Virgindade de Maria e os “Irmãos do Senhor”

Olá, gostaria que o senhor escrevesse os textos mais antigos que falam sobre a virgindade de Maria e seus respectivos anos em que foram escritos e queria tambem que o senhor comentasse mais sobre certo texto de Papias de Hierapolis que se encontra no site do Veritatis onde ele diz que Tiago, José, Judas e Simão são filhos de uma irmã de Maria, mãe de Jesus. Queria saber tudo sobre esse texto e qual é o grau de sua veracidade. Mas também quero os outros testemunhos dos Antigos Padres da Igreja. Desde já agradeço! (Jorge)

Prezado Jorge,

Pax Domini!

Primeiramente, agradecemos por nos ter escrito.

Pápias de Hierápolis viveu entre os anos 70 e 140 d.C. e, assim, teve a oportunidade de conhecer a pregação de alguns dos discípulos diretos dos Apóstolos, como ele próprio chegou a declarar.

Pois bem. Segundo informações prestadas por Santo Ireneu de Lião, Eusébio de Cesaréia e São Jerônimo, Pápias escreveu uma obra, em 5 volumes, intitulada “Exposição dos Oráculos do Senhor”, em que consignou por escrito as palavras que ouviu e recebeu desses discípulos dos Apóstolos.

Entre os poucos e pequenos fragmentos que restam de sua obra (a íntegra, entretanto, não logrou resistir até os nossos dias), achamos este, a que você faz referência em seu email:

“(1) Maria, a mãe do Senhor; (2) Maria, a esposa de Cléofas ou Alfeu, que era mãe de Tiago, bispo e apóstolo, de Simão, de Tadeu e de um dos que se chamavam José; (3) Maria Salomé, esposa de Zebedeu, mãe de João, o evangelista, e Tiago; (4) e Maria Madalena. Estas quatro mulheres são encontradas no Evangelho. Tiago, Judas e José são filhos de uma tia do Senhor. Maria, mãe de Tiago, o menor, e José, esposa de Alfeu, era irmã de Maria, mãe do Senhor, e que João liga a Cléofas; eram irmãs por parte de pai, por parte da família do clã ou por outra ligação qualquer. Maria Salomé é chamada simplesmente por Salomé por causa de seu marido ou de seu vilarejo. Alguns afirmam que ela é a mesma pessoa que Maria de Cléofas, já que teria se casado duas vezes. “

Tal fragmento de texto, encontrado em um manuscrito da Biblioteca Bodleiana, além de ser reproduzido no nosso site Veritatis Splendor também pode ser encontrado – em inglês – em outros sites, quer católicos (p.ex.: New Advent – http://www.newadvent.org/fathers/0125.htm , item X), quer protestantes (p.ex.: Christian Classics Ethereal Library – http://www.ccel.org/ccel/schaff/anf01.txt , tópico 1764).

Como se vê, o primitivo autor enumera aí as quatro mulheres que aparecem nos Santos Evangelhos com o prenome “Maria”, deixando bem claro que os denominados “irmãos do Senhor” não são filhos de Maria, a mãe de Jesus, mas sim de uma parente sua, de igual prenome. Logo, Jesus não teve irmãos consangüíneos…

O protestante Westcott (1825-1901), contudo, negava que tais palavras fossem oriundas de Papias, em razão de encontrá-las parcialmente reproduzidas em um dicionário manuscrito da Idade Média tardia.

Tal alegação, porém, não exclui a autoria de Pápias; antes dá a parecer que o redator do dicionário, ao preparar o verbete sobre as “Marias”, resolveu empregar o texto de Pápias – que bem sintetizava o verbete -, ao qual acrescentou ainda alguns títulos marianos – estes sim, medievais e estranhos ao texto original – como “Illuminatrix”, Estrela do Mar etc.

De fato, não nos soa estranho que naquela época – em que a cultura se difundia especialmente por livros manuscritos – se tentasse evitar ao máximo “reinventar a roda”. Isto porque se preferia empregar melhor o tempo copiando outros livros (parcial ou integralmente), do que criando novos textos sobre um assunto já abordado por outrem. Isto trazia uma outra “vantagem”: como o material para escrita era caro, copiando-se textos evitava-se o desperdício que inevitáveis erros traziam por conseqüência natural.

