“Sola Gratia”: princípio da Reforma?

Eu, nascido e criado protestante e ordenado pastor da Southern Baptist Church antes de minha conversão à Igreja Católica Romana, fico perplexo devido a acusação dos protestantes de que os católicos não entendem a salvação. O ensino constante da Igreja Católica sempre foi que a salvação está ligada somente à graça de Deus. Esta não foi a descoberta da Reforma.

Como Louis Bouyer mostrou em seu livro The Spirit and Forms of Protestantism, todas as três teses da Reforma – a autoridade da Escritura, a necessidade da fé, e nossa justificação em Cristo – estavam vivas na tradição Católica bem antes que elas fossem o estandarte dos reformadores.

Descobri, assim como muitos outros convertos do protestantismo, que não há nenhuma necessidade de rejeitar, ou mesmo minimizar, o ensino do Evangelho nestas questões. A doutrina católica revela o significado mais rico e profundo destes mesmos princípios que os evangélicos se esforçam em defender. Neste sentido, eles são nossos irmãos em Cristo, e nós falamos a eles neste Espírito.

Sem dúvida há uma tendência na religiosidade popular de equivocar o ato sacramental da penitência a algum tipo de mérito espiritual. Não resta nenhuma dúvida sobre nossa natureza humana decaída e que nós temos crédito pelos dons que recebemos. Os protestantes que lidam com o falar carismático em línguas sabem do orgulho gerado por tais dons espirituais.

Apesar de que os católicos acreditam que é pela morte e ressurreição de Cristo que o homem desfruta de uma nova relação com Deus, isto não resume o relato da salvação Cristã. O que alguns evangélicos consideram salvação por obras é simplesmente a expressão católica do renascimento e regeneração espiritual, a contínua bênção da graça para o crescimento das pessoas em direção a Deus. O que os católicos entendem como um efeito ou fruto da salvação alguns evangélicos infelizmente interpretam como sua causa.

Estes evangélicos também rejeitam o papel sacramental, praticado pela paróquia e pelo sacerdote, no drama da salvação. Argumentam que Jesus não necessita de nenhum outro mediador, que ao crente foi proporcionado acesso direto ao seu amor salvífico. Isto, penso, é a mais importante, mais substancial diferença entre evangélicos e católicos que a questão da “Fé somente”.  Nós podemos concordar com os evangélicos que a fé em Jesus nos salva de nossos pecados, mas é muito mais difícil concordar na forma, sacramental ou outra que seja, desta aceitação.

Os católicos são confundidos pela insistência evangélica de que Jesus Cristo é algo mais que a sua Igreja, seus sacerdotes e seus sacramentos. “Não é por estas formas que Cristo se apresenta concretamente para nós?”, o católico responderia. A Igreja como Corpo de Cristo, o sacerdote como representante de Cristo, os sacramentos como sinais visíveis da graça de Cristo, são todos ligados ao pensamento Católico.

A força do movimento protestante evangélico é visto em sua ênfase num encontro com a palavra de Deus como pregado e encontrado na Bíblia. Os católicos na América ainda têm muito que aprender desta tradição de adoração revitalizada continuamente. Alguns evangélicos dizem que seu cristianismo é o mais genuíno, mais semelhante à Igreja Primitiva do Novo Testamento. Afirmam praticar uma espiritualidade mais imediata, uma fé Cristã desprovida do desnecessário.

Mesmo os cristãos evangélicos, se forem honestos consigo mesmos, não possuem uma fé sem prática religiosa. Transpiram confiança na mediação do pastor protestante, o sermão, sua adoração, e o estudo da Palavra.

Cristo, concordamos, estabeleceu estes meios para nossa conversão. Mas é também verdadeiro que deu-nos mais – a realidade dos sacramentos e do sacerdócio da Igreja Católica. Assim, vários protestantes continuam a achar um lar na Igreja Católica não porque os católicos são cristãos e os protestantes não são, mas por causa da plenitude da revelação de Deus que encontram nela.

Fonte: Crisis Magazine, 13, no. 9 (Out, 1995). Tradução: Rondinelly Ribeiro.

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