“Vadias” no banco dos reús: Eu quero!

– Parece que o perdão e a justiça são contraditórios: a batalha pela justiça lançaria fora o perdão exigido do cristão; o perdão faria do cristianismo um grupo preferencial de ataques, pois se saberia antecipadamente que não reagiriam. Mas será que é assim mesmo?

A “Marcha das Vadias“, ocorrida há 20 dias no bairro de Copacabana-RJ, suscitou muita gritaria e manifestações na rede. Pulularam artigos que, ao meu ver, refletiram muito bem sobre o fato ocorrido, apontando para os sinais que a invasão à Igreja podem significar. Eu pessoalmente sou favorável a estas manifestações, pois elas rompem o silêncio da mídia oficial sobre assuntos importantes, como o direito à religião, por exemplo, direito previsto e protegido pela Constituição Federal. Tenho dúvida do espaço que a mídia daria ao evento se não fossem as dezenas de blogs e mídias sociais repercutindo o assunto. Destaco as meditações de O Possível e o Extraordinário, Deus lo Vult! e da Ecclesia Una. Mas foi a leitura do texto de O Catequista que me confirmou a ideia, já insinuada no meu post sobre o assunto e no comentário à Nota Oficial da Arquidiocese do Rio de Janeiro acerca da marcha: é preciso fazer mais! É preciso fazer mais que passeatas, mais que twitaços, mais que artigos em jornais, revistas e blogs. Reitero: eu acho fundamental tudo isso, pois a batalha da cultura se ganha com ciência, informação e cultura de qualidade. Ademais, nós mesmos participamos de twitaços e movimentos online, sempre que possível. Contudo, algo mais precisa ser feito.

Na verdade, a ofensa à Igreja nem foi tão grande assim: andar com o colo desnudado nas ruas de Copacabana não é tão diferente do que andar semi-nu na praia, ali do lado. Aquelas senhoras com os seios à mostra não chegam a ser ofensa pessoal aos crentes, a não ser por algumas manifestantes, que fariam um favor a si mesmas se usassem aqueles roupões da Assembleia de Deus… O que realmente é grave é o significado do ato, que ultrapassa em muito a agressão a uma igreja em particular! De fato, um artigo da Constituição Federal foi aviltado, pisoteado, achincalhado por um grupo de cidadãos e ficou – aparentemente – por isso mesmo. O episódio, além de revelar a intolerância deste movimento – não o único a clamar intolerantemene por tolerância – tem provocado muitas perguntas acerca do direito das Igrejas defenderem-se juridicamente das ofensas e violências de organizações civis. A título de informação: naquela tarde, algumas manifestantes feriram uma senhora dentro do território da Igreja, com gritos e palavrões atrapalharam a liturgia que ocorria no momento, apavorando crianças que lá estavam. Testemunhas dizem que, não fosse a intervenção da polícia, as manifestantes certamente invadiriam a nave central da Igreja de Nossa Senhora de Copacabana, local, aliás, que não estava no roteiro original da passeata enviado à Prefeitura. Os organizadores da passeata modificaram seu trajeto para ofender a Igreja Católica, denotando intenção clara de tornar público o repúdio e a intolerância contra essa instituição. Ora, a Constituição Federal do Brasil garante aos grupos religiosos, de qualquer confissão e não só os católicos, que tenham seus locais de culto e suas liturgias protegidos de ofensas de qualquer tipo (art. 5, inciso VI). Ao invadirem a Igreja de Copacabana e ao atrapalharem a celebração da Missa que lá estava ocorrendo, as senhoras violaram a Carta Magna do Brasil. E aqui vem o ponto da (longa) reflexão que proponho: é direito ou é dever da Igreja Católica exigir das autoridades competentes que os responsáveis pela passeata respondam criminalmente por essa ofensa à Constituição Federal? Alguns sustentam que a Igreja Católica deveria perdoar as manifestantes, inclusive ignorando o crime que cometeram; outros entendem que o perdão do ato não tem relação necessária com a abdicação do direito à justiça. Quero dizer que não desejo, nem de longe, ensinar o padre a rezar missa. Apenas pretendo refletir sobre um ponto muito delicado, que é a relação entre perdão e apatia; ou entre justiça e vingança.

Diante das ofensas das “vadias”, há um sentimento difundido entre os cristãos que confunde perdão com apatia; ou justiça com vingança. Para alguns, acionar o movimento na justiça equivaleria ao sentimento de vingança, que não combinaria, nas suas cabeças, com o cristianismo; para outros, perdoar significaria ser apático e permitir que o fato se repita em outros momentos e outros grupos o ocorrido naquele sábado. Na maioria dos casos, parece que o perdão e a justiça são contraditórios: a batalha pela justiça lançaria fora o perdão exigido do cristão; o perdão faria do cristianismo um grupo preferencial de ataques, pois se saberia antecipadamente que não reagiriam. Mas será que é assim mesmo? Vamos meditar:

1. O direito de defender-se

Os que argumentam em favor do perdão absoluto, abdicando da reparação pela ofensa à religião e à Carta Magna do país, dizem que foi isso que Nosso Senhor Jesus Cristo ensinou-nos quando esteve em meio a nós. Dizem que sua mensagem é de perdão e de caridade… Será? Será que Nosso Senhor ensinou-nos que não se pode reclamar pela justiça; que o perdão é de tal forma indiferente que tanto faz perdoar algo que é justo como algo injusto? De outro modo: será que é direito do ofendido injustamente reclamar justiça para as autoridades competentes? O que Jesus faria no nosso lugar??