Com efeito, a “criação de obras intelectuais” só se dava em alguns raros casos: divulgação de uma idéia original, ampliação ou atualização de textos pré-existentes… Um bom exemplo dessa prática podemos ver na clássica obra de Eusébio de Cesaréia, “História Eclesiástica”, em que a cópia de textos e documentos de outras fontes vem a perfazer considerável parte de sua obra final.

Desta forma, é muito mais provável e razoável ter sido o texto de Pápias empregado no dicionário (como se deduz dos acréscimos neste encontrados) do que ser uma “criação” da Idade Média tardia.

Mas seja como for, bem mais importante que a antigüidade atribuída ao testemunho de Papias (fins do séc. I ou início do séc. II), é o fato deste texto primitivo também encontrar-se em pleno acordo com o ensinamento da Sagrada Tradição (e professada até hoje pela Igreja Católica), em nada contrariando a Sagrada Escritura.

Aliás, nesse sentido, o nosso Apostolado Veritatis Splendor já teve a honra de disponibilizar para os seus leitores a obra “Da Virgindade Perpétua de Maria” ( https://www.veritatis.com.br/article/3688), de São Jerônimo, em que este grande santo e doutor da Igreja – que dominava as línguas bíblicas (hebraico, aramaico e grego) – abordava exatamente essa temática e demonstrava, contra o herege Helvídio, que os chamados “irmãos do Senhor” não eram absolutamente filhos de Maria, nem irmãos “carnais” de Jesus .

E além de Pápias e São Jerônimo, vários outros Padres da Igreja apontam que Maria não teve outros filhos, como Santo Atanásio de Alexandria, Santo Epifânio de Salamina, Santo Agostinho e São João Damasceno.

Santo Agostinho, por exemplo – figura respeitada até mesmo por muitos protestantes (inclusive Lutero e Calvino) – ensinava claramente aos fiéis: “Quando vocês ouvirem falar dos ‘irmãos do Senhor’, pensem logo que se trata de algum parentesco que os une a Maria, sem imaginar ter ela tido outros filhos” (Comentário ao Evangelho de João 28,3); e também: “Já era Filho único do Pai aquele que nasceu como filho único de sua Mãe” (Sermão 192,1) – grifamos.

E o fato de que Jesus não tinha outros irmãos oriundos do ventre santo de Maria – nossa “Arca da Aliança do Novo Testamento” – pode ainda ser confirmado de uma outra maneira: o ensinamento igualmente ortodoxo que confere à Maria o título de Aeiparthenos, ou seja, “Sempre Virgem”.

Assim, reconhecem esse título à Maria importantíssimos Padres da Igreja como Santo Efrém da Síria, Santo Ambrósio de Milão, Santo Epifânio de Salamina, São João Crisóstomo, Santo Agostinho de Hipona, São Cirilo de Alexandria, Santo Ildelfonso de Toledo e São João Damasceno. Inclusive o II Concílio Ecumênico de Constantinopla honra Maria com o título de “Sempre Virgem”!

E note como tal verdade da fé soa ainda mais bela nestes antiqüíssimos versos de Santo Efrém da Síria:

“Virgem, ela (=Maria) O deu à luz (a Jesus) e fica incólume em sua virgindade. / Inclinou-se e pariu-O; e, assim Virgem, ela O levantou e O alimentou com seu leite. / Ela é Virgem e assim morre, sem que sejam violados os selos de sua virgindade.” – grifamos.

Cremos que isto seja o sufiente… Mas você poderá encontrar outras citações do período patrístico em nosso site, através do uso da ferramenta de busca que disponibilizamos na página principal.

Nos próximos meses estaremos também lançando em livro essas e muitas outras citações dos primitivos Padres e Escritores da Igreja, o que certamente lhe facilitará a pesquisa, quer nesse como em outros temas. Aguarde-nos!

[]s,
que Deus te abençoe!

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