SACRIFÍCIO EUCARÍSTICO DA MISSA

Doutrina sobre o Sacrifício [Eucarístico] da Missa

O Sacrossanto, Ecumênico e Geral Concílio de Trento, reunido legitimamente no Espírito Santo, e presidido pelos mesmos Legados da Sé Apostólica, procurando que se conserve sempre na Igreja Católica, em toda sua pureza, a fé e doutrina antiga e absoluta, e em tudo perfeita, do grande Mistério da Eucaristia, dissipados todos os erros e heresias, instruída pela ilustração do Espírito Santo, ensina e declara e decreta que, em relação a ela, que é o verdadeiro e singular sacrifício, se preguem aos fiéis os dogmas que se seguem:

Cap. I – Da instituição do sacrossanto sacrifício da Missa

Ainda que o Antigo Testamento, como justifica o Apóstolo São Paulo, não tenha consumação (ou perfeita santidade) devido à debilidade do sacerdócio de Levi, foi conveniente, assim como foi disposto por Deus, Pai de Misericórdia, que nascesse outro sacerdote segundo a ordem de Melquidesec, ou seja, nosso Senhor Jesus Cristo, que pudesse completar e levar à perfeição todas as pessoas que deveriam ser santificadas. O Mesmo Deus e Senhor nosso, ainda que havia de Se oferecer a Si mesmo a Deus Pai, por meio da morte no alto da cruz, para trabalhar a partir dela, a redenção eterna, contudo, como seu sacerdócio não haveria de acabar com sua morte, para deixar na última ceia, na mesma noite em que entregou à sua amada esposa, a Igreja, um sacrifício visível, segundo requer a condição dos homens, que se representasse o sacrifício cruel que havia de fazer na cruz, e permanecesse sua memória até o fim do mundo, e se aplicasse Sua salutar virtude da remissão dos pecados que diariamente cometemos, ao mesmo tempo que se declarou sacerdote segundo a ordem de Melquidesec, constituído para toda a eternidade, ofereceu a Deus Pai, Seu corpo e seu sangue, sob as espécies do pão e do vinho, e o deu a seus Apóstolos, a quem então constituía sacerdotes do Novo Testamento, para que o recebessem sob os sinais daquelas mesmas coisas, ordenando-lhes, e igualmente a seus sucessores no sacerdócio, que O oferecessem pelas palavras: “Fazei isto em memória de Mim”, como sempre o entendeu e ensinou a Igreja católica. Pois havendo celebrado a antiga páscoa, que a multidão dos filhos de Israel significava a memória de sua saída do Egito, Se instituiu a Si mesmo uma nova páscoa para ser sacrificado sob os sinais visíveis em nome da Igreja, pelo ministério dos sacerdotes em memória de seu trânsito por este mundo ao Pai. Quando derramado Seu sangue, nos redimiu, nos tirou do poder das trevas e nos transferiu a Seu reino. E esta é por certo aquela oblação pura, que não pode ser manchada por mais indignos e maus que sejam aqueles que a fazem, a mesma que predisse Deus por Malaquias, que deveria ser oferecida limpa, em todo lugar, em Seu nome, que deveria ser grande entre todas as gentes, e a mesma que significa, sem obscuridade o Apóstolo São Paulo, quando disse, escrevendo aos Coríntios: “Não poderão participar da mesa do Senhor, os que estão manchados devido sua participação na mesa dos demônios”, como se fosse a mesa do altar. Esta é finalmente aquela que se figurava em várias semelhanças dos sacrifícios nos tempos da lei natural e da escrita, pois inclui todos os bens que aqueles significavam, como consumação e perfeição de todos eles.

