• Autor: Martin J. Scott, sj
  • Fonte: Livro “Things Catholics Are Asked About” (1927) / Site “Una Fides, One Faith” (http://net2.netacc.net/~mafg)
  • Tradução: Carlos Martins Nabeto

Católicos muitas vezes ouvem dizer que, fora da fé, uma religião é tão boa quanto outra. Às vezes, isso é colocado de uma outra maneira: “Todos os caminhos levam a Roma”. Uma razão pela qual a Igreja encontra oposição é porque ela afirma ser a única Igreja verdadeira.

Uma religião é tão boa quanto outra? Evidentemente, aqueles que fundaram novas denominações religiosas não pensaram assim. Se uma religião fosse tão boa quanto outra, não haveria razão para o estabelecimento das muitas denominações protestantes que vemos hoje. Toda nova seita religiosa é a admissão de que uma religião não é tão boa quanto outra. As centenas de seitas existentes entre os cristãos não-católicos são uma declaração de que a igreja que eles abandonaram não era tão boa quanto a igreja que eles inauguraram. Também não se pode dizer que a razão para se estabelecer uma nova denominação era simplesmente porque a antiga denominação era pessoalmente inadequada para quem a abandonava. A razão para se estabelecer a nova não foi por mera inadequação, mas porque a anterior foi doutrinalmente contestada. Mas este não é o ponto. No máximo, mostra que os não-católicos se contradizem quando afirmam que uma religião é tão boa quanto outra.

Ao considerarmos esta questão, devemos diferenciar entre um credo e o crente em um credo. Um credo pode estar errado, mas um crente pode estar muito sincero nesse credo. Um credo pode ser condenado sem que se condene os seus adeptos. Um exemplo ilustra isso: um homem pode se opor na política a outro homem sem se opor pessoalmente a esse outro homem. Um democrata pode agredir o partido republicano e, ao mesmo tempo, estimar e respeitar um republicano pessoalmente. Dois homens podem ser amigos íntimos e ainda assima pertencerem a partidos políticos opostos. Eles podem condenar mutuamente o partido do outro, atacando seus princípios e denunciando suas políticas, mas ao mesmo tempo se estimando individualmente. Podem condenar a política e os princípios de um determinado partido político e, não obstante, admirar e elogiar os indivíduos desse partido.

Portanto, ao considerarmos esse assunto das várias religiões e das suas reivindicações, devemos considerar apenas a religião, não os seus membros. É possível analisar, examinar e avaliar um credo religioso. É impossível para o homem analisar e julgar a consciência individual. Somente Deus vê e compreende o coração humano individual. O julgamento é Dele. Mas o homem pode julgar a verdade ou o erro de uma proposição. Se uma afirmação é auto-contraditória, ou contradiz uma verdade conhecida, ou está em desacordo com os dados conhecidos, ela é falsa e o homem pode declarar isso.

Se uma religião fosse tão boa quanto outra, não haveria razão para Cristo estabelecer a Religião Cristã. Se a religião pagã era tão boa quanto a cristã, não haveria necessidade dos Apóstolos e dos primeiros cristãos derramarem o seu sangue para estabelecer o Cristianismo. Se uma religião é tão boa quanto outra, o culto fetichista do selvagem africano é tão bom quanto o culto cristão ao Deus verdadeiro.

Podemos condenar a adoração de ídolos sem condenar o pobre idólatra. Podemos condenar a adoração que sacrifica a vida humana a ídolos grotescos sem condenar os seguidores lamentáveis ​​dessa adoração. E assim, com efeito, podemos declarar falsas certas religiões de hoje [simplesmente] porque são falsas. E se uma religião é falsa, não é tão boa quanto a religião verdadeira. É possível que um homem entre num trem errado e, eventualmente, consiga chegar ao seu destino; mas isso não faz desse trem o caminho certo. É possível que um homem receba instruções erradas e no entanto chegue, com o passar do tempo, no devido lugar; mas isso não torna tal direção correta. Algumas pessoas erram com direções certas e outras acertam com direções erradas. O cardeal Newman falou a verdade quando disse que muitos católicos eram piores que a sua religião, enquanto os protestantes, em muitos casos, eram melhores que a sua religião: afinal, a religião não obriga fisicamente ninguém a segui-la; simplesmente indica o caminho certo e ajuda a caminhar por este. Pode acontecer que um membro da religião verdadeira leve uma vida ruim e perca a alma, enquanto um membro de uma religião falsa, vivendo de acordo com a consciência, salve a sua alma. Isso não torna verdadeira a religião falsa e nem falsa a religião verdadeira.

Em qualquer área da vida, uma pessoa excepcional pode se elevar acima do nível dos princípios e da conduta dos seus companheiros. Mas a religião diz respeito não apenas aos casos excepcionais, mas à humanidade em geral. Normalmente, uma religião falsa conduzirá os seus adeptos da maneira errada e a religião verdadeira conduzirá os seus seguidores da maneira correta.

É certo, portanto, dizer que uma religião é tão boa quanto outra? Não é mais certo do que dizer que um guia falso é tão bom quanto um guia verdadeiro. Se qualquer religião do mundo for verdadeira, toda religião que difere dela será falsa. Isso é tão claro e nítido quanto 2+2=4. Pois bem: existe apenas uma religião no mundo que afirma ser exclusivamente a verdadeira; e essa religião é a católica. Todas as outras religiões afirmam que estão avançando em direção à verdade, ou que não há uma verdade absoluta, ou que é mais verdadeira do que algum outro credo. A Igreja Católica, se estiver certa, constitui todas as outras religiões em erradas. Essa é uma razão para estas se oporem a ela.