Ora, Nosso Senhor passou por uma situação parecida. Na Semana do Amor, durante o interrogatório dos seus algozes, um homem ataca o Senhor e lhe impõe uma bofetada, em razão de uma resposta. Ora, aos olhos dos que acham que o perdão é uma obrigação absoluta, sem características próprias, o Senhor deveria manter-se calado, sem esboçar qualquer repulsa acerca do ato injusto e, ato contínuo, deveria oferecer ao agressor a outra face. Mas não foi isso o que aconteceu. Diz o texto bíblico que o Senhor Jesus interpelou o agressor: “Se falei mal, prova-o, mas se falei bem, por que me bates?” (Jo 18,23). A lição que o Senhor quer nos dar: se não há nada de injusto nos atos, é direito do agredido reclamar justiça, sem violência, mas é seu direito. Essa foi a postura do Senhor Jesus neste episódio da Grande Noite.

São Paulo também apelou à justiça para escapar das agressões injustas. Quando ia sendo atacado pelos inimigos da Igreja e ia sendo amarrado sem julgamento e, portanto, violando o direito romano, o Apóstolo dos Gentios exigiu o cumprimento de uma lei que o favorecia: “Quando o iam amarrando com a correia, Paulo perguntou a um centurião que estava presente: É permitido açoitar um cidadão romano que nem sequer foi julgado?” (At 22,25). Paulo, sabendo que o que acontecia era um ato de violência, motivado pelo ódio aos cristãos, fez valer seu direito de cidadão romano, direito que teve de ser respeitado pelos inimigos, mesmo a contragosto.

Como disse, não sou teólogo, mas não parece haver nada contrário ao Evangelho quando se apela à justiça em nome da restauração de um direito vilipendiado. Além do Evangelho, mesmo as normas eclesiais resguardam os homens de injustiça, com o Direito Canônico, que deu origem aos códigos civis de direito no mundo inteiro. Ora, no caso em questão, o que se exige é que as “vadias” e qualquer um que ofenda os direitos constitucionais sintam o peso da justiça, a fim de desencorajar outros grupos que pretendam fazer o mesmo no futuro. E não é vingança pura e simples. É direito! Onde os cristãos sofrem calados, lá a injustiça aumenta em grau inimaginável:

1. Depois de perder milhões de dólares em ações judiciais sem cabimento e injustas, os bispos americanos têm contra-atacado. Há ações contra a administração dos EUA por violarem a Primeira Emenda da Carta Magna norte-americana, que normatiza o direito à liberdade de religião e de crença. Que o Brasil aprenda com os norte-americanos, antes que seja tarde.

2. Em todos os países de maioria muçulmana os cristãos têm sofrido um verdadeiro açoite, algo assemelhado a um genocídio, a diferença de que o motivo não é a raça das vítimas. Quem têm morrido com a perseguição, sem encontrar uma organização que os defenda apropriadamente, são os cristãos do Oriente Médio, África e Ásia.

Contudo, embora seja direito, é dever dos cristãos se defenderem na justiça?

2. O dever de defender-se

Embora me pareça clara a doutrina sobre a defesa legítima dos cristãos contra os seus agressores, inclusive utilizando a lei de um país ou organização, tenho que dizer que não é dever absoluto fazer isso. Isto é, embora os indivíduos possam utilizar da prerrogativa de defender-se dos inimigos com a lei, se eles não o fizerem não estarão pecando. O próprio Paulo diversas vezes abriu mão do seu direito de cidadão para aproximar-se mais do Cristo Sofredor, por meio de açoites e perseguições sem fim. E o Senhor Jesus também, diante de outras acusações injustas naquela noite, não levantou a voz. Sabia que aquela noite tinha um propósito e não podia pôr tudo a perder. Mas aqui eu distingo:

– Não é dever defender-se com a lei se estiver em jogo o seu bem pessoal, seus valores, sua vida. Mas se outros estão em jogo, não tenho certeza de que não seja dever grave agir para que a injustiça – que eventualmente você pode suportar – não abata outros cidadãos menos firmes na fé e na natureza. Quando está em perigo a fé e a saúde de outros, entendo que é dever dos responsáveis agir para que injustiças não coloquem limite a esses bens tão preciosos.

Por esse motivo é que rezo para que aquelas senhoras e senhoritas entendam que não são “vadias”, que elas saibam que são maravilhosas, insubstituíveis. Nenhuma mulher merece ser tratada como “vadia”. Apesar disso, rezo e peço às autoridades religiosas do Rio de Janeiro que coloque os líderes do movimento no banco dos réus, antes que outros entrem nas naves das Igrejas e violentem moralmente nossas crianças. “Vadias” no banco dos reús: Eu Quero! Você também, então deixa um comentário aqui.

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