Cap. II – O sacrifício da Missa é propicio não só para os vivos, mas também para os defuntos

Em virtude de que neste sacrifício que se faz na Missa, está contido e se sacrifica, sem dores, naquele mesmo a que Cristo Se ofereceu dolorosamente no altar da cruz, ensina o Santo Concílio, que este sacrifício é, com toda verdade propício, e que se consegue por ele que nos aproximamos do Senhor, arrependidos e penitentes e, se o fizermos com coração sincero, fé correta e com temor e reverencia, conseguiremos misericórdia e encontraremos sua graça por meio de seus oportunos auxílios. Efetivamente aplacado, o Senhor, com esta oblação e concedendo a graça e o dom da penitência, perdoa os erros e pecados por maiores que sejam, pois a hóstia e o vinho são exatamente Ele, que agora é oferecido pelo ministério dos sacerdotes, Ele que outrora se ofereceu a Si mesmo na cruz, com apenas a diferença do modo de oferecer-se. Os frutos, por certo, daquela oblação dolorosa, se conseguem, em muito maior quantidade, por esta indolor, mas de qualquer forma esta jamais revogará, de qualquer modo, àquela. Disso se pode concluir que não somente se oferece com justa razão pelos pecados, penas, satisfações e outras necessidades dos fiéis que vivem, mas também, segundo a tradição dos Apóstolos, pelos que já morreram em Cristo, sem estar plenamente purgados.

Cap. III – Das Missas em honra dos Santos

E ainda que a Igreja tenha tido o costume de celebrar, em várias ocasiões, algumas missas em honra e memória dos santos, ensina que não se oferece a estes o sacrifício, porém apenas a Deus, que lhes deu a coroa, de onde é que nunca diz o sacerdote: “eu te ofereço, ó São Pedro ” ou “ó São Paulo este sacrifício…”, senão dando graças a Deus pelas vitórias que estes alcançaram, implora sua ajuda para que os mesmos santos de quem lembramos na terra, se dignem a interceder por nós no céu.

Cap. IV – Do Cânon da Missa

E sendo conveniente que as coisas santas devem ser operadas santamente, e constando ser este sacrifício o mais santo de todos, estabeleceu há muitos séculos a Igreja Católica para que se oferecesse e recebesse digna e reverentemente o sagrado Cânon, tão limpo de todo erro que nada inclua que não dê a entender em máximo grau, certa santidade e piedade, e eleve a Deus os ânimos dos que sacrificam, porque o Cânon consta das mesmas palavras do Senhor e das tradições do Apóstolos assim como também dos piedosos estatutos dos santos Pontífices.

Cap. V – Das cerimônias e ritos da Missa

Sendo tal a natureza das pessoas que não se possa elevar facilmente a meditação das coisas divinas sem auxílios ou meios extrínsecos, nossa piedosa Mãe, a Igreja, estabeleceu por estes motivos, certos rituais a saber: que algumas palavras da Missa sejam ditas em voz baixa, e outras com voz mais elevada. Além disso, se valeu de cerimônias como bençãos místicas, luzes, incensos, ornamentos e outras muitas coisas deste gênero, por ensinamentos e tradição dos Apóstolos, com a finalidade de recomendar por este meio a majestade de tão grande sacrifício e excitar os ânimos dos fiéis por estes sinais visíveis de religiosidade e piedade à contemplação dos altíssimos mistérios que estão ocultos neste sacrifício.

Cap. VI – Da Missa em que comunga somente o sacerdote

Gostaria por certo, o Sacrossanto Concílio que todos os fiéis que assistem às missas comungassem, não apenas espiritualmente, mas também recebendo sacramentalmente a Eucaristia, para que deste modo lhes resultasse um futuro mais abundante deste santíssimo sacrifício. Todavia, nem sempre ocorre isto, e nem por isso classifica como privadas e ilícitas as Missas em que apenas o sacerdote comunga sacramentalmente, porém, pelo contrário, as aprova e as recomenda, pois aquelas Missas também devem ser tomadas com toda verdade comuns de todos, parte porque o povo comunga espiritualmente nelas, e parte porque se celebram por um ministro público da Igreja, não apenas por si, mas por todos os fiéis que sejam membros do corpo de Cristo.

