a palavra de Deus ao povo cristão: com mais razão poderá agora prestar o mesmo serviço esta edição da Neovulgata.

Por isso, temos o gosto de apresentar, já impressa, à Igreja a obra que Paulo VI muito desejou mas não pôde ver terminada, e João Paulo I continuou a estimar muito, resolvendo presentear, com os livros do Pentateuco, revistos pela mencionada Comissão Pontifícia, os Bispos que se iriam reunir na cidade de Puebla, presente que Nós mesmo, com muitos outros Bispos do orbe católico, ansiosamente esperámos.

Segundo isto, Nós com a autoridade desta Carta declaramos e promulgamos como típica a edição da Neovulgata da Bíblia, para ser usada sobretudo na sagrada Liturgia, mas apta também para as outras aplicações que indicámos.

Expressamos, por último, a vontade de que esta Nossa Constituição se mantenha sempre firme e eficaz, e seja observada exactamente por todos a quem diz respeito, nada obstando tudo o que lhe seja contrário.

Dado em Roma, junto de São Pedro, no dia 25 do mês de Abril, festa do Evangelista São Marcos, no ano de 1979, primeiro do Nosso Pontificado.

João Paulo II Papa

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