• Tradução: Pe. Ze

Paulo Bispo, servo dos servos de Deus, a todos os fiéis de Cristo que a presente Carta virem, saúde e bênção Apostólica.

O Deus sublime amou tanto o género humano, que criou o homem de tal maneira, que ele não só é participante dos bens terrenos, como as outras criaturas, mas também pode atingir o inacessível e invisível Bem Supremo, e vê-lo face a face. E, tendo sido o homem criado para alcançar a vida e a felicidade eterna, como disso é testemunha a Sagrada Escritura, e não podendo ninguém alcançar este vida e felicidade eterna a não ser pela confissão da Fé em Nosso Senhor Jesus Cristo, é necessário que o homem seja de tal condição e natureza que possa receber a Fé em Cristo, e que todo aquele que recebeu uma natureza humana seja capaz de receber a própria Fé. Nem é crível que alguém seja de tal forma destituído de entendimento que se convença de que pode alcançar um fim, mas não pode de maneira nenhuma atingir os meios extremamente indispensáveis. Por isso a própria Verdade, que nem se engana nem pode enganar, ao enviar os pregadores da Fé para o ofício da pregação, se sabe que disse: «Ide e ensinai todos os povos». Ele disse «todos», sem faltar ninguém, sendo todos capazes da aprendizagem da fé.

Vendo isto com maus olhos o inimigo do género humano, que sempre se opõe às boas obras, para que estas desapareçam, excogitou um meio até agora inaudito para impedir que a palavra de Deus fosse pregada aos gentios, em ordem à sua salvação, e moveu alguns dos seus sequazes que, ávidos de satisfazer a sua cobiça, se atrevem a afirmar que os Índios ocidentais e meridionais e outros povos, que nestes tempos chegaram ao nosso conhecimento, devem ser indistintamente reduzidos aos nossos interesses, como mudos animais, sob o pretexto de que são inaptos para a Fé Católica. Então reduzem-nos à escravidão, castigando-os com os mesmos maus tratos com que castigam os brutos animais que os servem.

Nós, portanto, que exercemos na terra as vezes de Nosso Senhor, embora sejamos indignos, e que procuramos com todo o empenho as ovelhas do seu rebanho a nós confiadas e que estão fora do seu redil, para as trazer para este redil, atendendo a que os referidos Índios, como verdadeiros homens, não só são capazes da Fé Cristã, mas também, como nos foi referido, acorrem muito prontamente à fé, e querendo nós ainda tomar providências a respeito disto com remédios convenientes, com a autoridade apostólica, pela presente Carta decretamos e declaramos que os mencionados Índios e todos os outros povos que no futuro chegaram ao conhecimento dos Cristãos, embora estejam fora da Fé de Cristo, não estão privados da sua liberdade e da posse das suas coisas, nem disso devem ser privados; pelo contrário, livre e licitamente podem usar, usufruir e gozar dessa mesma liberdade e posse, e não devem ser reduzidos à escravidão. E tudo o que se fizer ao contrário disto, seja nulo e sem efeito, sem qualquer valor ou autoridade. Decretamos e declaramos ainda que os referidos Índios e outros povos devem ser chamados à Fé de Cristo pela pregação da palavra de Deus e pelo exemplo de uma boa vida.

Às cópias desta presente Carta, assinadas pela mão de algum Notário público e munidas com o selo de alguma pessoa revestida de dignidade eclesiástica, deve ser dado o mesmo crédito que é dado ao original, sem que obstem quaisquer coisas antes referidas e outras contrárias.

Dado em Roma, no ano do Senhor de 1537, 2 de Junho, terceiro ano do nosso Pontificado.

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