Cap. VII – Da água que deve ser misturada ao vinho que é oferecido no cálice

Alerta também o Santo Concílio, que é preceito da Igreja, que os sacerdotes misturem água com o vinho que haverão de oferecer no cálice, seja porque se crê que assim o fez Cristo nosso Senhor, seja também porque na chaga de seu lado, na cruz, verteu água e sangue, cuja mistura nos recorda aquele mistério, e chamando o bem-aventurado Apóstolo São João, aos povos de “Águas”, se representa a união do mesmo povo com sua cabeça, Cristo.

Cap. VIII – Não se celebre a Missa em língua vulgar: explique-se seus mistérios ao público

Ainda que a Missa inclua muita instrução para o povo fiel, sem dúvida não pareceu conveniente aos Padres que ela seja celebrada em todas as partes em língua vulgar. Por este motivo, ordena o Santo Concílio aos Pastores e a todos que tenham cura de almas, que conservando em todas as partes o ritual antigo de cada igreja, aprovado por esta Santa Igreja romana, Mãe e Mestra de todas as igrejas, com a finalidade de que as ovelhas de Cristo não padeçam de fome, ou as crianças peçam pão e não haja quem o reparta, exponham freqüentemente por si ou por outros, algum ponto dos que se leêm na Missa, no tempo que esta se celebra entre os demais, declarem especialmente nos domingos e dias de festa, algum mistério deste santíssimo sacrifício.

Cap. IX – Introdução aos Cânones seguintes

Como se espalharam neste tempo muitos erros contra estas verdades de fé fundadas no Sacrossanto Evangelho, nas tradições dos Apóstolos e na doutrina dos santos Padres, e muitos ensinam e disputam muitas coisas diferentes, o Sacrossanto Concílio, depois de graves e repetidas discussões feitas com maturidade sobre estas matérias, determinou por consentimento unânime de todos os Padres, condenar e desterrar da Santa Igreja por meio dos Cânones seguintes todos os erros que se opõe a esta puríssima fé e sagrada doutrina.

Cânones do Sacrifício da Missa

Cân. I – Se alguém disser que não se oferece a Deus na Missa um verdadeiro e apropriado sacrifício ou que este oferecimento não é outra coisa senão recebermos a Cristo para que o possamos engolir, seja excomungado.

Cân. II – Se alguém disser que naquelas palavras: “Fazei isto em memória de Mim”, Cristo não instituiu como sacerdotes os Apóstolos, ou que não lhes ordenou e aos demais sacerdotes que oferecessem Seu Corpo e Sangue, seja excomungado.

Cân. III – Se alguém disser que o sacrifício da Missa é apenas um sacrifício de elogio e de ação de graças, ou mera recordação do sacrifício consumado na cruz, mas que não é próprio, ou que apenas é aproveitável àquele que o recebe, e que não se deve oferecer pelos vivos nem pelos mortos, pelos pecados, penas, satisfações nem outras necessidades, seja excomungado.

Cân. IV – Se alguém disser que se comete blasfêmia contra o Santíssimo Sacrifício que Cristo consumou na cruz ao se realizar o sacrifício da Missa, ou que por este se anula aquele, seja excomungado.

Cân. V – Se alguém disser que é uma impostura celebrar Missas em honra dos Santos e com a finalidade de obter sua intercessão junto a Deus como ensina a Igreja, seja excomungado.

Cân. VI – Se alguém disser que o Cânon da Missa contém erros, e que por esta razão ela deve ser anulada, seja excomungado.

Cân. VII – Se alguém disser que as cerimônias, vestimentas, e sinais externos que usa a Igreja Católica na celebração das Missas, são muito mais incentivos de impiedade que obséquios piedosos, seja excomungado.

Cân. VIII – Se alguém disser que as missas nas quais apenas o sacerdote comunga sacramentalmente são ilícitas, e que por este motivo devem ser abolidas, seja excomungado.

