Pode o católico colaborar com a Legião da Boa Vontade?

– “Por que não colaborar com a Legião da Boa Vontade?” (Boa Vontade – Teófilo Ottoni-MG).

Há certas palavras que fazem vibrar o íntimo da alma humana, pois representam elevado ideal; tal, por exemplo, a expressão “Boa Vontade”. É o que em grande parte explica a difusão da “Legião da Boa Vontade” entre nós. Esta sociedade parece estimular ao extremo a nobreza de afetos; dir-se-ia que o “legionário” é o homem magnânimo por excelência, capaz de abraçar a todos e a tudo em sua mente dilatada, ao passo que os adversários da LBV fazem o papel de mesquinhos, intolerantes… Atraídos por tal cartaz, muitos católicos aderem à Legião.

Na realidade, quem reflete um pouco percebe que a campanha da LBV é um dos mais requintados fatores da destruição de qualquer empreendimento. Vejamos bem.

Aquilo que tanto seduz na campanha de Alziro Zarur (1957), a pregação da caridade, não é em absoluto próprio da Legião da Boa Vontade; o Santo Evangelho já há vinte séculos o ensina através da Igreja Católica; nesta não faltam instituições de beneficência (orfanatos, asilos, colégios etc.) que, talvez por serem tradicionais, chamam menos a atenção e às vezes se vão sustentando com dificuldade. “Quotidiana vilescunt”, diz o adágio; o que é costumeiro perde o seu caráter interessante, nem se nota mais; ao contrário, as novidades seduzem as massas, que pouco refletem.

Não é preciso, pois, que um católico se inscreva na Legião da Boa Vontade para que tenha ocasião de trabalhar em prol dos necessitados; torne-se, antes, um católico de fibra, o qual não se dá por satisfeito com rótulos ou palavras apenas.

O que caracteriza o movimento de Zarur é “querer desconhecer a filosofia ou a religião que cada um professa”, é querer fundir todos os que creem (no que quer que seja) e os que não creem, numa só campanha.

Mas não seria isto ótima coisa?

Tal postulado implica necessariamente o fracasso do bem ou da boa vontade. Com efeito, nenhum homem pode prescindir de uma certa ideologia que lhe dê uma explicação da vida e oriente os seus passos; todos procuram espontaneamente a resposta para certas perguntas básicas: De onde viemos? Para onde vamos? O que significa o homem, com o qual devo tratar? O que vem a ser o bem? O que é o mal e de onde vem? É a solução dada a estas questões que vai nortear a conduta de cada um. Quem crê em Deus, encara a vida diversamente de quem não crê; quem aceita a doutrinação espírita, não considera a vida presente como o católico. Ora, cedo ou tarde, em qualquer empreendimento de relevo, vêm à tona tais interrogações; e, se os colaboradores não lhes dão a mesma resposta, separam-se, não podem continuar a obra. Quantas vezes não se ouve falar de iniciativas que falharam por causa de desentendimentos!

Nem se poderia esperar outra coisa. Como não riríamos se alguém nos dissesse: “Vamos trabalhar juntos em tal painel ou na caiação de tal parede, sem pensar na luz que ilumine nossa oficina, nossas mãos e nosso material”? Trabalhar sem levar em conta o fator “luz”, só atendendo ao fator “energia”, é impossível; a luz é anterior ao emprego da energia; torna-se indispensável que os operários tenham todos o mesmo tipo de olhos, iluminados pela mesma luz (branca, azul, vermelha etc.), de modo a verem como vermelho o que é vermelho, como grande o que é grande, como redondo o que é redondo etc. Se não se preenche previamente esta condição, é impossível começar a colaboração. Pois bem: tal observação, verídica no plano do trabalho material, é igualmente (ou mais ainda) verídica no plano das atividades espirituais, caritativas etc. A luz que se deve acender previamente para que haja beneficência são certos princípios doutrinários (o que é a vida, quem é o homem e qual o seu destino…); se os “pretensos colaboradores” não são todos iluminados pelas mesmas proposições, assemelham-se a cegos que querem atingir em comum o mesmo objetivo, atirando cada um conforme o seu próprio parecer, arranjado ou improvisado. O que pode resultar disso?

De resto, pelas afirmações da Legião da Boa Vontade verifica-se que esta sociedade não se pode furtar a propor certas ideias e combater outras; a tese da reencarnação, por exemplo, parece ser um de seus princípios prediletos; e essa tese nos leva para as regiões do espiritismo e do hinduísmo. [Outrora] já se [propalou até] mesmo que “Alziro Zarur é Elias redivivo”… talvez para preparar o fim do mundo. Quantas ideias se vão assim incutindo a quem se chega à Legião da Boa Vontade! No mínimo, o “legionário” irá formando em si um conceito relativo ou cético de Verdade. E isto é tremendo, pois solapa totalmente o ardor e a alegria. O homem possui tal grandeza de alma que só se pode satisfazer dando-se Àquele que é o Absoluto; ora, o Absoluto é um só, tem uma só face, a qual fala não somente de Amor, mas também de Verdade única, inconfundível.

  • Fonte: Revista Pergunte e Responderemos nº 5:1957 – set/1957
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