Mas ela é a única Igreja que afirma ser a verdade, toda a verdade e nada mais que a verdade. As outras igrejas nem mesmo afirmam possuir a verdade; elas admitem que as igrejas que diferem delas são tão boas quanto elas. Podem afirmar que elas diferem apenas em coisas secundárias. Mas não é assim, todavia: é em coisas fundamentais e essenciais. Então acho que deve-se admitir que se se provar que a Igreja Católica é verdadeira, seguir-se-á que as outras que diferem dela são falsas, e que uma religião falsa não é tão boa quanto a religião verdadeira, e que consequentemente uma religião não é tão boa quanto outra.

Para provarmos que a Igreja Católica é verdadeira, é necessário apenas mostrar que Cristo fundou uma Igreja e que a católica é essa Igreja. É claro que se Cristo estabeleceu uma Igreja, essa era verdadeira, pois Ele era Deus. É evidente também que Ele estabeleceu uma Igreja, caso contrário as várias igrejas existentes não reivindicariam ser a que Ele estabeleceu. Mas seria a Igreja Católica fundada por Ele e a única que Ele estabeleceu? Um livro inteiro pode ser escrito sobre esse assunto, mas no espaço que me propus para tratar desse assunto, serei breve. Contudo, apresentarei uma prova que qualquer júri de mentes sem preconceitos aceitaria. Uma breve discussão é tão convincente quanto uma longa e, muitas vezes, mais decisiva. A prova de que a Igreja Católica é aquela estabelecida por Jesus Cristo é que, durante séculos depois de Cristo, foi a única Igreja de Cristo conhecida no mundo. Inclusive, alguns hereges daqueles séculos se afirmavam católicos, de modo que é verdade que a Igreja Católica era reconhecida como a Igreja de Cristo. Se Cristo estabeleceu uma Igreja, ela existia como organização visível porque precisava pregar, administrar os Sacramentos etc., exigindo assim um ministério visível.

Não-católicos admitem isso. Eles dizem, no entanto, que após os primeiros séculos a Igreja foi gradualmente caindo em erro e que a Reforma restabeleceu a verdadeira Igreja Cristã. Duas coisas contradizem isso. A primeira é que Cristo, ao fundar a Sua Igreja, proclamou que Ele sempre estaria com ela e que nunca haveria de ensinar erros. Se a única Igreja no mundo que por séculos foi reconhecida pelos cristãos como a Igreja de Cristo caiu em erro, a garantia dada Cristo foi falsa. E se a Sua garantia foi falsa, Ele era falso, portanto, não era Deus; logo, todo o Cristianismo é uma fraude e quanto mais cedo for considerado falso, melhor.

Além disso, as religiões reconstruídas dos reformadores não afirmam que têm a verdade, toda a verdade e nada mais que a verdade. Porém, nenhuma igreja é de Cristo se não possui toda a verdade. Cristo declarou que Ele era o Caminho, a Verdade e a Vida. A Sua Igreja não pode ser parcialmente verdadeira e parcialmente falsa. Nenhuma igreja na terra afirma ser exclusivamente verdadeira, exceto a Igreja Católica. Como pode uma igreja que não é inteiramente verdadeira ser a Igreja do Cristo absolutamente verdadeira? Por sua própria admissão, portanto, as igrejas não-católicas se mostram como não sendo a Igreja de Cristo. Afirmar que uma igreja que não é a de Cristo é tão boa quanto a Igreja de Cristo é dizer que a falsidade é coisa tão boa quanto a verdade.

Em suma: Cristo era Deus. Ele estabeleceu uma Igreja. À esta Igreja Ele garantiu contra o erro. A única Igreja no mundo que afirma não errar é a Igreja Católica. Portanto, a Igreja Católica é a Igreja de Cristo. Logo, uma Igreja não é tão boa quanto outra porque há uma Igreja que é a de Cristo, que não pode errar e que se destaca por si mesma como a única Igreja verdadeira. Um homem em um barco a remo pode atravessar o Atlântico. Portanto, um homem, independentemente do credo, pode ser capaz de conhecer a verdade e viver de acordo com ela. Mas ninguém confiaria em um barco a remo para uma viagem transatlântica se um de nossos modernos navios de cruzeiro estivesse disponível para a travessia.

A Igreja de Cristo é o vaso garantido por Deus para conduzir todos os que nela viajam ao refúgio de vida e alegria eternas. Ninguém que viaja neste navio precisa temer o naufrágio se permanecer a bordo. É somente abandonando a embarcação que ele pode se perder. Ninguém pode fazê-lo sair do navio, a não ser ele mesmo. Mas algo pode fazer com que ele saia: desobedecer as ordens. Nesse caso, a segurança do navio não lhe valerá.

Deus concede a todo ser humano a graça necessária para a salvação. Ele fundou a Sua Igreja como o meio designado para guiar e ajudar o homem a alcançar a salvação. Embora seja possível que pessoas de fora da Igreja estejam de boa fé e possuam uma consciência correta sejam salvas, elas se vêem jogadas de um lado para outro num mar de dúvidas, carecendo das ajudas e orientações fornecidas pela verdadeira Igreja e, muitas vezes, desanimam e desistem do esforço de combater o mundo, a carne e o diabo. Na verdadeira Igreja de Cristo, não há dúvida, os filhos dela não estão procurando a verdade: eles a têm e possuem orientação segura em todas as vicissitudes da vida; se caem, encontram uma mão amiga para ajudá-los a se levantar; se são fracos, encontram força nos Sacramentos da graça. Eles têm aquela paz que a certeza dá, aquela paz que o mundo não pode dar nem tirar. Não, uma religião não é tão boa quanto outra. Não quando uma religião – e apenas uma – é estabelecida e garantida contra erros por Jesus Cristo, o Filho de Deus!

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