Cân. IX – Se alguém disser que deve ser condenado o ritual da Igreja Romana devido ao fato que algumas palavras do Cânon, e as palavras da consagração são ditas em voz baixa, ou que a Missa deve ser dita sempre em língua vulgar, ou que não se deve misturar água ao vinho do cálice que será oferecido, porque isto é contra a instituição de Cristo, seja excomungado.

Decreto sobre o que há de se observar e evitar na Celebração da Missa

Quanto ao cuidado deve ser tomado para que se celebre, com todo o culto e veneração que pede a religião sobre o santo sacrifício as Missa, facilmente poderá ser compreendido por qualquer pessoa que considere o que diz a Sagrada Escritura: “maldito aquele que executa com negligência a obra de Deus”.

E se necessariamente confessamos que a nenhuma outra obra podem manejar os fiéis cristãos, tão santa e tão divina como esse tremendo mistério no qual todos os dias é oferecida a Deus em sacrifício, pelos sacerdotes no altar, aquela hóstia vivificante, pela qual nós fomos reconciliados com Deus Pai, é muito importante que seja observado que se deve colocar todo o cuidado e diligência em executá-la, com maior inocência e pureza interior de coração e demonstração exterior de devoção e piedade que seja possível.

E constando ainda que foram introduzidos, seja pelo vício dos tempos, seja por descuido ou malícia dos homens, muitos abusos alheios à dignidade de tão grande sacrifício, decreta o Santo Concílio, para restabelecer sua devida honra e culto, à glória de Deus e à edificação do povo cristão, que os Bispos Ordinários dos lugares cuidem com esmero e estejam obrigados a proibir e retirar tudo o que foi introduzido pela avareza, culto dos ídolos, ou irreverência que não se pode encontrar separada da impiedade, ou a superstição, falsa imitadora da piedade verdadeira.

E para compreender muitos abusos em poucas palavras, em primeiro lugar, proíbam absolutamente (o que é próprio da avareza), as condições de quaisquer espécies de pagamentos, os contratos e o quanto se dá pela celebração de novas Missas, igualmente as importunas e grosseiras cobranças das esmolas, cujo nome mereceriam ser de imposições, e outros abusos semelhantes, que não ficam muito distantes do pecado da ambição ou ao menos de uma sórdida ganância. Além disso para que se evite toda a irreverência, cada Bispo deve ordenar em sua diocese, que não seja permitido a nenhum sacerdote vago e desconhecido, celebrar Missa, bem como que sirva ao santo altar, ou que assista os ofícios qualquer pecador público e notório.

Também não deve ser permitido que o Sacrifício da Missa seja celebrado por seculares ou regulares, quaisquer que sejam, em casas particulares, nem absolutamente, fora da igreja e oratórios unicamente dedicados ao culto divino, os quais deverão ser assinalados e visitados pelos Ordinários, com a condição de que os assistentes declarem com a decente e modesta compostura de seu corpo, que assistem a essa missa não apenas com o corpo, mas também com ânimos e afetos devotos de seu coração.

Afastem também de suas igrejas aquelas músicas em que, seja com o órgão, seja com o canto se misturem a coisas impuras e lascivas, assim como toda conduta secular, convenções inúteis, e consequentemente profanas, passos, estrondos, e vozerios, para que prevenido este fato, pareça e possa com verdade chamar-se casa de oração, a casa do Senhor

Atualmente, para que não se dê lugar a nenhuma superstição, proíbam por editais, e com imposição de penalidades, que os sacerdotes celebrem fora das horas devidas e se valham, na celebração da missa, de outros rituais ou cerimônias e orações que aquelas que sejam aprovadas pela Igreja, e adotadas pelo uso comum e bem recebido.

Sejam abolidos da Igreja o abuso de dizer certo número de Missas com determinado número de luzes, inventando muito mais por espírito de superstição que de verdadeira religião, e ensinem ao povo qual é e de onde provém especialmente o fruto preciosíssimo e divino deste sacrossanto sacrifício.

