Xadrez

Escreveram-me com dúvidas sobre o jogo de xadrez, e respondi (original em negrito, respostas minhas em texto normal):

Há poucos dias ouvi por parte de protestantes que seria errado jogar xadrez, pois ele teria origens no ocultismo. Foi algo passageiro e não deu para saber mais detalhes.

Que bom. Besteira é melhor não escutar, mesmo. 🙂

Explico: os protestantes têm uma péssima tendência gnóstica, que os leva a ver coisas como más em si. Para um protestante poder usar uma aliança de casamento, por exemplo (algo de comprovada origem pagã), ele precisa negar esta origem. O ideal, para eles, seria viver em um mundo etéreo, à parte, em que nada material existisse. A partir daí, eles têm esta tendência a demonizar isso ou aquilo devido a suas origens ou a alguma associação.

Ora, isso não faz sentido algum. Nós sabemos que toda a Criação é boa; mau é o uso que pode ser feito dela. Sabemos também que o abuso não tolhe o uso. Os exemplos disso são incontáveis: os macumbeiros usam panelas de barro para seus “trabalhos”; mesmo assim, podemos comer moquecas à vontade, mesmo elas sendo feitas em panelas de barro. Do mesmo modo, os protestantes usam terno e gravata, o que não torna esta roupa proibida. E por aí vai. Só o que se deve evitar é o escândalo, ou seja, dar a falsa impressão de que damos nosso aval a uma coisa que é errada. Assim, não é recomendável que se use roupas brancas e turbantes com colares coloridos no pescoço ou ternos feios e mal-cortados, não por estas combinações serem “demoníacas” ou qualquer besteira assim, mas para que as pessoas não pensem que somos macumbeiros ou protestantes.

Deste modo, mesmo que o xadrez fosse algo que houvesse começado no meio mais negro dos seguidores de demônios antropófagos, ele poderia ser jogado à vontade desde que esta identificação de xadrez e demonolatria não fosse automática e comum. Em outras palavras: todo mundo presume que reconheceu um macumbeiro ao ver uma pessoa de branco com colares coloridos ou que reconhece um herege ao ver um terno feio e mal-cortado somado a um livro preto debaixo do braço, o que faz com que se deva evitar estes trajes. Ninguém, porém, a não ser casos clínicos graves de doença mental, identifica xadrez e demonolatria, o que faz com que não haja problema algum com o xadrez. Há algumas décadas seria até possível, forçando muito a barra, acusar uma identificação de xadrez com comunismo soviético, mas mesmo isso seria tênue demais… 🙂

Em termos de “culpa por associação'” assim, a Sã Doutrina nos ensina que não devemos dar escândalo, mas que não existe “contaminação” à moda protestante. O único outro problema possível seria se o xadrez levasse, em si, a práticas condenáveis ou fosse ocasião para que surgisse a tentação dessas práticas. Como xadrez não é strip-poker, porém, não é um risco que se corra. 😉

Sabemos que protestantes não são fontes confiáveis, além do típico senciacionalismo deles. Mas como gosto muito de jogar xadrez e não sei muita coisa sobre a história desse jogo (só conheço a mais comum, que diz que foi inventado por um sábio a pedido de um rei, inclusive o sábio teria pedido um pagamento em grãos que deveriam ser distribuídos pelo tabuleiro), fiquei com essa “pulga atrás da orelha”.

Detefon nela. Deixe de dar ouvidos a besteiras de hereges e vc estará bem melhor. 🙂

Você conhece as origens desse jogo?

Parece que é de origem indiana, por volta do século 7; muitos fatores pontam para esta origem. Como muita coisa daquela época, ele nos veio por meio dos árabes (donde se explicam alguns termos, como “xeque”, título de nobre árabe), que ainda conservam em sua língua termos originais do jogo em sua origem indiana (como o nosso “bispo”, que é chamado pelos árabes de “elefante” – o que faz sentido, aliás, dentro do jogo. Pense no bispo como uma unidade militar blindada, o equivalente moderno dos elefantes encouraçados das guerras indianas antigas, e seus movimentos farão muito mais sentido).

Saberia se existe algo que desabonasse sua prática por cristãos?

Não, em absoluto. Só o que poderia ser problemático seria uma relação pouco sadia com o jogo (deixar de cumprir os seus deveres para jogar, etc.), não o jogo em si. Pelo contrário, aliás: é um excelente treinamento mental, para quem gosta (não é o meu caso; não gosto de jogo algum, mas meu gosto não é parâmetro para nada…).

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