Advirtam igualmente ao seu povo para que compareçam com freqüência a suas paróquias, pelo menos aos domingos e festas de guarda.

Todas estas coisas, que sumariamente ficam mencionadas, se propõe a todos os Ordinários dos lugares para que não apenas as proíbam ou ordenem, ou as corrijam ou as estabeleçam, bem como todas as demais que julguem condizentes com o mesmo objetivo, valendo-se da autoridade que lhes foi concedida pelo Santo Concílio e também como delegados da Sé Apostólica, obrigando aos fiéis a observá-las inviolavelmente e se assim não o fizerem, deverão sofrer censuras eclesiásticas e outras penas que estabeleçam a seu arbítrio, sem que sejam opostos quaisquer privilégios, exceções, apelações ou costumes.

Decreto sobre a pretensão de que se conceda o Cálice

Além do estabelecido, havendo reservado o mesmo Sacrossanto Concílio na Sessão antecedente para examinar e definir sempre que depois se lhe apresentasse ocasião oportuna dos artigos propostos em outra ocasião, e então examinados, a saber:

Se as razões que teve a Santa Igreja Católica, para dar a comunhão aos leigos e aos sacerdotes quando não celebram, sob apenas a espécie do pão, hão de subsistir com tanto vigor que por nenhum motivo se permita a ninguém o uso do cálice;

E o segundo artigo: se parecendo em força de alguns honestos motivos, conforme a caridade cristã que se deva conceder o uso do cálice a alguma nação ou reino, deverá ocorrer sob algumas condições.

Determinando agora dar providência sobre este ponto do modo mais condizente à salvação das pessoas põe quem se faz a súplica, decretou: seja remetido este negócio, como pelo presente decreto o remete, a nosso santíssimo senhor, o Papa, que com sua singular prudência fará o que julgar útil à República Cristã, e salutar aos que pretendem o uso do cálice.

Decreto sobre a Reforma

O Sacrossanto, Ecumênico e Geral Concílio de Trento, reunido legítimamente no Espírito Santo, e presidido pelos Legados da Sé Apostólica, determinou estabelecer na presente Sessão, o que segue, em prosseguimento da matéria da reforma:

Cap. I – Inova-se os decretos pertencentes à vida e honesta conduta dos clérigos.

Não existe coisa que disponha com mais constância os fiéis à piedade e culto divino que a vida e exemplo dos que se tenham dedicado aos sagrados mistérios, pois considerando-lhes os demais como situados em lugar superior a todas as coisas desta época, põe os seus olhos como em um espelho, de onde tomam exemplos que imitarão. Por este motivo, é conveniente que os clérigos, chamados para fazer parte do destino do Senhor, ordenem de tal modo sua vida e costumes, que nada apresentem em suas vestes, passos, porte, conversação e todo o demais, de modo que possa manifestar, à primeira vista, modéstia e religião. Fujam também das culpas leves que entre o povo seriam gravíssimas, concorrendo assim para a inspiração a todos, com suas ações, da veneração.

E como à proporção de que, maior utilidade e ornamento, dá esta conduta à Igreja de Deus, com tão maior diligência deve ser observada, e assim, estabelece o Santo Concílio que guardem, de ora em diante, sob as mesmas penas, ou maiores que deverão ser impostas ao arbítrio do Ordinário, tudo quanto até o momento se tenha estabelecido com muita extensão e proveito pelos Sumos Pontífices e sagrados Concílios, sobre a conduta da vida, honestidade, decência e doutrina que devem manter os clérigos, assim como o luxo, reuniões, bailes, dados, jogos e quaisquer outros crimes, e igualmente sobre a aversão com que devam fugir dos negócios seculares. A execução deste decreto pertencente à correção dos costumes, não poderá ser suspensa por nenhuma apelação.

E se acharem que o uso contrário anulou aquelas disposições, cuidem para que sejam postas em prática o mais rápido possível, e que sejam observadas por todos, sem que para isto sejam interpostos quaisquer costumes, para que assim o fazendo, não tenham que pagar os mesmos Ordinários, à Divina Justiça as penas correspondentes ao seu descuido na correção de seus súditos.

Cap. II – Quem deve ser promovido às igrejas catedrais.

Quaisquer pessoas que de ora em diante devam ser eleitas para governar igrejas catedrais deverão estar plenamente imbuídas, não somente das condições de nascimento, idade, costumes, conduta de vida, e tudo o demais que seja requerido pelos sagrados Cânones, mas também deverão estar constituídas previamente por um período de no mínimo seis meses nas sagradas ordens, devendo ser tomadas sobre elas, informações sobre todas as suas características, para se saber da existência ou não de qualquer notícia que o desabone, na cúria, dos Legados da Sé Apostólica, ou dos Núncios das províncias, ou do Ordinário, e em sua ausência, dos Ordinários mais próximos. Além disso, deverão estar instruídos de modo que possam desempenhar plenamente as obrigações do cargo que ser-lhes-ão conferidos, e por este motivo deverão ter obtido antes, legitimamente em universidade de estudos, o grau de mestre ou doutor ou licenciado em teologia sagrada ou direito canônico, ou ainda deverão ser comprovados por meio de testemunhos públicos de alguma academia, que são idôneos para ensinar a outros. Caso forem regulares, tenham os certificados equivalentes dos superiores de sua ordem.

E todos os mencionados, de quem deverão ser tomadas informações, conhecimentos e testemunhos, estejam obrigados a fornecê-los com veracidade e gratuitamente. Se não o fizerem, fica desde já entendido que agravaram mortalmente suas consciências e que terão a Deus e a seus superiores como juizes, os quais tomarão a providência correspondente.

Cap. III – Criem-se distribuições cotidianas da terceira parte de todos os frutos. Em quem recairão as porções dos ausentes. Casos excetuados.

Os Bispos, como delegados Apostólicos, possam repartir a terceira parte de quaisquer frutos e rendas de todas as dignidades, patronatos e ofícios que existam nas igrejas catedrais ou colegiadas, para distribuições que deverão designar por seu arbítrio.

Caso ocorra que as pessoas que as obtém, não cumprirem, em quaisquer dos dias estabelecidos, o serviço pessoal que lhes for imposto na igreja, segundo a forma que determinem os Bispos, então perderão a distribuição daquele dia, sem que de modo algum adquiram sua posse, e essa distribuição deverá ser aplicada junto às demais rendas da igreja, e se não houver necessidade disto, então deverão ser aplicadas em qualquer outro lugar piedoso, ao arbítrio do Ordinário.

Caso permaneçam contumazes, sejam processados segundo o estabelecido nos sagrados Cânones.

Mas se alguma das mencionadas dignidades por direito ou costume não tiverem, nas catedrais ou colegiadas, jurisdição, administração ou ofício, mas tenham a seu cargo a cura de almas nas dioceses fora da cidade, a cujo desempenho queira dedicar-se aquele que obtiver a dignidade, tenha-se presente, neste caso, perto do o tempo que residir e servir na igreja curada, como se estivesse presente e assistisse aos divinos ofícios nas catedrais ou colegiadas.

Esta disposição deverá ser entendida apenas a respeito daquelas igrejas em que não existe estatuto algum, nem costume de que as mencionadas dignidades que não residem, percam alguma coisa que ascenda a terceira parte dos frutos e rendas referidas, sem que sirvam de obstáculo quaisquer costumes, ainda que muito antigos, exceções e estatutos mesmo que confirmados por juramento, e qualquer outra autoridade.

CAP. IV – Não tenham voto no conselho as catedrais ou colegiadas que não estiverem ordenadas “in sacris”. Qualidades e obrigações dos que obtém benefícios nestas igrejas.

Não tenha voz nos conselhos das catedrais ou colegiadas, seculares ou regulares que, dedicando nelas aos divinos ofícios, não seja ordenado ao menos de subdiácono, ainda que os demais conselheiros tenham concedido essa permissão livremente.

E os que obtiveram ou venham obter de ora em diante, nas ditas igrejas, dignidades, personalidades, ofícios, prebendas, quotas, ou quaisquer outros benefícios aos quais estiverem anexas vários encargos, por exemplo, que uns cantem a missa, outros os evangelhos e outras epístolas, estejam obrigados por privilégio, exceção, prerrogativa ou nobreza, que tenham que receber dentro de um ano, cessando todo justo impedimento, as ordens requeridas. Se assim não for feito, incorrerão nas penas contidas na constituição do Concílio de Viena, que principia: “Ut ii Qui”, que este santo Concílio renova pelo presente decreto devendo obrigar os Bispos a que exerçam por si mesmos, nos dias determinados, as ditas ordens e cumpram todos os demais ofícios que devem contribuir ao culto divino, sob as penas mencionadas e outras mais graves que imponham a seu arbítrio.

Não sejam feitas, de ora em diante, estas provisões em outras pessoas que não sejam bastante conhecidas, que não tenham a idade e todas as demais características requeridas, e se assim não for, sejam anuladas as provisões.

Cap. V – Remetam-se ao Bispo as autorizações “extra Curiam”, para que as examine.

As autorizações que devam ser concedidas por quaisquer autoridades que sejam, se ocorrerem fora da cúria Romana, sejam feitas pelos Ordinários das pessoas que as impetrem. Não terão efeito algum as que forem concedidas gratuitamente se forem examinadas, apenas sumária e extra-judicialmnte pelo Ordinário como delegado Apostólico, e este não achar que não devem ser concedidas pois estão expostas ao vício, causas sub-reptícias ou prepotentes.

Cap. VI – As últimas vontades apenas poderão ser alteradas com muita circunspecção.

Os Bispos devem conhecer sumária e extra-judicialmente, como delegados da Sé Apostólica, as comutações das últimas vontades, o que não deverá jamais ser feito senão por causas muito justas e necessárias, nem serão colocadas em execução sem que primeiro lhes conste que não foram expressas nas preces nenhuma coisa falsa, e nem se ocultou a verdade.

Cap. VII – Se renova o cap. “Romana de Appellationibus”, no sexto.

Estejam obrigados os Legados e Núncios Apostólicos, aos Patriarcas, Primados e Metropolitanos a observar nas apelações interpostas perante eles, em quaisquer causas, tanto para admiti-las como para conceder as inibições depois da apelação, a forma e teor das sagradas constituições, em especial a de Inocêncio IV, que principia: “Romana”, sem que se oponham em contrário quaisquer costumes, ainda que muito antigos, estilo ou privilégio. De outro modo sejam “ipso jure”, nulas as inibições, processos e demais autos que se seguiram.

Cap. VIII – Os Bispos devem executar todas as disposições piedosas: visitem todos os lugares de caridade que não estejam sob a proteção imediata de Reis.

Os Bispos, mesmo como delegados da Sé Apostólica, sejam, nos casos concedidos por direito, executores de todas as disposições piedosas feitas tanto pela última vontade, como entre vivos; tenham também o direito de visitar os hospitais e colégios quaisquer que sejam, assim como as confrarias de leigos, mesmo as que se chamam escolas ou tenham qualquer outro nome, mas não as que estejam sob a imediata proteção dos Reis, sem obter sua licença.

Conheçam também de ofício e façam com que tenham o destino correspondente, segundo o estabelecido nos sagrados cânones, as esmolas, as sobras de caridade ou piedade, e dos lugares piedosos sob qualquer nome que tenham, seu cuidado pertença a pessoas leigas e ainda que esses lugares piedosos gozem do privilégio de exceção, assim como todas as demais fundações destinadas por seu estabelecimento ao culto divino e salvação de almas ou alimentação dos pobres, sem que seja oposto nenhum privilégio, estatuto ou costume ainda que muito antigo.

Cap. IX – Os administradores prestarão contas ao Ordinário das obras piedosas, caso não esteja estabelecida outra coisa nas fundações.

Os administradores, tanto eclesiásticos como seculares, das rendas de quaisquer igrejas, mesmo que sejam catedrais, hospitais, confrarias, esmolas de sobras de piedade e de quaisquer outros lugares piedosos, estejam obrigados a prestar conta ao Ordinário, da sua administração todos os anos ficando anulados quaisquer costumes e privilégios em contrário, a não ser que eventualmente esteja expressamente prevenida outra coisa na fundação ou constituições da tal igreja.

Mas se, por costume, privilégio ou outra constituição do lugar, essas contas sejam devidas a outras pessoas indicadas para isto, neste caso deverá ser agregado a essas pessoas, também o Ordinário. Os resguardos que não ocorram com essas condições, de nada sirvam aos ditos administradores.

Cap. X – Os notários estão sujeitos em exame e juízo dos Bispos

Como tem surgido muitos danos devido à imperícia dos notários, e sendo esta a causa de muitos pleitos, possa o Bispo, como delegado da Sé Apostólica, examinar quaisquer notários, ainda que estes sejam credenciados por autoridade Apostólica, Imperial ou Real. Caso o Bispo não os ache idôneos, ou achando que eventualmente delinqüíram em seu ofício, poderá proibi-los perpetuamente, ou por tempo limitado do uso e exercício de seu ofício em negócios, pleitos e causas eclesiásticas e espirituais, sem que sua apelação suspenda a proibição do Bispo.

Cap. XI – Penas para os que usurpam bens de qualquer igreja ou de lugares de piedade.

Se a cobiça, raiz de todos os males, chegar a dominar em tão alto grau a qualquer clérigo ou leigo distinguido com qualquer dignidade que seja, mesmo que Imperial ou Real, que ele possa pretender reverter ao seu próprio uso e usurpar por si ou por outros, com violência, ou infundindo terror, ou valendo-se também de pessoas suspeitas, eclesiásticas ou seculares, ou com qualquer outro artifício, coloração ou pretexto, a jurisdição, bens, censos e direitos, sejam feudais ou não os frutos, emolumentos ou quaisquer subvenções de alguma igreja, ou de qualquer benefício secular ou regular, sobras de piedade, ou de outros lugares piedosos que devem reverter-se ao socorro das necessidades dos ministros e pobres, ou ainda, pretender estorvar que os recebam as pessoas a quem de direito pertencem, fique sujeito à excomunhão, por todo o tempo que não restitua inteiramente à igreja e a seu administrador ou beneficiado, as jurisdições, bens, efeitos, direitos, frutos e rendas que tenha ocupado ou que de qualquer modo tenham entrado em seu poder, mesmo que por doação de pessoa suspeita, mesmo que, além disso, tenha obtido a absolvição do Pontífice Romano.

E se for patrono da mesma igreja, fique também pelo mesmo fato, privado do direito de patronato, além das penas mencionadas.

O Clérigo que for autor desta detestável fraude e usurpação, ou consentir nela, fique sujeito às mesmas penas, e além disso, privado de quaisquer benefícios, e inábil para obter qualquer outro, e suspenso, ao arbítrio do Bispo, do exercício de suas ordens, mesmo depois de ser absolvido e ter satisfeito inteiramente as obrigações acima descritas.

Determinação da Próxima Sessão

Além, disso, assinala o mesmo sacrossanto Concílio de Trento para o dia da Sessão próxima futura, na Quinta-feira depois da oitava da festa de todos os Santos, que será em 12 de novembro e nela serão feitos os decretos sobre os Sacramentos da Ordem e do Matrimônio etc.

Prorrogue-se a Sessão para o dia 15 de julho de 1563.

  • Fonte: Agnus Dei
  • Tradução: Dercio Antonio Paganini
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